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Ciclogravura

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Andrew Clemens criou obras de arte com camadas de areia naturalmente coloridas, formando desde padrões geométricos até paisagens detalhadas, em centenas de frascos.

A ciclogravura é uma forma de arte popular que utiliza areia colorida para criar desenhos e padrões dentro de recipientes de vidro transparente.[1]

No Brasil, é amplamente associada ao estado do Ceará, onde os artesãos criam peças em garrafas e outros recipientes de vidro transparente.[2]

No entanto, embora a arte das garrafas de areia seja um fenômeno conhecido em algumas regiões, sua origem remonta a práticas semelhantes desenvolvidas em outros lugares, como nos Estados Unidos, por Andrew Clemens, um artista de Iowa, que é amplamente reconhecido como o pioneiro dessa técnica.[3]

Nos Estados Unidos

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A prática de criar arte com areia colorida pode ser rastreada a várias tradições culturais ao longo da história, mas um dos momentos mais significativos e documentados no desenvolvimento dessa técnica moderna aconteceu no século XIX, com o artista Andrew Clemens, natural de Iowa, Estados Unidos.[3][4]

Clemens desenvolveu uma técnica única de "sand bottle art" (arte em garrafa de areia), onde ele pressionava grãos de areia colorida dentro de frascos de vidro para criar imagens complexas, sem utilizar cola, apenas a pressão da areia para manter a forma. Ele começou a trabalhar nessa técnica os 17 anos de idade durante suas férias escolares em 1874, coletando areia colorida de uma região chamada Pictured Rocks, em Iowa, e gradualmente aperfeiçoou sua arte, criando peças cada vez mais sofisticadas.[3][4]

Ao longo de sua vida, Clemens produziu centenas de frascos com imagens que variavam desde padrões geométricos simples até paisagens e cenas mais complexas, como barcos a vapor[5] e figuras patrióticas.[6] Seus trabalhos chamaram a atenção e foram exibidos em museus, além de serem vendidos por preços acessíveis na época. Contudo, com o passar dos anos, a demanda por suas peças aumentou, e hoje, algumas de suas garrafas são avaliadas em valores de leilão impressionantes, atingindo preços de até centenas de milhares de dólares.[3][4]

Outro artista que se destaca na américa do norte neste mesmo período foi John A. Adams, um ferroviário que cresceu em Iowa, nas proximidades das margens do rio Mississippi e da fronteira com Wisconsin e trabalhava para a Chicago, Milwaukee, St. Paul and Pacific Railroad[7]. Durante sua juventude, Adams conheceu as pinturas em garrafas com areia de Andrew Clemons, que o inspiraram a desenvolver sua própria arte. Quando começou a desenvolver suas obras, Adams dedicou-se à pintura de paisagens complexas, focada na representação detalhada de cenários naturais.[8][9]

Árabes de Petra na Jordânia fazendo garrafas de areia em American Colony, Jerusalém, entre 1925 e 1946.[10]

Em outros países

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Khalifa Krishna (1885) é considerado o pioneiro da arte em areia jordaniana. No início do século XX, enquanto trabalhava como pintor para as forças armadas na região entre Aqaba e Al Qoura, Krishna começou a utilizar garrafas vazias deixadas por soldados britânicos como telas para suas criações.[11][12][13][14]

O então presidente dos EUA Barack Obama observa um vendedor escrever um nome usando areia colorida em uma garrafa durante um passeio a pé pela antiga cidade de Petra, na Jordânia, em 2013.[15]

Inspirado pelas falésias de arenito de Petra, ele desenvolveu padrões simples com camadas de areia colorida, estabelecendo as bases dessa forma de arte. Seu trabalho influenciou artesãos e ajudou a consolidar uma estética distinta, que se desenvolveu dentro da tradição da arte islâmica e permaneceu relevante ao longo do tempo.[11][12][13][14]

A técnica da ciclogravura também está fortemente difundida na cultura do Egito e, em menor escala, em outras regiões do Oriente Médio desde o século XX, integrando-se à tradição artística local.[16][17][18]

Mais recentemente, também tem ganhado espaço em centros modernos, como Dubai, comercializada em estabelecimentos de souvenirs nos distritos comerciais da cidade.[19][20]

Arte cearense em garrafas com areia colorida no Mercado Central de Fortaleza.

