Cláusula de barreira

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Cláusula de barreira (também conhecida como patamar eleitoral, barreira constitucional, cláusula de exclusão ou cláusula de desempenho) é um dispositivo legal que restringe ou impede a atuação parlamentar de um partido que não alcança um determinado percentual de votos.

Essa exigência de votação mínima pode ser feita pela legislação eleitoral de diversas maneiras. No Sistema proporcional, a cláusula de barreira exige que um partido (ou uma coligação eleitoral de partidos) atinja um grau mínimo de votação para obter representação parlamentar. Esse número (ou percentual) mínimo de votos pode ser exigido no âmbito nacional ou em um âmbito mais restrito (departamento, estado, município).

A legislação também pode dispor um número máximo de votos que não serão considerados (uma fórmula negativa para uma regra similar), ou que cada membro da coligação deve atingir um número de votos sem os quais não será considerado representativo.

Efeitos[editar | editar código-fonte]

O efeito principal da cláusula de barreira é impedir a representação dos partidos pequenos. Normalmente, as cláusulas são estabelecidas para buscar estabilidade no sistema eleitoral, negando representação a agremiações radicais ou para evitar que tenham representação legendas de aluguel - que, mesmo sem ter representação real junto à população, cumprem os requisitos legais para formar um partido legal e oferecem os benefícios da estrutura partidária em troca de dinheiro ou outro tipo de benefício.

Os efeitos colaterais da adoção da cláusula de barreira podem ser uma dificuldade na renovação das agremiações políticas e a subrepresentação de uma minoria que não atinge o patamar exigido (esta última pode ser reduzida se a legislação eleitoral permitir o voto preferencial).

Cláusula de Barreira pelo mundo[editar | editar código-fonte]

Na Alemanha, onde é adotado o voto distrital misto, não ganham representação no Bundestag ou nos parlamentos regionais dos Länder (Estados), os partidos que não alcançarem 5% dos votos. Com a unificação com o Leste em 1990, houve uma mitigação nas normas, permitindo que o PDS (Partido do Socialismo Democrático) que reúne os ex-comunistas da Alemanha Oriental mantivessem sua representação.

Na Espanha, Noruega, Suécia, Polônia e em grande parte dos países da Europa, a cláusula de barreira varia de 3 a 4% dos votos, na Dinamarca é de 2%. Na Nova Zelândia é de 5%. Na Turquia, para que se evitassem partidos extremistas, a cláusula há alguns anos foi fixada em 10% dos votos. A Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa recomenda que a cláusula de barreira não deve ser superior a 3%.[1]

País Cláusula de Barreira
Alemanha 5%[2][3]
Rússia 5%[2][4]
Ucrânia 4%[2]
Bulgária 4%[2]
Suécia 4%
Noruega 4%
Itália 3%[5]
Espanha 3%[2]
Israel 3,25%[6]
Brasil 80% do quociente eleitoral para partidos

20% do quociente eleitoral para candidatos 2% dos votos válidos nas eleições para a Câmara dos Deputados para acesso ao fundo partidário e à propaganda gratuita no rádio e na televisão

Portugal Proibida constitucionalmente[2]

Cláusula de Barreira no Brasil[editar | editar código-fonte]

Cláusula de Barreira no Brasil Atualmente[editar | editar código-fonte]

Atualmente operam no Brasil duas formas de Cláusula de Barreira.

A primeira cláusula de barreira atualmente em funcionamento no Brasil limita a distribuição de cadeiras em eleições proporcionais e é determinada pelo art. 109 do Código Eleitoral. Essa regra determina que só podem concorrer à distribuição dos lugares os partidos que tenham obtido pelo menos 80% do quociente eleitoral e os candidatos que tenham obtido votos em número igual ou superior a 20%[7].

A segunda cláusula de barreira atualmente em funcionamento no Brasil tem efeitos sobre o financiamento de partidos políticos e foi criada em 2017. A Emenda Constitucional 97/2017 determina que apenas os partidos que obtiveram mais de 2% (dois por cento) dos votos válidos nas eleições para a Câmara dos Deputados de 2022 terão acesso ao fundo partidário e à propaganda gratuita no rádio e na televisão. A partir de 2030, apenas os partidos que obtiverem mais de 3% dos votos terão direito ao fundo partidário à propaganda gratuita.

