António de Alcântara Machado

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António de Alcântara Machado
António de Alcântara Machado
Nome completo António Castilho de Alcântara Machado d'Oliveira
Nascimento 25 de maio de 1901
São Paulo, Brasil
Morte 14 de abril de 1935 (33 anos)
Rio de Janeiro, Brasil
Nacionalidade brasileiro
Ocupação Escritor
Assinatura

António Castilho de Alcântara Machado d'Oliveira (São Paulo, 25 de maio de 1901Rio de Janeiro, 14 de abril de 1935), mais conhecido como António de Alcântara Machado, foi um escritor modernista brasileiro. Segundo o professor e crítico literário João Ribeiro, "um dos maiores nomes da literatura contemporânea, na feição modernista que a caracteriza. Não é um exagero dizer que é um mestre sem embargo da sua florida juventude. É realmente um mestre na sua arte de observar e dizer. [...] O seu método experimental a que não escapa o menor traço psicológico é realmente fora do comum."[1] Segundo Francisco de Assis Barbosa, "António de Alcântara Machado foi um escritor paulistano, da cidade de São Paulo, assim como Manuel Antônio de Almeida o foi do Rio de Janeiro."[2]

Biografia[editar | editar código-fonte]

António de Alcântara Machado nasceu na cidade de São Paulo numa "ilustre família, cujos troncos paterno e materno se enraízam nos primeiros tempos da colonização da capitania".[3] Depois de estudar no Colégio Stafford e Ginásio São Bento, diplomou-se em Ciências Jurídicas e Sociais em 1923 pela Faculdade de Direito de São Paulo.[4] Não chegou a exercer a profissão de jurista, preferindo aos dezenove anos iniciar a carreira de jornalista, na qual chegou a ocupar interinamente, em fins de 1924, o cargo de redator-chefe do Jornal do Comércio.

Começou na literatura publicando, com apenas dezenove anos, ainda estudante, seu primeiro artigo de crítica literária, sobre a obra Vultos e Livros, de Arthur Motta, para esse jornal. Dali em diante, escreveu as críticas de peças de teatro desse jornal.

No ano de 1925, viajou à Europa, onde já estivera quando menino, "seguindo o clássico itinerário: Lisboa, Paris, Londres, Itália e Espanha",[4] de onde se inspirou para escrever crônicas e reportagens que viriam a dar origem ao seu primeiro livro Pathé-Baby, primeiramente publicado em 1926, o qual recebeu um prefácio de Oswald de Andrade.

É interessante notar que, apesar de demonstrar traços marcadamente modernistas já desde essa primeira obra, composta de períodos curtos e rápidos de prosa urbana, o autor não havia participado da Semana de Arte Moderna de 1922.

A partir daí, escreveria diversos contos e crônicas modernistas, tomando parte, no ano de 1926, junto com Antônio Carlos Couto de Barros, na fundação da revista Terra Roxa e Outras Terras, também de viés modernista.

Uma de suas obras mais conhecidas é Brás, Bexiga e Barra Funda, uma coletânea de contos. Publicada em 1928, trata do cotidiano dos imigrantes italianos e dos ítalo-descendentes na cidade de São Paulo, expressando-se a narrativa numa linguagem livre, próxima da coloquial. Mostrava as impressões duma São Paulo imersa na experiência da imigração, que então vinha modificando os trejeitos da cidade.

Na primeira edição, o prefácio é substituído por um texto intitulado Artigo de fundo, disposto como que em colunas de página de jornal, onde se lê: "Este livro não nasceu livro: nasceu jornal. Estes contos não nasceram contos: nasceram notícias. E este prefácio portanto também não nasceu prefácio: nasceu artigo de fundo".[5]

Por si só, tal introdução revela uma caraterística fundamental de sua obra: "a narrativa curta, a linguagem elíptica e cinematográfica, entrecortada e justaposta, como se fossem coladas cenas permeadas pela oralidade (reprodução de trejeitos, expressões e onomatopeias), possibilitavam uma comunicação fácil e direta com o público.[6] Brás, Bexiga e Barra Funda revela ainda a preocupação em se descreverem os habitantes e os costumes das pessoas que habitavam os bairros periféricos da capital paulista, e, inadvertidamente, fez surgir um novo tipo de personagem na literatura brasileira: o ítalo-brasileiro.

