Chytridiomyceta

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Como ler uma infocaixa de taxonomiaChytridiomyceta
Ocorrência: Devónico - recente
Classificação científica
Domínio: Eukaryota
(sem classif.) Eumycota
Reino: Fungi
Sub-reino: Chytridiomyceta
Tedersoo et al., 2018[1]
Divisões[3]
Sinónimos

Chytridiomyceta é um clado do reino Fungi, tratado ao nível taxonómico de subreino nos sistemas de classificação biológica mais recentes,[1] que agrupa os fungos zoospóricos conhecidos pelos nomes comuns de quitrídios ou fungos flagelados, que se caracterizam por serem fungos simples, geralmente aquáticos, que se reproduzem mediante zoósporos.[2] Durante muito tempo tratado ao nível de divisão, como Chytridiomycota, o grupo viu a sua circunscrição taxonómica alargada para incluir outros grupos zoospóricos. Os quitrídios são um dos grupos mais basais na filogenia dos fungos,[4] maioritariamente saprófitos, que degradam quitina e queratina, embora também se possam tornar parasitas de animais e plantas. Muitos quitrídios são aquáticos (principalmente de água doce). Na sua presente circunscrição, o grupo inclui 4 divisões,[5] com aproximadamente 1000 espécies repartidas por 127 géneros.

Descrição[editar | editar código-fonte]

O nome deriva de chytridium (do grego chytrid, que significa "pequena caçarola"). Na antiga classificação, os quitrídios (exceto aqueles recentemente estabelecidos na ordem Spizellomycetales) foram colocados na classe Phycomycetes, subdivisão Phycomycotina do reino Fungi. No entanto, o grupo costumava ser geralmente considerado como integrante dos protistas. Embora com circunscrição taxonómica nem sempre coincidente, o agrupamento também recebeu nomes como Cilifungi, Archimycetes ou Zoosporiphera.

Morfologia e fisiologia[editar | editar código-fonte]

Embora alguns sejam unicelulares, a vasta maioria dos quitrídios são organismos multicelulares, com hifas ramificados e micélio simples. O talo é cenocítico esferoidal. Como os demais fungos, são aeróbicos, com exceção dos Neocallimastigomycetes, que são anaeróbicos por adaptação ao ambiente intestinal anóxico dos animais, possuindo hidrogenossomos em vez de mitocôndrias . Como outros fungos, a parede celular é composta de quitina, embora às vezes possa ser acompanhada de celulose como componente adicional.

Reprodução é principalmente assexuada ou com gerações alternadas com uma fase sexual. Tanto os zoósporos quanto os gâmetas dos quitrídios são uniflagelados (com flagelos opistocontos lisos, o que leva os fungos a serem classificados no grupo Opisthokonta). O talo é geralmente quitrídio, ou seja, desenvolve esporângios ou zoosporângios onde se formam os zoósporos. Na base do zoosporângio pode estar presente um micélio cenocítico, designado por rizomicélio.

Se o talo quitrídio forma rizomicélio, é denominado eucárpico, caso contrário, é denominado holocárpico. Os talos quitrídios eucárpicos podem ser classificados pelo número de zoosporângios que apresentam: se possuem apenas um, são denominados monocêntricos; mas se apresentam vários, conectados através do mesmo rizomicélio, são considerados policêntricos. Os talos quitídricos eucárpicos monocêntricos podem-se desenvolver dentro das células de um organismo hospedeiro (endobiótico) ou sobre as células do hospedeiro (epibiótico). Os esporângios ou zoosporângios são estruturas de reprodução assexuada ou sexuada. Os esporos são caracterizados por conter uma gotícula lipídica, um capote nuclear composto basicamente por ribossomas com membrana dupla, e por uma organela peculiar, denominada rumpossoma, cuja função não é clara, mas é utilizada como característica taxonómica distintiva. A disposição dos organelos dos zoósporos ajudam a classificar taxonomicamente os fungos deste grupo.[6][7]

Habitat e ecologia[editar | editar código-fonte]

Os quitrídios são principalmente fungos aquáticos, embora aqueles que os que têm como habitat a rede capilar em torno das partículas do solo sejam geralmente considerados terrestres. O zoósporo é principalmente um meio de sondar um pequeno volume de água em busca de um substrato adequado, em vez de um meio de dispersão a longa distância. Os quitrídios foram isolados de uma variedade de habitats aquáticos, incluindo turfas, pântanos, rios, lagoas, nascentess, e habitats terrestres, como solos ácidos, solos alcalinos, solos de florestas temperadas, solos de florestas tropicais húmidas e solos árticos.[8]

