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Mobbing

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Vários corvos-americanos (Corvus brachyrhynchos) praticando mobbing num bútio-de-cauda-vermelha (Buteo jamaicensis).

Mobbing, também chamado de "comportamento de tumulto", é uma expressão técnica, utilizada no estudo do comportamento de animais, especialmente em ornitologia. O termo faz referência a um conjunto de comportamentos apresentados por animais contra um possível predador ou um animal que represente perigo, esteja ele ativamente caçando no momento ou não. Identifica uma postura antipredatória agressiva, quando a espécie é ameaçada [1].

No contexto das relações humanas, mobbing corresponde a uma forma de bullying [2] ou de assédio moral. A diferença é que é cometido nas relações entre adultos. As mais comuns são nas relações laborais (mobbing laboral), comerciais e de vizinhança (mobbing imobiliário).

Na ecologia[editar | editar código-fonte]

O comportamento[editar | editar código-fonte]

Geralmente, o comportamento é caracterizado por um ou mais indivíduos que fazem aproximações direcionadas e bruscas a uma potencial ameaça. Esta formação pode ser composta por indivíduos de uma única espécie ou mesmo por grupos mistos, que envolvem indivíduos de espécies diferentes cooperando no comportamento de tumulto.

As características deste comportamento variam, principalmente entre espécies, mas pode-se observar chamados à distância, a realização de movimentos repetitivos de aproximação e afastamento, com rápidas mudanças de posição, podendo evoluir de uma simples inspeção do predador, até a perseguição e ataque físico, incluindo ações como mergulhar sobre ele, bater, morder ou picar [3] . O mobbing pode resultar na expulsão do predador da vizinhança ou na fuga das presas para um local seguro.

As descrições mais comuns são voltadas para aves, mas tal comportamento parece ter surgido independentemente em vários táxons ao longo do processo evolutivo[4], e ao longo dos anos passou-se a estudar essa interação para outros grupos, nos quais as vocalizações e movimentos repetitivos de aproximação e afastamento podem estar ausentes. Assim, são encontrados registros de “mobbing” para espécies de mamíferos, peixes, répteis e insetos.

Algo interessante é que mobbing pode ser inato ou aprendido. Semelhante a outros comportamentos antipredadores, ambos os modos de aquisição foram observados, mesmo para diferentes predadores dentro da mesma espécie. Além disso, as respostas aos predadores e ao próprio comportamento de mobbing de outros grupos também podem diferir. Essas diferenças provavelmente refletem se os jovens de uma espécie podem observar e aprender sobre o perigo que um predador representa sem serem atacados por ele [3]. Em algumas espécies, jovens inexperientes engajam-se no comportamento de mobbing independentemente da presença de indivíduos mais experientes, como esquilos terrestres da Califórnia (Spermophilus beecheyi) ou o cão da pradaria de rabo preto (Cynomys ludovicianus) [5][6], enquanto em outras, os jovens não se engajam no comportamento, pelo menos inicialmente, mas observam outros fazendo, como o chapim-azul (Cyanistes caeruleus) [7]. Essa variação pode refletir custos mais elevados de mobbing para indivíduos jovens do que para indivíduos mais velhos, uma vez que eles são fisicamente menos capazes e coordenados do que os adultos.

O comportamento em diferentes grupo[editar | editar código-fonte]

Aves[editar | editar código-fonte]

Pode ser visto em diversas famílias e o repertório comportamental é vasto e variado. É nesse grupo que se há mais registros e informações sobre esse comportamento. Agregam-se em volta do predador, aproximando-se e afastando-se, e às vezes até mesmo perseguindo-o e atacando-o, seja com contato físico, defecando ou regurgitando sobre o alvo. Elas também podem emitir vocalizações altas e repetidas, que geralmente atraem outros indivíduos, inclusive de outras espécies de presas em potencial, formando grupos heteroespecíficos, também chamados de bandos mistos.[8]

Mamíferos

Registros na literatura, sobre este grupo, são mais vastos para esquilos de chão, da tribo Marmotini, contra serpentes. Entretanto, o termo utilizado para o comportamento pode variar, dependendo da espécie analisada e dos pesquisadores, entre mobbing, harassment e confronto. [9]

Mobbing é o termo usado, em geral, quando primatas reagem se aproximando de potenciais predadores vocalizando repetidamente, às vezes perseguindo e atacando-os.[10] Outras interações desse tipo são observados entre quatis e jiboia, suricates (Suricata suricatta) e serpentes[11], Sciurus ingrami e um gato-maracajá (Leopardus wiedii) [12]

Peixes

Neles, observa-se mobbing, principalmente, como reação de algumas espécies contra quando um potencial predador se aproxima do seu habitat ou ninho.

Pode ocorrer manobras do cardume em torno do alvo, seguir de perto o alvo por um período, perseguição e ataques com mordiscadas[13] [14]. Algumas espécies também exibem posturas corporais e movimentos repetidos com suas nadadeiras e aproximação e afastamento em relação ao alvo.

Emissões acústicas também foram descritas em uma caso especial de “mobbing”, quando o território de um indivíduo da espécie Holocentrus rufus foi invadido por uma moreia[15].

Nesse grupo, também pode ser iniciada por um único indivíduo ou um grupo, e pode haver cooperação de indivíduos de outras espécies.

Insetos

Estudos utilizaram o termo mobbing para descrever o comportamento de abelhas em torno de intrusos em sua colônia. Elas se reunem ao redor deles e atacam-no fisicamente[16][17].

