Em cálculo de várias variáveis, um campo vetorial conservativo é um campo vetorial que é o gradiente de um campo escalar. Campos conservativos têm a propriedade de sua integral de linha apresentar independência de caminho, ou seja, a escolha de qualquer caminho entre dois pontos não altera o valor de sua integral de linha. Exemplos de campos conservativos são a gravidade e um campo elétrico fora da ação de campos magnéticos. Esse artigo descreve o caso matematicamente mais simples de campos vetoriais conservativos do
e a importância do potencial na descrição de sistemas físicos.
Campos vetoriais conservativos aparecem naturalmente na mecânica: são campos vetoriais que representam as forças de sistemas físicos onde a energia é conservada. Nesses sistemas, o trabalho realizado para mover uma partícula no espaço depende apenas dos pontos final e inicial. Em outras palavras, é possível definir uma energia potencial que seja independente do caminho utilizado.
Um campo vetorial
é chamado de campo vetorial conservativo se e somente se existe uma função escalar
, chamada de potencial, de tal forma que o gradiente de
seja
(
). Isso implica que qualquer campo gradiente, da forma
, é um campo conservativo.
![{\displaystyle \varphi (x_{0},y_{0},z_{0})=\int _{0}^{x_{0}}F_{1}(x,0,0)\,dx+\int _{0}^{y_{0}}F_{2}(x_{0},y,0)\,dy+\int _{0}^{z_{0}}F_{3}(x_{0},y_{0},z)\,dz}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/412ba4ef60b6b2e67ca2116c83be94482a5bbf5d)
![{\displaystyle {\frac {\partial \varphi }{\partial z_{0}}}={\frac {\partial \varphi }{\partial z_{0}}}\int _{0}^{x_{0}}F_{1}(x,0,0)\,dx+{\frac {\partial \varphi }{\partial z_{0}}}\int _{0}^{y_{0}}F_{2}(x_{0},y,0)\,dy+{\frac {\partial \varphi }{\partial z_{0}}}\int _{0}^{z_{0}}F_{3}(x_{0},y_{0},z)\,dz}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/5ad6e47184031cffe2ca77198dd53094c23d5524)
![{\displaystyle {\frac {\partial \varphi }{\partial z_{0}}}=0+0+F_{3}(x_{0},y_{0},z_{0})}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/7072e46c3a3f3794879f4385cfac38e70dcf1673)
(
Teorema Fundamental do Cálculo)
Analogamente:
![{\displaystyle {\frac {\partial \varphi }{\partial y_{0}}}=0+F_{2}(x_{0},y_{0},0)+{\frac {\partial \varphi }{\partial y_{0}}}\int _{0}^{z_{0}}F_{3}(x_{0},y_{0},z)\,dz}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/f564a73d2cb0042e54854e184817ce4e03e4a803)
onde
![{\displaystyle {\frac {\partial \varphi }{\partial y_{0}}}\int _{0}^{z_{0}}F_{3}(x_{0},y_{0},z)\,dz=\int _{0}^{z_{0}}{\frac {\partial \varphi }{\partial y_{0}}}F_{3}(x_{0},y_{0},z)\,dz}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/f5cd1d9f5279a76c55f217f0e8d87b44b843590b)
e, usando que, para campos conservativos
![{\displaystyle \nabla \times \mathbf {F} =0}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/9aedbc312276a1e3d2185bf8a48daa51c12a4117)
temos que
![{\displaystyle {\frac {\partial F_{3}}{\partial y_{0}}}={\frac {\partial F_{2}}{\partial z_{0}}}}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/23d6da1533be226efe4925ed5dd5e404f7cf5ce2)
Logo:
![{\displaystyle \int _{0}^{z_{0}}{\frac {\partial \varphi }{\partial y_{0}}}F_{3}(x_{0},y_{0},z)\,dz=\int _{0}^{z_{0}}{\frac {\partial \varphi }{\partial z}}F_{2}(x_{0},y_{0},z)\,dz=F_{2}(x_{0},y_{0},z_{0})-F_{2}(x_{0},y_{0},0)}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/581491d9f4565915f14d8c0dd4fe22b4239f7192)
E
![{\displaystyle {\frac {\partial \varphi }{\partial y_{0}}}=F_{2}(x_{0},y_{0},z_{0})}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/66ecae2aa3138f0a56d4d24f005a1f5fabfbff06)
Agora, olhando para
