Mouta Liz

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Mouta Liz
Nascimento 1 de agosto de 1939 (84 anos)
São Sebastião da Pedreira
Residência Luanda, Arroios
Cidadania Portugal
Filho(a)(s) Luís de Assunção Pedro da Mouta Liz, Filipe José Hilário Mouta Liz
Ocupação bancário, terrorista

José Luis Martinho da Mouta Liz, nascido em São Sebastião da Pedreira em Lisboa, a 1 de Agosto de 1939.[1] Quadro do Banco de Portugal e mais tarde fundador e dirigente da organização terrorista Forças Populares 25 de Abril (FP25) e do partido político Força de Unidade Popular (FUP), em conjunto com Otelo Saraiva de Carvalho e Pedro Goulart. Ambas, FP25 e FUP eram duas componentes do Projecto Global.[2][3]

Biografia[editar | editar código-fonte]

Viveu na Figueira da Foz, concluiu o curso geral dos liceus, trabalhou como recepcionista. Em 1960, fez o curso de sargentos milicianos e, entre 1961 e 1963, foi mobilizado para o Leste de Angola. Formou-se mais tarde em economia e começou a trabalhar no Banco de Portugal onde chegou a desempenhar o cargo de Tesoureiro. Foi o responsável pelos saneamentos ocorridos no Banco de Portugal no período do PREC, em 1975. Militou no Movimento de Esquerda Socialista (MES) e no Movimento Socialista Unificado (MSU), ambos partidos de esquerda radical. Apoia Otelo Saraiva de Carvalho na candidatura presidencial de 1976. Dois anos mais tarde, aparece como um dos dirigentes máximos da Organização Unitária dos Trabalhadores (OUT). Esta, criada em 1978, na Marinha Grande, congregava várias organizações da esquerda radical que defendiam a violência armada como método de acção politica.[4][5]

Mouta Liz era um elemento essencial de ligação da Estrutura Civil Armada, onde se integravam as FP25 e a Organização Política de Massas onde se integrava a FUP, partido politico que fornecia suporte politico às FP25 em contrapartida do financiamentos, obtidos via assaltos a bancos e instituições públicas.[2]

Era referido várias vezes nos cadernos de Otelo como «ML». É o responsável, no Projecto Global(FP-25 de Abril), encarregado de contabilizar o dinheiro proveniente de assaltos bem como a sua distribuição depois de aprovados os orçamentos.  Como dirigente participou nas várias reuniões da Direcção Politico Militar, nomeadamente a famosa reunião do Conclave, ocorrida na Serra da Estrela a 6 e 7 de Abril de 1984, onde todos os presentes estavam encapuçados. A reunião foi o mais importante encontro ocorrido no âmbito do Projecto Global e ocorre numa tentativa de resolver divergências sobre a estratégia a assumir, bem como o de travar um excessivo protagonismo de Otelo e dos seus apoiantes.[6][7][8][2]

É um dos responsáveis pela intimidação a um agente da DINFO, destacado para vigiar, à paisana, uma reunião da FUP, a 5 e 6 de março de 1983, no Hotel do Vimeiro, onde, estiveram ali reunidas várias dezenas de operacionais das FP25.[9]

É-lhe imputada responsabilidade directa no assalto a uma carrinha de transporte de valores, do Banco Fonsecas & Burnay, que transportava dinheiro entre um balcão deste banco e o Banco de Portugal. Nesta assalto, resultou no roubo de 108 mil contos em notas, e ocorreu na Rua Camilo Castelo Branco, perto do Marquês de Pombal, em Lisboa. Foi á data o maior assalto armado realizado em Portugal.[10][11] José Macedo Correia, que depois da sua detenção veio a colaborar com a justiça, o assalto só foi sido possível pelas informações transmitidas por José Mouta Liz, dirigente da organização e à data Director do Banco de Portugal. Em documentos posteriormente aprendidos, quando da prisão de um dirigente da organização, José Soares Neves, o dinheiro terá sido distribuído pelas várias componentes do Projecto Global: CNASPEL, FUP e IEP (que hoje dá pelo nome de Roteliz, com actividade em Angola, da qual Romeu Francês, Otelo Saraiva de Carvalho e José Mouta Liz são accionistas).[12][13][3][2]

No âmbito da operação Orion, a 20 de Junho de 1984, Mouta Liz encontrava-se a trabalhar no Banco de Portugal, quando da execução do mandado de detenção. Por cortesia, a Polícia Judiciária apresenta-se à administração do Banco, presidido por Manuel Jacinto Nunes e tendo como vice-presidentes Rui Vilar, Vitor Constâncio e Alexandre Vaz Pinto. No entanto, Mouta Liz que se encontrava a trabalhar no banco é informado, pondo-se imediatamente em fuga, não voltando a aparecer porque, entretanto, recorreu a uma baixa médica. Só viria a ser preso uns meses mais tarde, a 18 de setembro de 1984, já depois de ter dado uma entrevista ao jornal Expresso, durante um almoço no restaurante Pabe, em Lisboa.[14] O seu advogado foi Salgado Zenha, histórico dirigente socialista.[8]

Foi condenado pelo tribunal da 1.ª instância e 15 anos de prisão, pena agravada pelo Tribunal da Relação para 18 anos e depois reduzida pelo Supremo Tribunal de Justiça para 17 anos de pena de prisão efectiva.[15][16][1]