A ciclogravura teve início na década de 1950, com Joana Carneiro, uma moradora da praia de Majorlândia. Ela começou a experimentar a técnica de preencher garrafas com areia colorida de diferentes tonalidades, criando padrões circulares com intervalos entre as camadas de areia.[21][22][23][14]

Durante uma de suas tentativas, o recipiente virou acidentalmente, formando um desenho que, aos olhos de seu filho Antônio Eduardo Carneiro, parecia uma paisagem. Encantado com o efeito, Antônio, mais tarde conhecido como "Toinho da Areia Colorida", passou a aprender e a aprimorar a técnica, criando as primeiras paisagens em garrafas com areia colorida.[24][25][26]

Impacto cultural e econômico

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Mulheres produzindo ciclogravuras na Associação de Educação e Cidadania Santos Dumont (AESD) em Tibau, RN.[27]

A ciclogravura se tornou uma importante atividade econômica para artesãos das praias cearenses, especialmente nas cidades de Beberibe e Majorlândia, onde a técnica é praticada desde suas origens.[28][29]

A arte é uma fonte de sustento para muitos profissionais, sendo popular entre turistas que a adquirem como lembrança da região. O preço das peças varia conforme o tamanho e a complexidade do desenho, podendo variar de R$ 10 a mais de R$ 1 000.[28][29]

Além de ser uma atração turística, as peças de também são utilizadas como brindes e presentes em lojas e eventos. Muitos artesãos, como aqueles de Beberibe, mantêm a tradição da ciclogravura há mais de 35 anos, passando o conhecimento de geração em geração.[2][21][25]

Técnica e materiais

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Produção de ciclogravura em Assuão no Egito.

A ciclogravura utiliza principalmente areia natural, que pode ter diferentes tonalidades, como branco, amarelo, vermelho e marrom, de acordo com a região de origem. Apenas as cores verde e azul são produzidas artificialmente, por meio da adição de corantes à areia branca.[30][31]

A técnica envolve a colocação de camadas sucessivas de areia em recipientes de vidro transparente, como garrafas, cálices e tulipas. Essas camadas de areia formam desenhos, padrões geométricos ou paisagens, dependendo da habilidade do artesão.[32][25]

Os recipientes utilizados devem ser transparentes e sem cor para que as cores das areias possam ser apreciadas em sua totalidade. O trabalho exige grande habilidade e paciência para a disposição das areias, de forma que as camadas e as cores se misturem ou contrastem de maneira harmoniosa.[30][31][32]

Detalhes técnicos mais específicos podem varias de região para região.[25][3]

A ciclogravura é um souvenir popular em Dubai e, assim como em outros lugares, também é chamada de 'Garrafas de Areia da Jordânia' devido à fama dessa arte na região.[14]

Embora o termo 'ciclogravura' (em inglês, sand bottles art) seja amplamente utilizado no português brasileiro, outros nomes também são empregados para descrever essa arte, como silicografia, cericografia e silicogravura, entre outros.[29][33][24]

A silicografia, por exemplo, refere-se à impressão de textos no interior de recipientes de vidro, enquanto arenogravura é uma palavra criada por um grupo de artesãos a partir das palavras "arenosa" e "gravura", para se referir à técnica de criar gravuras realistas com areia.[29][33][24]

Esses termos, no entanto, são usados de forma intercambiável, dependendo da região ou do autor.[29][33][24]

