Parerga e Paralipomena

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Parerga e Paralipomena - escritos filosóficos menores (Parerga und Paralipomena. Kleine philosophische Schriften, no original alemão) é o título da última obra do filósofo alemão Arthur Schopenhauer (1788-1860).

Foi publicada no final de 1851, convertendo-se, em pouco tempo, no primeiro livro de sucesso do autor. Schopenhauer tornou-se o filósofo da moda, obtendo a fama que durante a maior parte de sua vida lhe havia sido negada.

Assim o biógrafo de Schopenhauer Rüdiger Safranski se refere a Parerga e Paralipomena:

"Em 1850 [Schopenhauer] conclui os Parerga e Paralipomena, obra na qual havia trabalhado durante os últimos seis anos. Trata-se de "escritos secundários" e "coisas pendentes", ou, como ele mesmo diz, "pensamentos dispersos, embora sistematicamente ordenados, sobre diversos temas". Entre esses encontram-se os Aforismos para a sabedoria de vida, que se tornariam famosos."[1]

A obra é um tratado sobre vários assuntos, dentre eles há um capítulo intitulado "Aforismos para a sabedoria de vida". Este capítulo em específico tirou o filósofo "pessimista" do anonimato em que se encontrou por toda a vida, dando-lhe quase uma década (de 1852 a 1860, ano de seu falecimento) de reconhecimento internacional .

Em "Aforismos para a sabedoria de vida" o filósofo divide a vida humana em três condições básicas e fundamentais, para uma vida feliz: o que se é (sendo o mais importante, por ser obra da natureza e posse inabalável), o que se tem (bens materiais e tudo o que disso resulta, sendo importantíssimo para a segurança e conforto mundanos) e o que se representa para os outros (este constituindo-se na etapa importante nos relacionamentos, outra inevitável barreira da vida).

Após a publicação desse imenso tratado (com mais de 1000 páginas), Schopenhauer obteve uma notoriedade com a qual nunca havia sonhado. Consta em sua biografia (de Karl Weissman) que nesse período de "estrelato", chegou-se a noticiar no jornal local um pequeno ferimento que o filósofo havia sofrido na testa!

Enfim, uma filosofia prática fechava o ciclo de obras do alemão que soube unir a metafísica acadêmica alemã aos preceitos religiosos e filosóficos do oriente.

Etimologia das palavras do título[editar | editar código-fonte]

As palavras incomuns do título são de origem grega.

Par-erga (πάρ-εργα), é o plural de par-ergon (πάρ-εργον), que significa "coisa acessória"[2]. Trata-se de seis extensos ensaios que buscam complementar o pensamento do autor.

A forma plural para-l(e)ipómena (παρα-λ(ε)ιπόμενα; singular para-l(e)ipomenon) significa "omissões", "aquilo que foi omitido". Trata-se de 31 capítulos menores, divididos em tópicos numerados (§1 - §396), cobrindo assuntos ainda não abordados pelo filósofo, mas que complementam os Parerga, além de uma seção final de poesias.[3]

Conteúdo[editar | editar código-fonte]

Volume Um (Parerga)

  • Prefácio
  • Esboço de uma história da doutrina do ideal e real (Skitze einer Geschichte der Lehre vom Idealen und Realen). Schopenhauer expõe sua visão da história do problema da "coisa em si" de Kant na filosofia moderna, remontando-o à dúvida sobre a realidade do mundo exterior formulada por Descartes.
  • Fragmentos para a história da filosofia (Fragmente zur Geschichte der Philosophie). Segundo mais longo texto do primeiro volume, dividido em quatorze seções, abordando a filosofia em si, os pré-socráticos, Sócrates, Platão, Aristóteles, os estoicos, os neoplatônicos, os gnósticos, João Escoto Erígena, a Escolástica, Francis Bacon, a filosofia moderna, a filosofia de Kant e a filosofia do próprio Schopenhauer.
  • Sobre a filosofia da universidade (Über die Universitäts Philosophie). Texto polêmico contra a filosofia institucional de meados do século XIX, da qual Schopenhauer sentia-se marginalizado.
  • Especulação transcendente sobre a aparente intencionalidade no destino do indivíduo (Transcendente Spekulation über die anscheinende Absichtlichkeit im Schicksale des Einzelnen). Com base em sua filosofia, Schopenhauer busca uma explicação conjectural para a crença universal, encontrada em todas as épocas e povos, no destino e na providência.
  • Ensaio sobre a visão de espíritos e tudo com isso relacionado (Versuch über das Geistersehn und was damit zusammenhängt). Às explicações espiritualistas das aparições de fantasmas Schopenhauer contrapõe sua explicação idealista.[4]
  • Aforismos para a sabedoria de vida (Aphorismen zur Lebensweisheit). Ver seção abaixo.