Conforme supracitado, o livro é versado na vida urbana, em especial no espaço urbano de São Paulo, nos bairros dos imigrantes (em sua maioria italianos), como já indica o título, retratados na sua intimidade de todos os dias. O leitor é levado a reconhecer e se familiarizar com esses arrebaldes, dos quais se indicam os nomes e, por vezes, mesmo o número da casa ou do estabelecimento.

Para além dum reconhecimento geográfico, descrevem-se também séries de valores humanos presentes nesses moradores menos favorecidos, em se evidenciando as suas peculiaridades comportamentais, tanto na forma de ver o mundo, como na difícil condição de estrangeiros, assim como na expressão, ilustrada pelo uso do português numa variedade linguística estigmatizada, porque extremamente arraigada à gramática italiana, com influência no vocabulário e nas construções.

Isso nos é mostrado criticamente por um narrador observador, distanciado, que impinge as personagens com os seus próprios juízos; ou, alternativamente, por um narrador onisciente, que adentra os personagens para recuperar a história pela visão deles.[5]

Constata-se, no livro, também a "importância dada à máquina e aos meios de transporte, vistos como símbolos do futuro e do progresso industrial",[7]: para além de identificadores da cidade, funcionam como parte do enredo, por vezes servindo como inferência à posição social da personagem.

A narração compõe-se a partir da sucessão cronológica, onde simultaneidade, anterioridade e posterioridade desempenham um papel importante. A passagem do tempo é demonstrada por saltos ou lacunas entre as partes do conto.

Alcântara e o Modernismo[editar | editar código-fonte]

Em 1928, após a publicação da coletânea, uniu-se a Oswald de Andrade para fundarem a Revista de Antropofagia. Alcântara Machado, juntamente com Raul Bopp, foi co-diretor da revista no período de maio de 1928 até a fevereiro de 1929, ano este no qual lançou outra obra, de título Laranja da China.

Com outros escritores do movimento, ele investia a favor da rutura, contra a Literatura dos valores estilísticos clássicos, com vistas a desconstruir as convenções, desmoralizar, evoluir e acabar com a cultura preestabelecida, com o estilo rebuscado que até então vogava dentre os literatos do Brasil.

Na sua prosa, caminhou pela senda da experimentação, aberta por Mário e Oswald de Andrade, ao fazer uso duma linguagem leve, bem-humorada e espontânea, altamente influenciada pelo seu passado de jornalista. Talvez tenha sido um dos primeiros brasileiros a usar o elemento gráfico como expressão literária aplicada à prosa de temas urbanos do cotidiano.

Juntou-se então, em 1931, com Mário de Andrade e dirigiram mais uma publicação, a Revista Nova. Nesse período de ebulição e transformações sociais e políticas, na época do chamado movimento constitucionalista, que, sucedendo à Revolução Paulista (1932), culminaria na elaboração da primeira constituição da República Nova em 1934, foi quando Alcântara ingressou na vida pública.[5]

Como superintendente da Rádio Sociedade Record durante a Revolução Constitucionalista de 1932, foi um pioneiro no uso do rádio como instrumento de propaganda política.[8]

Com a convocação da Assembleia Nacional Constituinte, no final de 1933, veio para o Rio de Janeiro dirigir os serviços da secretaria da bancada paulista. Continuou a exercer a carreira de crítico literário nessa cidade, escrevendo para os Diários Associados sobre os livros dos novos autores que surgiam.[3] . Assumiu depois a direção do Diário da Noite. Promulgada a Constituição de 1934, candidatou-se ao cargo de deputado federal pelo Partido Constitucionalista de São Paulo.[4] Eleito, nem sequer chegou a ser empossado, dadas complicações duma cirurgia do apêndice que resultariam no seu falecimento, na cidade do Rio de Janeiro, a 14 de Abril de 1935, deixando para trás, inacabado, o seu romance Mana Maria.

