Discurso de George S. Patton para o Terceiro Exército

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Patton discursando para tropas norte-americanas na Irlanda do Norte, 1944.

O discurso de George S. Patton para o Terceiro Exército foi uma série de discursos realizados pelo tenente-general George S. Patton em 1944 para tropas pertencentes ao Terceiro Exército dos Estados Unidos, antes da invasão Aliada da França. Os discursos tinham a intenção de motivar as tropas inexperientes para a iminente batalha. Patton pediu para seus soldados realizarem seu dever independentemente de medo pessoal, estimulando-os a serem agressivos e partirem para ação ofensiva constante.

O linguajar cheio de palavrões do general foi visto como não-profissional por alguns oficiais, porém o discurso foi bem recebido pelos soldados. Alguns historiadores afirmaram que sua oratória foi um dos melhores discursos motivacionais da história. Uma versão abreviada e com menos palavrões ficou icônica graças ao filme Patton de 1970, em que foi interpretado pelo ator George C. Scott. Esta performance foi instrumental em levar Patton para a cultura popular e transformá-lo em um herói folclórico.

Antecedentes[editar | editar código-fonte]

O tenente-general George S. Patton recebeu em janeiro de 1944 o comando do Terceiro Exército dos Estados Unidos, um exército de campo recém chegado no Reino Unido e que era composto principalmente por tropas inexperientes. O trabalho de Patton foi treinar os soldados em preparação para a iminente invasão da França pelos Aliados, onde juntariam-se ao avanço da Operação Cobra pela Bretanha sete semanas depois dos desembarques anfíbios da Operação Overlord na Normandia.[1]

Patton discursando na Irlanda do Norte, 1 de abril de 1944.

Patton já havia estabelecido-se por volta de 1944 como um líder muito eficiente e bem sucedido, conhecido por sua habilidade de inspirar seus homens através de discursos carismáticos, que ele fazia apenas de memória devido a um duradouro problema de leitura.[2] O general cultivava deliberadamente uma imagem espalhafatosa e distinta por acreditar que isto ajudaria inspirar os soldados. Patton costumava carregar um revólver Smith & Wesson Modelo 27 .357 Magnum.[3] Era frequentemente visto usando um capacete bem polido, calças de equitação e botas de cavalaria cano alto.[4] Seu veículo de comando possuía plaquetas de patente extra grandes na dianteira e traseira, além de uma buzina elétrica que usava para anunciar sua chegada.[5] Patton era um comandante de batalha eficiente, tendo reabilitado o II Corpo durante a Campanha Norte-Africana e em seguida liderado o Sétimo Exército no decorrer da invasão da Sicília em 1943, algumas vezes aparecendo pessoalmente entre suas tropas no meio do combate com o objetivo de inspirá-los.[6] Seu exército superou o general britânico Bernard Montgomery na corrida para Messina, algo que lhe rendeu fama considerável,[7] porém dois incidentes em que bateu em soldados sofrendo de transtorno de estresse pós-traumático fizeram sua carreira estagnar por vários meses.[8]

O general estava tentando manter-se discreto na época dos discursos, seguindo as ordens do general Dwight D. Eisenhower. Patton foi feito a figura central de um elaborado esquema de desinformação, com os alemães acreditando que ele estava em Dover preparando o Primeiro Grupamento do Exército dos Estados Unidos para uma invasão de Pas-de-Calais.[9] Em cada ocasião dos discursos ele apareceu usando seu capacete polido, uniforme completo e botas de equitação enceradas, carregando também uma chibata a fim de ampliar o efeito. Patton frequentemente mantinha seu rosto acarrancado, algo que ele chamava de seu "rosto de guerra".[10] Ele costumava chegar de Mercedes-Benz e proferir suas palavras de uma plataforma elevada cercado por uma grande multidão sentada. Cada discurso foi feito para uma força de divisão de aproximadamente quinze mil homens ou mais.[11]

Discurso[editar | editar código-fonte]