Cláusula de Desempenho da Lei dos Partidos Políticos[editar | editar código-fonte]

A Lei dos Partidos Políticos (lei 9.096/1995) criou uma Cláusula de Desempenho em seu art. 13[8], dispondo que apenas que obtivessem mais de 5% dos votos teriam direito a funcionamento parlamentar[9]. No entanto, essa regra considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal um ano antes de sua entrada em vigor, em 2006, no julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade 1351 e 1354[10]. O STF considerou que a regra violava o artigo 17 da Constituição brasileira de 1988 por violar a liberdade de criação de partidos políticos e a autonomia dos partidos.

A lei 9.096 de 1995[11] previa que os partidos com menos de 5% dos votos não teriam direito a:

  • representação partidária no Congresso Nacional;
  • tempo de propaganda eleitoral em rede nacional de rádio e de TV;
  • recursos do fundo partidário;
  • o espaço físico que a Câmara dos Deputados disponibiliza a todos os partidos políticos seria reduzido;
  • direito a liderança, deputados em comissões e cargos na mesa diretora;
  • Teriam estrutura menor na Câmara.

Julgamento da Lei 9.096[editar | editar código-fonte]

No final de 2006, os onze ministros do Supremo Tribunal Federal julgaram conjuntamente duas ações diretas de inconstitucionalidade promovidas pelo Partido Comunista do Brasil com o apoio do Partido Democrático Trabalhista, Partido Socialista Brasileiro, Partido Verde, Partido Social Cristão, Partido Socialismo e Liberdade, Partido Republicano Brasileiro (atual Republicanos) e Partido Popular Socialista (atual Cidadania) (Ação Direta de Inconstitucionalidade 1351) e pelo Partido Social Cristão (PSC) (Ação Direta de Inconstitucionalidade 1354). O argumento dessas legendas é que a lei 9.096, de 1995, que criou as regras da cláusula, fere o direito de manifestação política das minorias.[12]

Nova proposta e aprovação[editar | editar código-fonte]

Em 2016, novas propostas de reforma política foram apresentadas, propondo, entre outras alterações na legislação eleitoral, a mudança para o sistema eleitoral de lista fechada, o fim das coligações em eleições proporcionais (deputados federais, deputados estaduais e vereadores), uma cláusula de barreira progressiva e a criação de um fundo eleitoral.[13] Posteriormente, a proposta de voto em lista foi substituída pelo sistema Distritão.[14] A mudança de sistema eleitoral acabou rejeitada, mas a cláusula de barreira e o fundão eleitoral acabaram aprovados na Emenda Constitucional nº 97.

Emenda Constitucional 97/2017[editar | editar código-fonte]

A Emenda Constitucional 97/2017 criou uma cláusula de desempenho para que os partidos políticos possam ter acesso ao fundo partidário e à propaganda gratuita no rádio e na televisão. A regra entrará em vigor de forma gradual, até 2030.

Ano Votos válidos Deputados federais
2018 1,5% 9
2022 2% 11
2026 2,5% 13
2030 3% 15

Consequências[editar | editar código-fonte]

Eleições Gerais de 2018[editar | editar código-fonte]

Nas eleições de 2018, a cláusula de barreira entrou em vigor no Brasil, exigindo que os partidos tivessem pelo menos 1,5% dos votos válidos para deputado federal, com 1% dos votos válidos em pelo menos um terço das unidades da Federação ou eleger 9 Deputados federais, distribuidos em um terço das unidades federativas. Consequentemente, 14 dos 35 partidos políticos registrados no TSE em 2018 não superaram a cláusula de barreira, a saber: Rede, Patriota, PHS, PPL, PCdoB, PRP, PMN, PTC (atual Agir) e DC, que elegeram representantes para o Congresso Nacional, mas não superaram a cláusula de barreira e PRTB, PMB, PSTU, PCB e PCO, que não elegeram representantes e não superaram a cláusula de barreira.[15] Portanto, ficaram sem acesso ao Fundo Partidário e à Propaganda Eleitoral Gratuita entre 2019 a 2022.[15]

Consequentemente, alguns partidos foram incorporados a outros, para juntos superarem a cláusula de barreira. Em 2019, foram homologadas pelo TSE as incorporações do PPL ao PCdoB[16], PRP ao Patriota[17] e PHS ao Podemos.[18]

Consequentemente, PCdoB e Patriota superaram a cláusula de barreira.

