Modernização conservadora

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Modernização conservadora é um conceito elaborado por Barrington Moore Jr.[1] para retratar o caso de desenvolvimento capitalista na Alemanha e no Japão. A revolução burguesa, bem como o processo de industrialização desses países, fez-se através de um pacto político entre a burguesia industrial e a oligarquia rural - pacto orquestrado no interior do Estado -, sem rupturas violentas. Os Junkers alemães, no caso da Alemanha, conseguiram controlar a transição para a modernidade sem se contrapor a ela e sem deixar de estimulá-la, sobretudo no que se refere à industrialização, e sem tampouco perder o controle do campo - mantendo suas propriedades herdadas do período feudal.

Barrington Moore identifica três vias possíveis para se chegar à modernidade, desde o mundo pré-industrial: [1]:13-15 a democrática, a autoritária e a socialista revolucionária. A primeira levou à construção de sociedades capitalistas e democráticas na Inglaterra, na França e nos Estados Unidos. Já a segunda, também capitalista, "na ausência de um forte surto revolucionário, passou através de formas políticas reacionárias até culminar com o fascismo." O terceiro caminho foi o comunismo, que se desenvolveu na Rússia e na China.[2]

A abordagem da modernização conservadora abriu uma interessante linha de interpretação dos processos de construção do Estado e da modernização capitalista, tanto nos países centrais, quanto na América Latina. No Brasil, o livro de Moore teve grande impacto, especialmente porque a segunda das três vias para a modernidade parecia se encaixar perfeitamente na trajetória brasileira.[3] O conceito foi utilizado para explicar o desenvolvimento econômico do país pós-1964,[4] entendido como um processo de modernização que não destruiu os elementos tradicionais, provenientes da antiga sociedade pré-industrial, e no qual os proprietários rurais permaneceram no centro do poder político (ver: Milagre econômico brasileiro).

Na agricultura, a expressão clássica da modernização conservadora é a revolução verde, ou segunda revolução agrícola, em que a produção agrícola foi modernizada, por meio de implementos agrícolas, pacotes agroquímicos, sementes modificadas, etc., mas a estrutura agrária foi mantida. Segundo Alberto Passos Guimarães, a estratégia de modernização conservadora, "diferentemente da reforma agrária, tem por objetivo o crescimento da produção agropecuária mediante a renovação tecnológica, sem que seja tocada ou grandemente alterada a estrutura agrária."

A formulação sobre a modernização conservadora apresenta pontos de contato com o conceito de "revolução passiva", elaborado por Gramsci nos Cadernos do Cárcere, quando o autor analisa a continuidade na passagem do Risorgimento (1815-1871) ao fascismo (1922-1943), ou seja, de uma revolução passiva a outra. [5] :108 Na sequência das transformações sociais, econômicas e políticas que marcaram o processo de unificação italiana, a necessidade de inserção da economia do país no circuito europeu estimula a unificação das elites econômicas nacionais, que se associam ao Estado. Este assume uma política de modernização conservadora que se propõe estabelecer novas bases institucionais de modo a promover o crescimento da economia, conquanto preservadas as desigualdades, bem como privilégios e favores: "o poder do Estado preocupou-se apenas com o desenvolvimento, mesmo doentio, do capital industrial: proteções, prêmios, favores de todo tipo e de toda medida [...] O poder do Estado defendeu selvagemente o capital financeiro." [6] Gramsci também aplicou aquele mesmo conceito à URSS, após o fracasso da NEP e o advento do stalinismo. O autor percebe esse momento como uma regressão da URSS ao momento "econômico-corporativo", incapaz de gerar uma nova hegemonia e suscitando apenas uma revolução passiva específica do Oriente.[5]

Referências

  1. a b MOORE JR, B. As origens sociais da ditadura e da democracia: senhores e camponeses na construção do mundo moderno. São Paulo: Martins Fontes, 1975.
    Título original (em inglês): MOORE JR., Barrington. (1966), Social Origins of Dictatorship and Democracy: Lord and Peasant in the Making of the Modern World. Hardmondsworth, Penguin.
  2. O Termo Modernização Conservadora: sua origem e utilização no Brasil, por Murilo José de Souza Pires e Pedro Ramos. REN - Revista Econômica do Nordeste. Volume 40 nº 3, julho-setembro de 2009.
  3. A dialética da modernização conservadora e a nova história do Brasil, por José Maurício Domingues. Dados vol. 45, nº3. Rio de Janeiro, 2002.
  4. "Marxismo na Economia Brasileira", por Guido Mantega. In SZMRECSÁNYI, Tamás e SUZIGAN, Wilson (orgs.)História econômica do Brasil contemporâneo, p. 153. Edusp/Hucitec, 2002
  5. a b AGGIO, Alberto (org.) Gramsci - a vitalidade de um pensamento. Apresentação Leandro Konder. – São Paulo : Fundação Editora da UNESP, 1998. – (Prismas). Parte III - Gramsci, a América Latina e o Brasil, p. 161s.
  6. GRAMSCI, A. L'Ordine Nuovo: 1919-1920; Torino: Einaudi, 1954, p.77, apud Ivete Simionatto, "O social e o político no pensamento de Gramsci", in AGGIO, Alberto (org.) Gramsci - a vitalidade de um pensamento, p. 40.

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