Catarina Helena Abi-Eçab

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Catarina Helena Abi-Eçab
Catarina Helena Abi-Eçab
Nascimento 29 de janeiro de 1947
São Paulo
Morte 8 de novembro de 1968 (21 anos)
São João de Meriti
Cidadania Brasil
Progenitores
  • Trajano Xavier Ferreira
  • Helena Elias Xavier Ferreira
Ocupação estudante

Catarina Helena Abi-Eçab (São Paulo, 29 de janeiro de 1947 - Vassouras, 8 de novembro de 1968) foi estudante de Filosofia brasileira, militante da Aliança Libertadora Nacional (ALN), fundada em fevereiro de 1968. Participou ativamente dos movimentos estudantis durante a Ditadura Militar brasileira, vigente entre 1964 e 1985.[1]

Catarina atuou, também, na Vanguarda Popular Revolucionária, onde deu início as lutas contra o regime instalado no país e conheceu seu marido, Antônio dos Santos Abi-Eçab. Ambos tornaram-se desaparecidos e suas mortes foram investigadas após o período da ditadura.[1]

É um dos casos investigados pela Comissão da Verdade, fundada especialmente para realizar investigações sobre os crimes cometidos pelo Estado brasileiro, com interesse em apurar mortes e desaparecimentos na ditadura militar brasileira.[1]

Biografia[editar | editar código-fonte]

Catarina Helena nasceu na cidade de São Paulo, em 29 de janeiro no ano de 1947. Era filha de Helena Elias Xavier e Trajano Xavier Ferreira, não possuía irmãos e iniciou sua atuação política precocemente.[2]

A jovem era estudante de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (USP) e militava nos movimentos estudantis, onde conheceu seu marido, também nascido na capital paulista, João Antônio dos Santos Ebi-Açab.[2]

Fez parte de movimentos como o da Vanguarda Popular Revolucionária e foi detida, junto ao seu marido, pela operação comandada pelo comandante Pereira, em 1968.[3] Suspeitava-se que o casal fizera parte da execução de Charles Chandler, capitão do exército dos Estados Unidos, ocorrida um mês antes em São Paulo.[3]

Levados para uma propriedade rural nos arredores de São João do Meriti, Catarina e João foram torturados por horas e deixados no território.[3]

Circunstâncias de morte[editar | editar código-fonte]

Inicialmente, as investigações apontaram para uma falsa versão da morte de Catarina Helena. Foi divulgado que a jovem teria sido vítima de um acidente automobilístico, ocorrido por volta das 19 horas do dia 8 de novembro de 1968, na altura do quilômetro 69 da rodovia BR 116, estrada que liga o Rio de Janeiro à Bahia, onde seu corpo e de seu marido, João, havia sido encontrado.[1]

No veículo, teriam sido encontrados, supostamente, uma metralhadora, munição, dinheiro, livros e alguns documentos pessoais das vítimas. Consta no boletim de ocorrência que foi dado ciência à polícia às 20 horas do mesmo dia. Três policiais se dirigiram ao local constatando que na altura 69 da rodovia BR 116, o VW 349884-SP, dirigido por seu proprietário João Antônio dos Santos Abi-Eçab, tendo como passageira sua esposa, Catarina Helena, havia colidido com a traseira de um caminhão de marca DeSoto, placa 431152-RJ, dirigido por Geraldo Dias Silva, que não foi encontrado.[1]

Após os exames de rotina, os cadáveres foram encaminhados para o necrotério local e a versão sustentada pela imprensa da época afirmava, ainda, que o acidente teria se dado durante a viagem de lua de mel do casal.[1]

O corpo de João Antônio, que guiava o carro no momento do acidente, não passou por exumação e perícia. Segundo a análise feita pelo Núcleo de Perícia da Comissão Nacional da Verdade (CNV), as marcas de freagem desenhadas no asfalto pelo Volkswagen ocupado pelo casal indicam a ocorrência da colisão e a tentativa de evitá-la, acionando o sistema de freios. Vale ressaltar que as condições em que o casal viajava eram ideais.[1]

Na certidão de óbito de ambos os falecidos constava coo circunstância da morte o registro de "fratura de crânio com afundamento do crânio (acidente)". As investigações, contudo, assinalaram para improcedência da versão oficial, segundo a qual a morte do casal teria ocorrido sem a participação de agentes externos do Estado.[1]

Investigações[editar | editar código-fonte]

