Ibne Mucla
Ibne Mucla | |
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Nascimento | 885/886 Baguedade |
Morte | 20 de julho de 940 Baguedade |
Nacionalidade | Califado Abássida |
Religião | Islamismo sunita |
Abu Ali Maomé ibne Ali ibne Mucla (em árabe: أبو علي محمد بن علي ابن مقلة; romaniz.: Abū ʿAlī Muḥammad ibn ʿAlī ibn Muqla; Baguedade, 885/6 – Baguedade, 20 de julho de 940) foi um oficial persa do Califado Abássida que reteve altos postos estatais no começo do século X. Sua carreira chegou ao ápice com sua nomeação para o vizirado em Baguedade três vezes em 928–930, 932–933 e 934–936. Incapaz de enfrentar com sucesso o poder crescente dos emires regionais, perdeu sua posição para o primeiro emir de emires, ibne Raique, e morreu na prisão. Também foi um notório calígrafo.
Vida
[editar | editar código-fonte]Ibne Mucla nasceu em Baguedade, capital do Califado Abássida, em 272 A.H. (885/6). Sua carreira no serviço público começo em Pérsis, onde serviu como coletor de impostos. Sua ascensão no governo central começou em 908, sob o patrocínio do vizir Alboácem Ali ibne Alfurate, que nomeou-o responsável pelos despachos oficiais.[1] Foi nessa época, sob o governo ineficiente do califa Almoctadir (r. 908–932), que a burocracia civil alcançou seu zênite na corte, apesar de realizações de reinados anteriores para restaurar a sorte do califado colapsarem pela escassez financeira crônica. Por todo o período, o cenário político na corte foi dominado por ibne Alfurate e sua facção (os Banu Alfurate), seu rival Ali ibne Issa Aljarrá e sua facção (os Banu Aljarrá) e o chefe do exército Munis Almuzafar.[2] Apesar dos íntimos laços com ibne Alfurate, que foram reafirmados no segundo mandato do último em 917–918, ibne Mucla virou-se contra ele em seguida. Sua próxima promoção veio no vizirado de facto em 918–928 de Ali ibne Issa, quando assumiu o importante departamento (divã) das propriedades públicas.[1]
Ao cultivar a amizade do poderoso camareiro (hájibe) Nácer, ibne Mucla conseguiu assegurar o posto de vizir após a desgraça de Ali em 928. Seu vizirado, contudo, foi marcado por extrema instabilidade interna, incluindo o golpe de curta duração de 929, instigado por Munis, que depôs Almoctadir em favor de seu irmão Alcair.[3] Seu golpe fracassado não impediu que Munis e Ali tomassem o governo e provocassem a demissão de ibne Mucla em 930. Foi renomeado como vizir por Alcair quando sucedeu seu irmão após o assassínio dele em 932. As tentativas de Alcair para afirmar sua autoridade tiveram oposição de ibne Mucla e Munis. Munis quis conspirar contra Alcair, mas foi preso e morto antes de poder agir; ibne Mucla, após apenas seis meses em ofício, foi demitido.[1][4]
Ibne Mucla então chefiou outra conspiração, e em 934 Alcair foi capturado, cegado e deposto pelas tropas de Baguedade, com seu irmão Arradi sucedendo-lhe.[5] Ibne Mucla foi nomeado para seu terceiro mandato como vizir.[1] Por esta época, a maior ameaça enfrentada pelo califado era a independência crescente dos governadores regionais, que haviam tomado vantagem de conflitos internos na corte para fortalecer o controle deles sobre suas províncias e retiveram os impostos devidos a Baguedade, deixando o governo aleijado.[5] Ibne Mucla resolveu reafirmar seu controle sobre províncias vizinhas pela via militar e escolheu a Jazira (Mesopotâmia Superior) possuída pelos hamadânidas como seu primeiro alvo: em 935, lançou uma campanha que tomou a capital hamadânida, Moçul, mas foi forçado a retornar a Baguedade. Outra tentativa em 936 para atacar o governador rebelde de Uacite, Maomé ibne Raique, sequer ocorreu. Junto de seu fracasso para conter a crise financeira, este último desastre levou a demissão e prisão de ibne Mucla.[1][6]
A demissão de ibne Mucla marcou também o final da independência dos califas abássidas, pois logo depois ibne Raique foi nomeado para o novo posto de emir de emires ("comandante de comandantes"), um ofício de base militar que tornou-se o governante de facto do que restava do califado e privou o califa de toda sua autoridade real.[7] Ibne Raique confiscou as possessões de ibne Mucla e seu filho, e ibne Mucla, por sua vez, começou a conspirar contra ele. Ibne Raique preocupou-se com isso e ordenou que fosse preso e sua mão direita fosse cortada. Logo depois, ainda que o exército turco de Bajecã estivesse aproximando-se de Baguedade para depor ibne Raique, sua língua foi cortada. Bajecã venceu, mas ibne Mucla ficou preso, onde morreu em 20 de julho de 940.[1]
Caligrafia
[editar | editar código-fonte]Ibne Mucla também era famoso como calígrafo. Era reverenciado como 'profeta no campo da caligrafia; foi derramado sobre sua mão, assim como foi revelado às abelhas para tornar suas células de mel hexagonais'[8] Ele ou seus irmãos foram considerados os criadores do estilo al-khatt al-mansub (escrita proporcional), aperfeiçoado pelo calígrafo persa do século XI ibne Albauabe.[1] Khatt refere-se à "marcação" de linhas, sugerindo que a caligrafia é uma demarcação do espaço. No sistema al-khatt al-mansub, a forma das letras está relacionada a três medidas: o tamanho do nucta; a altura do álefe; e o círculo com um diâmetro igual à altura do álefe.[9][10] Nenhuma das obras de ibne Mucla sobreviveram, com sua obra sendo conhecida apenas através de outras fontes como Ibne Nadim.[11]
Referências
- ↑ a b c d e f g Sourdel 1986, p. 886–887.
- ↑ Kennedy 2004, p. 185–188.
- ↑ Kennedy 2004, p. 191.
- ↑ Kennedy 2004, p. 193–194.
- ↑ a b Kennedy 2004, p. 194.
- ↑ Kennedy 2004, p. 194–195.
- ↑ Kennedy 2004, p. 195ff.
- ↑ Tabbaa 1991, p. 119–148.
- ↑ Grabar 1992, p. 38.
- ↑ Osborn 2009, p. 289–306.
- ↑ Ali 1999, p. 81.
Bibliografia
[editar | editar código-fonte]- Ali, Widjan (1999). The Arab Contribution to Islamic Art: From the Seventh to the Fifteenth Centuries. Cairo: Imprensa da Universidade Americana do Cairo
- Grabar, Oleg (1992). The Mediation of Ornament. The A.W. Mellon Lectures in the Fine Arts. XXXV. Princeton, Nova Jérsei: Imprensa da Universidade de Princeton
- Kennedy, Hugh N. (2004). The Prophet and the Age of the Caliphates: The Islamic Near East from the 6th to the 11th Century (Second ed.). Harlow, RU: Pearson Education Ltd. ISBN 0-582-40525-4
- Osborn, J. R. (2009). «Narratives of Arabic Script: Calligraphic Design and Modern Spaces». Design and Culture. 1 (3): 289–306. doi:10.1080/17547075.2009.11643292
- Sourdel, Dominique (1986). «Ibn Muḳla». The Encyclopedia of Islam, New Edition, Volume III: H–Iram. Leida e Nova Iorque: BRILL. pp. 886–887. ISBN 90-04-08118-6