Foi amnistiado pela Assembleia da Republica a pedido do mesmo Mário Soares. A lei amnistiava as infrações com motivações políticas cometidas entre junho de 1976 e 21 de julho de 1991. A votação feita nominalmente, a pedido do CDS, que votou contra. Entre os 220 deputados presentes, 123 votaram a favor, 94 contra e três abstiveram-se.[17]

Posteriormente à sua libertação, por excesso de prisão preventiva, veio a trabalhar na discoteca “Banana Power”, pertencente ao arquitecto Tomás Taveira[18] e mais tarde, juntamente com Otelo e o seu advogado Romeu Francês, cria a Roteliz[19], evolução da EIP, que se tornou uma empresa de "trading" com particulares relações com o estado e o exército angolano.[20][21] Um dos seus filhos, Luís de Assunção Pedro da Mouta Liz[22] é o Vice-Procurador-Geral da República de Angola.[3]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências[editar | editar código-fonte]

  1. a b Vilela, António José (2005). «Réus do processo 396/91 (crimes de sangue)». Viver e morrer em nome das FP-25 1. ed ed. Cruz Quebrada [Portugal]: Casa das Letras/Editorial Notícias. pp. 336–339. ISBN 972-46-1594-4. OCLC 350197130 
  2. a b c d «"Caso FP-25 de Abril": Alegações do Ministério Público | Instituto +Liberdade». maisliberdade.pt. Consultado em 5 de outubro de 2022 
  3. a b c Pereirinha, Sónia Simões, Tânia. «Mais de 40 anos depois, o que fazem os ex-FP-25 de Abril». Observador. Consultado em 5 de outubro de 2022 
  4. Poças, Nuno Gonçalo (2021). «As organizações precedentes». Presos por um fio : Portugal e as FP-25 de Abril. Alfragide, Portugal: [s.n.] pp. 44–52. OCLC 1294405805 
  5. «O CONTESTÁRIO QUE SOARES MANDOU CALAR». www.dn.pt. Consultado em 5 de outubro de 2022 
  6. Ministério Público. "Caso FP-25 de Abril": Alegações do Ministério Público. Lisboa: Ministério da Justiça. pp. 341–349 
  7. Vilela, António José (2005). «O Conclave». Viver e morrer em nome das FP-25. Cruz Quebrada: Casa das Letras. pp. 126–128. ISBN 972-46-1594-4 
  8. a b «FP-25 Quem são os 73 acusados». FP-25 Quem são os 73 acusados. O Jornal. 19 de julho de 1985. pp. 18–19 
  9. Ângelo, Fernando Cavaleiro (2021). «O terrorismo de extrema esquerda». DINFO : a queda do último serviço secreto militar. Alfragide: Casa das Letras. pp. 181–207. OCLC 1246547358 
  10. «Assalto a carrinha com valores em Lisboa (108 mil contos)». 7 de fevereiro de 1984. Consultado em 20 de fevereiro de 2022. Cópia arquivada em 20 de março de 2022 
  11. «Reconstituição do assalto à carrinha do Grupo 8 - 108 mil contos». 11 de fevereiro de 1984. Consultado em 20 de fevereiro de 2022. Cópia arquivada em 20 de fevereiro de 2022 
  12. Gaspar, Fernando (13 de fevereiro de 1993). «José António Moreira, Chefe Operacional da Margem Sul: "Otelo é dos Fundadores do Projecto Global FP-25"». Expresso: 13 
  13. Vilela, António José (2005). «O assalto dos 108 000 contos». Viver e morrer em nome das FP-25. Cruz Quebrada: Casa das Letras. pp. 121–126. ISBN 972-46-1594-4. Consultado em 28 de janeiro de 2022. Cópia arquivada em 20 de março de 2022 
  14. «Um homem na sombra - Extrema Esquerda». Expresso. Revista Actual: 16-R. 25 de agosto de 1984 
  15. «Julgamento das Forças Populares 25 de Abril». Consultado em 5 de outubro de 2022 
  16. Vilela, António José. (2005). «As penas do processo 779/85». Viver e morrer em nome das FP-25 1. ed ed. Cruz Quebrada [Portugal]: Casa das Letras/Editorial Notícias. OCLC 350197130 
  17. Pereirinha, Sónia Simões, Tânia. «FP-25 de Abril. O processo judicial que foi desaparecendo aos poucos». Observador. Consultado em 21 de outubro de 2022 
  18. Gonçalo Poças, Nuno (2021). «Depois da Prisão». Presos por um fio : Portugal e as FP-25 de Abril. Lisboa: Casa das Letras. pp. 254–268. ISBN 978-989-66-1033-3. OCLC 1245348114 
  19. «Roteliz-Prestação de Serviços, Importação e Exportação S.A». Racius. Consultado em 5 de outubro de 2022 
  20. Simões, Sónia (17 de abril de 2021). «FP-25. "Otelo teve muito mais apoiantes do que Sócrates". Entrevista a Nuno Gonçalo Poças». Observador 
  21. Pereirinha, Sónia Simões, Tânia. «Seis interrogatórios e um encontro secreto. O frente a frente que durou meses entre Otelo e um juiz». Observador. Consultado em 5 de outubro de 2022 
  22. Morais, Rafael Marques de (5 de novembro de 2018). «O Centro Comercial de Mota Liz: Ilegalidades e Má-Fé». www.makaangola.org