Tiradentes: diferenças entre revisões

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Foi a [[Proclamação da República do Brasil|República]] – ou, mais precisamente, os ideólogos [[positivismo|positivistas]] que presidiram sua fundação – que buscaram na figura de Tiradentes uma personificação da identidade republicana do Brasil, mitificando a sua biografia. Daí a sua iconografia tradicional, de barba e camisolão, à beira do cadafalso, vagamente assemelhada a [[Jesus Cristo]] e, obviamente, desprovida de verossimilhança. Como militar, o máximo que Tiradentes poder-se-ia permitir era um discreto bigode. Na prisão, onde passou os últimos três anos de sua vida, os detentos eram obrigados a raspar barba e cabelo a fim de evitar [[piolho]]s. Segundo o jornalista [[Pedro Doria]], relatos da época declaravam que Tiradentes era "um homem alto, grisalho, a barba benfeita, bigodes bem-aparado", e o barbudo semelhante a Cristo só surgiu no [[século XX]]. Em 21 de abril de 1890 houve a primeira grande festa oficial em homenagem a Tiradentes, idealizada e realizada pelo governo republicano, então recém empossado. O marechal [[Deodoro da Fonseca]] presidiu a solenidade, sendo o orador do evento [[Silva Jardim]]. Antes mesmo dessa data os republicanos criaram o Clube Tiradentes, em 1882, cultuando seu herói todo dia 21 de abril.<ref>CHIAVENATO, pág. 100.</ref> A comemoração da data foi suprimida e restabelecida por diversas vezes durante o século XX e mobilizou grupos políticos, intelectuais e a opinião pública em vários debates. Em 1930, o feriado chegou a ser extinto por [[Getúlio Vargas]], porém o feriado retornou ao calendário já em 1933, após pressão de grupos políticos que consideravam necessário a sua comemoração como forma de valorização da memória do país.<ref name="HV">{{Citar web |url=http://www2.uol.com.br/historiaviva/reportagens/a_memoria_de_21_de_abril.html |título=A memória de 21 de abril |língua= |autor= |obra=História Viva |data= |acessodata=24 de maio de 2016}}</ref>
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Em 1953 a escritora [[Cecília Meireles]] imortalizou o sonho de liberdade dos inconfidentes na obra literária [[Romanceiro da Inconfidência]]. A popularidade e uso da imagem de Tiradentes foi reforçada em 1960, quando o presidente [[Juscelino Kubitschek]] oficializou a cerimônia do dia 21 de abril que ocorre todos os anos em [[Ouro Preto]].<ref name="HV"/> E em [[1965]] o então presidente e marechal [[Humberto de Alencar Castelo Branco|Castelo Branco]], durante seu governo no [[Ditadura militar no Brasil (1964–1985)|regime militar brasileiro]] tornou o dia 21 de abril além de uma data nacional um feriado comemorado no mesmo dia da morte de Tiradentes pela Lei Nº 4. 897, de 9 de dezembro de 1965.<ref name="BE">{{citar web| url=http://brasilescola.uol.com.br/datas-comemorativas/tiradentes.htm|titulo=21 de Abril — Dia de Tiradentes |autor= FERNANDES, Cláudio| obra= Brasil escola| acessodata= 24 de maio de 2016}}</ref><ref name="feriado nacional">{{citar web |url=http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-1969/L4897.htm |título=LEI No 4.897, DE 9 DE DEZEMBRO DE 1965. |autor=Humberto de Alencar Castelo Branco e Arthur da Costa e Silva |publicado=Presidência da Republica Brasileira/Casa civil |data=13 de Dezembro de 1965 |acessodata=24 de maio de 2016}}</ref> Também o nome do movimento, "Inconfidência Mineira", e de seus participantes, os "inconfidentes", foi cunhado posteriormente, denotando o caráter negativo da sublevação – ''inconfidente'' é aquele que trai a confiança.<ref>{{citar web |url=http://www.diariodamanha.com/noticias.asp?id=49099 |título=Tiradentes: um homem republicano |autor=|publicado=Diário da Manhã_Erechim-RS |data=16 de abril de 2013|acessodata=7 de julho de 2013}}</ref><ref name=em>{{citar web |url=http://divirta-se.uai.com.br/app/noticia/arte-e-livros/2014/04/06/noticia_arte_e_livros,153329/heroi-sem-rosto.shtml|título=Herói Sem Rosto|autor=Ana Clara Brant |publicado=Estado de Minas |data=4 de abril de 2014|acessodata=7 de julho de 2013}}</ref>
Em 1953 a escritora [[Cecília Meireles]] imortalizou o sonho de liberdade dos inconfidentes na obra literária [[Romanceiro da Inconfidência]]. A popularidade e uso da imagem de Tiradentes foi reforçada em 1960, quando o presidente [[Juscelino Kubitschek]] oficializou a cerimônia do dia 21 de abril que ocorre todos os anos em [[Ouro Preto]].<ref name="HV"/> E em [[1965]] o então presidente e marechal [[Humberto de Alencar Castelo Branco|Castelo Branco]], durante seu governo no [[Ditadura militar no Brasil (1964–1985)|regime militar brasileiro]] tornou o dia 21 de abril além de uma data nacional um feriado comemorado no mesmo dia da morte de Tiradentes pela Lei Nº 4. 897, de 9 de dezembro de 1965.<ref name="BE">{{citar web| url=http://brasilescola.uol.com.br/datas-comemorativas/tiradentes.htm|titulo=21 de Abril — Dia de Tiradentes |autor= FERNANDES, Cláudio| obra= Brasil escola| acessodata= 24 de maio de 2016}}</ref><ref name="feriado nacional">{{citar web |url=http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-1969/L4897.htm |título=LEI No 4.897, DE 9 DE DEZEMBRO DE 1965. |autor=Humberto de Alencar Castelo Branco e Arthur da Costa e Silva |publicado=Presidência da Republica Brasileira/Casa civil |data=13 de Dezembro de 1965 |acessodata=24 de maio de 2016}}</ref> Também o nome do movimento, "Inconfidência Mineira", e de seus participantes, os "inconfidentes", foi cunhado posteriormente, denotando o caráter negativo da sublevação – ''inconfidente'' é aquele que trai a confiança.<ref>{{citar web |url=http://www.diariodamanha.com/noticias.asp?id=49099 |título=Tiradentes: um homem republicano |autor=|publicado=Diário da Manhã_Erechim-RS |data=16 de abril de 2013|acessodata=7 de julho de 2013}}</ref><ref name=em>{{citar web |url=http://divirta-se.uai.com.br/app/noticia/arte-e-livros/2014/04/06/noticia_arte_e_livros,153329/heroi-sem-rosto.shtml|título=Herói Sem Rosto|autor=Ana Clara Brant |publicado=Estado de Minas |data=4 de abril de 2014|acessodata=7 de julho de 2013}}</ref>



