Alexander Selkirk

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Alexander Selkirk
Alexander Selkirk
Estatua d'Alexander Serlkirk a Lower Largo
Nascimento 1676
Lower Largo
Morte 13 de dezembro de 1721 (44–45 anos)
Cape Coast
Sepultamento Cape Coast
Cidadania Reino da Grã-Bretanha, Escócia
Ocupação marinheiro
Causa da morte febre amarela

Alexander Selkirk (167613 de dezembro de 1721) foi um marinheiro escocês que passou quatro anos como náufrago após ser abandonado em uma ilha deserta. Supõe-se que suas aventuras tenham inspirado Daniel Defoe a compor o clássico da literatura Robinson Crusoe.[1]

Biografia[editar | editar código-fonte]

Juventude[editar | editar código-fonte]

O sétimo filho de Elphan e John Selcraig, um curtidor e sapateiro de Lower Largo, Fife, Escócia, Selkirk nasceu em 1676, e na sua juventude demonstrou tendência a rompantes de rebeldia e violência. Intimado pela lei em 27 de agosto de 1695 por "comportamento indecente na igreja", ele não compareceu à audiência, tendo preferido partir para o mar.[1]

Permaneceu longe seis anos, fugindo das restrições e desaprovações de sua comunidade e aprendendo o ofício de marinheiro. Acabou voltando em 1701, "mais impulsivo e tempestuoso do que nunca", de acordo com alguns biógrafos. Tempos depois Andrew, irmão de Alexander, dá lhe um copo de água salgada, que o outro bebe incauto. Ao começar a rir da reação do irmão, Andrew é severamente espancado, o mesmo acontecendo a John, seu irmão mais velho, e também ao pai, que tentou intervir. Na confusão acaba sobrando também para a esposa de John, que é atingida por um golpe na cabeça.[1]

Dessa vez ele não conseguiu escapar da audiência, e em 30 de novembro de 1701, diante de todos no púlpito da igreja, "reconheceu seus pecados ao entrar em conflito com seus irmãos", sendo repreendido pela congregação e dispensado sob a promessa de que se regeneraria "em nome do Senhor". Aquilo fora humilhação suficiente para o jovem impulsivo. O inverno reteve-o em Largo, mas com a chegada da primavera ele partiu novamente. A princípio envolveu-se em expedições bucaneiras para as Ilhas do Sul, e em 1703 juntou-se à expedição do corsário e explorador de renome William Dampier. Enquanto Dampier capitaneava o St. George, Selkirk serviu na galé acompanhante Cinque Ports como mestre de navegação sob o comando de Thomas Stradling.[1]

Náufrago[editar | editar código-fonte]

Livro de 1835 baseado na vida de Selkirk

Em outubro de 1704, após as embarcações se separarem devido a um desentendimento entre Stradling e Dampier, o Cinque Ports dirigiu-se à ilha Más a Tierra (atualmente conhecida como Ilha Robinson Crusoe) no arquipélago desabitado de Juan Fernández, ao largo da costa do Chile, para renovar suas provisões e o estoque de água. O local, alvo de uma tentativa mal-sucedida de colonização pelos espanhóis, encontrava-se então abandonado, servindo como ponto de parada frequente para marinheiros britânicos.[1]

Neste ponto, Selkirk tinha graves preocupações a respeito da capacidade de navegação da galé, cuja estrutura mostrou-se não se adaptar bem ao clima tropical. Contando com a passagem iminente do St. George, ele disse a Stradling que preferia ficar em Más a Tierra a afundar com o Cinque Ports, tentando convencer alguns dos seus colegas a desertar e permanecer na ilha. Ninguém concordou, mas o capitão declarou que lhe concederia aquele desejo, abandonando-o sozinho no local. Selkirk imediatamente se arrependeu da decisão, mas não havia como voltar atrás. Como fora abandonado e não expulso, pôde permanecer com seus pertences, e munido de seu mosquete, pólvora, ferramentas variadas (incluindo suas ferramentas náuticas), uma faca, uma Bíblia, livros de salmos, algumas peças de roupa e uma corda, ele passaria os quatro anos e quatro meses seguintes privado de qualquer companhia humana. Quanto ao Cinque Ports, acabou naufragando em alto-mar, vitimando a maioria de seus marujos.[1]

