Axé (gênero musical)

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
 Nota: Para outros significados, veja Axé.
Axé
Origens estilísticas Samba-reggae, frevo, reggae, merengue, forró, ijexá, samba duro, ritmos de Candomblé, pop rock, ritmos afro-brasileiros e afro-latinos.
Contexto cultural Década de 1980, Salvador
Instrumentos típicos Guitarra elétrica, baixo elétrico, percussão
Popularidade Brasil
Outros tópicos
Samba-reggae, pagode baiano, arrocha, black semba, forró elétrico

O axé, ou axé music, é um gênero musical que surgiu no estado da Bahia na década de 1980 durante as manifestações populares do Carnaval de Salvador, misturando o ijexá,[1] samba-reggae,[2] frevo, reggae, merengue, forró, samba duro,[2] ritmos do candomblé,[3] pop rock,[4][5] bem como outros ritmos afro-brasileiros e afro-latinos.[6][7][8][9]

No entanto, o termo "axé" é utilizado erroneamente para designar todos os ritmos de raízes africanas ou o estilo de música de qualquer banda ou artista que provém da Bahia.[10] Sabe-se hoje, que nem toda música baiana é axé, pois lá há o samba-reggae,[11] representado principalmente pelo bloco afro Olodum, o samba de roda, o ijexá — tocado com variações diversas por bandas percussivas de blocos afro como Filhos de Ghandi, Cortejo Afro, Ilê Aiyê, e Muzenza, entre outros —, o pagode baiano e até uma variação de frevo, bem como o sertanejo e forró etc.[7][8][12][13]

A palavra "axé" é uma saudação religiosa usada no candomblé, que significa energia positiva.[13][14] Expressão corrente no circuito musical soteropolitano, ela foi anexada à palavra em inglês "music" pelo jornalista Hagamenon Brito em 1987 para formar um termo que designaria pejorativamente aquela música dançante com aspirações internacionais.[8][14]

Com o impulso da mídia, o axé music rapidamente se espalhou por todo o país (com a realização de carnavais fora de época, as chamadas micaretas), e fortaleceu-se como potencial mercadológico, produzindo sucessos durante todo o ano, tendo, como alguns dos maiores nomes, Luiz Caldas, Daniela Mercury, Cheiro de Amor, Ivete Sangalo, Bamda Mel, Claudia Leitte, Margareth Menezes, Asa de Águia, Chiclete com Banana, entre outros.[7][8][14]

Os pioneiros do gênero foram os músicos da renomada banda Acordes Verdes, que acompanhava Luiz Caldas e eram músicos de estúdio da W.R, em Salvador. O principal arranjador do estúdio, na altura, era o compositor Alfredo Moura.[7]

História[editar | editar código-fonte]

Daniela Mercury é considerada "Rainha do Axé"
Ivete Sangalo é uma das cantoras de maior sucesso da música brasileira atualmente
A cantora Claudia Leitte ganhou fama na banda Babado Novo, na Bahia, e adotou o axé
Margareth Menezes uniu o axé com ritmos afro-brasileiros em suas músicas
Alinne Rosa foi reconhecida pela revista norte-americana Billboard como umas das maiores cantoras de Axé no Brasil

Origens e ascensão[editar | editar código-fonte]

As origens do carnaval de Salvador como conhecemos hoje estão na década de 1950, quando Dodô e Osmar começaram a tocar o frevo pernambucano em guitarras elétricas de produção própria — batizadas de guitarras baianas — em cima de uma fobica (um Ford 1929). Nascia o trio elétrico, atração do carnaval baiano para a qual Caetano Veloso chamou a atenção do país em 1975 na canção "Atrás do Trio Elétrico". Mais tarde, Moraes Moreira, dos Novos Baianos, teria a ideia de subir num trio (que era apenas instrumental) para cantar — foi o marco zero da tradição de cantores "puxando" os trios elétricos. A partir da década de 1960, paralelamente ao movimento dos trios, aconteceu o da proliferação dos blocos afro: Filhos de Gandhi (do qual Gilberto Gil faz parte), Badauê, Ilê Aiyê, Muzenza, Araketu e Olodum. Eles tocavam ritmos afro como o ijexá e o samba (utilizando alguns instrumentos musicais da percussão, comuns nas baterias das escolas de samba do Rio de Janeiro).