Revisão das 17h10min de 19 de janeiro de 2018

 Nota: Este artigo é sobre a personalidade histórica. Para a cidade, veja Tiradentes (Minas Gerais). Para demais casos, veja Tiradentes (desambiguação).
Joaquim José da Silva Xavier (Tiradentes)
Tiradentes
Martírio de Tiradentes, óleo sobre tela de Francisco Aurélio de Figueiredo e Melo (1854 — 1916).
Nome completo Joaquim José da Silva Xavier
Nascimento 12 de novembro de 1746
Fazenda do Pombal, Minas Gerais, Estado do Brasil
Reino de Portugal Portugal
Morte 21 de abril de 1792 (45 anos)
Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Estado do Brasil
Reino de Portugal Portugal
Nacionalidade Português
Ocupação Dentista, militar e ativista político
Ideias notáveis Mártir da Inconfidência Mineira; independência do Brasil Colônia do Império Português

Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes (Fazenda do Pombal,[1] batizado em 12 de novembro de 1746Rio de Janeiro, 21 de abril de 1792), foi um dentista, tropeiro, minerador, comerciante, militar e ativista político que atuou no Brasil, mais especificamente nas capitanias de Minas Gerais e Rio de Janeiro. Personagem símbolo da conspiração denominada Inconfidência Mineira, é patrono cívico do Brasil, além de patrono das Polícias Militares e Polícias Civis dos Estados.[2]

Desde o advento da República no Brasil (1889), Tiradentes é considerado herói nacional: o mártir foi criado pelos republicanos com a intenção de ressignificar a identidade brasileira.[3]

O dia de sua execução, 21 de abril, é feriado nacional. A cidade mineira de Tiradentes, antiga Vila de São José do Rio das Mortes, foi renomeada em sua homenagem. Seu nome está inscrito no Livro dos Heróis da Pátria desde 21 de abril de 1992.

