Acidente de Alcântara

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Acidente de Alcântara
Acidente de Alcântara
Destroços da estrutura de lançamento do VLS
Hora 13h26m6s
Duração 8m45s[1]
Data 22 de agosto de 2003 (20 anos)
Local Alcântara
Localização Centro de Lançamento de Alcântara
Coordenadas 2° 22' 39.52" S 44° 23' 57.71" O
Também conhecido como VLS-1 V03
Mortes 21

O acidente de Alcântara, também conhecido como tragédia de Alcântara, foi um grande incêndio seguido de algumas explosões, que destruíram o foguete brasileiro VLS-1 V03 em sua plataforma de lançamento no Centro de Lançamento de Alcântara, matando 21 técnicos civis.[2][3]

O objetivo da missão, nomeada Operação São Luís, era colocar o microssatélite meteorológico SATEC do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais e o nanosatélite UNOSAT da Universidade do Norte do Paraná em órbita circular equatorial a 750 km de altitude.

Origem[editar | editar código-fonte]

O foguete, proposto em 1979,[4] teve até o acidente duas tentativas de lançamento: uma em 1997, que acabou no Oceano Atlântico devido ao não acionamento de um dos motores do primeiro estágio[5][6] e outra em 1999, destruído de forma remota devido à penetração de uma chama na parte superior do bloco do segundo estágio 3 minutos após a decolagem.[7][8]

Operação São Luís[editar | editar código-fonte]

Além de ser o terceiro voo do VLS-1, a operação tinha como objetivos o lançamento dos satélites SATEC e UNOSAT; verificar a capacidade do CLA de realizar lançamentos do tipo e o uso do CLBI como estação de rastreio.[9] O transporte de materiais para o V03 foi iniciado em 23 de agosto de 2002[10] e interrompido em 16 de abril de 2003. A operação foi reiniciada dia 1 de julho, uma vistoria realizada no dia seguinte não encontrou nenhum problema e os satélites foram transportados no dia 30.[11]

Acidente[editar | editar código-fonte]

Vista aérea do Centro de Lançamento de Alcântara durante o acidente

Após diversas operações na montagem, o acidente ocorreu às 13h 26min 06s (horário de Brasília) do dia 22 de agosto de 2003,[12] três dias antes da data prevista para o lançamento.[13][1] Ficou registrado entre os quadros 26 e 27 gravados pelo circuito fechado de TV da Torre Móvel de Integração.[14][15] Uma ignição não planejada destruiu o veículo de lançamento enquanto estava na plataforma do CLA.[14] 21 pessoas faleceram devido à ignição de um motor do primeiro estágio.[16] Levou cerca de oito segundos até que a torre fosse envolvida pela fumaça e gases aquecidos até 3 000ºC.[17] A torre móvel sustentou-se de pé por cinco minutos.[1]

Sobreviventes relataram o barulho de pelo menos um propulsor funcionado e diversos estrondos.[1]

Devido à escala do evento, os falecidos foram identificados via uma lista de chamada[18] e os restos mortais foram identificados e enviados para o IML no dia 23 de agosto de 2003.[19] No mesmo dia, a base foi reaberta para a imprensa.[20]

Ao mesmo tempo que ocorria o acidente, o presidente da AEB Luiz Bevilacqua, dava uma entrevista coletiva sobre o acordo firmado entre o Brasil e a Ucrânia para uso da base de Alcântara, que deu origem à empresa Alcântara Cyclone Space. Ao ser informado do acidente por jornalistas, ironizou dizendo "Só se for um foguete de São João".[21][22] Foi identificado que o processo de ignição ocorreu antes da hora e com isso a torre de lançamento não foi retirada a tempo, sendo esta a principal causa do incêndio.[23]

Nenhuma das ações realizadas no dia representavam risco[24] e o acidente atrasou consideravelmente o programa espacial brasileiro.[25]

Investigação[editar | editar código-fonte]