A axé music propriamente dita nasceu no estúdio WR, no bairro da Graça, em Salvador, com a formação de um grupo de músicos jovens que viria a substituir a banda residente, comandada por Toninho Lacerda (irmão do pianista Carlos Lacerda). O primeiro, da nova leva, a ser contratado foi o baterista Cesinha. Depois dele, o compositor, pianista e arranjador Alfredo Moura, que na época estudava composição e regência na escola de música da Universidade Federal da Bahia, tendo, como professores: Lindembergue Cardoso, Ernst Widmer, Jamary Oliveira, Paulo Costa Lima, entre outros. Luiz Caldas veio em seguida, trazendo o percussionista Tony Mola. Carlinhos Brown foi o último, dessa leva, a entrar, tendo sido submetido a uma audição e sendo aprovado já por Alfredo Moura, na altura o principal arranjador do estúdio.[15]

Essa banda que se formou do encontro de músicos contratados originaria a banda Acordes Verdes, que daria início ao movimento. Os arranjos de Alfredo Moura mostrariam ser fundamentais para o estabelecimento do novo estilo musical, pois encontrou um tipo de linguagem popular e altamente comunicativa que possibilitou a divulgação dessa nova música nas rádios e televisões por todo o Brasil.[15] Nos arranjos, notam-se elementos vindos de diversas culturas musicais e que interagiam de forma homogênea apesar da diversidade da origem. A música tinha características baianas e fazia referências ao passado enquanto se posicionava com o presente.

O movimento adquiriu força e os arranjos e a estética original foram intensamente copiados, evoluindo para novas leituras e estilos, tendo uma durabilidade impressionante em termos de música popular brasileira.[15]

Estava criado, então, um polo criador, um centro musical poderoso, e o estilo, concebido por Alfredo Moura com a ajuda dos músicos da banda Acordes Verdes, principalmente Carlinhos Brown, se tornaria referência para as três gerações vindouras, colocando a música da Bahia num cenário pioneiro, dinâmico, e inovador.[12][15]

O estilo nasceu com carga pejorativa e sem saber a que servia. Hoje, ainda há polêmica na hora de definir a quais músicas o termo se aplica, mas todos fazem coro num ponto: seu papel foi o de fundar um novo mercado musical.
[16]

Sob a influência das letras e canções de Bob Marley nos ouvidos, surgiu, no Olodum — sob a batuta do mestre Neguinho do Samba —, um ritmo que misturava reggae e samba, num estilo com forte caráter de afirmação da negritude, que fez sucesso em Salvador a partir da década de 1980: o samba-reggae. Posteriormente, artistas como Gerônimo, Banda Reflexu's e a Banda Mel aderiram a essa novidade rítmica, lançando canções que chegavam ao Sudeste em discos na bagagem dos que lá passavam férias. Em meados da década de 1980, mais precisamente em 1985, Luiz Caldas e Paulinho Camafeu compuseram juntos o primeiro sucesso nacional daquela cena musical de Salvador: "Fricote (Nega do cabelo duro)", gravado por Luiz Caldas. O ritmo era o deboche, criado por Alfredo Moura e Carlinhos Brown. O arranjo inovador e de alta qualidade técnica foi marcante para que a canção (de apenas dois acordes) se tornasse um dos maiores sucessos brasileiros. A canção imediatamente tornou-se um hit e espalhou-se por todo o país, virando um marco para o axé.[12] Com uma introdução épica, onde os teclados simulando metais eram precedidos por uma percussão dançante, a canção traduzia a necessidade de afirmação de uma geração de músicos que não queria ficar no ostracismo causado pela fuga de artistas para o eixo Rio–São Paulo.

Uma nova geração de estrelas aparecia para o Brasil: Banda Reflexu's (do sucesso "Madagascar Olodum"), Sarajane (do clássico "A Roda"), Cid Guerreiro (do "Ilariê, gravado por Xuxa), Chiclete com Banana (que vinha de uma tradição de bandas de baile), banda Cheiro de Amor (com Márcia Freire) e Margareth Menezes (a primeira a engatilhar carreira internacional, com a bênção do líder da banda americana de rock Talking Heads, David Byrne). No início da década de 1990, o Olodum foi convidado pelo cantor e compositor americano Paul Simon para gravar participação no disco The Rhythm of The Saints. Posteriormente, tocou com Michael Jackson no videoclipe da canção "They Don't Care About Us" nas ruas do Pelourinho e teve outras parcerias com artistas internacionais e nacionais, que aumentaram a visibilidade do grupo.[17] A modernidade das guitarras se encontrava com a tradição dos tambores em mistura de alta octanagem.

Aquela nova música baiana avançaria mais ainda na direção do pop em 1992, quando o Araketu resolveu injetar eletrônica nos tambores, e o resultado foi o disco homônimo Araketu, gravado pelo selo inglês independente Seven Gates, e lançado apenas na Europa. No mesmo ano, Daniela Mercury lançaria O Canto da Cidade, e o Brasil se renderia de vez ao axé. Aberta a porta, vieram Asa de Águia, Banda Eva (que nasceu do Bloco Eva e revelou Ivete Sangalo), Banda Mel (que depois assinaria como Bamdamel), Cheiro de Amor (que revelou Alinne Rosa) Ricardo Chaves, Babado Novo (que revelou Claudia Leitte) etc. A explosão comercial do axé passou, no entanto, longe da unanimidade. Dorival Caymmi reprovou suas qualidades artísticas, Caetano Veloso as endossou. Das tentativas de incorporar o repertório das bandas de pop rock, nasceu a marcha-frevo, que transformou sucessos como "Eva" (Rádio Táxi) e "Me Chama" (Lobão) em mais combustível para a folia.