![{\displaystyle {\frac {\partial \varphi }{\partial x_{0}}}=F_{1}(x_{0},0,0)+{\frac {\partial \varphi }{\partial x_{0}}}\int _{0}^{y_{0}}F_{2}(x_{0},y,0)\,dy+{\frac {\partial \varphi }{\partial x_{0}}}\int _{0}^{z_{0}}F_{3}(x_{0},y_{0},z)\,dz}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/9211ef51a65ed5c5a17e8146e89dd979f882dde3)
Analogamente a
![{\displaystyle {\frac {\partial \varphi }{\partial x_{0}}}=F_{1}(x_{0},0,0)+{\frac {\partial \varphi }{\partial y}}\int _{0}^{y_{0}}F_{1}(x_{0},y,0)\,dy+{\frac {\partial \varphi }{\partial z}}\int _{0}^{z_{0}}F_{1}(x_{0},y_{0},z)\,dz}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/3c0282162af110ed879faa5dc8e0bc9d4540bc98)
![{\displaystyle {\frac {\partial \varphi }{\partial x_{0}}}=F_{1}(x_{0},y_{0},z_{0})}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/04e57c86424c3fe6cbf1d408d4d3c534e50d6d34)
Então, se
![{\displaystyle {\frac {\partial \varphi }{\partial x_{0}}}=F_{1}(x_{0},y_{0},z_{0}),}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/6f0673faa94dd1471b70e40ed5873e41f9d810d2)
![{\displaystyle {\frac {\partial \varphi }{\partial y_{0}}}=F_{2}(x_{0},y_{0},z_{0})}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/66ecae2aa3138f0a56d4d24f005a1f5fabfbff06)
e
![{\displaystyle {\frac {\partial \varphi }{\partial z_{0}}}=F_{3}(x_{0},y_{0},z_{0})}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/f664901759f06c08673d7c71da659eaacac641e3)
![{\displaystyle \nabla \varphi =F}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/f7973262c76dd432353ff5e322b589b4395f806f)
[1]
Se
é uma função explícita de x,y,z então
F(x,y,z) =
i+
j +
k.
Se
é uma função implícita de x,y,z através de r =
, isto é,
(r) =
(r(x,y,z)) então é necessário usar a regra da cadeia para calcular o gradiente do potencial
. Potenciais desta forma são ditos potenciais centrais.[2]
Pode-se mostrar facilmente que, para qualquer campo conservativo:
![{\displaystyle \nabla \times \mathbf {v} =\nabla \times \nabla \varphi ={\vec {0}}}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/6385108c96ecb78122a074392711b912c1fa6798)
isto é, todo campo vetorial conservativo é irrotacional. Na linguagem de formas diferenciais isso é uma consequência da nilpotência da derivada exterior
nos mostra que toda forma exata é fechada.
A recíproca desse teorema sempre vale localmente, como provado pelo Lema de Poincaré, mas globalmente depende do primeiro grupo de cohomologia de de Rham:
.
No caso considerado aqui,
e toda forma fechada é exata ou, todo campo vetorial irrotacional é conservativo. Numa região de
que não seja simplesmente conexa, isto é, que não seja homotopicamente equivalente ao todo
, isso não é mais verdade. Um caso interessante é a corda de Dirac
que está relacionada ao conceito de monopolo magnético e quantização de carga elétrica.
Seja
um campo vetorial conservativo, ou seja ,
, definido em uma região R do espaço e uma curva C, dada por
, contínua por partes em R, com início em
e extremidade em
, então:
Partindo-se da expressão:
Dada a curva C
Então
Aplicando a Regra da cadeia
Logo:
E,
Sempre que o campo for conservativo, o Trabalho será dado pela diferença de potencial, ou seja , o trabalho é independente do caminho realizado e dependerá apenas dos pontos inicial e final que unem a curva C.
Caso a curva C seja uma curva fechada, o ponto inicial coincide com o ponto final e o trabalho será nulo.
Usando o teorema de Stokes, pode-se ver que a integral de linha de um campo conservativo não depende do caminho entre os pontos inicial e final. Mais especificamente, conclui-se que:
![{\displaystyle \oint _{\mathcal {C}}\mathbf {v} \cdot d\mathbf {x} =\oint _{\mathcal {C}}\nabla \varphi \cdot d\mathbf {x} =0}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/3796ee826a3bae2023f4fcc82b4f9735a27a1a86)
Dado o campo
calcular o trabalho (
) realizado para deslocar uma partícula de
até
:
Primeiro, verificamos se
é conservativo.