Patton começou a fazer os discursos para suas tropas no Reino Unido por volta de fevereiro de 1944. Não se sabe ao certo quando ocorreu o discurso em particular que tornou-se famoso, com fontes diferentes dizendo que ele tomou essa forma em março,[12] outras no início de maio[13][14] ou ainda no final de maio. Também não se sabe o número de discursos realizados, com uma fonte afirmando terem sido entre quatro e seis,[10] enquanto outras sugerem que todas as unidades do Terceiro Exército ouviram um.[12][14] O mais famoso e conhecido desses discursos ocorreu em 5 de junho de 1944, um dia antes dos Desembarques da Normandia.[15] Apesar dele não saber a real data para o começo da invasão da França, já que o Terceiro Exército não fazia parte da força inicial de desembarque,[10] Patton usou o discurso como dispositivo motivacional para animar os homens sob seu comando e impedir que eles ficassem muito ansiosos.[16] Ele realizou os discursos sem anotações por escrito, com a ordem de algumas partes variando apesar do conteúdo ser praticamente o mesmo em cada ocasião.[17] Uma diferença notável aconteceu no discurso do dia 31 de maio, enquanto falava para a 6ª Divisão Blindada, em que começou com um comentário que tornaria-se um de seus mais famosos:[18]

As palavras de Patton foram depois transcritas por vários soldados que testemunharam os discursos, assim existem várias versões com diferenças nas palavras. O historiador Terry Brighton construiu um discurso completo a partir dos relatos de diversos soldados que recontaram as ocasiões em suas memórias, incluindo Gilbert R. Cook, Hobart R. Gay e outros oficiais menos graduados.[17] Patton escreveu brevemente em seu diário sobre suas oratórias, dizendo apenas "como em todas as minhas falas, salientei lutar e matar".[16] O discurso ficou tão popular que começou a ser chamado de "discurso de Patton" ou "o discurso" quando se fala sobre o general:[10][16]

Legado[editar | editar código-fonte]

As tropas sob o comando de Patton receberam bem o discurso. A grande reputação do general causou animação entre seus homens, com eles ouvindo em absoluto silêncio e atentamente.[11] A maioria indicou terem gostado do modo de falar de Patton. Um dos oficiais comentou que ao final do discurso "Os homens sentiram instintivamente o fato e a marca reveladora que eles mesmos desempenhariam, na história do mundo por causa disso, pois fora lhes dito agora mesmo. Sinceridade e seriedade profundas estavam atrás das palavras pitorescas do general e os homens sabiam disso, porém eles amaram o modo que ele colocou como apenas ele poderia fazer".[20] Patton deu um tom bem humorado ao discurso, já que intencionalmente queria fazer os soldados rirem de sua oratória pitoresca. Observadores falaram depois que as tropas aparentemente acharam os discursos bem engraçados.[11] Particularmente, seu uso de humor obsceno foi muito bem recebido pelos soldados,[21] já que foi considerado "o linguajar dos quartéis".[10]

Uma notável minoria de oficiais não se impressionaram ou desgostaram do uso de obscenidades, vendo isso como uma conduta não-profissional para um oficial militar.[16][22] Os relatos posteriores de certos oficiais substituíram alguns palavreados, como foder para fornicar. Pelo menos um relato substituiu "Iremos segurá-lo pelas bolas" por "Iremos segurá-lo pelo nariz".[17] Dentre os críticos do frequente uso de vulgaridades por Patton estava o general Omar Bradley, seu ex-subordinado.[23] Os dois eram completos opostos em personalidade, existindo evidências consideráveis que Bradley não gostava de Patton pessoalmente e profissionalmente.[24] Patton escreveu a um familiar respondendo às críticas quanto seu linguajar: "Quando eu quero que meus homens se lembrem de algo importante, para que realmente grude, eu dou para eles duplamente sujo. Pode não soar bem para um bando de senhorinhas em uma festa do chá da tarde, mas ajuda meus soldados a se lembrarem. Você não consegue manejar um exército sem profanidades, e precisa ser uma profanidade eloquente. Um exército sem profanidade não conseguiria lutar para fora de um saco de papel encharcado de mijo".[17]