Enquanto o axé music se fortalecia, alguns nomes buscavam alternativas criativas para a música baiana. O mais significativo deles foi a Timbalada, grupo de percussionistas e vocalistas liderado por Carlinhos Brown (cuja música "Meia Lua Inteira" tinha estourado na voz de Caetano Veloso em 1989), veio com a proposta de resgatar o som dos timbales, que há muito tempo estavam restritos à percussão dos terreiros de candomblé. Paralelamente à Timbalada, Brown lançou dois discos solo – Alfagamabetizado (1996) e Omelete Man (1998), arranjados por Alfredo Moura. Com sua incorporação de várias tendências do pop e da MPB à música baiana, Brown obteve grande reconhecimento no exterior. Além disso, ele desenvolveu um trabalho social e cultural de alta relevância entre a população da comunidade carente do Candeal, no bairro de Brotas, em Salvador, com a criação do espaço cultural Candyall Guetho Square, o grupo de percussão Lactomia (para formar uma nova geração de instrumentistas) e a escola de música Pracatum. Enquanto isso, os nomes de sucesso da música baiana multiplicavam-se: juntaram-se o ex-Beijo Netinho e Gilmelândia, a girl band As Meninas, o grupo Jammil e Uma Noites e o cantor Tomate juntamente com o enorme sucesso da Ivete Sangalo em solo carreira.

Em 2017, a revista norte-americana Billboard abriu uma enquete para saber quem é a "Rainha do Carnaval de Salvador" na lista estava as principais cantoras do axé music, Daniela Mercury, Ivete Sangalo, Claudia Leitte e Alinne Rosa.

Perspectivas para o futuro[editar | editar código-fonte]

Muitos críticos avaliam que, nos últimos anos, o axé tem estado em declínio, não devido a queda de popularidade, mas sim porque novas canções de novos grupos musicais não têm a mesma força que as antigas. Os principais grupos de axé do país continuam sendo os mesmos da década da 1990, com novos grupos musicais não alcançando o mesmo nível de expressão dos grupos musicais mais antigos. Isso gera a preocupação de que o ritmo baiano não possa se renovar com uma nova geração e perca sua relevância quando os grupos musicais mais antigos gradualmente encerrarem suas atividades.

Ver também[editar | editar código-fonte]

O Commons possui uma categoria com imagens e outros ficheiros sobre Axé (gênero musical)

Referências

  1. PEREIRA, Ianá Souza. Axé-axé: o megafenômeno baiano. Revista África e Africanidades, Rio de Janeiro, ano 2, n. 8, fev. 2010, p.03
  2. a b CASTRO, A. A. Axé music: mitos, verdades e world music. Per Musi, Belo Horizonte, n.22, 2010, p.205.
  3. ARAÚJO FILHO, Antonio Neves de. PROTESTOS E MANIFESTAÇÕES AFRO-BRASILEIRAS NA MÚSICA NEGRA BAIANA NOS ANOS DE 1980. UFRN, Caicó, 2016, p.17.
  4. PEREIRA, Ianá Souza. Axé-axé: o megafenômeno baiano. Revista África e Africanidades, Rio de Janeiro, ano 2, n. 8, fev. 2010, p.02
  5. CASTRO, A. A. Axé music: mitos, verdades e world music. Per Musi, Belo Horizonte, n.22, 2010, p.204-205.
  6. Do fricote que esquenta Garanhuns. Portal Cultura PE.
  7. a b c d SANTANNA, Marilda (2009). As donas do canto. o sucesso das estrelas-intérpretes no carnaval de Salvador. Salvador: Edufba. ISBN 8523208852 
  8. a b c d DINIZ, André (2008). Almanaque do carnaval. A história do carnaval, o que ouvir, o que ler, onde curtir. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor. p. 180. ISBN 9788537800478 
  9. SYLLOS, Gilberto de; MONTANHAUR, Ramon (2002). Bateria e Contrabaixo na Música Popular Brasileira 3.ª ed. Rio de Janeiro: Lumiar. p. 65 
  10. «G1 lista 15 músicas para entender o axé e o carnaval baiano». G1 
  11. Margareth Menezes (abril de 2014). «A música para divulgar valores». Editora Minuano. Revista Raça Brasil (186) 
  12. a b c O sucesso do Axé music, 25 anos depois. Diário do Pará.
  13. a b http://www.tecap.uerj.br/pdf/v81/rafael_guarato.pdf
  14. a b c GUERREIRO, Almerinda (2000). A trama dos tambores. a música afro-pop de Salvador. [S.l.]: Editora 34. ISBN 9788573261752 
  15. a b c d SANTANNA, Marilda. As donas e as vozes: uma interpretação sociológica do sucesso das estrelas- intérpretes no carnaval de Salvador (PDF). [S.l.]: UFBA 
  16. ARANHA, Ana (7 de fevereiro de 2005). «Vinte anos de baianidade» 351 ed. Revista Época. Consultado em 15 de setembro de 2012 
  17. "They Don't Care About Us" - Michael Jackson. UOL Mais.

Ligações externas[editar | editar código-fonte]