Como
, o campo é conservativo, logo, permite uma função potencial dada por
Logo,
Como o campo é conservativo, o
realizado para deslocar uma partícula independe do caminho C, e é calculado pela diferença de potencial entre
e
Logo,
Se, em mecânica newtoniana, um campo de forças for um campo vetorial conservativo, então, partindo da segunda lei de Newton e usando a regra da cadeia, podemos escrever:
![{\displaystyle \mathbf {F} =m{\frac {d^{2}\mathbf {x} }{dt^{2}}}\Rightarrow -\nabla {V}=m\nabla \left[{\frac {1}{2}}\left({\frac {d\mathbf {x} }{dt}}\right)^{2}\right]\Rightarrow \nabla (V+T)=0\Rightarrow E=cte.}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/92ec726722bdad5d43040815c166d8dc52bf84bf)
onde
é a energia cinética e
é a energia total, que a igualdade acima mostra ser constante.
O conceito de independência de caminho mostra que o trabalho realizado por uma força conservativa em qualquer circuito fechado é sempre igual a zero e que num caminho qualquer só depende dos pontos inicial e final:
![{\displaystyle \displaystyle W=-\Delta {V}}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/a25f4d44af6a4e414e3e1259eb72e751cc84627e)
Alguns exemplos de forças conservativas são:
A força gravitacional sobre um corpo pontual de massa
em
devido a um corpo pontual de massa
em
é:
![{\displaystyle \mathbf {F} =-GmM{\frac {\mathbf {r} -\mathbf {r} ^{\prime }}{|\mathbf {r} -\mathbf {r} ^{\prime }|^{3}}}\Rightarrow V=-GmM{\frac {1}{|\mathbf {r} -\mathbf {r} ^{\prime }|}}}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/9ed50d9614a5f8c387b7ca14e353d2c2ae5715c1)
A força coulombiana, que tem a mesma dependência funcional, também é conservativa, como discutido abaixo.
Uma deformação elástica que obedeça à Lei de Hooke apresenta uma força de restauração conservativa:
![{\displaystyle \mathbf {F} =-k\mathbf {x} \Rightarrow V={\frac {1}{2}}k|\mathbf {x} |^{2}}](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/f764058aa3d28b71df26b496c939dbb6921a0f17)
As equações de Maxwell, especificamente
, mostram que o campo eletroestático é irrotacional e então, nas condições descritas acima, é um campo conservativo, ou seja,
. As curvas de nível do potencial elétrico
são chamadas de curvas equipotenciais. Em particular, a força elétrica
é uma força conservativa.
A relatividade restrita nos mostra que, mesmo abandonando a hipótese de campos estáticos, os campos elétricos e magnéticos podem ser descritos como uma forma fechada. Mas localmente não como a derivada de uma 0-forma e sim de uma 1-forma do espaço de Minkowski. Efeitos como o efeito Aharanov-Bohm mostram que o conceito de potencial é fisicamente mais fundamental que o da sua derivada (neste caso, o campo eletromagnético; para o caso de forças, veja abaixo).
Em mecânica quântica, o conceito de força é abandonado em detrimento do conceito de potencial. Nesse sentido, o potencial passa a ter um papel mais fundamental que a força e todas as interações são consideradas conservativas. Interações dissipativas passam a ser descritas através de sistemas quânticos abertos. A função de onda é calculada através da equação de Schrödinger
![{\displaystyle i\hslash {\frac {\partial \psi }{\partial {t}}}=-{\frac {\hslash ^{2}}{2m}}\nabla ^{2}\psi +V\psi }](https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/530712280cdda5dff8b45f742759218e6c6b8193)
A função de onda para os dois casos de forças potenciais vistas acima são as famosas soluções do átomo de hidrogênio e do oscilador harmônico.
Referências
- ↑ Parágrafo da apostila da Professora Irene Strautch -UFRGS
- ↑ Parágrafo da apostila da Professora Irene Strautch - UFRGS
- Lima, E.L.; (2005). Curso de Análise, vol 2. segunda ed. [S.l.]: IMPA. ISBN 85-244-0049-8
- Nakahara, M.; (2003). Geometry, Topology and Physics. segunda ed. [S.l.]: Taylor & Francis. ISBN 978-0750306065
- Frankel, T.; (2003). The Geometry of Physics: An Introduction. segunda ed. [S.l.]: Cambridge University Press. ISBN 978-0521539272
- Strauch, Irene Strauch (2008). Análise Vetorial em dez aulas. Porto Alegre: Departamento De Matemática Pura e Aplicada - UFRGS