Velório ocorrido no dia 27 de agosto de 2003

O Inquérito Policial Militar foi instaurado no dia 26 de agosto de 2003 e a Comissão Técnica de Investigação foi designada em 28 de agosto de 2003.[26] A investigação teve participação da Rússia[27] por pedido do ministério da Defesa, sendo respondido com o envio de seis técnicos da Agência Aeroespacial Russa.[28] As famílias das vítimas chegaram a pedir por uma investigação independente,[29] algo que o então presidente Lula não se pronunciou, mas que anunciou o envio de um projeto de lei para a indenização das famílias das vítimas.[30][23] Uma Comissão Especial da Câmara dos Deputados visitou a base no dia 20 de outubro.[31] A indenização foi aprovada pela Câmara no dia 28 de outubro de 2003.[32] Apesar das evidências de espionagem francesa no Maranhão, não foram encontradas evidências de sabotagem.[33]

A conclusão de tanto os investigadores brasileiros quanto russos foi de que a causa do acidente foi devido ao acionamento não planejado do propulsor A.[34] Entre as possíveis causas da ignição, levantaram a possibilidade da eletricidade estática, com os especialistas russos notando a inexistência de uma ponte entre o propelente e a carcaça do propulsor, mas foi considerado um evento de baixa probabilidade devido a não ocorrência de raios no dia.[35] A hipótese da descarga eletrostática foi considerada superior,[36] devido à inexistência de uma barreira entre os propulsores do primeiro estágio.[37]

Resultados[editar | editar código-fonte]

A torre de integração, que custou R$ 6,5 milhões em 1995, teve um custo de aproximadamente R$ 10 milhões para ser reconstruída.[38] A torre de lançamento foi concluída e entregue em 2012, mas em 2013 a base ainda não havia terminado sua reconstrução.[39] Uma maquete do VLS-1 foi testada na torre em 2012,[40] mas em 2016 foi decidido encerrar o programa do VLS em favor do VLM.[41] O VLS-1 V04 chegou a ter 70% de sua estrutura concluída, mas foi cancelado com o fim do programa.[42]

Vítimas[editar | editar código-fonte]

O acidente vitimou 21 civis que estavam trabalhando no momento do incêndio.[22][23][43]

Veja também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. a b c d Berquó et al. 2004, p. 32.
  2. Zimmermann, Patrícia (22 de agosto de 2003). «Ignição de motor provocou explosão de foguete, diz ministro». Folha 
  3. «Acidente em Alcântara começou com incêndio, diz comandante». Folha. 23 de agosto de 2003 
  4. Berquó et al. 2004, p. 7.
  5. Berquó et al. 2004, p. 11.
  6. Folha de São Paulo, 3 de novembro de 1997.
  7. Cabrera 2003, p. 27.
  8. Berquó et al. 2004, p. 12.
  9. Berquó et al. 2004, p. 14.
  10. Berquó et al. 2004, p. 16.
  11. Berquó et al. 2004, p. 17.
  12. Berquó et al. 2004, pp. 18-21.
  13. Zurita 2021.
  14. a b Leite 2013.
  15. Berquó et al. 2004, p. 30.
  16. Today 2003.
  17. Berquó et al. 2004, p. 31.
  18. Zimmermann 2003.
  19. Valente & Lessa 2003.
  20. Meneghini 2003.
  21. Estado 2003.
  22. a b Mendonça & Cosso 2003.
  23. a b c D'Alama 2013.
  24. Global 2003.
  25. Konner 2013.
  26. Berquó et al. 2004, p. 22.
  27. Berquó et al. 2004, p. 23.
  28. Agência Brasil, 3 de setembro de 2003.
  29. Nogueira 2003.
  30. Cosso 2003.
  31. Agência Brasil, 20 de outubro de 2003.
  32. Agência Brasil, 29 de outubro de 2003.
  33. Ferraz 2013.
  34. Berquó et al. 2004, p. 37.
  35. Berquó et al. 2004, p. 39, 3.2.1.2 Eletricidade estática no propelente.
  36. Berquó et al. 2004, p. 62.
  37. Berquó et al. 2004, pp. 61-62.
  38. Nogueira 2003a.
  39. Agência Brasil, 12 de fevereiro de 2013.
  40. DefesaNet, 12 de julho de 2012.
  41. DefesaNet, 29 de dezembro de 2016.
  42. Silva 2021, p. 388.
  43. «Tragédia anunciada». Época. 29 de agosto de 2013. Consultado em 5 de maio de 2020 

Bibliografia[editar | editar código-fonte]