Referências

  1. «CICLOGRAVURA». Fábricas de Cultura. 28 de setembro de 2023. Consultado em 2 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 4 de maio de 2025 
  2. a b «O que as garrafas de areia colorida dizem sobre a criatividade dos cearenses? Pesquisadora responde - Sérgio Ripardo». Diário do Nordeste. 18 de dezembro de 2020. Consultado em 2 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 25 de fevereiro de 2025 
  3. a b c d e «The Wonder and Precision of Sand Art». americanart.si.edu (em inglês). Smithsonian American Art Museum. Consultado em 2 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 5 de fevereiro de 2025 
  4. a b c Manty, Kris (13 de outubro de 2021). «Rare Sand Art By Andrew Clemens Sets World Record». Antique Trader (em inglês). Consultado em 2 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 5 de fevereiro de 2025 
  5. «Andrew Clemens Sand Bottles Gross $1,798,750 In 'Timed' SaleAntiques And The Arts Weekly» (em inglês). 24 de novembro de 2021. Consultado em 2 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 5 de fevereiro de 2025 
  6. «Sand Art - George Washington». iowa.minisisinc.com. Consultado em 2 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 25 de fevereiro de 2018 
  7. «Chicago, Milwaukee and St. Paul Railway Company Collection | South Dakota State University». www.sdstate.edu (em inglês). Consultado em 3 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 5 de fevereiro de 2025 
  8. Artblog (29 de junho de 2014). «Sandpainting by Andrew Clemens and John Adams». Art Kaleidoscope (em russo). Consultado em 3 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 5 de fevereiro de 2025 
  9. «SAND BOTTLE PAINTING». Norman Brosterman (em inglês). Consultado em 3 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 25 de fevereiro de 2025 
  10. «Petra Arabs making sand bottles at Am. [i.e., American] Colony». www.loc.gov (em inglês). 1925. Consultado em 2 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 5 de fevereiro de 2025 
  11. a b «Brilliant Sand Art in Jordan | lemonicks» (em inglês). 19 de fevereiro de 2016. Consultado em 3 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 5 de fevereiro de 2025 
  12. a b Ayesh, Saleem. «Filling sand bottles | The Encyclopedia of Crafts in WCC-Asia Pacific Region (EC-APR)» (em inglês). Consultado em 3 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 11 de setembro de 2024 
  13. a b «Visita Jordania». Visita Jordania (em espanhol). Consultado em 5 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 5 de fevereiro de 2025 
  14. a b c d «G1 > Mundo - NOTÍCIAS - Artesanato de Petra, na Jordânia, parece o do Nordeste do Brasil». g1.globo.com. Consultado em 5 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 4 de fevereiro de 2025 
  15. «Obama visita ruínas de Petra para finalizar viagem ao Oriente Médio». O Globo. 23 de março de 2013. Consultado em 5 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 23 de maio de 2019 
  16. Trotter, The Globe. «Sand in a bottle - Egyptian Sand Art». The Globe Trotter. Consultado em 3 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 4 de outubro de 2025 
  17. Atwell, Cabe. «Egyptian Street Artist Bottles Mesmerizing Sand Creations - Make:». Make: DIY Projects and Ideas for Makers (em inglês). Consultado em 3 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 8 de janeiro de 2025 
  18. «Packaging History: Packaging in Ancient Egypt». packagingschool.com (em inglês). Consultado em 3 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 5 de fevereiro de 2025 
  19. Your Official Webby Channel (19 de novembro de 2023), DUBAI “SAND ART BOTTLE” with Egyptian Sand Artist, consultado em 3 de fevereiro de 2025 
  20. «I Made a Sand Bottle at the Dubai Gold Souk and Ate a Camel Hamburger!!». Authentic Wanderlust (em inglês). 28 de maio de 2024. Consultado em 3 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 5 de fevereiro de 2025 
  21. a b «Praia de Majorlândia, em Aracati, pode se tornar capital cearense das 'ciclogravuras'». Opinião CE. Consultado em 2 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 5 de fevereiro de 2025 
  22. «Artistas lutam pela valorização de suas criações - Região». Diário do Nordeste. 25 de agosto de 2012. Consultado em 2 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 5 de fevereiro de 2025 
  23. «Mestre Toinho». Mapa Cultura do Ceará. Consultado em 2 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 5 de fevereiro de 2025 
  24. a b c d secultpaulasouza (29 de março de 2022). «Exposição "Lembrança de algum lugar", da pintora cearense Paula Siebra, chega em 02 de abril no Sobrado Dr. José Lourenço». Secretaria da Cultura. Consultado em 2 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 14 de março de 2023 
  25. a b c d CE, Do G1 (10 de agosto de 2012). «Pescador cearense faz arte com areia colorida em praia de Aracati». Nosso Ceará. Consultado em 3 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 5 de fevereiro de 2025 
  26. «Aracati: muito além das falésias coloridas de Canoa Quebrada». O Globo. 6 de maio de 2009. Consultado em 3 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 5 de fevereiro de 2025 
  27. «Associação de Educação e Cidadania Santos Dumont». Mapa da Cultura (mapa.cultura.gov.br). Consultado em 2 de fevereiro de 2025 
  28. a b «Artesanato de comunidades cearenses gera negócios no Sesc Povos do Mar». Povos do Mar. 17 de setembro de 2019. Consultado em 2 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 5 de fevereiro de 2025 
  29. a b c d e «A arte nordestina com areia colorida que encanta turistas». Visite o Brasil. Consultado em 2 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 11 de setembro de 2024 
  30. a b SP, Sebrae (24 de outubro de 2016). «Veja como são feitas as famosas garrafinhas de areia colorida de Fortaleza». Youtube. Consultado em 5 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 3 de fevereiro de 2025 
  31. a b «Saiba como é feita arte com areia colorida na garrafa». www.band.uol.com.br. 23 de fevereiro de 2025. Consultado em 2 de fevereiro de 2025 
  32. a b TV Assembleia, RN (25 de outubro de 2018). «Momento Cultural Ciclogravura». Youtube. Consultado em 5 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 5 de fevereiro de 2025 
  33. a b c «Aventura na areia! – Fundação Clóvis Salgado». Consultado em 2 de fevereiro de 2025. Cópia arquivada em 5 de fevereiro de 2025 

Ligações Externas

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