Vida

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 Nota: Para outros significados, veja Vida (desambiguação).
A Terra apresenta uma grande biodiversidade, com numerosas espécies de seres vivos.

A vida (do latim vita)[1] é um conceito muito amplo e admite diversas definições. Pode-se referir ao processo em curso do qual os seres vivos são uma parte; ao espaço de tempo entre a concepção e a morte de um organismo[2]; a condição de uma entidade que nasceu e ainda não morreu; e aquilo que faz com que um ser esteja vivo. Metafisicamente, a vida é um processo contínuo de relacionamentos.[3]

A vida

Definição convencional

A água é uma substância essencial para a vida

Por mais simples que possa parecer, ainda é muito difícil para os cientistas definirem vida com clareza. Muitos filósofos tentam defini-la como um "fenômeno que anima a matéria".[4]

De um modo geral, considera-se tradicionalmente que uma entidade é um ser vivo se exibe todos os seguintes fenômenos pelo menos uma vez durante a sua existência [5]:

  1. Desenvolvimento: passagem por várias etapas distintas e sequenciais, que vão da concepção à morte.
  2. Crescimento: absorção e reorganização cumulativa de matéria oriunda do meio; com excreção dos excessos e dos produtos "indesejados".
  3. Movimento: em meio interno (dinâmica celular), acompanhada ou não de locomoção no ambiente.
  4. Reprodução: capacidade de gerar entidades semelhantes a si própria.
  5. Resposta a estímulos: capacidade de "sentir" e avaliar as propriedades do ambiente e de agir seletivamente em resposta às possíveis mudanças em tais condições.
  6. Evolução: capacidade das sucessivas gerações transformarem-se gradualmente e de adaptarem-se ao meio.

Estes critérios têm a sua utilidade, mas a sua natureza díspar torna-os insatisfatórios sob mais que uma perspectiva; de facto, não é difícil encontrar contra-exemplos, bem como exemplos que requerem maior elaboração. Por exemplo, de acordo com os critérios citados, poder-se-ia dizer que o fogo tem vida.

Tal situação poderia facilmente ser remediada pela adição do requisito de limitação espacial, ou seja, a presença de algum mecanismo que delimite a extensão espacial do ser vivo, como por exemplo a membrana celular nos seres vivos típicos. Tal abordagem resolve o caso do fogo, contudo leva adicionalmente a novos problemas como o de definição de indivíduo em organismos como a maioria dos fungos e certas plantas herbáceas, e não resolve em definitivo o problema, pois ainda poder-seia dizer que:

  • as estrelas têm vida, por motivos ainda semelhantes aos do fogo.
  • os geodes também poderiam ser consideradas seres vivos.
  • Vírus e afins não são seres vivos porque não crescem e não se conseguem reproduzir fora da célula hospedeira; caso extensível a muitos parasitas externos.

Se nos limitarmos aos organismos "convencionais", poder-se-ia considerar alguns critérios adicionais em busca de uma definição mais precisa:

  1. Presença de componentes moleculares como hidratos de carbono, lipídios, proteínas e ácidos nucleicos.
  2. Composição por uma ou mais células.
  3. Manutenção de homeostase.
  4. Capacidade de especiação.

Contudo, mesmos nesses casos ainda detectar-se-ia alguns impasses. A exemplo, toda a vida na Terra se baseia na química dos compostos de carbono, dita química orgânica. Alguns defendem que este deve ser o caso para todas as formas de vida possíveis no universo; outros descrevem esta posição como o chauvinismo do carbono, cogitando, a exemplo, a possibilidade de vida baseada em silício.

Mais definições

A definição de "vida" de Francisco Varela e Humberto Maturana (amplamente usada por Lynn Margulis) é a de um sistema autopoiético (que gera a si próprio) de base aquosa, limites lipoproteicos, metabolismo de carbono, replicação mediante ácidos nucleicos e regulação proteica, um sistema de retornos negativos inferiores subordinados a um retorno positivo superior.[6]

Stuart Kauffman define-a como um agente ou sistema de agentes autónomos capazes de se reproduzir e de completar pelo menos um ciclo de trabalho termodinâmico.