Biografia

Juventude

Ruínas da Fazenda do Pombal, no atual município de Ritápolis. Neste local, onde teria nascido Tiradentes e que pertencia na época à Vila de São João del-Rei,[4] está prevista a construção de um memorial.

Tiradentes nasceu na Fazenda do Pombal, próximo ao arraial de Santa Rita do Rio Abaixo, à época território disputado entre as vilas de São João del-Rei e São José del-Rei, na Capitania de Minas Gerais.[5]

Joaquim José da Silva Xavier era filho do português Domingos da Silva Xavier, proprietário rural, e da portuguesa nascida na colônia do Brasil, Maria Paula da Encarnação Xavier (prima em segundo grau de Antônio Joaquim Pereira de Magalhães), tendo sido o quarto dos nove filhos.

Em 1755, após a morte de sua mãe, segue junto a seu pai e irmãos para a sede da Vila de São José; dois anos depois, já com onze anos, morre seu pai. Com a morte prematura dos pais, logo sua família perde as propriedades por dívidas. Não fez estudos regulares e ficou sob a tutela de seu tio e padrinho Sebastião Ferreira Leitão, que era cirurgião dentista.[6] Trabalhou como mascate e minerador, tornou-se sócio de uma botica de assistência à pobreza na ponte do Rosário, em Vila Rica, e se dedicou também às práticas farmacêuticas e ao exercício da profissão de dentista, o que lhe valeu o apelido (alcunha) de Tiradentes.[4] Segundo frei Raimundo de Penaforte, Tiradentes "ornava a boca de novos dentes, feitos por ele mesmo, que pareciam naturais".[7]

Vida adulta

Tiradentes, em pintura de Oscar Pereira da Silva.

Com os conhecimentos que adquirira no trabalho de mineração, tornou-se técnico em reconhecimento de terrenos e na exploração dos seus recursos. Começou a trabalhar para o governo no reconhecimento e levantamento do sertão sudestino. Em 1780, alistou-se na tropa da Capitania de Minas Gerais; em 1781 foi nomeado comandante do destacamento dos Dragões na patrulha do "Caminho Novo", estrada que servia como rota de escoamento da produção mineradora da capitania mineira ao porto Rio de Janeiro na Serra da Mantiqueira. Sua atuação levou à prisão de um famoso grupo de salteadores liderados pelo temido Montanha.[8] Foi a partir desse período que Tiradentes começou a se aproximar de grupos que criticavam o domínio português sobre as capitanias por onde circulava. Insatisfeito por não conseguir promoção na carreira militar, tendo alcançando apenas o posto de alferes, patente inicial do oficialato à época, e por ter perdido a função de marechal da patrulha do Caminho Novo, pediu licença da cavalaria em 1787.

Na crônica Memórias da Rua do Ouvidor, capítulo 7, o escritor e médico fluminense Joaquim Manuel de Macedo relata que, neste mesmo ano de 1787, Tiradentes conhece uma certa "Perpétua Mineira", dona de uma casa de pasto na rua do Ouvidor, na cidade do Rio de Janeiro e apaixonam-se, mantendo um romance por pouco mais de dois anos. Em 1790, o Conde de Resende é nomeado Vice-Rei do Brasil, com a missão de acabar com a conspiração mineira. Perpétua também passou a ser espionada, sua casa de pasto foi por vezes invadida e já não se encontrava mais com Tiradentes, que já havia sido preso. Segundo a crônica, Perpétua foi vista pela última vez em 21 de abril de 1792 nas proximidades da forca onde havia sido executado seu amante.[9]

