Teste do desenho da figura humana

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Desenho livre de uma criança com 4-5 anos.

O teste do desenho da figura humana, teste do desenho de Goodenough é um teste projetivo de personalidade e/ou um teste cognitivo usado para avaliar crianças e adolescentes para uma variedade de propósitos psicométricos. Com nome de testes gráficos ou teste HTP amplia-se sua possibilidade interpretativa incluindo-se na avaliação o desenho de uma casa (house), árvore (tree) além da figura humana (person). Em estudos da atual frequência de uso de testes por revisão de literatura, o Desenho de Figura Humana (DFH) aparece como o sexto instrumento mais utilizado na avaliação da personalidade nos Estados Unidos e o terceiro lugar no conjunto dos instrumentos de avaliação psicológica no Brasil. [1]

Breve história[editar | editar código-fonte]

Desenvolvido originalmente por Florence Goodenough (1886 – 1959), em 1926, este teste foi o primeiro conhecido como teste do desenho de uma pessoa — Goodenough. Foi descrito detalhadamente em seu livro intitulado Measurement of Intelligence by Drawings (Medição da inteligência através de desenhos).[2] Posteriormente Dr. Dale B. Harris realizou uma revisão e ampliação desse teste que ficou conhecida como teste do desenho de Goodenough-Harris detalhada em seu livro Children's Drawings as Measures of Intellectual Maturity (Desenhos de crianças do como medidas de maturidade intelectual).[3] [4]

Um dos sistema de interpretação e avaliação do desenho da pessoa juntamente com casa e árvore, conhecido como HTP (house, Tree, Person), até hoje utilizado e recomendado, foi proposto por John N. Buck (1906-1983), psicólogo clínico com título adquirido por mérito do reconhecimento nacional por suas diversas contribuições para o campo da psicologia, pois não possuí a graduação formal em psicologia. Além de desenvolver a Técnica Projetiva do teste do desenho (H-T-P) em sua monografia publicada em 1948 no "Journal Clinical Psychology", desenvolveu uma série de outros inventários psicológicos, sendo um dos pioneiros do estabelecimento da psicologia clínica na Virgínia (EUA). [5] [6]

De acordo com Hammer [7] entre os primeiros exploradores de sua utilização clínica incluem-se Karen Machover (1902-1996),[8] Paul Schilder (1886-1940) [9] e Lauretta Bender(1897-1987).[10] Contudo pode se tomar como marco da interpretação do desenho, especialmente no âmbito da psicanálise, a observação de Leonardo da Vinci (1452-1519) de que o desenho da figura humana traduzia a própria experiência corporal do artista, ensinava ele que se tornava necessário uma atenção especial prática para evitar tal expressão. Observe-se também que a produção de auto-retratos, conscientemente realizados pelo artista, passou a ser cada vez mais frequente, a partir da renascença italiana.

Leonardo da Vínci, 1490. Estudo das proporções humanas

É também de Da Vinci também um dos melhores e mais conhecidos estudos sobre as proporções humanas, cujas variações no teste do desenho é um componente essencial para interpretação sobre conflitos quanto a forma ou função simbólica de cada componente do corpo humano.[11] Atualmente estudos clínicos, de análise de símbolos e de comparação de testes psicológicos sugerem normas ou parâmetros de interpretação específica para cada parte da figura humana desenhada além do plano de avaliação da capacidade técnica (de representação anatômica e reprodução gráfica) e /ou estilo artístico e quanto personalidade inteligência humana. Segundo C. G. Jung (1875-1961) é possível estabelecermos uma classificação da arte entre abstrata e figurativa (conceituadas segundo Worringer) relacionando estas categorias estéticas à disposição dos tipos psicológicos, introvertidos e extrovertidos respectivamente.[12]

Tomando-se com parâmetro a interpretação do desenho infantil é consenso atribuir-se à Conrado Ricci (1887). L’arte dei bambini (A arte das crianças) referindo-se às dificuldades de reprodução do realidade visual, as interferências das concepções próprias delas sobre o que ou como vêem e o que desenham, a ocorrência de transparências e semelhanças entre estes e a arte primitiva.[13][14]

O desenho infantil tem sido considerado uma atividade necessária ao aprendizado da escrita desde as proposições pedagógicas de Johann Heinrich Pestalozzi (1746 - 1827). A origem de sua utilização na psicoterapia infantil pode ser a Melanie Klein (1882 - 1960) com o clássico trabalho da análise dos desenhos da análise de Richard [15] ou como das técnicas utilizadas por Donald Woods Winnicott (1896 - 1971) [16]. Recentemente o Geledés - Instituto da Mulher Negra publicou uma série de desenhos infantis vítimas de abuso sexual enquanto crianças, onde são visíveis as referências às cenas traumáticas em símbolos mais ou menos explícitos, evidenciando o valor do desenho da criança inclusive como prova pericial em processos jurídicos contra autores enquadrados no crime de abuso sexual de menor. [17]

A Virgem e o Menino com Santa Ana (1508)

Perspectivas de interpretação[editar | editar código-fonte]

Além das clássicas escalas e padrões de comparação/interpretação que fazem do desenho da figura humana um teste psicológico outras formas de interpretação podem e devem ser consideradas.[18] Não se pode esquecer, principalmente, que os estudos psicanalíticos da projeção e em especial nesse caso do clássico ensaio de Sigmund Freud: Leonardo da Vinci e uma lembrança da sua infância [19] que, em 1910, identificaria os elementos de um sonho infantil desse artista relatado por ele em seus escritos, um abutre representado de modo disfarçado no manto da madona que segura o menino no quadro Sant’Ana com a Virgem e o menino.