Vida na ilha[editar | editar código-fonte]

Ouvindo sons estranhos vindo do interior da ilha, que ele temia serem bestas perigosas, Selkirk permaneceu à princípio na linha costeira. Durante este período ele comia frutos do mar e vasculhava o oceano diariamente por sinais de resgate, sofrendo nesse meio tempo de solidão, angústia e remorso. Hordas de ruidosos leões-marinhos, reunindo-se na praia para a temporada de acasalamento, finalmente o obrigaram a explorar o interior da ilha. Uma vez ali, sua vida deu uma guinada para melhor. Mais alimentos estavam disponíveis: cabras selvagens – introduzidas ao habitat pelos antigos colonos espanhóis – forneceram-lhe carne e leite, complementados por uma dieta de nabo, repolho e pimenta-preta. Apesar de ratos atacarem-no à noite, Selkirk foi capaz, ao domesticar e viver próximo a gatos selvagens, de dormir profundamente e em segurança.[1]

"Selkirk lendo sua Bíblia", gravura de 1837

Selkirk provou ser engenhoso em utilizar o equipamento que trouxera, assim como materiais disponíveis na ilha. Ele construiu, próximo a uma fonte de água, duas cabanas a partir de árvores de pimenta-da-jamaica, utilizou seu mosquete para caçar cabras, e a faca para limpar suas carcaças.[2] Quando a munição ficou escassa, passou a caçar suas presas a pé e, durante uma dessas perseguições, feriu-se seriamente ao cair de um penhasco, ficando inconsciente por aproximadamente um dia. O animal a quem caçava, pelo menos, amorteceu-lhe a queda, poupando-o de ferimentos mais graves. Ele lia a Bíblia com frequência, procurando nela conforto para a sua condição e prática para o seu inglês.[3]

As lições que aprendera no curtume de seu pai na infância foram de grande ajuda durante a estadia na ilha; quando suas roupas puíram, ele produziu novos trajes a partir da pele das cabras, usando um prego para costurar. Depois que seus sapatos desgastaram, ele não teve necessidade de fabricar outros uma vez que seu pé calejado e endurecido tornou qualquer outra proteção desnecessária. Quanto aos instrumentos, ele conseguiu ao menos forjar uma nova faca a partir dos anéis dos barris abandonados na praia.

Nesse ínterim, duas embarcações ancoraram na ilha, mas eram ambas espanholas; no auge da Guerra da Sucessão e na condição de corsário e escocês, Selkirk corria um grande risco caso fosse capturado. Da primeira vez, seguiu até a praia para determinar a nacionalidade do navio ancorado; ao descobrir, pôs-se a correr, não sem antes servir de alvo aos mosquetes espanhóis, cujos donos decidiram não perseguir mais além aquela estranha figura. O segundo encontro, no entanto, foi mais arriscado. Tendo os espanhóis desembarcado sem o náufrago os ter visto, a sua única opção foi buscar refúgio no topo de uma árvore, de onde viu seus perseguidores matarem diversos animais e urinarem no sopé da própria árvore onde se escondia. Frustrados e incapazes de encontrar o marinheiro inimigo, os espanhóis levantaram vela e partiram.[1]

Desenho de 1859 mostrando o resgatado Selkirk (sentado, à direita) sendo levado a bordo do Duke

O esperado resgate ocorreu em 1 de fevereiro de 1709 na forma do Duke, um navio privado pilotado justamente por William Dampier. Selkirk foi descoberto pelo capitão do Duke, Woodes Rogers, que referiu-se a ele como "governador" da ilha. Finalmente entre irmãos, ele ficou praticamente louco de alegria. O ágil náufrago, capturando duas ou três cabras por dia, ajudou a restaurar a saúde abalada pelo escorbuto dos homens de Rogers, e o capitão eventualmente fez amizade com ele, concedendo-lhe o comando independente de um de seus navios. Um livro de autoria de Rogers, A cruising voyage round the world: first to the South-Sea, thence to the East-Indies, and homewards by the Cape of Good Hope, foi publicado em 1712, e incluía um relato sobre o suplício de Selkirk. Na mesma época ele foi entrevistado por Richard Steele, e o artigo sobre suas aventuras, publicado no The Englishman, foi um sucesso entre os leitores.[4]