A definição de Robert Pirsig pode ser encontrada no seu livro Lila: An Inquiry into Morals, como tudo o que maximiza o seu leque de possibilidades futuras, ou seja, tudo o que tome decisões que resultem num maior número de futuros possíveis, ou que mantenha o maior número de opções em aberto.

Por positivismo, bioquímicos tem definido a vida como um conjunto de moléculas que em suas interações mútuas desenvolvem um programa de auto-regulação cujo resultado final é a perpetuação da mesma coleção de moléculas. Um equilíbrio dinâmico que ao trocar matéria e energia com o meio permite a redução da entropia.[7]

Há possivelmente mais possibilidades de definição de vida, uma vez que se pode conceituá-la a partir do sentido que se atribui ao "viver".

Descendência modificada: uma característica útil

Uma característica útil sobre a qual se pode basear uma definição de vida é a da descendência modificada: a capacidade de uma dada forma de vida de gerar descendentes semelhantes aos progenitores, mas com a possibilidade de alguma variação devida ao acaso.

A descendência modificada é por si própria suficiente para permitir a evolução, desde que a variação entre descendentes confira diferentes probabilidades de sobrevivência. Ao estudo desta forma de hereditariedade conforme verificada na natureza dá-se o nome de genética. Em todas as formas de vida conhecidas - excluídos os priões, que não são considerados seres vivos, contudo incluídos os vírus e viroides, de classificação ainda incerta - o material genético consiste principalmente em DNA ou no outro ácido nucleico comum, RNA.

Uma crítica a esse critério surge ao se considerar o código de certas formas de vírus e programas informáticos estruturados através de uma programação genética: a questão de programas informáticos poderem ser considerados seres vivos, frente esta definição, é certamente um assunto controverso.

Exceções à definição comum

Muitos organismos são incapazes de reproduzirem-se e contudo são seres vivos, como as mulas e as formigas obreiras. No entanto, estas exceções podem ser levadas em consideração aplicando a definição de vida ao nível da espécie ou do gene individual. Entretanto novos questionamentos a essa abordagem são inevitáveis ao considerarem-se temas específicos como a selecção de parentesco, que fornece informação adicional acerca da possibilidade de indivíduos não-reprodutivos poderem mesmo assim aumentar a dispersão dos seus genes e a sobrevivência da sua estirpe.

Quanto aos dois casos do fogo e das estrelas encaixarem na definição de vida, ambos podem ser facilmente remediados definindo metabolismo de uma forma bioquimicamente mais precisa. No seu Fundamentals of Biochemistry (ISBN 0-471-58650-1), Donald e Judith Voet definem metabolismo da seguinte maneira:

"Metabolismo é o processo geral pelo qual os sistemas vivos adquirem e utilizam a energia livre de que necessitam para desempenhar as suas várias funções. Fazem-no combinando as reações exoérgicas da oxidação de nutrientes com os processos endoérgicos necessários para a manutenção do estado vivo, tais como a realização de trabalho mecânico, o transporte ativo de moléculas contra gradientes de concentração, e a biossíntese de moléculas complexas."

Esta definição, usada pela maioria dos bioquímicos, torna claro que o fogo não está vivo, pois liberta toda a energia oxidativa do seu combustível em uma reação "explosiva", sob a forma de calor.

Os vírus reproduzem-se, as chamas crescem, as máquinas movem-se, alguns programas informáticos sofrem mutações e evoluem e, no futuro, provavelmente exibirão comportamentos de elevada complexidade; contudo não são seres vivos via tal definição. Por outro lado, na origem da vida, células com metabolismo mas sem sistema reprodutivo podem perfeitamente ter existido. A maioria contudo também não considerara estas entidades como seres vivos, e geralmente todas as cinco características devem estar presentes para que um ser seja considerado vivo.

