Hydra (género)

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Como ler uma infocaixa de taxonomiaHidra

Classificação científica
Reino: Animalia
Filo: Cnidaria
Classe: Hydrozoa
Ordem: Anthomedusae
Família: Hydridae
Género: Hydra
Linnaeus, 1758

A hidra (gênero Hydra) é uma espécie de animal cnidário de corpo cilíndrico e em forma de pólipo. Vive em água doce, preferencialmente em águas frias e limpas, presa por uma extremidade a um rocha ou à vegetação aquática. Tem cor verde, parda ou cinza. As hidras são animais vágeis, locomovendo-se ao longo das superfícies que ocupa.

Alimentação[editar | editar código-fonte]

A hidra faz parte do grupo de celenterados (metazoários celenterados).

Os celenterados são também chamados cnidários. A água-viva, a caravela, a hidra e os corais são alguns exemplos de celenterados. Eles são aquáticos e vivem principalmente no mar.

Os cnidários são carnívoros e nutrem-se de zooplâncton (pequenos animais em suspensão na água), crustáceos, ovos de peixe e larvas.

Quando uma presa é capturada por um celenterado, ela penetra pela boca do animal e chega até uma cavidade digestiva - aliás, o nome desse grupo vem de celo = "cavidade" e entero = "intestino". Nessa cavidade, o alimento é parcialmente digerido e depois absorvido por certas células, no interior das quais a digestão se completa. Por isso se diz que a digestão nos celenterados é extracelular (na cavidade digestiva) e também intracelular (no interior da células). Não possuindo ânus, esses animais eliminam pela boca os resíduos não aproveitáveis.

Reprodução assexuada[editar | editar código-fonte]

A hidra pode também reproduzir-se assexuadamente (gemiparidade ou brotamento): Neste caso da hydra, nasce um gomo na superfície da hidra, que cresce e, quando já está madura, separa-se da hidra-mãe. Em seguida, fixa-se em algum lugar e continua a desenvolver-se independentemente. A reprodução assexuada também possui capacidade de regeneração.

A hidra é um animal único no aspecto que ela nunca, jamais envelhece, podendo teoricamente viver para sempre. Na prática, é claro, em algum momento ela acaba morrendo devido a doença ou predadores.[1]

Não realiza reprodução sexuada, ou seja, não precisa de relações sexuais para se reproduzir.

Hydra: modelo da biologia regenerativa[editar | editar código-fonte]

Espécies do gênero Hydra há muito tempo têm sido importantes modelos para pesquisas em biologia do desenvolvimento, expressão gênica e células tronco. O naturalista suíço Abraham Trembley foi o primeiro pesquisador a descobrir, em 1744, a capacidade de pólipos de água doce de formar novos indivíduos a partir de pedaços retirados de um indivíduo adulto.[2] Diversas pesquisas em desenvolvimento celular sucederam essa descoberta com a aplicação de técnicas de observação de comportamento celular para elucidar os mecanismos que controlam a pluripotência e diferenciação de células de Hydra. No entanto, foi apenas a partir do início de pesquisas genômicas em Hydra pela J. Craig Venter Institute, nos Estados Unidos, que os processos de organização, posicionamento e regulação de regeneração celular começaram a ser compreendidos. O genoma de Hydra magnipapillata foi completamente sequenciado em 2010,[3] abrindo portas para utilização deste organismo para estudos avançados em genética reversa, manipulação de expressão gênica e transgenia.[4][5][6] A hidra foi escolhida como organismo modelo em biologia do desenvolvimento por apresentar certas características em sua biologia que facilitam seu estudo, como a sua transparência ótica que facilita a visualização de células e tecidos, uma alta taxa de crescimento populacional e possibilidade de cultura em massa de clones.[7]

Organização corporal de Hydra

A capacidade impressionante de regeneração em Hydra se deve a sua característica organização corporal formada por duas camadas germinativas, a ectoderme e a endoderme, e pela mesogleia.[8] A ectoderme e a endoderme dão origem aos epitélios externo e interno, respectivamente, e a mesogleia é responsável por formar as linhagens de células nervosas, cnidócitos, células glandulares e gametas.[9] Enquanto que as linhagens celulares da mesogleia são determinadas, os epitélios permanecem em um estado reversível e de contínua produção celular. Portanto, são as células dos epitélios externo e interno que permitem tanto a rápida regeneração de tecido em caso de ferimento quanto a formação completa de um indivíduo a partir de apenas um bloco de células epiteliais extraído de um indivíduo adulto6.

Formação de novos indivíduos a partir de fragmentos extraídos de indivíduo adulto. Note como a mesma região de células (destacada em laranja) pode dar origem à cabeça ou ao disco pedal graças à polaridade ao longo do corpo da hidra

Diferente da regeneração em planárias, a hidra se regenera sem proliferação celular. O que ocorre é a transformação das células e tecidos já existentes em novas estruturas por meio de desdiferenciação celular. Esse tipo de regeneração foi primeiramente descrita e denominada morfalaxia por Thomas Hunt Morgan, em 1901.[10] As células se reorganizam e rediferenciam a partir de informações posicionais; ou seja, a polaridade ao longo do tecido informa se uma certa região deve se diferenciar em boca e tentáculos ou no disco pedal. Acredita-se que essa polaridade é estabelecida por meio de um gradiente de concentração de certas moléculas, como peptídios, que informa uma célula sua posição em relação ao corpo.[11] Devido à ausência de proliferação celular, um bloco de células epiteliais da hidra dão origem a um indivíduo em miniatura, e somente após alimentação ocorre o crescimento normal deste novo indivíduo.