Últimos anos[editar | editar código-fonte]

Muitos que estiveram com Selkirk após o resgate (como o capitão Rogers e o jornalista Steele), impressionaram-se com a paz de espírito e vigor corporal que o ex-náufrago adquirira enquanto na ilha. No começo de 1717, Selkirk retornou a Lower Largo, mas permaneceu apenas alguns meses. Conheceu ali Sophia Bruce, uma criada de dezesseis anos. Eles fugiram para Londres, mas aparentemente não se casaram pois, em março daquele ano, o marujo estava de volta ao trabalho. Mais tarde, em visita a Plymouth, ele casou-se com uma estalajadeira viúva.[5]

Um diário de bordo registra que Selkirk morreu às oito da noite de 13 de dezembro de 1721, enquanto servia como tenente a bordo do navio real Weymouth. Ele provavelmente foi vítima da febre amarela que devastou igualmente grande parte daquela tripulação. Foi sepultado no mar, próximo à costa ocidental de África.[5]

Legado[editar | editar código-fonte]

Placa em homenagem a Selkirk em Lower Largo

Um dos muitos leitores do livro do capitão Woodes Rogers foi o escritor Daniel Defoe, e a história das desventuras de Selkirk exerceu profunda influência na caracterização do personagem-título de sua obra-prima Robinson Crusoe. Uma das semelhanças mais evidentes é a vestimenta de pele de cabra de seu náufrago, e apesar de no contexto do livro parecer absurda e desnecessária (levando-se em conta que a ilha paradisíaca foi transposta por Defoe do Pacífico para o Atlântico, com seu clima temperado e muito mais quente), esta permanece como uma das características mais marcantes do personagem.[1]

Em 1863, em homenagem à passagem do escocês por Más a Tierra, a tripulação do HMS Topaze inaugurou uma placa de bronze em um local chamado de "Selkirk's Lookout" ("Observatório de Selkirk") em uma elevação da ilha. Na mesma época, a ilha mais ocidental do Arquipélago Juan Fernández foi rebatizada de Ilha Alejandro Selkirk, embora ele provavelmente jamais a tenha visitado.[6]

Em 11 de dezembro de 1885, após um discurso de Lorde Aberdeen, sua esposa desvelou uma estátua de bronze e uma placa de Alexander Selkirk no exterior de uma residência construída no local onde ficava a casa do marinheiro, na Rua Principal de Lower Largo, Fife, Escócia. David Gillies, um descendente dos Selkirks, doou a estátua, que foi produzida por T. Stuart Burnett.[7]

Em 2007, uma expedição arqueológica liderada pelo dr. Dalvid Caldwell anunciou a descoberta do local exato habitado por Selkirk na ilha, definindo o terreno onde ele construiu suas cabanas e apresentando como evidência um dos instrumentos náuticos do escocês, recuperado durante as escavações.[2][8]

Referências

  1. a b c d e f g h i Desperate Journeys, Abandoned Souls: True Stories of Castaways and Other Survivors. Edward E. Leslie. Houghton Mifflin Harcourt. ISBN 9780395911501 (1998)
  2. a b "Dig finds camp of 'real Crusoe'". BBC News, 1 de novembro de 2008
  3. "Providence display’d, or a very surprising account of one". Woodes Rodgers. The British Library journal, Volumes 5-6. British Museum Publications (1979)
  4. Richard Steele, "Alexander Selkirk," The Englishman. Artigo original de 1713, reproduzido no site do Brooklyn College English Department
  5. a b "Scientists Research the Real Robinson Crusoe". Der Spiegel, 2 de junho de 2009
  6. Marooned: The Strange But True Adventures of Alexander Selkirk. Robert Kraske. Clarion Books. ISBN 0-618-56843-3 (2005)
  7. "Notable Dates in History" Arquivado em 5 de dezembro de 2014, no Wayback Machine.. Scots Independent
  8. "Mystery of Alexander Selkirk, the real Robinson Crusoe, solved". The Telegraph, 30 de outubro de 2008

Ligações externas[editar | editar código-fonte]

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