Volume Dois (Paralipomena)

  • Sobre a filosofia e seu método (Über Philosophie und ihre Methode)
  • Sobre a lógica e a dialética (Zur Logik und Dialektik)
  • Idéias relativas ao intelecto em geral e em cada relação (Den Intellekt überhaupt und in jeder Beziehung betreffende Gedanken)
  • Algumas observações sobre a oposição entre a coisa em si e o fenômeno (Einige Betrachtungen über den Gegensatz des Dinges an sich und der Erscheinung")
  • Umas palavras sobre o panteísmo (Einige Worte über den Pantheismus)
  • Sobre a filosofia e a ciência natural (Zur Philosophie und Wissenschaft der Natur)
  • Sobre a teoria das cores (Zur Farbenlehre)
  • Sobre a ética (Zur Ethik)
  • Sobre a jurisprudência e política (Zur Rechtslehre und Politik)
  • Sobre a doutrina da indestrutibilidade de nossa verdadeira natureza pela morte (Zur Lehre von der Unzerstörbarkeit unseres wahren Wesens durch den Tod)
  • Adendos à doutrina da futilidade da existência (Nachträge zur Lehre von der Nichtigkeit des Daseins)
  • Adendos à doutrina do sofrimento do mundo (Nachträge zur Lehre vom Leiden der Welt). Em português publicado em volume independente sob o título As Dores do Mundo ou Dores do Mundo e numa coletânea de ensaios intitulada Sobre o Sofrimento do Mundo & outros ensaios. Neste ensaio Schopenhauer expõe, de forma contundente, sua visão pessimista do mundo e da vida, em frases como:
Onde iria Dante procurar o modelo e o assunto do seu inferno senão no nosso mundo real?
Se um Deus fez este mundo, eu não gostaria de ser esse Deus: a miséria do mundo esfacelar-me-ia o coração.
  • Sobre o suicídio (Über den Selbstmord)
  • Adendos à doutrina da afirmação e negação da vontade de viver (Nachträge zur Lehre von der Bejahung und Verneinung des Willens zum Leben)
  • Sobre a religião (Über Religion). Diálogo entre dois personagens, Demófeles e Filatetes, discutindo prós e contras da religião, por exemplo, "a religião é uma fraude, e chegará uma época em que a verdade estará ao alcance de todos, sem mistura com mitos e fábulas" versus "a religião preenche a necessidade de uma explicação metafísica e consola o homem nas amarguras da vida", etc.
  • Algo sobre a literatura sânscrita (Einiges zur Sanskritliteratur)
  • Algumas considerações arqueológicas (Einige archäologische Betrachtungen)
  • Algumas considerações mitológicas (Einige mythologische Betrachtungen)
  • Sobre a metafísica do belo e da estética (Zur Metaphysik des Schönen und Ästhetik)
  • Sobre o julgamento, crítica, aprovação e fama (Über Urteil, Kritik, Beifall und Ruhm)
  • Sobre a erudição e os eruditos (Über Gelehrsamkeit und Gelehrte)
  • Pensar por si mesmo (Selbstdenken)
  • Sobre a escrita e o estilo (Über Schriftstellerei und Stil)
  • Sobre a leitura e os livros (Über Lesen und Bücher)
  • Sobre a linguagem e as palavras (Über Sprache und Worte)[5]
  • Observações psicológicas (Psychologische Bemerkungen)
  • Sobre as mulheres (Über die Weiber)
  • Sobre a educação (Über Erziehung)
  • Sobre a fisiognomia (Zur Physiognomik)
  • Sobre o barulho e ruído (Über Lärm und Geräusch). Neste ensaio Schopenhauer invectiva contra o ruído incessante do estalar dos chicotes dos cocheiros das carruagens que percorrem as ruas da cidade, tirando a concentração de quem se dedica à atividade intelectual.
  • Alegorias, parábolas e fábulas (Gleichnisse, Parabeln und Fabeln)
  • Alguns versos ( Einige Verse)

