Iri-Hor

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
(Redirecionado de Ro (faraó))
Iri-Hor
Iri-Hor
Sereque do tipo IXa.2.
Museu Petrie de Arqueologia Egípcia
Faraó no Alto Egito
Antecessor(a) Falcão Duplo?
Sucessor(a) ?
 
Sepultado em B1/B2, Umel Caabe, Abidos
Dinastia 0
Religião Politeísmo egípcio
Titularia
Nome
G5
D21
Título

Iri-Hor ou Ro (como lido por Flinders Petrie[1]) foi um faraó do Antigo Egito, que reinou em data incerta durante Nacada IIIb (3220/3200–3150 a.C.).[2] Sua existência foi debatida com o egiptólogo Toby Wilkinson contestando a leitura e significado de seu nome. Porém, novas escavações em Abidos nos anos 80 e 90[3][4][5] e a descoberta em 2012 de uma inscrição dele no Sinai confirmaram sua existência.

Nome[editar | editar código-fonte]

O nome Iri-Hor é escrito com o hieróglifo do falcão Hórus (sinal G5 de Gardiner) acima de um hieróglifo da boca (Gardiner D21). Enquanto a leitura moderna do nome é "Iri-Hor", Flinders Petrie, que descobriu e escavou o túmulo no final do século XIX, leu-o "Ro", que era a leitura usual do hieróglifo da boca à época.[6][7] Dada a natureza arcaica do nome, a tradução mostrou-se difícil e, na ausência de melhor alternativa, Ludwig D. Morenz propôs que a tradução literal fosse retida dando "Boca de Hórus".[8] Na década de 1990, Werner Kaiser e Günter Dreyer traduzem o nome de Iri-Hor como "Companheiro de Hórus".[3] Toby Wilkinson, que contestou que Iri-Hor era rei, traduziu os sinais como "Propriedade real".[9] Após as escavações em Abidos e a descoberta de uma inscrição de Iri-Hor no Sinai em 2012, a hipótese de Wilkinson é agora rejeitada pela maioria dos egiptólogos e Iri-Hor é amplamente aceita como um rei pré-dinástico.[10][11][12]

Os egiptólogos Jürgen von Beckerath e Peter Kaplony também inicialmente rejeitaram a identificação do rei e propuseram que as inscrições conhecidas se referissem a uma pessoa privada cujo nome é para ser lido Uer-Rá (em egípcio: wr-r3; lit. "Grande Boca"), ou seja, a leitura do pássaro acima do sinal da boca como o hieróglifo da andorinha G36 em vez do falcão Hórus. Eles traduziram o nome como "porta-voz" ou "chefe".[13] Porém, as contínuas escavações da tumba de Iri-Hor em Abidos por Günter Dreyer estabeleceram que ela tinha dimensões e arranjos semelhantes aos de e Narmer e, portanto, deviam pertencer a um rei. Isto foi consequentemente aceito por von Beckerath que o incluiu como primeira entrada na última edição de seu Manual dos Faraós Egípcios.[14]

Identidade[editar | editar código-fonte]

Controvérsia[editar | editar código-fonte]

Selo de barro
Sereque do tipo IXa.1

Até 2012, o nome de Iri-Hor não foi achado em ou perto a um sereque, então sua identificação como rei foi controversa. Os egiptólogos Flinders Petrie, Laurel Bestock[7] e Jochem Kahl,[15] contudo, acreditavam que era de fato um verdadeiro governante. Eles apontaram à grafia distinta do nome dele: o falcão de Hórus segura o hieróglifo da boca em suas garras. Em vários selos de barro, o grupo aparece acompanhado de um segundo hieróglifo independente de boca. Esta notação é uma reminiscência de numerosos sereques anônimos mantidos por um falcão Hórus com hieróglifos individuais colocados próximos a ele e não dentro, como seria de se esperar. Finalmente, o sereque poderia ter sido uma convenção que começou com Cá, cujo nome foi encontrado com e sem um sereque. Assim, concluíram que o argumento de que não era um rei porque seu nome nunca foi encontrado num sereque era insuficiente.[7]

Os defensores da identificação de Iri-Hor como rei, como o egiptólogo Darell Baker, também apontaram para o tamanho e localização de seu túmulo. É uma tumba dupla, tão grande quanto a de Cá e Narmer, localizada dentro de uma ordem sequencial que liga o antigo Cemitério U protodinástico (3200–3100 a.C.) com os túmulos da I dinastia (3100–2890 a.C.).[16] Além disso, o nome dele está inscrito num grande jarro exibindo o falcão real de Hórus e é semelhante aos encontrados nos túmulos de outros reis desse período.

