Entrelaçamento quântico

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Mecânica quântica
Princípio da Incerteza
Introdução à mecânica quântica

Formulação matemática

Conceitos fundamentais
Estado quântico · Função de onda
Superposição · Emaranhamento

· Incerteza
Efeito do observador
Exclusão · Dualidade
Decoerência · Teorema de Ehrenfest · Tunelamento

O entrelaçamento quântico (ou emaranhamento quântico, como é mais conhecido na comunidade científica) é um fenômeno da mecânica quântica que permite que dois ou mais objetos estejam de alguma forma tão ligados que um objeto não possa ser corretamente descrito sem que a sua contra-parte seja mencionada - mesmo que os objetos possam estar espacialmente separados por milhões de anos-luz. Isso leva a correlações muito fortes entre as propriedades físicas observáveis das diversas partículas subatômicas. O entrelaçamento quântico foi chamado de "ação fantasmagórica à distância" por Albert Einstein, que acreditava ser um evento impossível, sob as leis da mecânica quântica ortodoxa.[1][2]

Essas fortes correlações fazem com que as medidas realizadas numa delas pareçam estar a influenciar instantaneamente à outra com a qual ficou entrelaçada, e sugerem que alguma influência estaria a propagar-se instantaneamente, apesar da separação entre elas. Mas o entrelaçamento quântico não permite a transmissão a uma velocidade superior à da velocidade da luz, porque nenhuma informação útil pode ser transmitida desse modo. Só é possível a transmissão de informação usando um conjunto de estados entrelaçados em conjugação com um canal de informação clássico - aquilo a que se chama o teletransporte quântico. Isto dá a entender que tudo está conectado por "forças" que não vemos e que permanecem no tempo, ou estão fora do sistema que denominamos, entendemos ou concebemos como sistema temporal.

O entrelaçamento quântico é a base para tecnologias emergentes, tais como computação quântica, criptografia quântica e tem sido usado para experiências como o teletransporte quântico. Ao mesmo tempo, isto produz alguns dos aspectos teóricos e filosóficos mais perturbadores da teoria, já que as correlações previstas pela mecânica quântica são inconsistentes com o princípio intuitivo do realismo local, que diz que cada partícula deve ter um estado bem definido, sem que seja necessário fazer referência a outros sistemas distantes. Os diferentes enfoques sobre o que está a acontecer no processo do entrelaçamento quântico dão origem a diferentes interpretações da mecânica quântica.

Teorema de Bell[editar | editar código-fonte]

De acordo com a mecânica quântica, o spin de um elétron não pode ser conhecido com antecedência e ainda ser perfeitamente correlacionado com o outro. Einstein, em particular, não gostava dessa ideia porque ela dava a entender que a informação poderia ser enviada a partir de um elétron para o outro instantaneamente – quebrando uma regra que diz que nada pode viajar mais rápido do que a velocidade da luz. Em vez disso, a suposição de Peter Mosley, da Universidade de Bath, é a de que havia variáveis ocultas codificadas em cada elétron que poderiam determinar o resultado se nós conseguíssemos acessá-las.[3]

Na década de 1960, o cientista norte-irlandês John Bell veio com um método para testar a teoria de Einstein. A chamada desigualdade de Bell é satisfeita apenas se as ações em um local não puderem afetar outro lugar instantaneamente e os resultados das medições forem bem definidos de antemão – algo apelidado de “realismo local”. Bell mostrou, teoricamente, que o entrelaçamento quântico violaria sua teoria da desigualdade, mas teorias realistas contendo as variáveis ocultas, não. Isso ocorre porque a ligação entre partículas entrelaçadas é mais forte do que Einstein queria acreditar. Então, se a correlação medida entre pares de partículas de um experimento fosse acima de um determinado limiar, seria inconsistente com variáveis ocultas e a teoria do emaranhamento quântico estaria correta.[3]

Entrelaçamento quântico de uma única partícula[editar | editar código-fonte]

O entrelaçamento quântico de uma única partícula foi demonstrado por uma equipe da Universidade Griffiths. Usando uma técnica chamada "Homodyne Detection", eles dividiram um único fóton entre dois laboratórios e testaram se a medição de uma parte alterava o status da outra. Dessa forma, verificaram a ocorrência do entrelaçamento.[4]

Dois fótons são emitidos por uma fonte S e são propagados em duas direções opostas.