Aforismos para a sabedoria de vida[editar | editar código-fonte]

Os Aforismos para a sabedoria de vida são o texto mais conhecido do primeiro volume de Parerga e Paralipomena. Com eles Schopenhauer enfim conquistou, tardiamente, o tão esperado sucesso de público. Esta extensa obra também foi publicada, com grande êxito, como um livro independente.

Neste texto mais longo, Schopenhauer pratica a “filosofia” no sentido original grego antigo de “amor à sabedoria” (“φιλο-σοφία” - philo-sophía). Por “filosofia como sabedoria” ele quer dizer:

a arte de tornar a vida tão agradável e feliz à medida das possibilidades individuais […], um tratado versando sobre a vida ditosa.

[6]

De Schopenhauer, cuja filosofia pessimista se baseia na tese metafísica de que a vida sequer vale a pena ser vivida, não seriam de esperar conselhos para uma vida feliz. Mas para as pessoas que querem tirar o melhor proveito de sua existência, ele dá conselhos que extrai da filosofia antiga (platonismo, aristotelismo, epicurismo e estoicismo) e indiana (Upanishades) e dos ensinamentos sobre sabedoria e felicidade.

Schopenhauer apresenta uma doutrina "negativa" da felicidade, uma espécie de "tecnologia para evitar o infortúnio", porque a "felicidade " segundo sua visão de mundo pessimista não pode ser tomada positivamente.

Na introdução aos Aforismos sobre a Sabedoria da Vida ele cunhou um neologismo para sua doutrina da arte de viver, suas instruções para uma vida feliz: “Eudemonologia”, do grego ευδαίμωνία (eudaimonía = felicidade) + λόγος (lógos = ensino)), literalmente, "ensinamentos de felicidade".[7]

O texto está dividido em uma introdução e seis capítulos:

  • Divisão fundamental
  • Do que cada um é
  • Do que cada um tem
  • Do que cada um representa
  • Parêneses e máximas[8]
  • Das diferentes épocas da vida.

Referências

  1. Schopenhauer und die wilden Jahre der Philosophie. Eine Biographie (em português: "Schopenhauer e os anos selvagens da filosofia), 1988, p. 450.
  2. Dictionnaire Grec-Français par Ch. Georgin, p. 568),
  3. Material desta seção obtido dos verbetes alemão e inglês da Wikipédia.
  4. Resumos dos ensaios obtidos no verbete correspondente da Wikipédia espanhola.
  5. Estes cinco últimos capítulos – Sobre a erudição e os eruditos, Pensar por si mesmo, Sobre a escrita e o estilo, Sobre a leitura e os livros, Sobre a linguagem e as palavras – foram reunidos no livro A Arte de Escrever, Porto Alegre, Editora L&PM, 2005, organização, tradução, prefácio e notas de Pedro Süssekind.
  6. Schopenhauer, Aforismos para a Sabedoria da Vida, tradução de Rômulo Argentière.
  7. Seção traduzida do verbete correspondente da Wikipédia alemã.
  8. A Parte B deste capítulo foi publicada em um livro independente sob o título Como Lidar Consigo Mesmo. Petrópolis, Editora Vozes, 2022, tradução de Vilmar Schneider.

Ligações externas[editar | editar código-fonte]