Em contraste, alguns egiptólogos duvidavam que Iri-Hor existisse, precisamente porque seu nome nunca apareceu num sereque, com Hórus sendo simplesmente colocado acima do sinal da boca. Ludwig D. Morenz e Kurt Heinrich Sethe duvidaram da leitura do nome de Iri-Hor e, portanto, que era um rei. Morenz, por exemplo, suspeitava que o sinal bucal pudesse simplesmente ter sido um complemento fonético para Hórus.[8] Sethe entendeu o grupo como indicação de origem (do conteúdo de um jarro e outros bens aos quais os selos de barro eram geralmente presos). Toby Wilkinson descartou a tumba atribuída a ele como um depósito e o nome como uma marca do tesouro. De fato, r-Ḥr pode simplesmente significar propriedade do rei.[9][17] Apoiando sua hipótese, Wilkinson também notou que foi mal atestado e, até 2012, a única inscrição de fora de Abidos estava localizada no Baixo Egito em Zauiate Ariane.[18]

Resolução[editar | editar código-fonte]

As escavações de Dreyer na necrópole de Abidos revelaram que Iri-Hor estava de fato bem atestado com mais de 27 objetos com seu nome e que seu túmulo era de proporções reais.[19] Além disso, em 2012 uma inscrição mencionando-o foi descoberta no Sinai e nela há um sereque arcaico vazio à direita do nome de Iri-Hor. A inscrição menciona a cidade de Mênfis, colocando sua fundação antes de Narmer e estabelecendo que Iri-Hor já estava reinando sobre ela. Com isso, a maioria dos egiptólogos, incluindo Günter Dreyer e os descobridores da inscrição, Pierre Tallet e Damien Laisney, acreditam agora que era de fato um rei.[10]

Reinado e atestações[editar | editar código-fonte]

Seu nome, como aparece em Abidos

Iri-Hor era provavelmente o antecessor imediato de Cá[20] e assim reinaria durante o início do século XXXII a.C.. Ele provavelmente governou de Hieracômpolis sobre Abidos e a região mais tinita mais ampla e controlou o Egito pelo menos até o norte de Mênfis, uma vez que a inscrição em rocha do Sinai relata uma visita de Iri-Hor a esta cidade.[21] Os egiptólogos Tallet e Laisney propõem ainda que também controlasse partes do delta do Nilo.[10]

Foi enterrado no cemitério real de Umel Caabe perto de Cá, Narmer e os reis da I dinastia. Seu nome aparece em vasos de barro de seu túmulo em Abidos e um selo de argila com os hieróglifos para r-Ḥr foi encontrado no túmulo de Narmer e pode se referir a ele. No total, não menos de 22 potes de cerâmica gravados com seu nome estão em Abidos, bem como pelo menos cinco fragmentos com tinta e um selo.[19] Um selo similar também foi encontrado ao norte na tumba Z 401 de Zauiate Ariane no Baixo Egito.[3][16] A incisão num fuso localizado em Hieracômpolis durante as escavações de James Quibell e Petrie em 1900 pode ser sua.[18][22] Finalmente, a descoberta da inscrição do Sinai, constitui seu atestação mais setentrional. A inscrição mostra seu nome num barco, ao lado da palavra Inebe-Hedje que significa "muros brancos", o antigo nome de Mênfis.[10]

Tumba B1/B2

Tumba[editar | editar código-fonte]

O túmulo de Iri-Hor é o mais antigo da necrópole B de Abidos no Umel Caabe.[18] Compreende duas câmaras subterrâneas separadas B1 (6m × 3.5m) e B2 (4.3m × 2.45m) escavadas por Petrie em 1899 e depois por Werner Kaiser.[1][23] Uma nova câmara, "B0", foi achada na reescavação dos anos 90.[16] As câmaras têm tamanho semelhante às de Cá e Narmer. Qualquer superestrutura, se é que existiu alguma, sobreviveu. A câmara B1 produziu fragmentos de jarros com o seu nome.[18] A câmara B2 produziu outro fragmento de jarra incisa, uma impressão de selo, várias inscrições de tinta e fragmentos de recipiente que levam os nomes de Cá e Narmer. Partes de uma cama também foram encontradas no local.[3]

Referências

  1. a b Petrie 1900, p. 29-30.
  2. Raffaele 2002.
  3. a b c d Dreyer 1982, p. 211–246.
  4. Dreyer 1993, p. 56.
  5. Dreyer 1996, p. 48-57 e taf. 9.
  6. Petrie 1902, p. 4-6.
  7. a b c Bestock 2009, p. 16, 17, 21 & 28.
  8. a b Morenz 2004, p. 88.
  9. a b Wilkinson 1993, p. 91–93.
  10. a b c d Tallet 2012, p. 385-386.
  11. van den Brink 1996, p. 140-158, pl.s 24-32.
  12. van den Brink 2001, p. 46-51.
  13. Kaplony 1964, p. 468.
  14. Beckerath 1999, p. 9 e 36-37.
  15. Kahl 1996, p. 96-101.
  16. a b c Baker 2008, p. 156.
  17. Wilkinson 1999, p. 19, 55 & 234.
  18. a b c d Raffaele 2003.
  19. a b van den Brink 2008, p. 655-659.
  20. Barta 1982, p. 11–13.
  21. Jarus 2016.
  22. Quibell 1900, placa 63.1.
  23. Kaiser 1964, p. 86-124.