Após a licença da cavalaria, Tiradentes morou por volta de um ano na cidade carioca, período em que idealizou projetos de vulto, como a canalização dos rios Andaraí e Maracanã para a melhoria do abastecimento de água no Rio de Janeiro; porém, não obteve aprovação para a execução das obras.[carece de fontes?] Esse desprezo fez com que aumentasse sua indignação perante o domínio português. De volta às Minas Gerais, começou a pregar em Vila Rica e arredores, a favor da independência daquela capitania. Fez parte de um movimento aliado a integrantes do clero e da elite mineira, como Cláudio Manuel da Costa, antigo secretário de governo, Tomás Antônio Gonzaga, ex-ouvidor da comarca, e Inácio José de Alvarenga Peixoto, minerador e grande proprietário de terras na Comarca do Rio das Mortes. O movimento ganhou reforço ideológico com a independência das colônias estadunidenses e a formação dos Estados Unidos. Ressalta-se que, à época, oito de cada dez alunos brasileiros em Coimbra eram oriundos das Minas Gerais, o que permitiu à elite regional acesso aos ideais liberais que circulavam na Europa.[carece de fontes?]

Participação na Inconfidência Mineira

Ver artigo principal: Inconfidência Mineira
Óleo sobre tela de Leopoldino de Faria (1836-1911) retratando a Resposta de Tiradentes à comutação da pena de morte dos Inconfidentes.
Prisão de Tiradentes, por Antônio Diogo da Silva Parreiras.

Além das influências externas, fatores mundiais e religiosos contribuíram também para a articulação da conspiração na Capitania de Minas Gerais. Com a constante queda na receita institucional, devido ao declínio da atividade mineradora, a Coroa resolveu, em 1789, a aplicar o mecanismo da Derrama, para garantir que as receitas oriundas do Quinto, imposto português que reservava um quinto (1/5) de todo minério extraído no Reino de Portugal e seus domínios. A partir da nomeação de Luís da Cunha Meneses como governador da capitania, em 1783, ocorreu a marginalização de parte da elite local em detrimento de seu grupo de amigos. O sentimento de revolta atingiu o máximo com a decretação da derrama, uma medida administrativa que permitia a cobrança forçada de impostos, mesmo que preciso fosse prender o cobrado, a ser executada pelo novo governador da Capitania, Luís Antônio Furtado de Mendonça, 6.º Visconde de Barbacena (futuro Conde de Barbacena), o que afetou especialmente as elites mineiras. Isso se fez necessário para se saldar a dívida mineira acumulada, desde 1762, do quinto, que à altura somava 768 arrobas de ouro em impostos atrasados.

O movimento se iniciaria na noite da insurreição: os líderes da sedição sairiam às ruas de Vila Maria dando vivas à República, com o que ganhariam a imediata adesão da população. Porém, antes que a conspiração se transformasse em revolução, em 15 de março de 1789 foi delatada aos portugueses por Joaquim Silvério dos Reis, coronel, Basílio de Brito Malheiro do Lago, tenente-coronel, e Inácio Correia de Pamplona, luso-açoriano, em troca do perdão de suas dívidas com a Real Fazenda. Anos depois, por ordem do novo oficial de milícia Ernesto Gonçalves, planejou o assassinato de Joaquim Silvério dos Reis. Entrementes, em 14 de março, o Visconde de Barbacena já havia suspendido a derrama, o que esvaziara por completo o movimento. Ao tomar conhecimento da conspiração, Barbacena enviou Silvério dos Reis ao Rio para apresentar-se ao vice-rei, que imediatamente abriu uma investigação (devassa), no dia 7 de maio. Avisado, o alferes Tiradentes, que estava em viagem licenciada ao Rio de Janeiro escondeu-se no sótão da casa de Domingo Fernandes da Cruz, amigo da tia de Alvarenga Peixoto, dona Inácia. Desejando saber "em que termos vão as coisas", pediu ao padre Inácio de Lima, sobrinho de dona Inácia, para que procurasse por Silvério dos Reis: "amigo". No dia 9 de maio, Silvério dos Reis contou ao vice-rei que sabia quem conhecia o paradeiro de Tiradentes. No dia seguinte, o Padre Inácio foi apresentado ao Palácio e ameaçado para entregar a localidade do alferes.[10]