Outra consequência da cláusula de barreira é a possibilidade dos deputados federais eleitos pelos partidos que não superaram a cláusula de barreira se desfiliarem sem perder o mandato. Por isso, todos os deputados eleitos pelo PMN, PTC (atual Agir) e DC se desfiliaram destas siglas em 2019, deixando-as sem representantes no Congresso Nacional.[19]

O único partido que não superou a cláusula de barreira e continuou tendo representantes no Congresso até o fim da 56° legislatura foi o Rede Sustentabilidade, que ingressou na Federação PSOL REDE em 2022 para ter acesso ao fundo partidário e o tempo de propaganda eleitoral na televisão e rádio.[20]

Eleições Gerais de 2022[editar | editar código-fonte]

Nas eleições de 2022, a cláusula de barreira passou a exigir 2% dos votos válidos, com 1% dos votos válidos em pelo menos um terço das unidades da Federação ou eleger pelo menos 11 deputados federais distribuídos em nove unidades da Federação.[21]

Neste ano, 15 dos 28 entes políticos (partidos e federações) não atingiram a cláusula de barreira. São eles: PSC, Solidariedade, PROS, Patriota, NOVO e PTB, que elegeram representantes para o Congresso em 2022, mas não superaram a cláusula de barreira e PMN, Agir, DC, PRTB, PMB, PSTU, PCB, PCO e UP, que não superaram a cláusula de barreira e também não elegeram representantes para o Congresso Nacional em 2022.[22][23]

Consequentemente, alguns desses partidos buscaram fusões e incorporações para superar a cláusula de barreira.[24]

Em 17 de outubro de 2022, foi aprovada pelos diretórios dos partidos Solidariedade e PROS a incorporação deste por aquele. Consequentemente, o partido incorporador superou a cláusula de barreira.[25]

Em 26 de outubro de 2022, foi aprovada pelas convenções nacionais do PTB e do Patriota a fusão entre os partidos, para formar um partido que se chamaria Mais Brasil, o qual pela soma de votos também superaria a cláusula de barreira.[26][27][28][29] Ao final, a nova agremiação adotou o nome de Partido Renovação Democrática (PRD), sendo a fusão homologada pelo Tribunal Superior Eleitoral em novembro de 2023[30].

Em 22 de novembro de 2022, o PODE anunciou que incorporaria o PSC.[31] Posteriormente, a incorporação foi aprovada e convenção conjunta pelas siglas em 8 de dezembro de 2022.[32]

O percentual mínimo de votos e o número mínimo de eleitos deve aumentar progressivamente em 2026 e 2030, quando a cláusula de barreira será estabilizada:

