Conquista de Ceuta

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Conquista de Ceuta (1415)
Reconquista

Painel de azulejos de Jorge Colaço (1864 - 1942) na Estação de São Bento, no Porto: o Infante D. Henrique na conquista de Ceuta.
Data 22 de agosto de 1415 (608 anos)
Local Ceuta
Desfecho
Beligerantes
Reino de Portugal Império Merínida
Comandantes
D. João I

Infante D. Henrique
Ben Salah
(governador)
Forças
45 000 homens Desconhecido
Baixas
8 homens mortos Vários milhares de mortos ou feitos prisioneiros
1 canhão capturado

A Conquista de Ceuta, cidade islâmica no Norte de África, por tropas portuguesas sob o comando de João I de Portugal, deu-se a 22 de Agosto de 1415.[1]

Os motivos

As causas e origens da conquista de Ceuta não são hoje suficientemente claras: uma das razões, a Causa Bélica, teria sido a oportunidade dos infantes (D. Duarte, D. Pedro e D. Henrique) serem armados cavaleiros por um feito de guerra.[2] Outra, a Causa Religiosa, defendida por historiadores como Joaquim Bensaúde (1859-1951), viram na figura do infante D. Henrique um símbolo do espírito de cruzada, defendendo ter havido na génese da expansão um zelo religioso; Outra, a Causa Política, talvez a ameaça castelhana constante sobre a cidade, defendida por historiadores como Jaime Cortesão (1884-1960), que realçava o desejo da antecipação a Castela na expansão para o norte de África. Estes motivos não são incompatíveis com a Causa Económica, defendida por António Sérgio (1883-1969) e, mais recentemente, Vitorino Magalhães Godinho (1918-2011): Ceuta era uma cidade rica e teriam sido levados pela burguesia comercial, que queria canalizar para Lisboa o tráfego do Mediterrâneo ocidental feito por aquela cidade. Para se informar de todos os pormenores da cidade, D. João I enviou à Sicília dois embaixadores com o pretexto de pedirem a mão da rainha para o infante D. Pedro;[3] estes na passagem colheram todas as informações sobre Ceuta.[1]

Causas

Estas são consideradas as principais razões da conquista de Ceuta:[1]

  • Geoeconómicas: a posição geográfica de Ceuta permitiria controlar a entrada e saída dos navios vindos do Atlântico para o Mediterrâneo e vice-versa através do estreito de Gibraltar, de modo que a costa do Algarve parasse de ser atacada por piratas oriundos ou baseados na cidade muçulmana.
  • Religiosas: havia um desejo de expansão da fé cristã através do incremento de territórios onde o cristianismo poderia ser implantado.
  • Sociais: as classes mais abastadas tinham vários interesses nesta conquista. A nobreza buscava novas terras, honras e rendas; o clero desejava expandir a fé cristã; e a burguesia estava à procura de novos produtos e mercados.
  • Económicas: Portugal sofria com a falta de diversos produtos como trigo, ouro, prata, e especiarias. A conquista de Ceuta significaria para o reino lusitano o controle sobre uma cidade em que afluiam os produtos orientais vindos da Índia pelas rotas caravaneiras que traziam ouro, especiarias, etc. Ressalte-se ainda que a cidade era uma zona fértil, apropriada para a produção de cereais.
  • Políticas: o reino português procurava aumentar sua importância no quadro das monarquias ibéricas através do estabelecimento de Ceuta como o ponto mais oriental da reconquista cristã a ser feita por Portugal no norte da África.

A conquista

Infante D. Henrique na conquista de Ceuta, em azulejos de Jorge Colaço no Centro Cultural Rodrigues de Faria

Um exército de cerca de 19 000 a 20 000 cavaleiros e soldados portugueses, ingleses, galegos e biscainhos havia largado de Lisboa a 25 de Julho de 1415, embarcado em 212 navios de transporte e vasos de guerra (59 galés, 33 naus e 120 embarcações pequenas)[1]. Na expedição seguia a fina flor da aristocracia portuguesa do século XV, incluindo os príncipes Duarte (o herdeiro), Pedro, Duque de Coimbra e Henrique, Duque de Viseu, além do condestável Nuno Álvares Pereira.

Após uma escala em Lagos, fundearam diante de Ceuta a 21 de Agosto, tendo efectuado o desembarque sem encontrar resistência por parte dos Mouros.

A guarnição da cidade de Ceuta correu a fechar as portas da cidade, mas as tropas portuguesas foram rápidas a impedir o estabelecimento de defesas adequadas.

Na manhã de 22 de Agosto, Ceuta estava em mãos portuguesas. Segundo Azurara, nessa altura, foi pedido a D. João Vasques de Almada que hasteasse a bandeira de Ceuta, que é idêntica à bandeira de Lisboa mas na qual foi acrescentado o brasão de armas do Reino de Portugal ao centro, símbolo que perdura até hoje.

Depois a mesquita foi consagrada e, na primeira missa lá realizada, os três príncipes da Ínclita geração presentes foram feitos cavaleiros pelo seu pai.

Ceuta seria a primeira possessão portuguesa em África, estratégica para a exploração Atlântica que começava a ser efectuada.