Tiradentes teve a casa cercada ainda no dia 10 por soldados originais da cidade de Estremoz. Escondeu-se atrás das cortinas da cama, segurando um bacamarte carregado, cedido por Matias Sanches Brandão, e mantendo duas pistolas por perto, cedidas por Francisco Xavier Machado.[11][12] Quando os soldados invadiram o quarto, Tiradentes entregou-se. Talvez ainda houvesse chance para a revolução, mesmo sem ele.[13]

Julgamento e sentença

Wikisource
Wikisource
A Wikisource contém fontes primárias relacionadas com Autos da Devassa e Sentença de Tiradentes

Presos, todos os inconfidentes aguardaram durante três anos pela finalização do processo. Alguns foram condenados à morte e outros ao degredo; algumas horas depois, por carta de clemência de D. Maria I, todas as sentenças foram alteradas para degredo, à exceção apenas para Tiradentes, que continuou condenado à pena capital, porém não por morte cruel como previam as Ordenações do Reino: Tiradentes foi enforcado.

Execução de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, no dia 21 de abril de 1792 (Reconstrução histórica feita sob apontamentos do Barão Homem de Mello, publicada na Revista Illustrada).

Os réus foram sentenciados pelo crime de "lesa-majestade", definida, pelas ordenações afonsinas e as Ordenações Filipinas, como traição contra o rei. Tiradentes foi o único conspirador punido com a morte por ser o inconfidente de posição social mais baixa, haja vista que todos os outros ou eram mais ricos, ou detinham patente militar superior.[2][14]

Execução

E assim, numa manhã de sábado, 21 de abril de 1792, Tiradentes percorreu em procissão as ruas do centro da cidade do Rio de Janeiro, no trajeto entre a cadeia pública e onde fora armado o patíbulo. O governo geral tratou de transformar aquela numa demonstração de força da coroa portuguesa, fazendo verdadeira encenação. A leitura da sentença estendeu-se por dezoito horas, após a qual houve discursos de aclamação à rainha, e o cortejo munido de verdadeira fanfarra e composta por toda a tropa local. Bóris Fausto aponta essa como uma das possíveis causas para a preservação da memória de Tiradentes, argumentando que todo esse espetáculo acabou por despertar a ira da população que presenciou o evento, quando a intenção era, ao contrário, intimidar a população para que não houvesse novas revoltas.

Tiradentes Esquartejado, obra de Pedro Américo (1893; Museu Mariano Procópio).

Executado e esquartejado, com seu sangue se lavrou a certidão de que estava cumprida a sentença, tendo sido declarados infames a sua memória e os seus descendentes. Sua cabeça foi erguida em um poste em Vila Rica, tendo sido rapidamente cooptada e nunca mais localizada; os demais restos mortais foram distribuídos ao longo do Caminho Novo: Santana de Cebolas (atual Inconfidência, distrito de Paraíba do Sul), Varginha do Lourenço, Barbacena e Queluz (antiga Carijós, atual Conselheiro Lafaiete), lugares onde fizera seus discursos revolucionários. Arrasaram a casa em que morava, jogando-se sal ao terreno para que nada lá germinasse.

 

Descendentes

A questão da descendência de Tiradentes é controversa. Há poucas provas documentais sobre os mesmos.

Tiradentes nunca se casou. Teve um caso com Antônia Maria do Espírito Santo, a quem prometeu casamento. Constam autos do processo de Antónia Maria descobertos no Arquivo Público Mineiro que a mesma pediu a posse de um escravo que Tiradentes lhe havia dado e havia sido confiscado após sua morte.[17] Tiradentes também teria querido casar-se com uma moça de nome Maria, oriunda de São João del-Rei, filha de abastados portugueses que se opuseram à união.[17]

Sem registros comprovados por documentação, Tiradentes teria tido com Eugênia Joaquina da Silva dois filhos, uma Joaquina que logo morreu[carece de fontes?] e João de Almeida Beltrão, que teve oito filhos.[carece de fontes?]