No estudo dos clássicos da pintura do ponto de vista estético subdivide-se a história da arte em períodos específicos, identificando estilos e características de época. A interpretação de desenhos também tem sido útil no estudo da arte nas culturas primitivas e pré históricas.

Na forma de análise que tem sido denominada de psicologia da arte destacam-se os estudos sobre Pablo Picasso analisado por C. G. Jung que publicou um ensaio sobre ele em 1932, em especial sobre os seus quadros que exploram o "horrível" ou "grotesco" semelhantes em muitos aspectos à produção psicótica, que nesse caso, ressalta Jung, não pode ser considerado uma patologia e sim, no máximo, uma disposição baseada na qual uma grave complicação psíquica poderia produzir uma esquizofrenia [20]. Observe-se porém, que a psicopatologia representa apenas um breve capítulo das aplicações da psicologia à compreensão e análise das obras de arte. São muito conhecidos e discutidos nessa perspectiva alguns estudos biográficos de conhecidos artistas que padeceram de distúrbios mentais ou se interessaram em retratar tal condição humana a exemplo de Vincent Van Gogh (1853-1890), Louis Wain (1860-1939) e Edvard Munch (1863-1944).

Galeria de imagens[editar | editar código-fonte]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Leonardo da Vinci (1452-1519). Estudo sobre um homem velho (possível auto-retrato)

Referências

  1. PASIAN, Sonia Regina; JACQUEMIN, André. "O auto-retrato em crianças institucionalizadas". Paidéia (Ribeirão Preto), Ribeirão Preto , v. 9, n. 17, Dec. 1999 . Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-863X1999000200006&lng=en&nrm=iso>. access on 17 Dec. 2014. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-863X1999000200006.
  2. Goodenough, F.. Measurement of intelligence by drawings. New York, World Book Co, 1926
  3. Harris, D. B. Children's drawings as measures of intellectual maturity. New York: Harcourt, Brace & World, Inc., 1963
  4. ROSA, Helena Rinaldi; ALVES, Irai Cristina Boccato. Precisão do Teste Goodenough-Harris em crianças. Aval. psicol., Porto Alegre , v. 7, n. 2, p. 171-179, ago. 2008 . Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-04712008000200008&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 24 ago. 2019.
  5. Rowe FB, Crews WD Jr, Finger FW. John N. Buck (1906-1983): did he practically establish clinical psychology in Virginia? J Clin Psychol 1993; 49(3):428-34 Abstract Aces. Agosto de 2019
  6. FERREIRA, Gisele Vieira, Teste projetivo do desenho da figura humana: estudo da fidedignidade entre avaliadores / Gisele Vieira Ferreira. – Porto Alegre, (2011) Dissertação (Mestrado) – Fac.de Psicologia, PUCRS. Orientação: Profa. Dra. Maria Lucia Tiellet Nunes. Disponível em [http://tede2.pucrs.br/tede2/handle/tede/758 Acesso Agosto de 2019
  7. Hammer, Emanuel F. Testes proyectivos gráficos. Buenos Aires, Paidos, 1978
  8. Machover, Karen. Pesonality projection in the drawing of human figure. Springfield, Thomas, 1949
  9. Schilder, P. Image and appearance of the human body. NY, Internat Univ. Press, 1950
  10. Bender, Lauretta. Schizophrenic childhood. Nerv. Child, 138-140, 1952
  11. Campos, Dinah Martins S. O teste do desenho como instrumento de diagnóstico da personalidade (40ª Ed.). RJ, Vozes, 2008
  12. Jung, Carl G. Tipos psicológicos. RJ, Zahar, 1974
  13. Tarantini, Nunzia.Il disegno infantile: un po’ di storia. Seminari di Psicologia Infantile Ri-vivere 2009
  14. Lopes, Juliana Cassab. O desenvolvimento histórico do processo do estudo do desenho da criança. Monografia apresentada à Universidade de Franca para a conclusão de Curso de Especialização em Arte e Criatividade Modalidades de Criação à Universidade de Franca, 2001. PDF Out. 2011
  15. Kein, Melanie. O complexo de édipo à luz das ansiedades arcaicas, 1945 in: Klein, M. Amor, culpa e reparação e outros trabalhos (1921 - 1945).RJ, Imago, 1996
  16. Winnicott, Donald Woods. O brincar e a realidade. RJ, Imago, 1975
  17. Geledés - Instituto da Mulher Negra. Os monstros da minha casa, desenhos de crianças retratando o abuso que sofreram. Geledés Publicação on-line Artigos em 20 Setembro 2013 Consulta Outubro de 2013
  18. Costa, Paulo Pedro P. R. A propósito da interpretação psicológica do desenho da figura humana, um consagrado teste projetivo Portal Pluridoc Jan. 2011
  19. Freud, S. Leonardo Da Vinci e uma lembrança da sua infância. Ed Standard das Obras completas de Sigmund Freud vol. XI. RJ Imago, 1970
  20. Jung, C.G. Picasso, (1932) in: Jung C.G. O espírito na arte e na ciência. Petrópolis, Vozes, 2007