Leo Felipe: diferenças entre revisões

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Revisão das 06h44min de 14 de julho de 2015

Leo Felipe em 2011, na abertura de uma exposição na Fundação Ecarta.

Leonardo Azevedo Felipe, mais conhecido como Leo Felipe, é um escritor, jornalista, músico, DJ e curador de arte brasileiro, e foi um conhecido empresário da noite em Porto Alegre, capital do estado do Rio Grande do Sul.

Iniciou sua carreira com cerca de 15 anos como bancário, mas desde jovem era apreciador de arte, rock e literatura underground, e logo o ambiente formal do trabalho de escritório o deixou insatisfeito. Com 19 anos conheceu Ricardo Kudla, e com ele fundou em 1992 o bar Garagem Hermética, instalado em um casarão antigo e decadente da rua Barros Cassal, na esquina com a avenida Independência. A princípio o bar apareceu como uma simples forma de extravasar as pressões que sentiam vir da cultura mainstream, onde pudessem, reunindo amigos de ideias semelhantes, confraternizar e tocar as músicas de que gostavam com as bandas alternativas que integravam.[1][2]

A despeito desta origem despretensiosa, pela sua postura libertária e pela valorização dos artistas locais, o Garagem Hermética desempenhou um papel vital para o desenvolvimento do rock independente e autoral sulino na última década do século XX, tornando-se um centro de revelação de novos talentos e uma espécie de refúgio da contracultura de Porto Alegre, criando um rico folclore urbano em seu redor.[1][3][4][5][6] Fernando Rosa, editor da revista Senhor F, disse que o bar foi "uma das lendas urbanas do rock porto-alegrense e, mesmo, do rock nacional".[5] Segundo Daniel Feix, em matéria para a Zero Hora, "as memórias do 'Velho Garagem' envolvem sexo, drogas e bebedeiras vivenciadas por pelo menos duas gerações de jovens cheios daquela energia que [Leo] sintetiza simplesmente como 'roquenrol'. [...] Artistas, cineastas, músicos, estudantes e quem mais tivesse um dedinho do pé no underground, na Porto Alegre da década de 1990, tem alguma história envolvendo o casarão da Barros Cassal".[1] A atriz Cléo de Páris deixou outro testemunho sobre a atmosfera do Garagem e do significado que ele assumiu tanto para a população que o frequentou quanto para a cultura local:

"O Garagem Hermética não foi só um bar; foi um vulcão com lavas incandescentes que nos presenteou com nosso melhor e nosso pior, na condição de artistas inquietos e malucos. Éramos pura poesia; poesia sublime e poesia dos calabouços. Éramos pura beleza; beleza mágica e beleza das trevas. O Garagem nos fez desbravadores de um espaço além mídia, além conformismo, além comercial de margarina. Foi lá que revolucionamos e nos revolucionamos, nos pensamentos e nas atitudes, dando a cara a tapa sempre. Lá, no meio daquelas paredes inadequadas, fomos deuses, visionários e pessoas comuns".[1]

Na sua fase de apogeu ali surgiriam ou fariam importantes shows bandas que se destacaram na cena sulina, como Cachorro Grande, Aristóteles de Ananias Jr., Júpiter Maçã, Graforréia Xilarmônica, Ultramen e Space Rave,[5][7] e ali foi lançado o disco A Sétima Efervescência,[8] de Júpiter Maçã, um dos álbuns mais emblemáticos do rock gaúcho e incluído na lista dos 100 melhores discos da música brasileira da revista Rolling Stone,[9] que segundo o autor foi concebido exatamente em função do bar: "Eu estava muito entusiasmado e contagiado pelo clima do early Garagem Hermética e pelas garotas, pela simpatia dos rapazes. Acabei me tornando uma espécie de ícone pra aquela turma. Posso dizer que praticamente fiz o disco para aquela turma.[10]

Leo Felipe e Ricardo Kudla comandaram o bar até 2000, quando o venderam. Foi então reformado, e permaneceu em atividade até 2013, mas nesta segunda etapa ele já havia perdido boa parte do seu antigo apelo.[1][6]

Neste ínterim, Leo Felipe tentou ingressar no curso de Artes Visuais, mas não teve sucesso. Então optou pelo Jornalismo, onde graduou-se. Depois passou a escrever, publicando os livros AUTO (2004) e O Vampiro (2006).[8][11] Em 2014 lançou A Fantástica Fábrica, que narra sem rodeios a fervilhante trajetória do Garagem Hermética. O livro é produto de dez anos de trabalho. Partes de seu material foram sendo publicadas à medida que iam sendo redigidas no seu blog e em outros veículos. A partir da repercussão positiva, o autor decidiu reunir suas histórias em um livro, que recebeu ampla divulgação e muitas críticas positivas.[1][12][13][5][14] Segundo o autor, "quando pensei na transição do blog para o livro, vi que não podia me autocensurar. Apesar de ter coisas muito fortes, alterei o mínimo possível".[15] Diego Medina, ex-Video Hits, que responde pelas psicodélicas ilustrações do livro,[14] assim o analisou:

"O livro de Leo Felipe vem de certa forma preencher um vácuo na história da cultura pop porto-alegrense. Enquanto o pessoal da Oswaldo [ver nota [16]] recebeu, com méritos, extensa reflexão e registro, a geração dos anos 90 parece que nunca recebeu a atenção necessária em relação aos seus mitos de origem. [...] Interessante na verdade é que Leo Felipe não assume aqui ares de historiador ou jornalista-testemunha do berço de uma cena cultural tão rica como a do Garagem. O livro de Leo Felipe é um legítimo memoir, que conta muito mais a sua história pessoal do que a distanciada de um bar. Sorte que ambas coexistem e se confundem fortemente. [...] Mas não se enganem: poderia ser um saco ficar lendo sobre a ascensão e decadência de um jovem nos seus vinte e poucos anos, seja ela física, moral ou financeira. No caso de A Fantástica Fábrica é sensacional. Muito pela tradução perfeita que Leo Felipe consegue fazer do ethos noventista".[12]

Fabrício Silveira, do grupo de pesquisa CultPop, vinculado ao Programa de Pós-Graduação da UNISINOS, também deixou impressão favorável:

"A Fantástica Fábrica é um livro delicioso. Não consegui parar de ler. Leo Felipe nos apresenta um relato corajosamente franco, irônico, às vezes, hilário, sobre o Garagem Hermética, bar que comandou durante boa parte da década de 1990. Tratava-se de um ponto de encontro obrigatório, um parque de diversões do underground rockeiro do cidade. Por ali passou muita gente (assombrações, Otto Guerra, Edu K perneta, Júpiter Maçã, ilustres conhecidos, ilustres desconhecidos, ilustradores e cineastas independentes). Ali aconteceu muita coisa (brigas, amores, quedas, pinduras, concertos desastrosos, atraques policiais). O livro faz justiça a isto tudo. É como se o Garagem tivesse existido para se tornar um livro. Sem ser nostálgico nem saudosista, A Fantástica Fábrica faz um brinde à memória e à experiência que nos vinculam ao presente. É uma leitura altamente recomendável".[6]

Logo após sua formatura no Jornalismo passou a apresentar o programa Radar da TV Educativa do Rio Grande do Sul, dirigindo-o por por oito anos, da mesma maneira dando espaço para a produção emergente e alternativa da cena musical gaúcha. Enquanto isso, entre 2006 e 2009 foi curador do projeto República do Rock promovido pela Coordenação de Música da Secretaria Municipal de Cultura, e passou a se interessar mais fortemente pelas artes visuais, que admirava desde a juventude.[8][17]

Prédio da Fundação Ecarta decorado com pixação e graffiti patrocinadas por Leo Felipe.

Ao deixar a TVE em 2011, foi convidado pela Fundação Ecarta para assumir a gerência e a curadoria da sua galeria de arte, imediatamente expandindo suas atividades e projetando o nome do espaço,[8] que em 2012 recebeu o Prêmio Açorianos na categoria Destaque Espaço Institucional de Divulgação Cultural.[18][17] Integrou em 2011 o conselho curatorial da Casa M, projeto da 8ª Bienal do Mercosul, fez da parte da comissão de seleção do Prêmio IEAVI, mantido pelo Instituto Estadual de Artes Visuais,[17][19] é diretor da rádio Mínima FM, onde apresenta o programa Elefante, voltado a uma programação cultural, com música e entrevistas,[8][17] ministra palestras e seminários e faz curadorias independentes, entre outros projetos.[20][21][22][23][24][25][26] É também conhecido DJ, há mais de dez anos produtor e animador da festa Pulp Friction, que ocorre uma vez por mês no Bar Ocidente e já se tornou tradicional na noite porto-alegrense.[2][27][28]

O seu interesse pela contracultura se expressou também no ambiente acadêmico. Em 2013 obteve o Mestrado em História, Teoria e Crítica de Arte pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul com a dissertação Rock My Art, ou O Novo Esteticismo de "Por que Choras?", ou O dia em que Edu K entrou para a História da Arte,[8] que analisa a performance Por que Choras?, de Telmo Lanes e Rogério Nazari, que teve acompanhamento do grupo de rock DeFalla, "apontando momentos do século XX em que o campo das artes visuais foi cruzado com o da cultura popular massiva representada pelo rock", propondo "reflexões acerca do fazer da própria História da Arte e das maneiras de produção da chamada pós-crítica".[29]

No texto "O Legado da Contracultura", relacionado à exposição Um firme e vibrante NÃO, sob a curadoria dele e de Jorge Bucksdricker, que enfocou exatamente este universo e circulou por Pelotas, Caxias do Sul e Porto Alegre,[30] Leo Felipe deixou sua visão sobre a importância de um movimento que ele conhece por dentro:

"A revolução proposta pela contracultura é de uma abrangência que vai do molecular ao social, do psicológico ao ambiental. Não é a revolução vinda da classe proletária, são os filhos burgueses da tecnocracia que se rebelam questionando um modelo desenvolvimentista de progresso que nos desconecta da natureza e do ser. Num contraditório jogo de forças, a transgressão da contracultura não está imune à cooptação, assimilação ou diluição, já que sempre fará parte da cultura contra a qual tentar insurgir-se. [...] A contracultura nos ensinou como criar sistemas alternativos de circulação e difusão da informação: imprensa alternativa, arte postal, os fanzines, modelos que sugerem que para combater o inimigo é preciso aprender a usar suas armas. A informação quer ser livre, o aforismo hacker do escritor Stewart Brand (postulado lá por 68, claro), se torna um axioma para o século digital, a despeito de todas as tentativas de controle".[31]

Referências

  1. a b c d e f Feix, Daniel. "Garagem Hermética é tema de livro de Leo Felipe". Zero Hora, 19/05/2014
  2. a b Silveira, Fabrício. "Rock gaúcho, cultura urbana e cenas musicais em Porto Alegre. Um exercício metodológico". In: Cadernos da Escola de Comunicação, 2014; (12):35-48
  3. "Em comunicado no Facebook, Garagem Hermética anuncia fechamento". Zero Hora, 20/02/2013
  4. Oliveira, Samir. "Fim do Garagem Hermética deixa órfão rock autoral em Porto Alegre". Sul 21, 02/03/2013
  5. a b c d "A história do lendário Garagem Hermética por um de seus fundadores". Senhor F, s/d.
  6. a b c Silveira, Fabrício. "Garagem Hermética". Grupo CultPop - UNISINOS, 08/09/2014
  7. Lerina, Roger. "Memórias herméticas". Zero Hora, 03/05/2014
  8. a b c d e f Teló, Luiz Paulo. "A Franqueza de Leo Felipe". Culturíssima, 24/05/2015
  9. "Os 100 maiores discos da música brasileira". Rolling Stone, s/d.
  10. Bonfim, Leonardo. "Entrevista – Júpiter Maçã passa a carreira a limpor". Noize, 21/08/20099
  11. "Apresentador Leo Felipe é o convidado do Primeira Pessoa". Coletiva, 03/11/2006
  12. a b Medina, Diego. "Resenha: A Fantástica Fábrica". Noize, 22/06/2014
  13. Galera, Daniel. "Garagem histórica". O Globo, 18/05/2014
  14. a b Santos, Laura Pacheco dos. "O velho Garagem". In: Jornal da Universidade, 2014; XVII (171):12
  15. Pedrazza, Danilo & Velazquez, Matheus. "Garagem Hermética: Entre Bebidas, Festas, Blogs E Livros". Lado B, 2015
  16. Refere-se à avenida Oswaldo Aranha, entre os anos 70 e 80 o centro da contracultura local.
  17. a b c d Fundação Ecarta. Leo Felipe.
  18. "Premiados no VI Açorianos de Artes Plásticas". Secretaria Municipal da Cultura de Porto Alegre
  19. "Eduardo Veras, Léo Felipe e Ana Baldisserotto assinam curadoria do IEAVi". Assessoria de Comunicação da Casa de Cultura Mario Quintana, 24/09/2013
  20. Maya, Bruno. "Leo Felipe ministra o quinto seminário do CEN 2011". Cine Esquema Novo, 2011
  21. "Projeto URBE na Casa de Cultura Mário Quintana". Mundo Cult, 25/09/2014
  22. "Diego Medina (ex-Video Hits) leva seu mundo psicodélico ao Museu do Trabalho". Rock Gaúcho, 19/02/2015
  23. Galeria Arte&Fato. "O Texto de Leo Felipe". Disponível em [http://artefatogaleria.blogspot.com.br/2015/04/o-texto-de-leo-felipe.html]
  24. "Batepapo Caminhos do Rock, com os jornalistas Daniel Soares e Leo Felipe Projeto República do Rock Especial Dia Mundial do Rock". Feest, jul/2013
  25. Sarau Elétrico. Edições anteriores.
  26. "Semana da Cultura do RS no Uruguai abre com Artes Visuais". Casa da Cultura Mario Quintana, s/d.
  27. "Sábado tem Pulp Friction no Ocidente". Mais Porto Alegre, 11/07/2014
  28. Brigatti, Gustavo. "Baladas se firmam na noite de Porto Alegre com personalidade e público fiel". Zero Hora, 06/09/2013
  29. Felipe, Leonardo Azevedo. Rock My Art, ou O Novo Esteticismo de "Por que Choras?", ou O dia em que Edu K entrou para a História da Arte. Dissertação de Mestrado. UFRGS, 2013
  30. "Exposição sobre contracultura chega a Pelotas em itinerância promovida pela galeria Ecarta". Diário da Manhã, 17/06/2015
  31. Felipe, Leo. "O legado da contracultura". In: Nonada, 14/11/2014

Ligações externas

  • Trechos de A Fantástica Fábrica no blog do autor, disponíveis em [http://fogueteformidavel.blogspot.com.br/2007/04/fantstica-fbrica-de-choclate-captulo-3.html] e [http://www.fogueteformidavel.blogspot.com.br/2009/06/entao-era-isso.html]
  • Site da festa Pulp Friction