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  • Baker, Darrell D. (2008). The Encyclopedia of the Pharaohs: Volume I - Predynastic to the Twentieth Dynasty 3300–1069 BC. Londres: Stacey International. ISBN 978-1-905299-37-9 
  • Barta, Winfried (1982). «Zur Namensform und zeitlichen Einordnung des Königs Ro». GM. 53 
  • Beckerath, Jürgen von (1999). Handbuch der ägyptischen Königsnamen, Münchner ägyptologische Studien 49 ed. Mogúncia: P. von Zabern. ISBN 3-8053-2591-6 
  • Bestock, Laurel (2009). The Development of Royal Funerary Cult at Abydos. Two Funerary Enclosures from the Reign of Aha. Viesbade: Harrassowitz 
  • Dreyer, Günter; Kayser, W. (1982). «Umm el-Qaab. Nachuntersuchungen im frühzeitlichen Königsfriedhof. 2. Vorbericht». Instituto Arqueológico Alemão do Cairo. 38 
  • Dreyer, Günter; Kayser, W. (1993). «Umm el-Qaab. Nachuntersuchungen im frühzeitlichen Königsfriedhof 5./6. Vorbericht». Instituto Arqueológico Alemão do Cairo. 49 
  • Dreyer, Günter; Kayser, W. (1996). «Umm el-Qaab. Nachuntersuchungen im frühzeitlichen Königsfriedhof 7./8. Vorbericht». Instituto Arqueológico Alemão do Cairo. 52 
  • Jarus, Owen (2016). «Early Egyptian Queen Revealed in 5,000-Year-Old Hieroglyphs». Live Science 
  • Kahl, Jochem (1996). Das System der ägyptischen Hieroglyphenschrift in der 0.-3. Dynastie. Viesbade: Harrassowitz 
  • Kaiser, Werner (1964). «Einige Bemerkungen zur ägyptischen Frühzeit». Zeitschrift für Ägyptische Sprache und Altertumskunde. 9 
  • Kaplony, Peter (1964). Inschriften der Ägyptischen Frühzeit Vol. I. Viesbade: Harrassowitz 
  • Morenz, Ludwig D. (2004). Bild-Buchstaben und symbolische Zeichen: die Herausbildung der Schrift in der hohen Kultur Altägyptens. Friburgo, Suíça: Academic Press Fribourg 
  • Petrie, Flinders (1900). The Royal tombs of the earliest dynasties. Londres: Fundo de Exploração do Egito 
  • Petrie, Flinders (1902). Abydos: Part I. Londres: Fundo de Exploração do Egito 
  • Quibell, James Edward; Petrie, Flinders (1900). Hierakonpolis. Part I. Plates of discoveries in 1898 by J. E. Quibell, with notes by W. M. F. Petrie. Londres: Sociedade de Exploração do Egito 
  • Raffaele, Francesco (2002). «Dinastia 00» 
  • Raffaele, Francesco (2003). «Dinastia 0» 
  • Tallet, Pierre (2012). «Iry-Hor et Narmer au Sud-Sinai (Ouadi 'Ameyra). Un complément à la chronologie das expéditions minières égyptiennes». Cairo. Boletim do Instituto Francês de Arqueologia Oriental. 112 
  • van den Brink, Edwin (1996). «The incised serekh signs of Dynasties 0-1. Part I: complete vessels». In: Spencer, J. Aspects of Early Egypt. Londres: Imprensa do Museu Britânico. ISBN 978-0714109992 
  • van den Brink, Edwin (2001). «The Pottery-Incised Serekh-Signs of Dynasties 0-1. Part II: Fragments and Additional Complete Vessels». Archeo-Nil (11) 
  • van den Brink, Edwin (2008). «Two Pottery Jars Incised with the Name of Iry-Hor from Tomb B1 at Umm El-Ga'ab, Abydos». In: Dreyer, Günter; Müller, Vera; Hartung, Ulrich. Zeichen aus dem Sand, Streiflichter aus Ägyptens Geschichte zu Ehren. Viebade: Imprensa do Museu Britânico. ISBN 978-3-447-05816-2 
  • Wilkinson, Toby (1993). «The identification of Tomb B1 at Abydos: refuting the existence of a king 'Ro/Iry-Hor'». London: Sociedade de Exploração do Egito. Journal of Egyptian Archaeology. 79. ISSN 0307-5133 
  • Wilkinson, Toby A. H. (1999). Early Dynastic Egypt. Londres e Nova Iorque: Routledge. ISBN 0415186331