Definição biológica moderna

Diante desse impasse, frente à definição mais atual e aparte as propostas não factualmente corroboradas, por certo sabe-se que biologicamente vida é um fenômeno natural que pode ser descrito como um processo contínuo de reações químicas metabólicas ocorrendo em um ambiente evolutivamente estruturado de forma a tornar propícias a ocorrência e manutenção de tais reações; que fazem-se sempre sob controle direto ou indireto de um grupo de moléculas especiais, os ácidos desoxirribonucleicos, ou simplesmente DNA.

A presença de DNA ou, de forma "equivalente", RNA, é na atualidade condição necessária à definição de ser vivo, contudo discute-se ainda se a presença de forma potencialmente funcional dessa molécula é ou não condição suficiente para defini-la. A classificação dos virus como seres vivos ou não ainda encontra-se incerta.

Vida no contexto religioso

O conceito de vida é notório o suficiente para não passar desapercebido pelos religiosos: fundamenta-se no princípio de vida ou de existência da alma (na crença cristã sendo exclusiva aos humanos); a existência animada (do latim anima) no caso, ou a duração da existência animada de um indivíduo ou ente.

Sob a ótica cristã, no caso bíblico, quanto à vida terrestre, física, as coisas que possuem vida em geral têm a capacidade de crescimento, metabolismo, reação a estímulos externos, e reprodução. A palavra hebraica usada na bíblia é hhai‧yím, e a palavra grega é zo‧é. A palavra hebraica né‧phesh e o termo grego psy‧khé, que significam “alma”, também são usados para referir-se à vida, não em sentido abstrato, mas à vida como pessoa ou animal. Compare as palavras “alma” e “vida”, segundo usadas em Jó 10:1; Sal 66:9; Pr 3:22. Segundo a bíblia, a vegetação possui vida, operando nela o princípio de vida, mas não vida como alma. A vida no mais pleno sentido, conforme aplicada a entes inteligentes, é a existência perfeita com direito a ela [8].

O conceito dentro da fé religiosa transcende contudo a ciência e a biologia modernas, não havendo suporte de cunho científico moderno algum que corrobore a existência de alma. O animismo há muito foi descartado pela ciência no caso.

Origem da vida

Ver artigo principal: Origem da vida
A origem da vida levanta questões científicas, religiosas e filosóficas

Não existe ainda nenhum modelo consensual para a origem da vida, mas a maioria dos modelos atualmente aceitos baseiam-se duma forma ou doutra nas seguintes descobertas:

  1. Condições pré-bióticas plausíveis resultam na criação das moléculas orgânicas mais simples, como demonstrado pela experiência de Urey-Miller.
  2. Fosfolípidos formam espontaneamente duplas camadas, a estrutura básica da membrana celular.
  3. Processos para a produção aleatória de moléculas de RNA podem produzir ribozimas capazes de se replicarem sob determinadas condições.
  4. A árvore da vida converge todos os seres vivos conhecidos a um único ponto de ancestralidade comum.

Existem muitas hipóteses diferentes no que diz respeito ao caminho percorrido das moléculas orgânicas simples às protocélulas e ao metabolismo. A maioria das possibilidades tendem quer para a primazia dos genes quer para a primazia do metabolismo; uma tendência recente sendo a de buscar modelos híbridos que combinem aspectos de ambas as abordagens.

De acordo com o astrônomo e astrofísico Thomas Gold, a Teoria Deep Hot Biosphere indica que há fortes indícios de que a vida microbiana é extremamente difundida em profundidade na crosta da terra, e condizente com tal a vida tem sido identificada em vários locais no oceano profundo, ligada a emanações de gases primordiais. Essa vida não é dependente da energia solar e da fotossíntese como sua principal fonte como fornecimento de energia, e é essencialmente independente das circunstâncias da superfície . Seu suprimento de energia vem de fontes químicas, devido aos fluidos que ascendem, oriundos de níveis mais profundos na Terra. Os seres unicelulares vivendo em tais ambientes são hoje classificados em um superreino próprio, o Archaea, e pondem muito bem guardar em si os mecanismos que deram origem aos primeiros seres vivos.

