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INTRODUÇÃO[editar | editar código-fonte]

No Brasil, existe uma percepção generalizada de que os servidores públicos corruptos não são punidos, mesmo não havendo, até então, evidência que apoie tal pensamento, pois há uma grande dificuldade em se identificar casos reais de corrupção e mensurar se eles são ou não punidos pelo Judiciário. No afã de superar tal dificuldade, Carlos Higino Ribeiro de Alencar e Ivo Gico Jr. elaboraram o artigo “Corrupção e judiciário: a (in)eficácia do sistema judicial no combate à corrupção”[1] e, valendo-se do sistema de responsabilidade tríplice (Administrativo, Penal e Cível)[2], buscaram averiguar o desempenho do Judiciário frente à corrupção. Então, com o presente verbete, e supondo que os servidores punidos na via administrativa sejam realmente corruptos, pretende-se averiguar se o sistema judicial[3] é capaz de identificar os casos de corrupção e efetivamente punir o agente corrupto.

A TEORIA ECONÔMICA DO CRIME[editar | editar código-fonte]

Aplicação da lei, penalidades e comportamento racional[editar | editar código-fonte]

A teoria da Escolha Racional surgiu entre os economistas, ao tentarem explicar certas relações de consumo e produção, mas não tardou a extravasar para outras áreas que estudam o comportamento humano, como o Direito. Gary Becker, em 1968[4], foi o vanguardista dessa abordagem nas questões jurídicas relacionadas à criminalidade, fazendo surgir daí a Teoria Econômica do Crime. Tal teoria apregoa que a maior parte das pessoas cometeria um ilícito somente se a utilidade esperada e percebida por elas superasse a utilidade esperada em relação ao emprego de seu tempo e recursos em outras atividades. Nessa senda, algumas pessoas podem ser consideradas criminosas não por terem motivações básicas diferentes das demais, mas pelo fato de seus benefícios e custos diferirem. Válido salientar, essa abordagem fez renascer o debate entre os efeitos retributivos e dissuasivos das penalidades, e Gary Becker retoma a linha de argumentação particularmente em relação aos efeitos dissuasivos. De acordo com a abordagem, a probabilidade de ser pego e a magnitude da punição são os elementos-chave para a análise juseconômica do comportamento criminoso, levando-nos à conclusão de que a atividade criminosa está intimamente ligada aos fatores que influenciam a alocação de tempo entre as atividades lícitas e ilícitas (custo de oportunidade).

Teoria econômica da corrupção[editar | editar código-fonte]

Uma vez que os autores focam sua atenção nos servidores públicos, eles alertam para o fato de que o custo de oportunidade mais importante na corrupção desses agentes não é representado pelas demais atividades permitidas que eles poderiam desenvolver, e sim pela perda potencial de seu salário, sua aposentadoria e outros benefícios que perderiam caso fossem pegos. Por meio de inúmeros modelos matemáticos, os autores procuraram demonstrar que a corrupção é mais propensa a ocorrer somente quando o valor máximo da propina do corruptor for superior ao valor mínimo aceito pelo servidor. Além disso, constataram que o grau de corrupção é ligado à estrutura de incentivos dos agentes envolvidos, de modo que podemos falar em níveis diferentes de corrupção[5].

MEDINDO O DESEMPENHO JUDICIAL EM CASOS DE CORRUPÇÃO[editar | editar código-fonte]

O estudo acerca da corrupção e do combate a ela não é simples. Diferentemente de outros crimes, em que a chance de o crime ser relatado é maior, esse delito depende de um certo sigilo para ser realizado com sucesso, portanto muitas ocorrências acabam não sendo descobertas. Além disso, deve-se levar em conta o envolvimento direto ou suborno de agentes fiscalizadores nesses esquemas, o que acaba ocultando ainda mais casos. Por esse motivo, muitos pesquisadores, ao abordarem o assunto, escolheram usar a percepção de corrupção como material para seus estudos, mas essa presunção não é necessariamente condizente com a realidade, podendo ser vítima do contexto histórico e cultural. Então, os autores informam que, para cumprir o objetivo de analisar o desempenho do sistema judiciário contra a corrupção, haverá uma comparação entre o número de casos totais ocorridos com o de casos onde se observou alguma punição. A pesquisa se dá por meio de uma averiguação das condutas ilícitas que puderam ser identificadas pelas comissões administrativas durante certo intervalo de tempo (1993 a 2005), sendo este levantamento feito através de busca por funcionários que foram demitidos ou tiveram benefícios suspensos por razões relacionadas à corrupção. Após a conclusão desse passo, é realizada uma apuração para se determinar quantas dessas ações administrativas culminaram em punição aplicada pelo judiciário. A relação entre as duas estatísticas é calculada de maneira simples: casos punidos pelo judiciário (Qp) sobre casos punidos pelo meio administrativo (Qo), resultando na fórmula QpQo, cujo resultado equivaleria a um quociente de desempenho judicial.

