Ecossocialismo

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O ecossocialismo, comunismo solar, ecomarxismo, ou, ainda, leninismo ecológico, é uma ideologia marxista revolucionária que conjuga elementos do socialismo com a ecologia. O ecossocialismo defende que a expansão do sistema capitalista é a causa da exclusão social, da pobreza, da exploração e da degradação ambiental. Devido a isto, os ecossocialistas se opõem ao capitalismo e defendem uma revolução socialista energética e internacionalista de uma sociedade sem classes e sem exploração do capital sobre o homem e do homem sobre a natureza, concebendo a humanidade como parte dela na filosofia marxista[1], rumo à uma sociedade comunista tendo o ecossocialismo como programa de transição.[2][3][4][5]

História[editar | editar código-fonte]

Segundo John Bellamy Foster, os trabalhos de Marx e Engels possuem reflexões ecossocialistas.

1880-1930: Marx, Morris e a influência sobre a Revolução Russa[editar | editar código-fonte]

Ao contrário do que a representação de Karl Marx por alguns ambientalistas, ecologistas sociais e socialistas, como um produtivista que favoreceu a dominação da natureza, os ecossocialistas, relendo os escritos de Marx, acreditam que ele "foi um dos principais precursores da visão ecológica de mundo".[6] Autores ecossocialistas como John Bellamy Foster e Paul Burkett apontam para a discussão, em Marx, de uma "fractura metabólica" entre o homem e a natureza. Além disso, Marx afirma que "a propriedade privada do mundo por indivíduos parecerá completamente absurda, tal como a propriedade privada de um homem por outro" e observa que uma sociedade deve "entregar o mundo às próximas gerações em uma condição melhor". No entanto, outros ecossocialistas consideram que Marx dava para um "reconhecimento da natureza em si e por si", ignorando a sua "receptividade" e tratar a natureza como "sujeito a trabalho desde o início" num "activo relacionamento totalmente". O Marx defendia que o capitalismo não se preocupava com a viabilidade agricultura no longo prazo, se preocupando mais com maiores retornos imediatos de alto risco no setor.[7]

A William Morris, romancista, poeta e desenhista inglês, é geralmente creditado o desenvolvimento de princípios-chave do que mais tarde foi chamado ecossocialismo. Durante os anos 1880 e 1890, Morris promoveu suas ideias ecossocialistas dentro da Federação Social Democrata e da Liga Socialista.

Após a Revolução Russa, alguns ambientalistas e cientistas ambientais tentaram integrar a consciência ecológica para o bolchevismo. Embora tenham conseguido grandes avanços durante o período revolucionário da União Soviética[8], liderada por Lênin, muitas destas pessoas foram posteriormente expurgadas pelo Partido Comunista da União Soviética durante o período stalinista[8].

1970-1990: Emergência do ambientalismo e engajamento com o marxismo e o "socialismo realmente existente"[editar | editar código-fonte]

Após longos debates e surgimento de vertentes do ambientalismo na segunda metade do século XX, a temática ambiental começa a se fixar de diferentes formas dentro de grupos socialistas, sendo cada vez mais central.

Em 1970, Barry Commoner, sugerindo uma resposta pela esquerda ao documento "Limits to Growth" (limites ao crescimento) que apresentava uma previsão catastrófica de esgotamento de recursos naturais e que incentivou o ambientalismo, postulou que as tecnologias capitalistas foram as principais responsáveis pela degradação ambiental, em oposição à visão neo-malthusiana que imputava a degradação ambiental a pressões derivadas do crescimento da população mundial.[9] Já o escritor dissidente alemão-oriental, e ativista Rudolf Bahro, publicou livros que abordaram a relação entre o socialismo e a ecologia[10][11] - "A alternativa - Crítica ao Socialismo Realmente Existente" - que promoveu um "partido novo" e levou à sua prisão, com o que ganhou notoriedade internacional.

A chave do desenvolvimento do ecossocialismo na década de 1980 foi a criação da revista "Capitalism, Nature, Socialism" com James O'Connor sendo fundador e responsável pela primeira edição em 1988. Os debates que se seguiram levaram a uma série de trabalhos teóricos por O'Connor, Carolyn Merchant, Paul Burkett e outros.