No contexto da desconfiança da invalidez dos primeiros registros de óbito de Catarina Helena, o Jornal Última Hora divulgou trechos do depoimento de testemunhas do acidente que colocavam em xeque a versão dos órgãos estatais. Em matéria intitulada "Marighella. Polícia procura casal de estudantes", uma testemunha que manteve sigilo de sua identidade, revelou que o carro estava sendo perseguido na estrada antes de colidir. Nos dias seguintes, o mesmo jornal publicou a matéria "Esta confusa história da metralhadora", que revelava um trecho do depoimento do investigador da Delegacia de Vassouras, segundo o qual seria difícil um acidente ocorrer naquela altura da rodovia por se tratar de um percurso reto de quatro quilômetros.[1]

Segundo relato de Geraldo Dias Silva, proprietário do caminhão vitimado pela colisão, teria sido o próprio Exército a reparar o veículo.[1]

Posteriormente, em abril de 2001, denúncias feitas pelo jornalista Caco Barcellos levantaram a hipótese de que Catarina e João teriam sido executados com tiros na cabeça. O jornalista entrevistara o ex-soldado Valdemar Martins de Oliveira, que relatou ter visto o casal ser levado para um imóvel em São João do Meriti, onde funcionava um centro clandestino, ocasião em que teriam sido torturados e executados. Segundo essa versão, o acidente não passaria de uma farsa para esconder a prática de tortura a qual Catarina e João Antônio teriam sido submetidos.[4] Fundamentada nesse relato, a família de Catarina concordou em exumar seus restos mortais. O laudo da exumação, elaborado pela Polícia Técnica de São Paulo, contradisse a versão anterior e concluiu que sua morte foi consequência de “traumatismo crânio-encefálico” causado por “ação vulnerante de projétil de arma de fogo”. Mais recentemente, em depoimento à CNV, datado de 2 de abril de 2013, Valdemar Martins de Oliveira afirmou que teriam participado da ação as equipes de Freddie Perdigão e de outro agente chamado Miro, a quem não atribuiu identificação exata.[4]

Perdigão seria o responsável pelos tiros que executaram Catarina e João Antônio. A CEMDP, ao analisar o caso, no ano de 2005, concluiu que ambas as versões – a que sustentava que o acidente teria sido causado por perseguição ao veículo; e a que afirmava que o acidente teria sido forjado para encobrir a prisão, tortura e execução do casal – eram verossímeis e indicavam que as mortes de João Antônio e de Catarina tinham ocorrido por ação de agentes do Estado brasileiro.[4]

Belisário dos Santos Júnior, relator do caso na Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos CEMDP, em testemunho dado à Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva, datado de 16 de maio de 2013, destacou que, naquela ocasião, a polícia política foi a primeira a chegar ao local do acidente. Afirmou, ainda, que não houve perícia de local nem mesmo laudo necroscópico. Nesse sentido, levantou a possibilidade de que as armas encontradas no carro tenham sido, na verdade, “plantadas” no local para justificar a morte e afastar a suspeita de participação do Estado no óbito.[3]

A análise questionou, portanto, a ocorrência de um acidente comum e indica a possibilidade de interpretações que levem em consideração a participação do Estado na tentativa de provocar a colisão automobilística. Os restos mortais de Catarina Helena Abi Eçab foram enterrados no cemitério do Araçá, em São Paulo.[4]

Conclusão da Comissão Nacional da Verdade (CNV)[editar | editar código-fonte]

Diante das investigações realizadas, conclui-se que Catarina Helena Abi Eçab foi alvejada por um tiro, que, a despeito de não ser possível imputar sua autoria, é factível afirmar do esforço do Estado para omitir sua causa de morte, inclusive, atribuindo seu óbito a acidente automobilístico, envolto em contexto de sistemáticas violações de direitos humanos promovidas pela ditadura militar implantada no país a partir de abril de 1964.[4]

Recomendou-se a retificação da certidão de óbito de Catarina Helena Abi Eçab, assim como a continuidade das investigações sobre as circunstâncias do caso para identificação e responsabilização dos demais agentes envolvidos.[4]

Homenagens[editar | editar código-fonte]

Foi homenageada com nome descrito em placas feitas para os três principais cemitérios da cidade de São Paulo.[5]

Ligações Externas[editar | editar código-fonte]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. a b c d e f g h i j «CATARINA HELENA ABI-EÇAB - Comissão da Verdade». comissaodaverdade.al.sp.gov.br. Consultado em 17 de novembro de 2019 
  2. a b «CATARINA HELENA ABI-EÇAB (1947 – 1968) | | Documentos Revelados». Consultado em 17 de novembro de 2019 
  3. a b c d «Ex-soldado detalha assassinato de casal militante - Política». Estadão. Consultado em 17 de novembro de 2019 
  4. a b c d e f «Catarina Helena Abi-Eçab». Memórias da ditadura. Consultado em 17 de novembro de 2019 
  5. «Mortos na ditadura militar recebem homenagem no cemitério de Perus». G1. Consultado em 17 de novembro de 2019