Hieróglifo

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Hieróglifos em uma estela funerária.

Hieróglifo ou hieroglifo é cada um dos sinais da escrita de antigas civilizações, tais como os egípcios, os hititas, e os maias. Também se aplica, depreciativamente, a qualquer escrita de difícil interpretação, ou que seja enigmática.

Deve-se ao linguista francês Jean-François Champollion a decifração dos hieróglifos egípcios.

Hieróglifos egípcios

Hieróglifo é um termo originário de duas palavras gregas: ἱερός (hierós) "sagrado", e γλύφειν (glýphein) "escrita". Apenas os sacerdotes, membros da realeza, altos cargos, e escribas conheciam a arte de ler e escrever esses sinais "sagrados".

A escrita hieroglífica constitui provavelmente o mais antigo sistema organizado de escrita no mundo, e era vocacionada principalmente para inscrições formais nas paredes de templos e túmulos. Com o tempo evoluiu para formas mais simplificadas, como o hierático, uma variante mais cursiva que se podia pintar em papiros ou placas de barro, e ainda mais tarde, com a influência grega crescente no Oriente Próximo, a escrita evoluiu para o demótico, fase em que os hieróglifos iniciais ficaram bastante estilizados, havendo mesmo a inclusão de alguns sinais gregos na escrita.

Uso ao longo dos tempos

Os hieróglifos foram usados durante um período de 3.500 anos para escrever a antiga língua do povo egípcio.

Existem inscrições desde antes de 3000 a.C. até 24 de Agosto de 394, data aparente da última inscrição hieroglífica, numa parede no templo da ilha de File.

Constituíam uma escrita monumental e religiosa, pois eram usados nas paredes dos templos, túmulos, etc. Existem poucas evidências de outras utilizações.

Durante os mais de três milênios em que foram usados, os egípcios inventaram cerca de 6.900 sinais. Um texto escrito nas épocas dinásticas não continha mais do que 700 sinais, mas no final desta civilização já eram usados milhares de hieróglifos, o que complicava muito a leitura, sendo isso mais um dos fatores que tornavam impraticável o seu uso e levaram ao seu desaparecimento.

Quando e como desapareceram os hieróglifos

Com a invasão de vários povos estrangeiros ao longo da sua história, a língua e escrita locais foram se alterando, incorporando novos elementos. Fatores decisivos foram a introdução dos idiomas grego e latino, com a conquista pelos respectivos impérios. Também o cristianismo, ao negar a religião politeísta local, contribuiu bastante para que o conhecimento desta escrita se perdesse, no século V depois de Cristo. Tudo o que estava relacionado com os antigos deuses egípcios era considerado pagão, e portanto, proibido.

Hieróglifos e o alfabeto

O primeiro alfabeto consonantal conhecido foi elaborado com a seleção de cerca de 26 hieróglifos que eram signos uniconsonantais, ou seja, o primeiro alfabeto foi elaborado pelos escribas egípcios, e era consonantal, só representando o som de consoantes.

Como todos os alfabetos posteriores derivam deste, inclusive o fenício, algumas letras usadas por nós são simplificações das imagens usadas nos hieróglifos originais, a letra "T" deriva de um hieróglifo semelhante a uma cruz, também notável é a letra "M" que derivou do hieróglifo que era usado para simbolizar a água, e que pode ser facilmente reconhecido, pois graficamente é simplesmente a junção de três letras "m".[1]

Pedra de Roseta

Pedra de Roseta.
Ver artigo principal: Pedra de Roseta

A Pedra de Roseta é um texto do Antigo Egito escrito em hieróglifos, grego e demótico egípcio num grande bloco de granito, facilmente confundido com basalto. Esse texto foi descoberto em 1799 por homens sob o comando de Napoleão Bonaparte enquanto cruzavam a região de Roseta, Egito. Esse texto foi fundamental para a compreensão dos hieróglifos atualmente. Ele foi compreendido pela primeira vez por Jean François Champollion em 1822 e por Thomas Young em 1823, comparando a versão em hieróglifos com a em grego, sendo que ambos eram profundos conhecedores da língua grega. Ela refere-se a um decreto de Ptolomeu V Epifânio, do Egito ptolomaico. Hoje, a pedra encontra-se no Museu Britânico, Londres, sendo que foi cedida às autoridades militares britânicas em 1801, graças ao Tratado da Capitulação.