Na teoria, o entrelaçamento acontece quando duas partículas continuam conectadas apesar de estarem separadas. Dessa forma, o que acontece em uma partícula é refletido na outra. Por exemplo, um spin no sentido horário na primeira partícula será equivalente a um spin no sentido anti-horário na segunda, com o spin combinado das duas sendo zero. No entanto, medir uma partícula pode ser uma ação sobre ela, que, por sua vez, afetaria a outra partícula. Então seria impossível saber se a ação na segunda partícula é um resultado do entrelaçamento ou da medição.[5]

Mas existia a possibilidade do entrelaçamento quântico acontecer com uma única partícula. Se um único fóton for dividido em duas partes de pacote de onda ainda conectadas, essa conexão é considerada um entrelaçamento. No entanto, a partícula em si nunca é detectada em mais de um lugar - quando medida, sua função de onda entra em colapso. Isso foi descrito por Albert Einstein há 80 anos em um artigo e se tornou conhecido como o paradoxo EPR. A conclusão era que o entrelaçamento de uma única partícula seria impossível, ou que as definições da realidade física vindas da mecânica quântica estavam erradas.[5]

A equipe da Universidade de Griffiths verificou quantitativamente a "ação fantasmagórica" de Einstein, ao violar uma desigualdade de Einstein-Podolsky-Rosen em 0,042 ± 0,006. O experimento também verificou o emaranhamento do fóton único dividido, mesmo quando um lado não é confiável.[4]

Fontes de fótons emaranhados[editar | editar código-fonte]

Fontes de fótons emaranhados, conforme publicado na Nature, estão no cerne do processamento de informações quânticas fotônicas.[6] Desde a década de 1980, sabe-se como gerar pares de fótons emaranhados através do processo de conversão descendente paramétrica espontânea (SPDC), onde um feixe de fótons é dividido em pares emaranhados passando-o através de um cristal.[7] Para evitar muito ruído (isto é, múltiplos eventos de pares de fótons), os pares de fótons só podem ser produzidos com uma probabilidade de emissão baixa por pulso (p),[8] tipicamente p <0,1 por pulso de excitação. Essa ineficiência tem sido, portanto, tinha sido uma das desvantagem intrínseca dessas fontes.[9]

Muitas tecnologias fotônicas quânticas exigem a geração eficiente de pares emaranhados de fótons, mas até 2018 havia poucas maneiras de produzi-las de maneira confiável. Fontes baseadas em conversão paramétrica descendente operaram com uma eficiência muito baixa por pulso devido ao processo de geração probabilística. Os pontos quânticos de semicondutores podem emitir determinados pares de fótons emaranhados deterministicamente, mas ficam aquém devido à eficiência de extração extremamente baixa. Estratégias para extrair fótons únicos de pontos quânticos, como incorporá-los em cavidades ópticas de banda estreita, eram difíceis de traduzir para fótons emaranhados.[10]

Sistemas ópticos com aprimoramento quântico que operam dentro da região espectral de 2 a 2,5 μm podem ajudar a revolucionar aplicações emergentes em comunicações, sensoriamento e metrologia. Até 2019, fontes de fótons emaranhados foram realizadas principalmente na janela espectral de 700 a 1 550 nm do infravermelho próximo. Em 2020, uma equipe de pesquisa de 15 membros, usando um cristal não linear feito de niobato de lítio, desenvolveu um método para gerar e detectar fótons quânticos emaranhados a um comprimento de onda de 2,1 micrômetros.[11] Os pares de fótons emaranhados no comprimento de onda de 2 micrômetros seriam significativamente menos influenciados pela radiação solar de fundo. Além disso, especialmente para comprimentos de onda de dois micrômetros, os fótons são menos absorvidos pelos gases atmosféricos, permitindo uma comunicação mais eficaz.[12]