Segundo a teoria, em massa e volume essa biosfera profunda pode ser comparável com toda a vida de superfície. Tal vida microbiana poderia em princípio explicar a presença de moléculas biológicas em todos os materiais carbonosos na crosta, e considerar que estes materiais são em totalidade oriundos de depósitos biológicos acumulados em superfície não seria, portanto, necessariamente válido.

A vida como conhecida poderia encontrar-se em hipótese generalizada também no interior de corpos planetários do nosso sistema solar ou mesmo em objetos isolados vagando no espaço interestelar; uma vez que muitos deles têm condições tão adequadas para que isso ocorra como as encontradas em certas situações aqui na terra, embora constituindo ainda ambientes totalmente inóspitos em suas superfícies para quase a totalidade dos seres vivos. Pode-se mesmo especular que a única alternativa é a vida ser amplamente distribuída no universo, habitando desde corpos planetários no nosso sistema solar até outros sistemas estelares. Sabe-se hoje que a nossa tabela periódica é responsável pela descrição de toda a química do universo. A vida como conhecemos tem por base o carbono e a água, e a energia é obtida usualmente via presença de oxigênio, esteja esse livre no ar ou sendo liberado em subsuperfície através da redução de compostos como óxidos, sulfatos, e outros. As fontes de carbono estão relacionadas com hidrocarbonetos primordiais, sobretudo o metano. Tais substâncias primordiais encontram-se amplamente distribuídas no universo, e cogitar que os processos que a originaram ocorreram apenas aqui na Terra é para muitos, nestes termos, no mínimo muita pretensão. Uma extensão desse argumento nos leva à hipótese da panspermia.

Especulações a parte, de facto tem-se contudo que a vida conforme conhecida com quase certeza surgiu e certamente evoluiu na Terra. De acordo com o físico Marcelo Gleiser em seu livro "Criação Imperfeita", a vida teria surgido na terra há cerca de 4 bilhões de anos. Os primeiros registros fósseis de vida remontam aos estromatólitos formados na era paleoarqueana do éon arqueano, há uns 3,430 mil milhões de anos atrás [9].

A possibilidade de vida extraterrestre

Ver artigo principal: Vida extraterrestre e Astrobiologia

Até a data, a Terra é o único planeta do universo conhecido por humanos a sustentar vida. A questão da existência da vida noutros locais do universo permanece em aberto, mas análises como a equação de Drake têm sido usadas para estimar a probabilidade dela existir. Das inúmeras reivindicações de descoberta de vida noutros locais do universo, nenhuma sobreviveu ao escrutínio científico.

O mais próximo que a ciência moderna chegou de descobrir vida extraterrestre é a evidência fóssil de possível vida bacteriana em Marte (por via do meteorito ALH84001).

A procura de vida extraterrestre centra-se atualmente em planetas e luas que se crê possuam ou já tenham possuído água no estado líquido. Dados recentes dos veículos da NASA Spirit e Opportunity apoiam a teoria de que Marte teve no passado água à superfície (ver Vida em Marte para mais detalhes). As luas de Júpiter são também consideradas boas candidatas para albergarem vida extraterrestre, especialmente Europa, que parece ter oceanos de água liquida.

Fora do sistema solar, os únicos planetas descobertos até agora potencialmente habitáveis são Gliese 581 c,Kepler 452b e Kepler 108.

Referências

  1. Dicionário Michaelis UOL. «Vida». Consultado em 5 de fevereiro de 2012 
  2. MOORE, K. L.; PERSAUD, T.V.N. Embriologia Clínica. 7 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
  3. Unesp. «O que é vida». Consultado em 5 de fevereiro de 2012 
  4. Molwick. «Teorias da origem da vida». Consultado em 5 de fevereiro de 2012 
  5. Silva Júnior, César da; Sasson, Sezar - Biologia César e Sezar - Volume Único - 3. edição reformulada - 2003 - Editora Saraiva - ISBN 85-02-04456-7
  6. J. theor. Biol. 2001
  7. lehninger,Princípios de bioquímica
  8. it-3 pp. 780-787 Vida
  9. Evolução - A História da Vida - Palmer, Douglas; Barret, Petter - Larrouse - 2009

Ver também

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Ligações externas