Indiscutivelmente, a função ecológica mais importante desempenhada pelos quitrídios é a decomposição. Estes organismos omnipresentes e cosmopolitas são responsáveis pela quebra de materiais refratários, como pólen, celulose, quitina e queratina. Os quitrídios também podem ser parasitas de plantas, animais e protistas. Foi sugerido que os quitrídios parasitas têm um grande efeito nas cadeias alimentares de lagos e lagoas.[9][10]

A espécie mais amplamente estudada tem sido Batrachochytrium dendrobatidis por ser responsável pela extinção de várias populações de anfíbios em todo o mundo, principalmente na América Central e do Sul.[11][12][13][14] A enfermidade que causam nos anfíbios é conhecida como quitridiomicose. Na Austrália, a quitridiomicose é conhecida desde pelo menos 1993.[7]

Os quitrídios também infectam plantas, particularmente milho e alfafa. A espécie Synchytrium endobioticum é um importante patógeno da batateira.

Filogenia e classificação[editar | editar código-fonte]

Evolução[editar | editar código-fonte]

Os fósseis mais antigos atribuídos a este grupo são do Devoniano do sítio Rhynie Chert, Escócia, uma localidade com preservação especial de plantas e fungos. Entre os microfósseis, encontram-se quitrídios preservados como parasitas de Rhyniophyta, alguns próximos ao género extante Allomyces.

Restos de quitrídios foram encontrados em pederneiras recolhidas em Combres, no centro da França, datando do final de Viseano. Esses restos foram encontrados junto com restos eucárpicos e são de natureza ambígua, embora se acredite que sejam quitrídios. Outros fósseis parecidos com os quitrídios foram encontrados em sílex na Bacia de Saint-Etienne, França, datando entre 300 e 350 Ma.

As características deste grupo colocam-no evolutivamente como grau intermediário entre os fungos unicelulares primitivos (Aphelidiomycota e Rozellomycota) e os fungos terrestres mais evoluídos (Amastigomycota) cujos esporos não possuem flagelos.

Como o modo de vida saprófito é comum nos quitrídios, a principal tendência evolutiva pode ser o aumento da capacidade de degradar a matéria orgânica indigerível para outros seres vivos, principalmente a lignocelulose (biomassa de lignina e celulose ou hemicelulose) e é possível que essa característica tenha sido decisiva na irradiação evolutiva dos fungos mais avançados.[15]

A natureza do esporo uniflagelado compartilhado com Aphelidiomycota e Rozellomycota, paralelamente ao que ocorre com os espermatozóides uniflagelados em animais, bem como a análise molecular, seria o traço evolutivo que se relaciona com a reinos Fungi e Animalia com o clado eucariótico Opisthokonta, onde ancestralmente os protozoários tipicamente possuíam um único flagelo inserido posteriormente.

Filogenia[editar | editar código-fonte]

Os quitrídios na classificação tradicional são um táxon parafilético porque os Blastocladiomycota (anteriormente Blastocladiales) está mais intimamente relacionado com os fungos terrestres (Amastigomycota) do que com os outros quitrídios. Foi proposta uma classificação filogenética baseada em grupos monofiléticos que divide os quitrídios em dois clados, que nalgumas classificações são colocados em subreinos distintos.[16]

Análises moleculares (publicadas em 2016 e 2021) e outras observações fornecem a seguinte filogenia:[4][17][18]

Fungi 

Rozellomyceta

Eumycota

 Aphelidiomyceta

Chytridiomyceta

 Chytridiomycota

 Caulochytriomycota

 Monoblepharomycota

 Neocallimastigomycota

 

 Blastocladiomyceta

Amastigomycota

Zoopagomyceta

Mucoromyceta

 Dikarya 

 Entorrhizomycota

 Ascomycota

 Basidiomycota

Referências[editar | editar código-fonte]