O Terceiro Exército desembarcou na Normandia em junho de 1944 sob a liderança de Patton e desempenhou um papel integral durante os últimos meses da guerra na Europa, fechando a Bolsa de Falaise em agosto[25] e aliviando o cerco da cidade de Bastogne em dezembro na Batalha das Ardenas, um feito considerado uma das realizações mais notáveis da guerra. A velocidade e ofensividade que Patton pediu em seu discurso tornaram-se ações que trouxeram grande aclamação para o Terceiro Exército.[26]

Historiadores muito elogiaram o discurso de Patton como uma de suas maiores obras. Terry Brighton o descreveu como "o maior discurso motivacional da guerra e talvez de todos os tempos, excedendo (em seu efeito de impulso moral se não como literatura) as palavras que Shakespeare deu ao rei Henrique V em Azincourt".[10] O historiador Alan Axelrod argumentou que o discurso foi a mais famosa de suas muitas e memoráveis citações.[16]

A cena de abertura do filme Patton.

O discurso tornou-se um ícone da cultura popular depois do filme Patton de 1970, que contava a história do general durante seu tempo na Segunda Guerra. A cena de abertura mostrava o ator George C. Scott como Patton diante de uma enorme Bandeira dos Estados Unidos e interpretando uma versão com menos palavrões do discurso.[27] Ele começa com uma versão da citação "Nenhum bastardo já venceu uma guerra morrendo por seu país..." A interpretação de Scott omitiu boa parte da porção do meio do discurso, sobre as anedotas de Patton das campanhas na Sicília e África, além de seus comentários sobre a importância da cada soldado para o esforço de guerra.[21] O ator fez a cena em um tom completamente sério, grave e áspero, diferentemente da abordagem bem humorada do general. A interpretação de Scott no filme lhe rendeu o Oscar de Melhor Ator e foi instrumental em levar Patton para a cultura popular como um herói folclórico.[28]

Referências

  1. Axelrod 2006, p. 124; Blumenson 1974, p. 407
  2. Axelrod 2006, pp. 67–68
  3. Brighton 2009, p. xvi; Zaloga 2010, p. 9
  4. D'Este 1995, p. 478
  5. Axelrod 2006, pp. 77–79
  6. Brighton 2009, pp. 201–202
  7. Axelrod 2006, pp. 110–111
  8. Axelrod 2006, p. 117; Blumenson 1974, p. 331
  9. Axelrod 2006, p. 127; Blumenson 1974, p. 409
  10. a b c d e f Brighton 2009, p. 260
  11. a b c D'Este 1995, p. 601
  12. a b «George S. Patton's Speech to the Third U.S. Army». Museu Patton de Cavalaria e Blindados. Consultado em 18 de maio de 2017. Cópia arquivada em 16 de junho de 2006 
  13. Blumenson 1974, p. 456
  14. a b Axelrod 2006, p. 21
  15. Gist 2010, p. 477
  16. a b c d e Axelrod 2006, pp. 130–131
  17. a b c d Brighton 2009, p. 261
  18. a b Gist 2010, p. 487
  19. Brighton 2009, pp. 262–265
  20. D'Este 1995, p. 604
  21. a b D'Este 1995, p. 603
  22. Brighton 2009, p. 249
  23. D'Este 1995, p. 578
  24. D'Este 1995, pp. 466–467
  25. Axelrod 2006, p. 139–140
  26. Axelrod 2006, pp. 152–153
  27. D'Este 1995, p. 602
  28. D'Este 1995, pp. 1–2

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  • Axelrod, Alan (2006). Patton: A Biography. Londres: Palgrave Macmillan. ISBN 978-1-4039-7139-5 
  • Blumenson, Martin (1974). The Patton Papers: 1940–1945. Boston: Houghton Mifflin. ISBN 0-395-18498-3 
  • Brighton, Terry (2009). Patton, Montgomery, Rommel: Masters of War. Nova Iorque: Crown Publishing Group. ISBN 978-0-307-46154-4 
  • D'Este, Carlo (1995). Patton: A Genius for War. Nova Iorque: Harper Collins. ISBN 0-06-016455-7 
  • Gist, Brenda Lovelace (2010). Eloquently Speaking. Bloomington: Xlibris. ISBN 978-1456811525 
  • Zaloga, Steven (2010). George S. Patton: Leadership, Strategy, Conflict. Oxford: Osprey Publishing. ISBN 978-1-84603-459-6