Para escapar das perseguições da coroa e da população, um destes netos trocou seu sobrenome para Zica, dos quais alguns descendentes recebem pensões.[18]

Viveu em Uberaba, uma neta de Tiradentes, nascida em março de 1819, Carolina Augusta Cesarina, falecida, com 86 anos de idade, em 30 de setembro de 1905, em Uberaba.[19]

A lei 7.705, de 21 de dezembro de 1988, concedeu pensão especial a Jacira Braga de Oliveira, Rosa Braga e Belchior Beltrão Zica, trinetos de Tiradentes.[20]

Além destes, também foi concedida à sua tetraneta Lúcia de Oliveira Menezes, por meio da Lei federal 9.255/96, uma pensão especial do INSS no valor de R$ 200,00, o que causou polêmica sobre a natureza jurídica deste subsídio, mas solucionado pelo STF no agravo de instrumento 623.655.[21]

Impacto cultural

Uso historiográfico

Estátua mostrando Tiradentes a ser enforcado, na Praça Tiradentes, em Belo Horizonte.

Tiradentes permaneceu, após a Independência do Brasil, relativamente obscuro, pois o país continuou sendo uma monarquia regida pela Casa de Bragança, e os dois monarcas, Pedro I e Pedro II, eram descendentes de D. Maria I, contra a qual Tiradentes conspirara e que havia assinado sua sentença de morte. Além disso, Tiradentes era republicano. O "Código Criminal do Império do Brasil", sancionado em 16 de dezembro de 1830, também previa penas graves para quem conspirasse contra o imperador e contra a monarquia:

Foi a República – ou, mais precisamente, os ideólogos positivistas que presidiram sua fundação – que buscaram na figura de Tiradentes uma personificação da identidade republicana do Brasil, mitificando a sua biografia. Daí a sua iconografia tradicional, de barba e camisolão, à beira do cadafalso, vagamente assemelhada a Jesus Cristo e, obviamente, desprovida de verossimilhança. Como militar, o máximo que Tiradentes poder-se-ia permitir era um discreto bigode. Na prisão, onde passou os últimos três anos de sua vida, os detentos eram obrigados a raspar barba e cabelo a fim de evitar piolhos. Segundo o jornalista Pedro Doria, relatos da época declaravam que Tiradentes era "um homem alto, grisalho, a barba benfeita, bigodes bem-aparado", e o barbudo semelhante a Cristo só surgiu no século XX. Em 21 de abril de 1890 houve a primeira grande festa oficial em homenagem a Tiradentes, idealizada e realizada pelo governo republicano, então recém empossado. O marechal Deodoro da Fonseca presidiu a solenidade, sendo o orador do evento Silva Jardim. Antes mesmo dessa data os republicanos criaram o Clube Tiradentes, em 1882, cultuando seu herói todo dia 21 de abril.[22] A comemoração da data foi suprimida e restabelecida por diversas vezes durante o século XX e mobilizou grupos políticos, intelectuais e a opinião pública em vários debates. Em 1930, o feriado chegou a ser extinto por Getúlio Vargas, porém o feriado retornou ao calendário já em 1933, após pressão de grupos políticos que consideravam necessário a sua comemoração como forma de valorização da memória do país.[23]

Estátua de Tiradentes no Quartel do Comando Geral da Polícia Militar do Estado do Piauí.

Em 1953 a escritora Cecília Meireles imortalizou o sonho de liberdade dos inconfidentes na obra literária Romanceiro da Inconfidência. A popularidade e uso da imagem de Tiradentes foi reforçada em 1960, quando o presidente Juscelino Kubitschek oficializou a cerimônia do dia 21 de abril que ocorre todos os anos em Ouro Preto.[23] E em 1965 o então presidente e marechal Castelo Branco, durante seu governo no regime militar brasileiro tornou o dia 21 de abril além de uma data nacional um feriado comemorado no mesmo dia da morte de Tiradentes pela Lei Nº 4. 897, de 9 de dezembro de 1965.[24][25] Também o nome do movimento, "Inconfidência Mineira", e de seus participantes, os "inconfidentes", foi cunhado posteriormente, denotando o caráter negativo da sublevação – inconfidente é aquele que trai a confiança.[26][27]

Outra versão diz que por inconfidência era termo usado na legislação portuguesa na época colonial e que "entendia-se por inconfidência a quebra da fidelidade devida ao rei, envolvendo, principalmente, os crimes de traição e conspiração contra a Coroa", e, que para julgar estes crimes eram criadas "juntas de inconfidência".[28]

Historiadores como Francisco de Assis Cintra e o brasilianista Kenneth Maxwell procuram diminuir a importância de Tiradentes, enquanto autores mineiros como Oilian José e Waldemar de Almeida Barbosa procuram ressaltar a sua importância histórica e seus feitos, baseando-se, especialmente, em documentos no Arquivo Público Mineiro.