Decifração dos hieróglifos egípcios

A decifração do sistema de escrita dos hieróglifos egípcios é geralmente atribuída a Jean François Champollion, o chamado "Pai da Egiptologia". Nascido na França em 1790, desde muito jovem Champollion mostrou um grande interesse pelo estudo das línguas orientais, e aos 16 anos já conhecia hebraico, árabe, persa, chinês e várias outras línguas asiáticas.

Concluiu que o cóptico, a língua falada pelos cristãos egípcios ainda existentes, correspondia ao último estágio da antiga língua egípcia. Esta foi a sua grande vantagem sobre o médico inglês Thomas Young, que também investigou o significado dos hieróglifos, embora com menos sucesso.

Inicialmente, Champollion estava convencido, tal como Young, de que os hieróglifos eram puramente simbólicos, sem qualquer valor fonético. No entanto, após estudar várias inscrições hieroglíficas contendo nomes reais, tais como o obelisco de Bankes e a Pedra de Roseta, Champollion descobriu que afinal muitos hieróglifos possuíam o efeito fonético comum aos ideogramas.

O estudo da antiga língua egípcia - vinculada nos hieróglifos egípcios - avançou bastante durante o século XX, com o trabalho de linguistas como Sir Alan Gardiner e Hans Jakob Polotski, que permitiram uma melhor compreensão da gramática e do sistema verbal.

Princípios gerais da escrita hieroglífica egípcia

Direção de leitura

Alfabeto hieroglífico (unilíteros)
Sinal Transliterção Pron. Descrição
A
3 a Oclusiva-glotal-surda
Aleph semítico
Abutre egipcio
i
i Constritiva-palatal-sonora
yod semítico.
Junco florescente
ii
ou
y
y y Constritiva-palatal-sonora
Como no inglês Yes
Dupla de juncos
a
ˁ a Fricativa-faringal-sonora
ayin semítico
Braço
w
ou
W
w u Constritiva-bilabial-sonora
Como no inglês war
Filhote de codorna
b
b b Oclusiva-labial-sonora
"B", como em português
Parte inferior da pierna
p
p p Oclusiva-labial-surda
"P", como em português
Esteira
f
f f Fricativa-labiodental-surda
"F", como em português
Cobra com chifres
m
m m Oclusiva-sonora-labial-nasal
"M", como em português
Coruja
n
n n Oclusiva-sonora-dental-nasal
"N", como em português
Água
r
r r Líquida-vibrante-dental
"R", como em português
Boca
h
h h Aspirada-laringal-surda
H aspirado, como no inglês how
Planta de uma casa
H
h Aspirada-faringal-surda
Som surdo, da faringe. árabe
Corda retorcida
X
j Fricativa-palatal-surda
Som de ch como no gaélico escocês loch
Placenta (?)
x
j Fricativa-velar-surda
Som de ch como no alemão ich خ árabe
Úbere
s
ou
z
s s Fricativa-sibilante-dental-sonora
"S", como em português
Roupa dobrada ou
Fecho de porta
S
š sh Sibilante-pré-palatal-surda
Som de Sh
Piscina
q
q Uvular-oclusiva-surda
"Q" semítico
Colina
k
k k Oclusiva-velar-surda-aspirada
"k" como em "casa"
Cesto com asa
g
g g Oclusiva-palatal-fraca
"G", como em gato
Base para vaso
t
t t Oclusiva-dental-surda
"T", como em português
Pão
T
ch Oclusiva-dental-surda
Som de tch
Amarras
d
d d Oclusiva-dental-fraca
"D" menos sonoro que em português
Mão
D
dy Africada-pré-palatal-fraca
Som intermediário entre o G (de gelo) e o D
Cobra

A escrita hieroglífica podia ser escrita em linhas ou colunas, tanto da esquerda para a direita, como da direita para a esquerda. Para identificar a direção de leitura de um determinado texto, deve-se analisar a direção para onde os sinais estão voltados. Os sinais hieroglíficos estão sempre voltados para o início do texto[2].

Desta forma, o texto

nTrnfrnb
Z1
tA
tA
nb
ir
x t
←ramnxpr→G38ra
Z1
←G26ms
z
nfrxpr→

deve ser lido da esquerda para a direita, pois os sinais (como o do machado sagrado, do olho, e dos pássaros) estão voltados para a esquerda[3].

Os sinais, ainda, eram agrupados de forma a construir um conjunto harmonioso, com a escrita dos hieróglifos dentro de quadrados imaginários. Em um texto, os sinais superiores são sempre lidos antes dos inferiores .