Inúmeras pesquisas em bioquímica e expressão gênica em Hydra têm revelado o controle de diferenciação das células tronco epiteliais durante a embriogênese e também durante a regeneração. O peptídio HEADY é expresso por um gene ausente em outros animais e é uma importante molécula que direciona as células à formação da região apical (boca e tentáculos).[12] Outro importante peptídio foi descoberto em 2005, o Hym-301. Pesquisas indicam que esse peptídio é expresso abaixo da boca e é responsável pela formação de tentáculos, e tratamentos com silenciamento do gene expressando Hym-301 levaram a redução no número de tentáculos durante regeneração e formação de brotos.[13] Outros dois peptídios, pedina e pedibina, foram isolados e descobriu-se serem responsáveis por estimular a formação do disco pedal durante a regeneração.[14]

O gênero Hydra apresenta certas vias de regulação de expressão gênica também observadas em grupos mais evolutivamente mais recentes, como os Vertebrados. Uma delas é a via de sinalização Wnt, muito conhecida por regular fatores de transcrição em diversos grupos animais. A partir dos anos 2000 foram encontradas diversas moléculas da cascata Wnt nas regiões terminais da hidra durante a regeneração da cabeça ou do disco pedal, como a HyWnt (molécula de sinalização Wnt específica ao gênero Hydra), a β-catenina e a TCF, todos responsáveis pela regulação da proliferação e reorganização celulares.[15][16][17]

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  1. «5 animais (biologicamente) imortais». Superinteressante. 27 de novembro de 2013. Consultado em 22 de agosto de 2021 
  2. Lenhoff, H.M; Lenhoff, S.G. (1988). «Trembley's polyps». Sci. Am. 258 (4): 86-91 
  3. Chapman, J.A.; Kirness, E.F.; Simakov, O.; Hampson, S.E.; Mitros, T.; Weinmaier, T.; Rattei, T.; Balasubramanian, P.G.; Borman, J.; Busam, D. and Disbennet, K. (2010). «The dynamic genome of Hydra». Nature. 464 (7288): 592-596 
  4. Lohmann, J.U.; Endl, I.; Bosch, T.C.G. (1999). «Silencing of developmental genes in Hydra». Dev. Biol. 214: 211-214 
  5. Takahashi, T.; Muneoka, Y.; Lohmann, J.; Lopez de Haro, M.S.; Solleder, G.; Bosch, T.C.G.; David, C.N.; Bode, H.R.; Koizumi, O.; Shimizu, H., Hatta, M., Fujisawa, T. and Sugiyama, T. (1997). «Systematic isolation of peptide signal molecules regulating development in hydra: LWamide and PW families». Proc. Natl. Acad. Sci. U. S. A. 94 (4): 1241-1246 
  6. Wittlieb, J.; Khalturin, K.; Lohmann, J.; Anton-Erxleben, F.; Bosch, T.C.G. (2006). «Transgenic Hydra allow in vivo tracking of individual stem cells during morphogenesis». Proc. Natl. Acad. Sci. U. S. A. 103: 6208-6211 
  7. Bosch, T.C. (2007). «Why polyps regenerate and we don't: towards a cellular and molecular framework for Hydra regeneration. Developmental biology». Dev. Biol. 303 (2): 412-433 
  8. Wolpert, L.; Tickle, C.; Arias, A.M. (2015). «Regeneration». Principles of development. USA: Oxford University Press. pp. 548–552 
  9. Bosch, T.C.G.; David, C.N. (1987). «Stem cells of Hydra magnipapillata can differentiate into somatic cells and germ line cells». Dev. Biol. 121: 182-191 
  10. Morgan, T.H. (1901). «Regeneration in the egg, embryo, and adult». Am. Nat. 35 (420): 949-973 
  11. Wolpert, L.; Clarke, M.R.; Hornbruch, A. (1972). «Positional signalling along hydra». Nature New Biology. 239: 101-105 
  12. Lohmann, J.U.; Bosch, T.C.G (2000). «The novel peptide HEADY specifies apical fate in a simple, radially symmetric metazoan». Genes Dev. 14 (21): 2771-2777 
  13. Takahashi, T.; Hatta, M.; Yum., S.; Gee, L.; Ohtani, M.; Fujisawa, T.; Bode, H.R. (2005). «Hym-301, a novel peptide, regulates the number of tentacles formed in hydra». Development. 132 (9): 2225-2234 
  14. Hoffmeister, S. (1996). «Isolation and characterization of two new morphogenetically active peptides from Hydra vulgaris». Development. 122: 1941-1948 
  15. Hobmayer, B.; Rentzsch, F.; Kuhn, K.; Happel, C.M.; von Laue, C.C.; Snyder, P.; Rothbacher, U.; Holstein, T.W. (2000). «WNT signalling molecules act in axis formation in the diploblastic metazoan Hydra». Nature. 407 (6801): 186-189 
  16. Broun, M.; Gee, L.; Reinhardt, B.; Bode, H.R. (2005). «Formation of the head organizer in hydra involves the canonical Wnt pathway». Development. 132 (12): 2907-2916 
  17. Lee, P.N.; Pang, K.; Matus, D.Q.; Martindale, M.Q. (2006). «AWNT of things to come: evolution of Wnt signaling and polarity in cnidarians». Semin. Cell Dev. Biol. 17 (2): 157-167 
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