Atualmente, onde se encontrava sua prisão, funcionou a Câmara dos Deputados na chamada Cadeia Velha, que foi demolida e no local foi erguido o Palácio Tiradentes que funcionava como Câmara dos Deputados até a transferência da capital federal para Brasília. No local onde foi enforcado ora se encontra a Praça Tiradentes e onde sua cabeça foi exposta fundou-se outra Praça Tiradentes. Em Ouro Preto, na antiga cadeia, hoje há o Museu da Inconfidência.

Feriado

Ver artigo principal: Tiradentes (feriado nacional)
Efígie na moeda de 5 centavos da segunda família do Real.

Tiradentes é considerado atualmente Patrono Cívico do Brasil, sendo a data de sua morte, 21 de abril, feriado nacional. Seu nome consta no Livro de Aço do Panteão da Pátria e da Liberdade, sendo considerado Herói Nacional.

Em 1965, durante a primeira fase do regime militar no Brasil, o marechal Castelo Branco, então presidente da República, durante seu governo na Ditadura militar Brasileira, para reforçar essa imagem de Tiradentes, foi sancionando a Lei Nº 4. 897, de 9 de dezembro, que instituía o dia 21 de abril como feriado nacional e Tiradentes como, oficialmente, Patrono da Nação Brasileira.[24][25]

Carnaval

Tiradentes recebeu grande homenagem popular do G.R.E.S. Império Serrano, que desfilou em 1949 entoando o samba Exaltação a Tiradentes, cujos autores são Mano Décio, Estanislau Silva e Penteado.[23]

Em 2008, a escola Unidos do Viradouro, com o tema "É de arrepiar", desfilou no carro de número 5 – "execução da liberdade" – o destaque com o carnavalesco Paulo Barros fantasiado de Tiradentes.[29]

Cinema, televisão e livros

Ver também

O Commons possui uma categoria com imagens e outros ficheiros sobre Tiradentes

Referências

  1. A Fazenda do Pombal está localizada em terras pertencentes hoje ao município de Ritápolis e que na época eram disputadas por São João del-Rei e São José do Rio das Mortes. Esta disputa foi resolvida somente em 1755 em favor da Vila de São José. Há ainda hoje, todavia, uma disputa por esses três municípios (Ritápolis, São João del-Rei e Tiradentes) sobre qual seria considerada a cidade natal de Tiradentes.
  2. a b «9 mitos e uma verdade sobre Tiradentes e a Inconfidência Mineira». Nova Escola. Consultado em 1 de maio de 2017 
  3. «Tiradentes: da inconfidência do século XVIII à crise política do século XXI». Jornal do Brasil. Consultado em 1 de maio de 2017 
  4. a b Joaquim José da Silva Xavier - Tiradentes no São João del Rei On-Line
  5. A vila de São José del-Rei foi criada em 1718, compondo-se de todo território pertencente à Vila de São João del-Rei que se localizava à margem direita do Rio das Mortes. Porém a Vila de São João del-Rei contestou essa perda territorial e a questão só foi resolvida em 1755.
  6. "Tiradentes ficou aos cuidados do seu tio e padrinho, Sebastião Ferreira Leitão, cirurgião-dentista registrado e que possuía lavras de mineração." Joaquim José da Silva Xavier - Tiradentes no São João del Rei On-Line
  7. CHIAVENATO, Júlio José. Inconfidência Mineira - As Várias Faces. São Paulo: Contexto, 2000. pág. 25.
  8. CHIAVENATO, pág. 26.
  9. Joaquim Manuel de Macedo (1878). «7». Memórias da Rua do Ouvidor. [S.l.: s.n.] 227 páginas. ISBN 8523001107. Digitalizado por Google Livros 
  10. Doria 2014, pp. 24–27
  11. Doria 2014, pp. 13–14
  12. «Autos da Devassa da Inconfidência Mineira, vol. 3». Câmara dos Deputados do Estado de Minas Gerais. 1981. Consultado em 10 de fevereiro de 2017 
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Bibliografia

Ligações externas