Desta forma, o texto

nTrnfrnb
Z1
tA
tA
nb
ir
x t

Deve ser lido nesta ordem:

nTrnfrnbZ1tAtAnbirxt

Tipos de sinais

Os sinais hieroglíficos egípcios são divididos entre ideogramas e fonogramas.

Ideogramas

Quando um único sinal representa, sozinho, uma determinada ideia ou coisa, ele é considerado um ideograma. Por exemplo, o sinal

pr

que representa uma casa, pode significar a palavra “casa”.

Na maior parte das vezes, os ideogramas funcionam como determinativos. Ao final das palavras, um ideograma é colocado, para indicar a qual categoria uma palavra pertence[4].

Por exemplo, o sinal

O49

é um determinativo para a ideia de cidade. Assim, pode-se identificar que as palavras

AbbDw
Z1
O49
z
G39
wt
O49

são nomes de cidades, pois terminam com o hieróglifo

O49

Os cartuchos, dentro dos quais era escrito o nome de reis e rainhas, era também um ideograma, relacionado à ideia de eternidade[5].

sw
t
bit
t
ra
Z1
←nbw
kA
kA
kA→
dianxra
Z1
mi

Fonogramas

Em egípcio antigo, os fonogramas poderiam ser de três tipos[6]:

  • unilíteros, ou alfabéticos: quando cada sinal representa apenas um som. Estes são os sinais que formam o chamado “alfabeto” egípcio.
  • bilíteros, quando um sinal representa dois sons. Por exemplo,
wr

e

pr

são sinais que representam duas consoantes (na ordem, wr e pr).

  • trilíteros, quando um sinal representa três sons. Como, por exemplo,
anx

, ou

nTr

ou

nfr

.

(Na ordem, os sinais representam os sons an, nr e nfr)[7].

A escrita egípcia não representava vogais, apenas consoantes e semivogais. A partir do período ptolemaico, alguns sinais foram adaptados para representar vogais dos nomes dos governantes estrangeiros (como Cleópatra e Ptolomeu, que eram nomes gregos)[8].

Neste texto, que deve ser lido da esquerda para a direita, está escrito:
D
S43
i
n
ir
st A40
swN41
t
wr&r&t
x
r
ir
st A40
←mwttnfrit

r
y
nN36
t→
mAaxrw
Palavras ditas por Osíris: grande rainha, perante Osíris. Nefertari, amada de Mut. Note o nome da rainha escrito dentro de um cartucho

Ver também

Referências

  1. Fischer, Steven Roger (2007). História da Escrita. [S.l.: s.n.] ISBN 978-85-7139-950-1 
  2. FONTOURA JR., Antonio. Hieróglifos Egípcios: um curso de introdução à leitura e decifração de textos do Antigo Egito. Curitiba: PatolaLivros, 2010.
  3. GARDINER, A. Egyptian Grammar: being an introduction to the study of hieroglyphs.Oxford: Griffith Institute, 1988.
  4. GARDINER, A. Egyptian Grammar: being an introduction to the study of hieroglyphs.Oxford: Griffith Institute, 1988.
  5. FONTOURA JR., Antonio. Hieróglifos Egípcios: um curso de introdução à leitura e decifração de textos do Antigo Egito. Curitiba: PatolaLivros, 2010.
  6. ALLEN, J. P. Middle Egyptian: an introduction to the language and culture of hieroglyphs.Cambridge: Cambridge University Press, 2001.
  7. ALLEN, J. P. Middle Egyptian: an introduction to the language and culture of hieroglyphs.Cambridge: Cambridge University Press, 2001.
  8. FONTOURA JR., Antonio. Hieróglifos Egípcios: um curso de introdução à leitura e decifração de textos do Antigo Egito. Curitiba: PatolaLivros, 2010.

Outras leituras

  • ALLEN, J. P. Middle Egyptian: an Introduction to the Language and Culture of Hieroglyphs. Cambridge: Cambridge University Press, 2001.[1]
  • FONTOURA JR., Antonio. Hieróglifos Egípcios: um Curso de Introdução à Leitura e Decifração de Textos do Antigo Egito. Curitiba: PatolaLivros, 2010.[2]
  • GARDINER, A. Egyptian Grammar: Being an Introduction to the Study of Hieroglyphs. Oxford: Griffith Institute, 1988.[3]
  • OLIVEIRA, Francis Lousada Rubiini de. A Escrita Sagrada do Egito Antigo. Dicionário Hieróglifo-Português. Ed. autor, 2008.
  • PARKINSON, Richard. O Guia dos Hieróglifos Egípcios. Editora Madras. ISBN 85-370-0027-2

Ligações externas