A conquista foi recordada como:

"(...) Já passavam de sete horas e meia depois do meio dia, quando a cidade foi de todo livre dos mouros. (...) As outras Companhias [de soldados portugueses], não tinham maior cuidado doutra coisa que de apanharem o esbulho. (...) Muitos que se acercaram primeiramente naquelas lojas dos mercadores que estavam na rua direita, assim como entraram pelas portas sem nenhuma temperança nem resguardo, davam com suas facas nos sacos das especiarias, e esfarrapavam-nos todos, de forma que tudo lançavam pelo chão. E bem era para haver dor do estrago, que ali foi feito naquele dia. Que as especiarias eram muitas de grosso valor. E as ruas não menos jaziam cheias delas (...) as quais depois que foram calcadas pelos pés da multidão das gentes que por cima delas passavam, e de si com o fervor do sol que era grande, davam depois de si muy grande odor. (...)" (Crónica da Tomada de Ceuta, Gomes Eanes de Zurara, 1450.)

Deixando ficar o conde de Viana, D. Pedro de Meneses, o rei, os infantes e o resto da frota regressaram a Lisboa em Setembro, tendo permanecido durante treze dias em Ceuta.

Os marroquinos não se conformaram e atacaram a cidade duas vezes, em 1418 e em 1419, sem sucesso.

Manter a cidade constituía-se em um problema logístico: era necessário enviar suprimentos, armas e munições; a maior parte dos soldados era recrutada à força, recorrendo-se a condenados e criminosos a quem o rei comutava a pena desde que fossem para Ceuta e ainda recompensar generosamente os nobres que ocupavam postos de chefia. Julgaram consegui-lo, quando do desastre português de Tânger, pedindo como resgate do infante de D. Fernando a cidade de Ceuta. Mas D. Fernando faleceu no cativeiro e a cidade continuou portuguesa (1443).[1]

Ceuta teve que se aguentar sozinha, durante 43 anos, até que a posição da cidade ser consolidada com a tomada de Alcácer Seguer (1458), Arzila e Tânger (1471).

A cidade foi reconhecida como possessão portuguesa pelo Tratado de Alcáçovas (1479) e pelo Tratado de Tordesilhas (1494).

Quando da Dinastia Filipina, Ceuta manteve a administração portuguesa do Reino de Portugal, assim como Tânger e Mazagão. Todavia, quando da Restauração Portuguesa, não aclamou o Duque de Bragança, como rei de Portugal, mantendo-se espanhola. A situação foi oficializada em 1668 com a assinatura do Tratado de Lisboa entre os dois países, e que pôs fim à guerra da Restauração.

O fracasso de Ceuta

As expectativas relacionadas aos benefícios da conquista de Ceuta não se confirmaram a longo prazo. Sob a ótica econômica, pode-se afirmar que o domínio português sobre a cidade se revelou um completo fracasso. As rotas comerciais que chegavam ou passavam por Ceuta foram desviadas para outras localidades. Além disso, o permanente estado de guerra comprometia o cultivo dos campos e a produção de cereais. Os muçulmanos chegaram a sequestrar o Infante Dom Fernando (considerado santo a partir deste episódio) e outras pessoas, para exigir Ceuta de volta, mas Portugal não cedeu e os prisioneiros acabaram por ser torturados e morrer. A situação agravou-se em função das elevadas despesas militares necessárias à manutenção da praça africana. Os membros da corte chegaram a cogitar o abandono da cidade. O Infante D. Pedro, em carta ao seu irmão, afirmava mais tarde:

Referências

  1. a b c d e «Tomada de Ceuta». Porto Editora. Infopédia. Consultado em 22 de agosto de 2012 
  2. Crónica da Conquista de Ceuta, Gomes Eanes de Zurara
  3. Chronica De El-rei D. João, Gomes Eanes De Zurara

Bibliografia

  • Gomes Eanes de Zurara, Crónica da Tomada de Ceuta (escrita em 1453, trata-se de uma importante obra relativa a esta guerra.)
  • Mestre Mateus Pisano, Livro da guerra de Ceuta (escrito, em 1460, em latim, este livro foi vertido em português por Roberto Correia Pinto.)
  • Antoine de la Sale (única testemunha ocular da guerra de Ceuta), Consolações dirigidas a Catharina de Neufville, Senhora de Fresne (escrita, em 1453, em francês, esta obra foi vertida em português pelo general Carlos du Bocage.)
  • Arkan Simaan, L'Ecuyer d'Henri le Navigateur (romance histórico, em francês, editado por Harmattan. Nos primeiros capítulos encontra-se uma descrição da tomada de Ceuta e da ocupação da cidade até o cerco de 1418-1419. Em seguida vem o relato das atividades do Infante Dom Henrique em Sagres, as expedições marítimas, as descobertas de Porto Santo e da Madeira, a passagem do cabo Bojador por Gil Eanes, o desastre de Tanger e a chegada dos primeiros escravos africanos em Lagos.)
  • Aileen Gallagher, Prince Henry the Navigator: Pioneer of Modern Exploration (2003) ISBN 978-0-8239-3621-2
  • Jeff Kinard, Artillery: an illustrated history of its impact (2007) ISBN 978-1-85109-556-8
  • Kenneth Warren Chase, Firearms: a global history to 1700 (2003) ISBN 978-0-521-82274-9
  • Peter O. Koch, To the ends of the earth: the age of the European explorers (2003) ISBN 978-0-7864-1565-6
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