Na Austrália, o Partido Democrata Socialista lançou o semanário da esquerda verde (Green Left Weekly) em 1991, após um período de trabalho conjunto com a Aliança Verde e o Partido Verde na área da formação. Esta cooperação cessou quando os verdes australianos adoptaram uma política de proscrição de outros grupos políticos, em agosto de 1991. O DSP também publicou uma resolução política global, "Socialismo e Sobrevivência Humana" em forma de livro em 1990, com uma segunda edição ampliada em 1999 intitulada "Ambiente, Capitalismo e Socialismo".[12]

Década de 1990 em diante: engajamento com o movimento antiglobalização e o "Manifesto Ecossocialista"[editar | editar código-fonte]

Michael Löwy é uma grande referência ecossocialista no Brasil e no mundo.

A década de 1990 viu as feministas socialistas Mary Mellor[13] e Ariel Salleh[14] abordarem as questões ambientais dentro de um paradigma ecossocialista. Com o crescente perfil do movimento antiglobalização no Sul Global, um "ambientalismo dos pobres", combinando consciência ecológica e justiça social, também se tornou proeminente.[15] David Pepper também lançou seu importante trabalho, Ecosocialism: From Deep Ecology to Social Justice, em 1994, que critica a abordagem atual de muitos dentro da política verde, particularmente "ecologistas profundos".[16]

Em 2001, Joel Kovel, cientista social, psiquiatra e ex-candidato à indicação presidencial do Partido Verde dos Estados Unidos (GPUS) em 2000, e Michael Löwy, antropólogo e membro da Quarta Internacional Reunificada (referenciada também como "Internacional Ecossocialista"[17]), lançou "Um Manifesto Ecossocialista", que foi adotado por algumas organizações e sugere possíveis rotas para o crescimento da consciência ecossocialista.[18] O trabalho de Kovel de 2002, "The Enemy of Nature: The End of Capitalism or the End of the World?",[19] é considerado por alguns como a exposição mais atualizada do pensamento ecossocialista.[20]

Em outubro de 2007, a Rede Ecossocialista Internacional foi fundada em Paris.[21]

Em maio de 2024 aconteceu o 1° Encontro Ecossocialista Latino-Americano e Caribenho junto com o 6° Encontro Ecossocialista Internacional, em Buenos Aires[22], que contou com a presença de várias personalidades ecossocialistas brasileiras e mundiais.

Também em maio de 2024, o Comitê Internacional da Quarta Internacional Reunificada aprovou o texto de seu Manifesto Ecossocialista[17] para ser debatido em seu próximo congresso mundial, incorporando ainda mais os debates do ecossocialismo na sua organização.

Brasil[editar | editar código-fonte]

Partidos políticos[editar | editar código-fonte]

Chico Mendes foi um conhecido ecossocialista brasileiro.[23]

O Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) acumula, atualmente, o maior número de organizações e atividades ecossocialistas no Brasil[24][25]. Suas atividades são organizadas na setorial ecossocialista do partido[26], sendo o único que possui uma setorial exclusiva para essa ideologia, e em algumas correntes internas, como o Movimento Esquerda Socialista[27] e outras. Algumas de suas juventudes, como o coletivo Juntos! (Movimento Esquerda Socialista), coletivo Pajeú! (Ação Popular Socialista), Afronte! (Resistência) e RUA - Juventude Anticapitalista (Insurgência) são alguns exemplos de organizações ecossocialistas atuantes no movimento social e movimento estudantil no Brasil. O partido possui quadros ecossocialistas de destaque na política brasileira, como Renato Roseno, Nadja Carvalho, Fernanda Melchionna, Simone Nascimento, Talíria Petrone e Gabriel Aguiar. Seus grandes apoiadores são Sabrina Fernandes[28], ex-militante do Subverta[29] e Michael Löwy[30][31].

O Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU) é um partido trotskista que admite o ecossocialismo em seu programa[32][33][34], sendo atualmente o único partido brasileiro oficialmente ecossocialista[32].

O Partido dos Trabalhadores (PT), foi o primeiro partido politico a promover reflexões e debates sobre o ecossocialismo, por intermédio de uma secretaria partidária denominada de Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável - SEMAD. São considerados militantes políticos e ambientalistas históricos no âmbito do ecossocialismo no Brasil, os quais na época estavam filiados ao PT: Carlos Minc, Nilo Diniz, Mauricio Laxe, Mauricio Waldman, Calor Walter Porto Gonçalves, Rosalvo Junior, João Bosco Senra, Fernando Ferro e Gilney Viana.