RESULTADOS[editar | editar código-fonte]

O artigo se propôs a verificar se o sistema judicial brasileiro é efetivo no combate à corrupção, ressaltando o fato de que não se buscou explicar os resultados nem identificar as causas associadas. Do ponto de vista teórico, a partir do modelo que aplica a Teoria Econômica do Crime aos casos de corrupção, limitando-se aos servidores públicos, concluiu-se que: (i) O nível de corrupção é contínuo e não discreto[6]; (ii) um incremento na sanção judicial para o servidor tende a reduzir o nível de corrupção, uma vez que aumenta os custos do indivíduo caso seja pego; (iii) o incremento na probabilidade de punição também tende a reduzir a corrupção; (iv) um aumento na probabilidade de punição é a variável mais importante no estabelecimento do nível de equilíbrio atual de corrupção, já que o efeito de um aumento na probabilidade de punição é um aumento maior da renda necessária para que a corrupção seja realmente interessante para o agente corruptor. Os autores consideram que a aplicação da lei (law enforcement) tem um efeito dissuasivo substancial, instituindo graus de importância nas variáveis que reduziriam a corrupção, respectivamente: 1) Probabilidade de punição; 2) Magnitude das sanções judiciais para corruptor e servidor corrupto; 3) Magnitude das sanções administrativas aplicáveis apenas ao servidor corrupto. Entretanto, é importante considerar que, uma vez que o custo associado ao aumento da probabilidade de punição (melhores instrumentos de monitoração, promotores e juízes especializados) é normalmente muito superior ao custo associado apenas ao aumento da magnitude da punição (mero processo legislativo), não causa espanto saber que essa última medida seja a mais empregada. Já do ponto de vista empírico, buscou-se mensurar a probabilidade de punição em casos de corrupção. Os autores analisaram o sistema de responsabilidade redundante nos casos de corrupção cometidos por servidores públicos, no qual o agente corrupto pode enfrentar cumulativa e independentemente sanções criminais, cíveis e administrativas por suas ações. Utilizando a suposição de que os servidores públicos punidos administrativamente são realmente corruptos como proxy - ou aproximação - para todos os casos de corrupção, verificou-se que o sistema judicial brasileiro - entendido de forma ampla - é altamente ineficaz no combate à corrupção. Numericamente falando, apenas 4,5% dos servidores demitidos foram judicialmente reintegrados, inferindo-se que é um mito a afirmativa de que a maioria dos servidores públicos demitidos retornam à Administração Pública. Por outro lado, os resultados também demonstram que a chance de um servidor público corrupto ser criminalmente processado é muito menor que 34,01%. Além disso, a chance de ser efetivamente condenado criminalmente é de cerca de 3,17%.

CONSIDERAÇÕES FINAIS[editar | editar código-fonte]

Inicialmente, os autores partiram do pressuposto de que há uma percepção generalizada no Brasil de que os servidores públicos identificados em práticas corruptas não são punidos. De fato, constatou-se que existem no país volumosos incentivos à realização de práticas de corrupção, tendo em vista que o servidor provavelmente sairá impune, referendando, assim, a percepção popular, amparada por evidências empíricas. Pode-se afirmar, então, que, a partir do exposto, a eficácia do sistema judicial no combate à corrupção no Brasil é desprezível

  1. ALENCAR, Carlos Higino Ribeiro de; GICO JR., Ivo. Corrupção e judiciário: a (in)eficácia do sistema judicial no combate à corrupção. Rev. direito GV [online]. 2011, vol.7, n.1, pp.75-98. Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/revdireitogv/article/view/24041/22794. Acesso em 03 de maio de 2021.
  2. O sistema brasileiro permite investigação e punição em três âmbitos: administrativo, civil e criminal, os três com direito de investigar e punir de maneira independente, embora possam cooperar.
  3. Os autores utilizam esse termo no sentido amplo, de modo a abarcar não apenas magistrados, mas também promotores públicos, advogados, policiais, etc.
  4. Ano em que esse estudioso lançou seu artigo seminal “Crime and Punishment: an Economic Approach”.
  5. Aqui, surge uma ideia de “eficiência da corrupção”, no mesmo sentido que usamos para falar em níveis eficientes de poluição ou de qualquer outra atividade humana.
  6. Isso significa dizer que, conforme já aventado, o grau de corrupção é ligado à estrutura de incentivos dos agentes envolvidos, de forma a ser possível haver vários níveis diferentes de corrupção.