Referências

  1. «Resolution 1547 (2007) State of human rights and democracy in Europe». Consultado em 12 de outubro de 2023 
  2. a b c d e f Braga da Cruz, Manuel (2015). Política Comparada. Maia: Cruz Editores. 176 páginas. ISBN 978-989-97225-7-6 
  3. Braga da Cruz, Manuel (2015). Política Comparada. Maia: Cruz Editores. pp. 177–78. ISBN 978-989-97225-7-6 
  4. Braga da Cruz, Manuel (2015). Política Comparada. Maia: Cruz Editores. 179 páginas. ISBN 978-989-97225-7-6 
  5. Braga da Cruz, Manuel (2015). Política Comparada. Maia: Cruz Editores. pp. 179–81. ISBN 978-989-97225-7-6 
  6. Nicolau, Jairo (2 de setembro de 2015). Sistemas eleitorais. [S.l.]: Editora FGV. ISBN 9788522509867 
  7. «Nova regra complica distribuição de vagas de deputados | Opinião». Poder360. Consultado em 20 de junho de 2023 
  8. BRASIL. «LEI Nº 9.096, DE 19 DE SETEMBRO DE 1995» 
  9. «Cláusula de barreira: entenda o que é e as mudanças propostas - Politize!». Politize!. 17 de outubro de 2016 
  10. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. «Plenário do STF considera "cláusula de barreira" inconstitucional» 
  11. «Cláusula de barreira restringiria ação de 14 partidos se já estivesse em vigor». Política. 18 de setembro de 2016 
  12. Folha Online - STF derruba cláusula de barreira
  13. Por Estadão Conteúdo (4 de abril de 2017). «Um resumo das propostas da reforma política 2017». Consultado em 30 de dezembro de 2018 
  14. Paula Adamo Idoeta (11 agosto 2017). «Por que a proposta do 'distritão' é tão criticada?». Consultado em 30 de dezembro de 2018 
  15. a b Agência Câmara Notícias (9 de outubro de 2018). «Sem votação mínima, 14 partidos ficarão sem recursos públicos». Consultado em 22 de janeiro de 2020 
  16. «Plenário aprova incorporação do PPL ao PCdoB». Tribunal Superior Eleitoral. 28 de maio de 2019. Consultado em 3 de setembro de 2022 
  17. «Plenário do TSE aprova incorporação do PRP ao Patriota». Tribunal Superior Eleitoral. 28 de março de 2019. Consultado em 3 de setembro de 2022 
  18. «Plenário aprova incorporação do PHS ao Podemos». 19 de setembro de 2019. Consultado em 3 de setembro de 2022 
  19. «Deputado federal Luiz Antônio se filia ao Partido Liberal». 21 de agosto de 2019. Consultado em 17 de outubro de 2022 
  20. «PSOL e Rede apresentam pedido de registro de federação ao TSE». G1. Consultado em 24 de maio de 2022 
  21. Com dura cláusula de barreira, metade das siglas corre risco de acabar O Tempo. Consultado em 19 de outubro de 2021
  22. «12 partidos e federações alcançam cláusula de barreira; 16 partidos ficam de fora». Senado Federal do Brasil. 17 de outubro de 2022. Consultado em 17 de outubro de 2022 
  23. «Pernambuco garante que o Avante atinja a cláusula de barreira». CBN Recide. 20 de dezembro de 2022. Consultado em 19 de dezembro de 2022 
  24. «Cláusula de barreira: Patriota, PTB e PSC temem asfixia financeira e discutem fusão ou incorporação; entenda». G1. 10 de outubro de 2022. Consultado em 17 de outubro de 2022 
  25. «Solidariedade oficializa incorporação do PROS para sobrevivência». O Antagonista. 17 de outubro de 2022. Consultado em 17 de outubro de 2022 
  26. G1. «Partidos PTB e Patriota anunciam fusão; nova sigla deve se chamar Mais Brasil». Consultado em 26 de outubro de 2022 
  27. Estadão. «PTB aprova fusão com Patriota e novo partido vai se chamar Mais Brasil; Jefferson é vetado». Consultado em 26 de outubro de 2022 
  28. CNN. «PTB e Patriota aprovam fusão e criam Mais Brasil; Jefferson não fará parte». Consultado em 26 de outubro de 2022 
  29. «PTB aprova fusão com Patriota, mas Roberto Jefferson é vetado no partido». 26 de outubro de 2022. Consultado em 26 de outubro de 2022 
  30. https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2023/Novembro/tse-aprova-criacao-do-partido-renovacao-democratica-prd
  31. «Podemos anuncia incorporação do PSC, e partido terá 18 deputados e 7 senadores em 2023». 22 de novembro de 2022. Consultado em 25 de novembro de 2022 
  32. «Podemos e PSC realizam primeira Convenção Nacional e avançam no processo de união política». 8 de dezembro de 2022. Consultado em 8 de dezembro de 2022 

Ligações externas[editar | editar código-fonte]