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 possui cláusulas com esse tipo de ideologia na parte de meio ambiente, que antes era um bem econômico.[35]

Movimentos sociais[editar | editar código-fonte]

Manifestante segurando placa com escritos "Mude o sistema, não mude o clima"

Recentemente, a organização Fridays for Future do Brasil tem se aproximado de setores ecossocialistas, principalmente de correntes ecossocialistas do PSOL.[36] No plano internacional, Greta Thunberg, líder do movimento Fridays for Future, tem ressoado gritos dos manifestantes climáticos ao redor do mundo por uma mudança de sistema para salvar o clima, ainda que não seja falada de maneira explicita a mudança defendida.[37]

Lista de Ecossocialistas[editar | editar código-fonte]

No Brasil[editar | editar código-fonte]

No exterior[editar | editar código-fonte]

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  • Karl Marx’s Ecosocialism: Capital, Nature, and the Unfinished Critique of Political Economy - Kohei Saito[38]
  • A ecologia de Marx: materialismo e natureza - John Bellamy Foster[39]
  • O que é o Ecossocialismo? - Michael Löwy[40]
  • Ecosocialism: A Radical Alternative to Capitalist Catastrophe - Michael Löwy[41]
  • Ecosocialismo negroafricano e indoamericano - Andrés Bansart
  • Ecossocialismo: Uma Utopia Concreta: Estudo das correntes ecossocialistas na França e no Brasil - Arlindo Rodrigues
  • Red-Green Revolution: The Politics and Technology of Ecosocialism - Victor Wallis[42]
  • Ecosocialismo: La alternativa radical a la catástrofe ecológica capitalista - Michael Löwy
  • Se quiser mudar o mundo: Um guia político para quem se importa - Sabrina Fernandes
  • Half-Earth Socialism: A Plan to Save the Future from Extinction, Climate Change and Pandemics - Troy Vettese e Drew Pendergrass

