Jurisprudência

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Um julgamento (gravura britânica do século XIX).

Jurisprudência (do latim: jus "justo" + prudentia "prudência") é o termo jurídico que designa o conjunto das decisões sobre interpretações das leis feitas pelos tribunais de uma determinada jurisdição.

Origem

A jurisprudência nasceu com o direito romano mas ganhou importância com o common law inglês, que foi desenvolvido para ir contra os costumes locais que não eram comuns. Para combater isso o rei enviava juízes que presidiam aos júris e constituiu um sistema de regras e tribunais separados. O direito inglês apresenta-se como direito jurisprudencial, como um direito casuístico, ou case law, em que predomina a regra do precedente, temperada pela aplicação do princípio da equidade.

Conceito

A jurisprudência pode ser conceituada tanto em termos gerais quanto pela ótica do caso particular. Sob a primeira perspectiva é definida como o conjunto das soluções dadas pelos tribunais as questões de Direito. Para a segunda, denomina-se Jurisprudência o movimento decisório constante e uniforme dos tribunais sobre determinado ponto do Direito. Para Marcel Nast, Professor da Universidade de Estrasburgo “a Jurisprudência possui, na atualidade, três funções muito nítidas, que se desenvolveram lentamente: uma função um tanto automática de aplicar a lei; uma função de adaptação, consistente em pôr a lei em harmonia com as ideias contemporâneas e as necessidades modernas; e uma função criadora, destinada a preencher as lacunas da lei"[1]. Nos tempos modernos o conceito termina por se afigurar como a causa mais geral da formação dos costumes jurídicos.

Um aprofundamento teórico

Para o acadêmico Dimitri Dimoulis[2], a Jurisprudência representa fonte escrita do Direito; e para que possamos compreendê-la em sua inteireza, deve ser realizada uma distinção entre três figuras decisórias emanadas pelo Poder Judiciário (decisão isolada, jurisprudência assentada e súmula).

I - Decisão isolada

O Direito funciona por uma mecânica impositiva. Dizer isso significa que ele não se limita apenas a ordenar e prescrever comportamentos, mas utiliza-se também de sanções no caso de descumprimento da norma. Desta mesma maneira impositiva são solucionados os conflitos de Direito levados ao Poder Judiciário. Assim, afirma-se que os tribunais resolvem as controvérsias jurídicas a eles encaminhadas de forma definitiva; ou seja, possuem a “última palavra”. Caso um ordenamento jurídico não funcionasse dessa maneira, a aplicação do Direito seria impossível.

Quando essa decisão judicial - que representa a “última palavra” - não pode mais ser derrubada via instrumento jurídico recursal, passa a ser considerada e a possuir força de coisa julgada.

Torna-se latente a relevância da Jurisprudência enquanto elemento de constituição do Direito e de condição precípua para a sua aplicação/fruição. Extrai-se também que as decisões dos Tribunais possuem caráter vinculativo para as partes litigantes; e mediante seu poderio decisório terminam por criar normas jurídicas individuais aplicáveis a casos concretos[3].

II - Jurisprudência assentada

A jurisprudência assentada compreende um conjunto de decisões uniformes dos tribunais, proveniente de uma aplicação uniforme de um mesmo conjunto de normas a casos semelhantes. Caso tribunais distintos decidirem por um largo período de tempo de uma maneira semelhante, o grau vinculativo desse posicionamento será muito maior que o da decisão isolada. Quando isso ocorre, temos a existência de uma jurisprudência assentada, que diferentemente da decisão isolada, desempenha uma função muito mais integradora do Direito, pacificando o entendimento interpretativo do direito vigente.

Por mais que exista uma jurisprudência assentada/dominante sobre uma determinada questão jurídica, nada impede que no futuro, um tribunal venha a decidir de uma maneira distinta. Contudo, por comprometerem a segurança jurídica e a própria autoridade do Poder Judiciário , modificações jurisprudenciais efetuadas por tribunais inferiores são algo extremamente raro.

Assim e na prática, a existência de uma jurisprudência assentada afeta substancialmente o modo pelo qual futuros tribunais decidirão casos abarcados pela jurisprudência existente.

III - Súmulas

A segurança jurídica afigura-se enquanto elemento imprescindível para a consecução das finalidades do Estado de Direito Moderno. A contribuição dos tribunais a esse princípio norteador do ordenamento jurídico constitucional ocorre pela uniformização da jurisprudência via publicação de súmulas de jurisprudência predominante.

Por configurarem-se enquanto proposições que dizem respeito a interpretação do direito como resultado de uma jurisprudência assentada, as súmulas formalizam juridicamente as teses jurídicas corroboradas pelos tribunais. É o que se percebe no caput do artigo 479 do Código de Processo Civil: o julgamento, tomado pelo voto da maioria absoluta dos membros que integram o tribunal, será objeto de súmula e constituirá precedente na uniformização da jurisprudência.

Por mais que possuam um grau alto de importância, as súmulas não vinculam de maneira plena os tribunais que as emitem e os tribunais a eles inferiores. Tal assertiva decorre da premissa teórica de que a atividade judicial dos juízes brasileiros reside em interpretar e aplicar as normas gerais do ordenamento jurídico. Ou seja, não tem o poder para criar essas normas gerais, nem tampouco para vincular plenamente os demais membros do Poder Judiciário.

Contudo, na prática vislumbra-se uma tendência generalizada de respeito a súmula que corrobora uma jurisprudência dominante. Isso explica melhor a constatação empírica de as súmulas serem publicadas não somente nas coletâneas de jurisprudência mas também nas de legislação; cumprindo salientar que a existência de uma súmula não impede que no futuro uma lei disponha entendimento contrário ao que ela denota.

Ver também

Notas

  1. Maximiliano, Carlos. “Hermenêutica e aplicação do Direito”. 20 ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2011. Pág. 146.
  2. A exposição dos argumentos do Professor Dimitri Dimoulis foram baseadas na seguinte obra: Dimoulis, Dimitri. “Manual de Introdução ao estudo do Direito: definição e conceitos básicos, norma jurídica.../ 4. Ed. Rev. Atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. Págs. 177 a 180.
  3. Dimoulis explora a distinção entre leis em sentido material e as decisões do Poder Judiciário. Analisando o ordenamento jurídico brasileiro termina por elencar dois pontos principais de distinção. O primeiro diz respeito ao grau vinculativo desses instrumentos jurídicos: no caso das decisões judiciais abrange somente as partes do processo. O segundo decorre do fato de que a atividade legislativa possui um poder discricionário muito mais amplo que a atividade judicial, pois o Magistrado – em consonância com os ditâmes da lei - possui o dever de aplicar o Direito em vigor (art. 35, I, da Lei Orgânica da Magistratura).