Entrelaçamento quântico de mais de uma partícula[editar | editar código-fonte]

Uma equipe da Universidade de Ciência e Tecnologia da China (USTC) conseguiu entrelaçar 18 qubits em apenas seis fótons conectados.[13] Isso é um número sem precedentes de três qubits por fóton e um registro do número de qubits vinculados uns aos outros por meio do entrelaçamento quântico.[14]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. «Emaranhamento quântico cria novo estado da matéria | Scientific American Brasil | Nastari Editores». www2.uol.com.br. Consultado em 17 de maio de 2018 
  2. «O Universo é qântico (página 6)». cftc.cii.fc.ul.pt. Consultado em 17 de maio de 2018 
  3. a b «Emaranhamento quântico finalmente é provado». HypeScience. 3 de dezembro de 2015 
  4. a b Fuwa, Maria; Takeda, Shuntaro; Zwierz, Marcin; Wiseman, Howard M.; Furusawa, Akira (24 de março de 2015). «Experimental proof of nonlocal wavefunction collapse for a single particle using homodyne measurements». Nature Communications (em inglês). 6 (1). ISSN 2041-1723. doi:10.1038/ncomms7665 
  5. a b «Pesquisadores demonstram o entrelaçamento quântico entre uma partícula - e provam que Einstein estava errado». revistagalileu.globo.com 
  6. Kimble, H. J. (junho de 2008). «The quantum internet». Nature (em inglês). 453 (7198): 1023–1030. ISSN 1476-4687. doi:10.1038/nature07127 
  7. Burnham, David C.; Weinberg, Donald L. (13 de julho de 1970). «Observation of Simultaneity in Parametric Production of Optical Photon Pairs». Physical Review Letters. 25 (2): 84–87. doi:10.1103/PhysRevLett.25.84 
  8. Pan, Jian-Wei; Chen, Zeng-Bing; Lu, Chao-Yang; Weinfurter, Harald; Zeilinger, Anton; Żukowski, Marek (11 de maio de 2012). «Multiphoton entanglement and interferometry». Reviews of Modern Physics. 84 (2): 777–838. doi:10.1103/RevModPhys.84.777 
  9. Wang, Xi-Lin; Chen, Luo-Kan; Li, W.; Huang, H.-L.; Liu, C.; Chen, C.; Luo, Y.-H.; Su, Z.-E.; Wu, D. (15 de novembro de 2016). «Experimental Ten-Photon Entanglement». Physical Review Letters. 117 (21). 210502 páginas. doi:10.1103/PhysRevLett.117.210502 
  10. Chen, Yan; Zopf, Michael; Keil, Robert; Ding, Fei; Schmidt, Oliver G. (31 de julho de 2018). «Highly-efficient extraction of entangled photons from quantum dots using a broadband optical antenna». Nature Communications (em inglês). 9 (1): 1–7. ISSN 2041-1723. doi:10.1038/s41467-018-05456-2 
  11. Prabhakar, Shashi; Shields, Taylor; Dada, Adetunmise C.; Ebrahim, Mehdi; Taylor, Gregor G.; Morozov, Dmitry; Erotokritou, Kleanthis; Miki, Shigehito; Yabuno, Masahiro (1 de março de 2020). «Two-photon quantum interference and entanglement at 2.1 μm». Science Advances (em inglês). 6 (13): eaay5195. ISSN 2375-2548. doi:10.1126/sciadv.aay5195 
  12. «A new method for generating quantum-entangled photons» (em inglês). 31 de março de 2020 
  13. Letzter,LiveScience, Rafi. «Chinese Researchers Achieve Stunning Quantum-Entanglement Record». Scientific American (em inglês) 
  14. Wang, Xi-Lin; Luo, Yi-Han; Huang, He-Liang; Chen, Ming-Cheng; Su, Zu-En; Liu, Chang; Chen, Chao; Li, Wei; Fang, Yu-Qiang (28 de junho de 2018). «18-Qubit Entanglement with Six Photons' Three Degrees of Freedom». Physical Review Letters. 120 (26). 260502 páginas. doi:10.1103/PhysRevLett.120.260502 
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