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. em: 13/06/2020 12h14, Modificado (13 de junho de 2020). «Marx e a ruptura no metabolismo universal da natureza». Esquerda Online. Consultado em 15 de maio de 2024 
  2. Santos, João Vitor. «Revolução ecossocialista e o desafio de não ceder à resignação». www.ihuonline.unisinos.br. Consultado em 15 de maio de 2024 
  3. Löwy, Michael (abril de 2013). «Crise ecologica, crise capitalista, crise de civilização: a alternativa ecossocialista». Caderno CRH: 79–86. ISSN 0103-4979. doi:10.1590/S0103-49792013000100006. Consultado em 8 de janeiro de 2022 
  4. Kovel, J.; Löwy, M. (Setembro de 2001). An ecosocialist manifesto. [S.l.: s.n.] 
  5. Löwy, Michael. «Ecossocialismo e planejamento democrático» 
  6. Karl Marx, radical environmentalist
  7. Marx, Karl. [1867] 1998. Marx Engels Collected Works Vol. 37 (Capital, Vol. 3). New York: International Publishers, p. 611
  8. a b «O terceiro período da ecologia soviética e a crise planetária». LavraPalavra. 6 de março de 2020. Consultado em 16 de maio de 2024 
  9. Commoner, Barry (1972). The closing circle: confronting the environmental crisis. London,: Cape. OCLC 348035 
  10. Bahro, Rudolf (1978). The alternative in Eastern Europe. [London]: NLB. OCLC 4623954 
  11. Bahro, Rudolf (1982). Socialism and survival : (articles, essays, and talks, 1979-1982). London: Heretic Books. OCLC 9361134 
  12. Environment, capitalism & socialism. Sydney: Resistance Books. 1999. OCLC 44894415 
  13. Mellor, Mary (1992). Breaking the boundaries : towards a feminist green socialism. London: Virago. OCLC 27687422 
  14. Salleh, Ariel (2017). Ecofeminism as politics nature, Marx and the postmodern Second edition ed. London, England: [s.n.] OCLC 1259448898 
  15. Guha, Ramachandra (1997). Varieties of environmentalism : essays North and South. Juan Martínez Alier. London: Earthscan Publications. OCLC 37262006 
  16. Pepper, David (1993). Eco-socialism : from deep ecology to social justice. London: Routledge. OCLC 252779182 
  17. a b «Draft Manifesto of Revolutionary Marxism in the Age of Capitalist Ecological and Social Destruction». Fourth International (em inglês). Consultado em 15 de maio de 2024 
  18. www.greenleft.org.uk http://www.greenleft.org.uk/. Consultado em 30 de setembro de 2021  Em falta ou vazio |título= (ajuda)
  19. Kovel, Joel (2002). The enemy of nature : the end of capitalism or the end of the world?. London: Zed Books. OCLC 48449635 
  20. Wall, Derek (2005). Babylon and beyond : the economics of anti-capitalist, anti-globalist, and radical green movements. London: Pluto Press. OCLC 666935260 
  21. Horstink, Lanka; Fernandes, Lúcia; Campos, Rita (15 de dezembro de 2020). «Introdução». e-cadernos CES (34). ISSN 1647-0737. Consultado em 30 de setembro de 2021 
  22. «International Ecosocialist Encounters». Consultado em 15 de maio de 2024 
  23. Löwy, Michael (2019). O que é o Ecossocialismo. [S.l.]: Cortez. ISBN 9788524922091 
  24. «É preciso frear o sistema: ecossocialismo é solução estratégica no combate à crise climática no Brasil e no mundo». PSOL 50. 28 de setembro de 2021. Consultado em 16 de maio de 2024 
  25. 2020AdminSP (17 de março de 2017). «A QUESTÃO ECOSSOCIALISTA». PSOL SP. Consultado em 16 de maio de 2024 
  26. «Setorial Ecossocialista do PSOL lança documento de propostas ambientais para o Brasil». PSOL 50. 3 de outubro de 2019. Consultado em 15 de maio de 2024 
  27. «Ecossocialismo ou extinção!». Revista Movimento. Consultado em 15 de maio de 2024 
  28. «Conheça Sabrina Fernandes, a anti-Olavo». Época. 21 de fevereiro de 2019. Consultado em 5 de julho de 2020 
  29. «Se quiser mudar o mundo, vem junto». Trip. Consultado em 16 de maio de 2024 
  30. «Michael Löwy critica Rio+20 e a propaganda da 'economia verde'»  Caros Amigos, 23 de março de 2012
  31. «Ecossocialismo. Por uma ecologia socialista.»  Entrevista especial com Michael Löwy. IUH - Unisinos, 22 de fevereiro de 2011.
  32. a b Cruz, Diego (10 de junho de 2010). «Um programa ecossocialista». PSTU. Consultado em 16 de maio de 2024 
  33. «Arquivos Ecossocialismo». PSTU. 26 de março de 2020. Consultado em 16 de maio de 2024 
  34. Cruz, Diego (1 de novembro de 2011). «Michel Löwy: "As coisas não serão como antes"». PSTU. Consultado em 16 de maio de 2024 
  35. «Saiba o que mudou com a Constituição de 1988» 
  36. «Movimentos Parceiros». Jovens pelo Clima. Consultado em 13 de dezembro de 2022 
  37. Cannon, Sheila M. «Climate strikes: Greta Thunberg calls for 'system change not climate change' – here's what that could look like». The Conversation (em inglês). Consultado em 15 de dezembro de 2022 
  38. Saitō, Kōhei, 1987-. Karl Marx's ecosocialism: capitalism, nature, and the unfinished critique of political economy. New York: [s.n.] OCLC 1003193200 
  39. Foster, John Bellamy. (2000). Marx's ecology: materialism and nature. New York: Monthly Review Press. OCLC 823170281 
  40. LÖWY, Michael (2014). O que é o Ecossocialismo?. [S.l.]: Cortez. 128 páginas 
  41. Löwy, Michael, 1938- (2015). Ecosocialism: a radical alternative to capitalist catastrophe. Chicago, Illinois: Haymarket Books. OCLC 907942412 
  42. Wallis, Victor, 1938-. Red-Green revolution: the politics and technology of ecosocialism. Toronto, Canada: [s.n.] OCLC 1042355283 

Ligações externas[editar | editar código-fonte]