  1. a b Leho Tedersoo, Santiago Sánchez-Ramírez, Urmas Kõljalg, Mohammad Bahram, Markus Döring, Dmitry Sergeevich Schigel, Thomas William May, Martin Ryberg, Kessy Abarenkov, Fungal Diversity 90(1): 148 (2018). [Index Fungorum ID: 553996].
  2. a b Hibbett, D.S.,; et al. (março de 2007). «A higher level phylogenetic classification of the Fungi». Mycol. Res. 111 (5): 509-547. doi:10.1016/j.mycres.2007.03.004 
  3. Chytridiomycota. NCBI.
  4. a b Spatafora, Joseph W.; Chang, Ying; Benny, Gerald L.; Lazarus, Katy; Smith, Matthew E.; Berbee, Mary L.; Bonito, Gregory; Corradi, Nicolas; Grigoriev, Igor; Gryganskyi, Andrii; James, Timothy Y.; O’Donnell, Kerry; Roberson, Robert W.; Taylor, Thomas N.; Uehling, Jessie; Vilgalys, Rytas; White, Merlin M.; Stajich, Jason E. (2016). «A phylum-level phylogenetic classification of zygomycete fungi based on genome-scale data». Mycologia. 108 (5): 1028–1046. ISSN 0027-5514. PMC 6078412Acessível livremente. PMID 27738200. doi:10.3852/16-042 
  5. Wijayawardene NN, Hyde KD, Al-Ani LK, Tedersoo L, Haelewaters D, Rajeshkumar KC, et al. (2020). «Outline of Fungi and fungus-like taxa» (PDF). Mycosphere. 11 (1): 1060–1456. ISSN 2077-7019. doi:10.5943/mycosphere/11/1/8Acessível livremente 
  6. División Mastigomycota. Universidad de Hamburgo /Universidad de Extremadura 1998
  7. a b Department of Sustainability, Environment, Water, Population and Communities [Gobierno de Australia] (ed.). «Chytridiomycosis (Amphibian chytrid fungus disease)» (PDF) (em inglês). Consultado em 24 de maio de 2015. Cópia arquivada (PDF) em 24 de maio de 2015 
  8. Carlile, M.J. (1986). Ayres, Peter G.; Boddy, Lynne, eds. Water, Fungi, and Plants. 11. [S.l.]: Cambridge University Press 
  9. Gleason, Frank H.; et al. (2008). «The ecology of chytrids in aquatic ecosystems: roles in food web dynamics». Fungal Biology Reviews. 22 (1): 17–25. doi:10.1016/j.fbr.2008.02.001 
  10. Lefèvre, E.; Letcher, P.M.; Powell, M.J. (2012). «Temporal variation of the small eukaryotic community in two freshwater lakes: Emphasis on zoösporic fungi». Aquatic Microbial Ecology. 67 (2): 91–105. doi:10.3354/ame01592 
  11. Kilpatrick, A. Marm; Briggs, Cheryl J.; Daszak, Peter (fevereiro de 2010). «The ecology and impact of chytridiomycosis: an emerging disease of amphibians». Trends in Ecology & Evolution (em inglês). 25 (2): 109–118. doi:10.1016/j.tree.2009.07.011. Consultado em 2 de dezembro de 2020 
  12. O’Hanlon, Simon J.; Rieux, Adrien; Farrer, Rhys A.; Rosa, Gonçalo M.; Waldman, Bruce; Bataille, Arnaud; Kosch, Tiffany A.; Murray, Kris A.; Brankovics, Balázs (11 de maio de 2018). «Recent Asian origin of chytrid fungi causing global amphibian declines». Science (em inglês). 360 (6389): 621–627. ISSN 0036-8075. PMC 6311102Acessível livremente. PMID 29748278. doi:10.1126/science.aar1965. Consultado em 2 de dezembro de 2020 
  13. Fisher, Matthew C.; Garner, Trenton W. J. (junho 2020). «Chytrid fungi and global amphibian declines». Nature Reviews Microbiology (em inglês). 18 (6): 332–343. ISSN 1740-1534. doi:10.1038/s41579-020-0335-x. Consultado em 2 de dezembro de 2020 
  14. Johnson, Pieter T. J.; Preston, Daniel L.; Hoverman, Jason T.; Richgels, Katherine L. D. (fevereiro de 2013). «Biodiversity decreases disease through predictable changes in host community competence». Nature (em inglês). 494 (7436): 230–233. ISSN 0028-0836. doi:10.1038/nature11883. Consultado em 2 de dezembro de 2020 
  15. Philippe Silar 2016, Protistes Eucaryotes.: Origine, Evolution et Biologie des Microbes Eucaryotes, 2016, 978-2-9555841-0-1. <hal-01263138>
  16. Miguel A. Naranjo‐Ortiz et Toni Gabaldón. Fungal evolution: diversity, taxonomy and phylogeny of the Fungi Wiley Online Library.
  17. Yuanning Li, Jacob L Steenwyk, Ying Chang, Yan Wang, Timothy Y James, Jason E Stajich, Joseph W Spatafora, Marizeth Groenewald, Casey W Dunn, Chris Todd Hittinger, Xing-Xing Shen, Antonis Rokas (2021). A genome-scale phylogeny of the kingdom Fungi. Cell.com.
  18. Tedersoo, L., Sánchez-Ramírez, S., Kõljalg, U. et al. 2018, High-level classification of the Fungi and a tool for evolutionary ecological analyses Fungal Diversity 90: 135. https://doi.org/10.1007/s13225-018-0401-0