Seu corpo foi sepultado no túmulo da família no Cemitério da Consolação,em São Paulo. O pai, o escritor e Jurista José de Alcântara Machado, que nunca se refez do forte abalo causado pela morte do filho, faleceu em 1941 e foi sepultado no mesmo túmulo.

Entretanto, as suas crônicas inéditas, desde as que não conseguiram integrar Pathé-Baby até às escritas no ano do seu óbito, encontram-se publicadas no póstumo Cavaquinho e Saxofone (solos), abrangendo quase dez anos do jornalismo literário do escritor (1926-35).[5]

Suas Obras[editar | editar código-fonte]

  • Pathé-Baby (1926), crônica de viagem.
  • "Anchieta na Capitania de São Vicente" (1928, Prêmio Capistrano de Abreu), monografia publicada na Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, tomo 105, volume 159, pp. 5–94. Pode ser acessada no site do referido Instituto.
  • Brás, Bexiga e Barra Funda (1927), contos
  • Laranja da China (1928), contos
  • Mana Maria (1936), edição póstuma reunindo o romance inacabado de mesmo nome e contos esparsos, inéditos ou publicados anteriormente em revistas e jornais
  • Cavaquinho e Saxofone (solos) (1940), edição póstuma, organizada por Sérgio Milliet e Cândido Mota Filho, reunindo crônicas e artigos jornalísticos
  • Brás, Bexiga e Barra Funda e Laranja da China (1944), segunda edição, num único volume, dos dois livros de contos, com prefácio de Sérgio Milliet
  • Novelas Paulistanas (1971), reunião da obra de ficção completa, incluindo os dois livros de contos, o romance inacabado e os contos avulsos. Organização e prefácios ("Nota da Editora" e "Nota sobre António de Alcântara Machado") de Francisco de Assis Barbosa, com ilustrações de Poty
  • Prosa Preparatória e Cavaquinho e Saxofone (1983), nova compilação, ampliada, de textos jornalísticos, organizada por Cecília de Lara e Francisco de Assis Barbosa
  • Palcos em Foco (2009), textos relacionados ao teatro coligidos por Cecília de Lara.

Traduções[editar | editar código-fonte]

  • Pathé-Baby, prefácio de Oswald de Andrade, estampas de Paim, tradução em francês, notas e posfácio de Antoine Chareyre, Paris, Editions Pétra, coleção "Voix d'ailleurs", 2013, 272p.
  • Brás, Bexiga et Barra Funda (Informations de São Paulo), tradução em francês, notas, suplementos, bibliografia e posfácio de Antoine Chareyre, Paris, L'oncle d'Amérique, 2021, 252p.[9]

Referências

  1. João Ribeiro, Crônica Literária, Jornal do Brasil, 24 de outubro de 1928, p. 10, acessada na Hemeroteca Digital.
  2. "Nota sobre Antônio de Alcântara Machado", prefácio de Francisco de Assis Barbosa para Novelas Paulistanas, obra organizada por ele.
  3. a b António de Alcântara Machado, Novelas Paulistanas, Nota da Editora.
  4. a b c Idem.
  5. a b c d Site do Instituto Histórico e Geográfico de Santos, página dedicada a Alcântara Machado, patrono da Cadeira 37.
  6. Luís Toledo Machado, Antônio de Alcântara Machado e o Modernismo. Citado em Carolina Curassá Rosa de Souza, "Alcântara Machado e Norman Rockwell: a arte de descrever sociedades", tese de mestrado.
  7. Carolina Curassá Rosa de Souza, "Alcântara Machado e Norman Rockwell: a arte de descrever sociedades", tese de mestrado.
  8. "Nota sobre Antônio de Alcântara Machado", prefácio de Francisco de Assis Barbosa para Novelas Paulistanas.
  9. «livre | Alcântara Machado, Brás, etc. | L'oncle d'Amérique, traducteur-éditeur». L'oncle d'Amérique (em francês). Consultado em 23 de junho de 2021 

Ligações externas[editar | editar código-fonte]