Urânio empobrecido

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Projétil de urânio empobrecido.

O urânio empobrecido, também conhecido como urânio exaurido, urânio esgotado ou DU (do inglês depleted uranium), basicamente composto do isótopo 238U (urânio-238), de difícil fissão, é o subproduto do processo de enriquecimento ou do reprocessamento de urânio para obtenção do isótopo 235U (urânio-235), que é usado para fissão em reatores e armas nucleares.

O urânio empobrecido obtido como subproduto do processo de enriquecimento contém menos que 1/3 da quantidade de 235U e 234U existente no urânio natural. O urânio encontrado na natureza é composto de aproximadamente de 99,27% de U-238, 0,72% de 235U e 0.0055% de 234U, enquanto a composição típica do urânio empobrecido é 99,8% de 238U; 0,2% a 0.4% de 235U e 0,001% de 234U.

O DU também pode ser subproduto do reprocessamento nuclear e, neste caso, distingue-se pela presença de 236U (urânio-236).[1]

O urânio empobrecido é ainda menos radioativo que o urânio natural (emite o equivalente a cerca de 60% da radiação emanada do urânio natural).[2] Sua alta densidade (19.050 kg/m³ ou 67% superior à do chumbo) faz do urânio empobrecido um material apreciado para diversas aplicações civis e militares. No campo civil ele é usado como lastro em aeronaves e como escudo contra radiação. No meio militar é utilizado em projéteis, blindagens físicas e peças de artilharia em geral. Tais usos são controversos. Embora seja menos tóxico que outros metais pesados (como o arsênico e o mercúrio) e fracamente radioativo em razão da sua longa meia-vida (bilhões de anos),[3] não há pesquisas conclusivas sobre os riscos envolvidos no uso do DU.[4] É comprovado a partir de diversos estudos laboratoriais que o Urânio-238 é tóxico para mamíferos, ataca o sistema reprodutivo e o desenvolvimento do feto causando fertilidade reduzida, abortos e deformações no nascituro.[4] Testes citológicos mostram que, à exposição crônica, o DU é leucogênico, mutagênico e também neurotóxico. Sabe-se que toda exposição a radiação ionizante envolve riscos, mas não há dados epidemiológicos conclusivos acerca da exposição humana ao urânio empobrecido e sua correlação com a ocorrência de patologias específicas como o câncer.[5] Contudo o governo do Reino Unido atendeu ao pleito de um veterano da Guerra do Golfo sob a alegação de intoxicação por urânio empobrecido, além de defeitos congênitos em seus filhos concebidos após sua atuação na guerra.[6][7]

História[editar | editar código-fonte]

A bomba de hidrogênio fissiona também urânio empobrecido.

No início da década de 1940 a corrida bélica da Segunda Guerra Mundial dava seus primeiros passos em direção ao poder do átomo previsto por Einstein e sua famosa equação E=MC². Os Estados Unidos da América e a União Soviética lideravam a corrida iniciando a produção de urânio enriquecido, o U-235. No entanto o U-235 é, na verdade, separado do minério de urânio e não representa mais que 0,73% do urânio encontrado na natureza. O resto, ou seja mais de 99%, constituía-se de urânio empobrecido de pouca ou nenhuma utilidade naquele momento. Anos mais tarde surgiriam reatores capazes de produzir energia a partir do urânio empobrecido e dispositivos termonucleares onde também serviria como combustível.

Todavia não apenas as propriedades atômicas mostrariam a utilidade do isótopo U-238.

Fontes de obtenção[editar | editar código-fonte]

O urânio empobrecido é um derivado do enriquecimento do urânio natural para o uso em reatores nucleares. Quando a maior parte dos isótopos radioativos físseis do urânio é removida do urânio natural, o resíduo é chamado de urânio empobrecido. Outra fonte, menos comum, do material é o reator de combustível consumido reprocessado. A origem pode ser distinguida pelo teor de urânio-236,[8] produzido por captura de nêutrons do urânio-235 em reatores.

Aplicações militares[editar | editar código-fonte]

Na década de 1970, o Pentágono divulgou que o Pacto de Varsóvia havia desenvolvido tanques com blindagem tal que a munição da OTAN não era capaz de penetrar. Após o teste de vários metais, o Pentágono aprovou o urânio empobrecido como ideal na construção de obuses e munição para perfurar as novas blindagens devido às suas propriedades físicas e relativa facilidade de obtenção.

Comparado ao tungstênio, o U-238 mostra-se mais frágil e menos denso. Ademais, os estoques americanos datados à época somavam mais de 500 000 toneladas e o tungstênio teria de ser importado da China.

O exército americano utilizou munições de urânio empobrecido durante a Guerra do Golfo, em 1991, e actualmente na ocupação do Iraque. A OTAN voltou a utilizá-las, como na Guerra da Bósnia, entre 1994 e 1995. Em 1999 foi usado na campanha de agressão contra a Sérvia. Segundo relatos de médicos noruegueses, que atenderam feridos na Faixa de Gaza, as Forças de Defesa de Israel também usaram urânio empobrecido nos ataques a Gaza, em 2008 - 2009.[9][10] O diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atômica das Nações Unidas (AIEA), Mohammed ElBaradei, acolheu a denúncia dos países árabes, entregue pelo embaixador da Arábia Saudita, sobre o uso de munição com urânio empobrecido. A porta-voz da AIEA, Melissa Fleming, informou que "investigaremos o assunto na medida de nossa capacidade".[11]

Existe uma controvérsia sobre se as armas à base de urânio empobrecido deveriam ser proibidas pelas convenções internacionais, dado que o urânio se pulveriza durante a explosão, formando nuvens de partículas ligeiramente radioativas, capazes de contaminar extensas áreas.[12] Em 2001 a ONU verificou que, contrariamente ao que se pensava anteriormente, a munição de urânio empobrecido norte-americano contém plutônio e provém, portanto, de usinas de reprocessamento, não de enriquecimento, razão pela qual sua radioatividade é mais alta do que se imaginava.[13]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. «UN Press Release UNEP/81: Uranium 236 found in depleted uranium penetrators». UN 
  2. "Properties and Characteristics of DU" U.S. Office of the Secretary of Defense
  3. Agency for Toxic Substances and Disease Registry (1999). «Toxicological profile for uranium». Washington, DC, US Public Health Service 
  4. a b Miller AC, McClain D. (janeiro–março de 2007). «A review of depleted uranium biological effects: in vitro and in vivo studies». Rev Environ Health. 22 (1): 75-89. PMID 17508699 
  5. Health Effects of Uranium. «Toxicological profile for uranium». Arquivado do original em 23 de novembro de 2007 
  6. «Gulf soldier wins pension fight». BBC News. 2 de fevereiro de 2004 
  7. «When the dust settles». Guardian Unlimited. 17 de abril de 2003 
  8. «Programa das Nações Unidas para o Urânio-235» 
  9. «Aumenta suspeita do uso de armas ilegais no conflito em Gaza. O Estado de S.Paulo, 13 de janeiro de 2009» 
  10. «ONU vai abrir inquérito a presumível uso de urânio empobrecido em Gaza por Israel» 
  11. «Agência da ONU investiga se Israel usou urânio em Gaza. Jornal do Commercio, 21 de janeiro de 2009» 
  12. [1]
  13. Plutonium traces found in munitions tracked to processing plants, por Katherine Rizzo. AP. 25de janeiro de 2001.

Ligações externas[editar | editar código-fonte]