Martírio de São Sebastião (Gregório Lopes)

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Martírio de São Sebastião
Martírio de São Sebastião (Gregório Lopes)
Autor Gregório Lopes
Data c. 1536 - 1538
Técnica Pintura a óleo sobre madeira de carvalho
Dimensões 119 cm × 244,6 cm 
Localização Museu Nacional de Arte Antiga, Lisboa

Martírio de São Sebastião é uma pintura a óleo sobre madeira de carvalho, de c. 1536 - 1538, do artista português do Renascimento Gregório Lopes (c. 1490-1550), obra proveniente do Convento de Cristo, em Tomar e que está actualmente no Museu Nacional de Arte Antiga de Lisboa.

De acordo com a tradição católica, São Sebastião, soldado romano, foi um mártir e santo cristão do século XIII, mandado executar por meio de flechas pelo imperador romano Diocleciano que o acusou de traição pela sua conduta branda para com os prisioneiros cristãos. O culto de S. Sebastião nasceu no século IV e atingiu o seu auge na Baixa Idade Média, designadamente nos séculos XIV e XV, tanto na Igreja Católica como na Igreja Ortodoxa, sendo o Martírio de São Sebastião de Gregório Lopes um novo exemplo da iconografia do suplício do santo.

Descrição[editar | editar código-fonte]

No centro da composição está São Sebastião já atingido por flechas, com a auréola de santo, preso a uma coluna que assenta num pedestal de pedra, tendo o braço direito preso por cima da cabeça, o esquerdo preso por detrás e os pés atados por uma corda, estando um punhal sobre o pedestal. Um arqueiro e um besteiro de cada lado, vestidos com ricas indumentárias, apontam as suas armas ao corpo do santo, enquanto dois outros, um pouco mais longe, preparam as armas para o atingir de novo.[1]

Como pano de fundo do martírio do santo, Gregório Lopes realizou uma grande composição paisagista povoada por inúmeras figuras e pontuada por pormenores da vida quotidiana de uma cidade do século XVI. Em segundo plano da cena estende-se uma cidade com um casario encavalitado do lado esquerdo, e que é dominado, do lado oposto, por um templo circular de inspiração italiana rasgado por balcões e arcadas decoradas por enormes estátuas, a que se tem acesso através de uma escadaria. Ao lado deste monumento, uma multidão assiste a um auto-de-fé, estando os corpos de dois sentenciados a arder numa grande fogueira cujo fumo se avoluma no céu no canto direito.[1]

História[editar | editar código-fonte]

O Martírio de São Sebastião estava colocado sobre um dos altares pequenos da Charola do Convento de Cristo em Tomar, provavelmente o altar de São Sebastião, conforme consta de manuscrito de Frei Jerónimo de S. Romão, havendo documentação a comprovar a realização da obra, designadamente as verbas pagas pelo trabalho do pintor régio Gregório Lopes nos anos de 1536 e 1537 (Torre do Tombo, Convento de Cristo, 23, fls. 187v., 188 e 196), o qual esteve em Tomar, de Setembro de 1536 a Abril de 1539, a trabalhar nalguns retábulos destinados à Charola do dito convento.[1]

Apreciação[editar | editar código-fonte]

Para Dagoberto Markl e Fernando Pereira, o Martírio de S. Sebastião é uma obra de transição que se constata na própria elaboração pois se à esquerda estão edifícios com telhados nórdicos, tendo sido flamenga a principal influência na pintura portuguesa até então, já do lado direito está uma construção circular de inspiração italiana, o que corresponderá ao primeiro ensaio de pintura maneirista,[2] para além do uso de novos eixos de perspectiva e da figura serpentinata.[2]:132

Por outro lado, a obra documenta, para além da cena principal, em fundo do lado direito, um auto-de-fé o que é um facto assinalável. Em 1536, quando Gregório Lopes está a trabalhar nas pinturas da Charola do Convento de Cristo, em Tomar, a Inquisição é estabelecida em Portugal, tendo o primeiro auto-de-fé oficial ocorrido em 1540. Mas o que Gregório Lopes pinta deve corresponder ao selvagem que presenciara, em Lisboa, em 1506, o Massacre de Lisboa de 1506. Dado que a Ordem de Cristo, na altura já dirigida pelo Monarca português, era a proprietária do Convento de Cristo e quem encomendara a pintura, a inclusão desta cena na obra resultou também do assentimento da Corte.[2]

O massacre de judeus em 1506 foi assim descrito por Garcia de Resende na sua obra em verso Miscelânea (1554):[3]

"Vi que em Lisboa se alçaram povo baixo e villãos contra os novos christãos, mais de quatro mil mataram dos que houveram às mãos: uns d'elles, vivos queimaram, meninos despedaçaram, fizeram grandes cruezas, grandes roubos e vilezas em todos quantos acharam."

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. a b c Nota sobre a obra na Matriznet [1]
  2. a b c Markl, Dagoberto; Pereira, Fernando António Baptista, História da Arte em Portugal, Vol. VI O Renascimento, Lisboa: Alfa, 1986, pág. 138.
  3. Garcia de Resende, Miscelância, pag. 185, na edição de 1902 em conjunto com Crónica de El-Rei D. João II, na Biblioteca de Clássicos Portugueses, editor Melo de Azevedo, exemplar pertencente à Universidade de Michigan digitalizado pela Google: [2]

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  • Figueiredo, José de - "Gregório Lopes e a Infanta D. Maria", in Lusitânia, Vol. IV. Lisboa: 1927, pág. -
  • Taborda, José da Cunha - Regras da Arte de Pintura. Lisboa: Nota da Impressão Régia, 1815, pág. -
  • Santos, Reinaldo dos - "O Mestre de São Bento é Gregório Lopes", in Boletim da Academia Nacional de Belas Artes, 2ª Série, Nº 16-17. Lisboa: 1961, pág. -3 - 6
  • Machado, Cyrillo Volkmar - Collecção de Memorias Relativas às Vidas dos Pintores, e Escultores, Architetos, e Gravadores Portuguezes, e dos Estrangeiros que estiverão em Portugal. Lisboa: Victorino Rodrigues da Silva, 1823, pág. -
  • Mendonça, Maria José - Catálogo da exposição de Primitivos Portugueses (texto policopiado inédito). Lisboa: Museu Nacional de Arte Antiga, 1940, pág. -
  • Figueredo, José de - "Introdução a um Ensaio sobre a Pintura Quinhentista em Portugal", in Boletim de Arte e Arqueologia, Fasc. I. Lisboa: 1921, pág. -
  • Caetano, Joaquim Oliveira - "Gregório Lopes", in Grão Vasco e a Pintura Europeia do Renascimento. Lisboa: C.N.C.D.P., 1992, pág. -
  • Calado, Maria Margarida - Gregório Lopes. Revisão da obra do pintor régio e sua integração na corrente maneirista. Texto policopiado da Tese de Licenciatura apresentada na Faculdade de Letras. Lisboa: 1971, pág. -
  • Gusmão, Adriano de - Mestres desconhecidos do Museu Nacional de Arte Antiga. Lisboa: Artis, 1957, pág. -
  • Carvalho, José Alberto Seabra de - Gregório Lopes. Lisboa: Edições Inapa, 1999, pág. -

Ligação externa[editar | editar código-fonte]