Importância ecológica

Estudos e ocorrência desse comportamento no Brasil

Não existe uma tradução padronizada do termo “mobbing” para a língua portuguesa quando se trata de comportamento animal. Dessa forma, os estudos publicados em português, que são escassos, emprestam o termo do inglês ou empregam termos usados em espanhol que também são encontrados na língua portuguesa, como “tumulto”[18][19] , apesar de não ser considerado por muitos pesquisadores o mais expressivo. Essa falta de padronização acaba dificultando a comunicação, principalmente com o público leigo, no nosso país. Alguns dos termos utilizados no nosso país são: tumulto, mobilização, molestamento, turbação e assédio[20].

Para ter-se registros sobre eventos deste tipo no Brasil, os "birdwatchers" são uma fonte de informações valiosas. Da Cunha e Fontenelle (2014) analisaram as características de comportamento de tumulto de aves no Brasil através de informações plotadas por observadores de aves na plataforma WikiAves.

Neste trabalho, o maior número de registros foi na região Sul e Sudeste, que reflete as regiões que também mais utilizam a plataforma, assim como nas quais a atividade de "birdwatching" é mais disseminada.

Predadores

Foram feitos 62 registros, nos quais foram identificados 22 animais diferentes como alvos, sendo 19 aves, 1 mamífero e 2 répteis.

Dos 62 registros: 16 eram gavião-carrapateiro (Milvago chimachima; Falconiformes: Falconidae), 8 eram caracará (Caracara plancus; Falconiformes: Falconidae), 7 gavião-carijó (Rupornis magnirostris; Accipitriformes: Accipitridae) , 5 caburé (Glaucidium brasilianum; Strigiformes: Strigidae)

Alguns que antes nunca tinham sido observados como alvo de tumulto no Brasil: o lagarto teiú (Tupinambis sp.; Teiidae) e a jiboia (Boa constrictor; Boidae). Registrou-se também um registro de tumulto contra o mico (Callithrix sp.; Callitrichidae).

Tumultuadores

Apenas aves foram registradas, de 15 espécies diferentes

A maioria da ordem Passeriformes (41), com as espécies de tesourinha (Tyrannus savana), sabiá-do-campo (Mimus saturninus), suiriri (Tyrannus melancholicus) e o bem-te-vi (Pitangus sulphuratus)

Outras ordens que foram registradas foram: Charadriiformes (5), Apodiformes (4), Cuculiformes (1), Falconiformes (1), Gruiformes (1), Psittaciformes (1).

Confrontos

Foram observados 50 pares de tumultuadores-predadores diferentes, sendo que a maioria (40 deles) foi registrada uma única vez, e o encontro mais comum foi entre gavião-carrapateiro (predador)e sabiá-do-campo (tumultuador) (9,6% dos eventos).

Pelos registros de comportamento de tumulto na plataforma WIkiAves foi possível casos desse evento que antes só haviam sido registrados fora do país, como o tumulto contra lagartos[21] e serpentes.

Notas e Referências

  1. Mobbing Royal Society for Protection of Birds, UK, website
  2. vítima de “mobbing” ganha equiparação salarial[ligação inativa], Rondônia Jurídico, acessado em 29 de setembro de 2011
  3. a b Carlson, Nora V.; Griesser, Michael (1 de janeiro de 2022). Healy, Susan; Podos, Jeffrey, eds. «Chapter One - Mobbing in animals: A thorough review and proposed future directions». Academic Press: 1–41. doi:10.1016/bs.asb.2022.01.003. Consultado em 5 de junho de 2024 
  4. Altmann, Stuart A. (julho de 1956). «Avian Mobbing Behavior and Predator Recognition». The Condor (4): 241–253. ISSN 0010-5422. doi:10.2307/1364703. Consultado em 8 de junho de 2024 
  5. Owings, Donald H.; Coss, Richard G. (1977). «Snake Mobbing by California Ground Squirrels: Adaptive Variation and Ontogeny». Behaviour (1/2): 50–69. ISSN 0005-7959. Consultado em 8 de junho de 2024 
  6. Owings, Donald H.; Owings, Sharon C. (26 de abril de 2010). «Snake-directed Behavior by Black-tailed Prairie Dogs (Cynomys ludovicianus)». Zeitschrift für Tierpsychologie (em inglês) (1): 35–54. doi:10.1111/j.1439-0310.1979.tb00272.x. Consultado em 8 de junho de 2024 
  7. Carlson, Nora V.; Healy, Susan D.; Templeton, Christopher N. (julho de 2020). «Wild fledgling tits do not mob in response to conspecific or heterospecific mobbing calls». Ibis (em inglês) (3): 1024–1032. ISSN 0019-1019. doi:10.1111/ibi.12754. Consultado em 8 de junho de 2024 
  8. Siqueira, Leandro de Castro (dezembro de 2014). «Proposta de tradução do termo mobbing para o português». Revista de Etologia (2): 38–47. ISSN 1517-2805. Consultado em 8 de junho de 2024 
  9. Owings, Donald; Coss, Richard; McKernon, Diane; Rowe, Matthew; Arrowood, Patricia (1 de janeiro de 2001). «SNAKE-DIRECTED ANTIPREDATOR BEHAVIOR OF ROCK SQUIRRELS (SPERMOPHILUS VARIEGATUS): POPULATION DIFFERENCES AND SNAKE-SPECIES DISCRIMINATION». Behaviour (em inglês) (5): 575–595. ISSN 0005-7959. doi:10.1163/156853901316924485. Consultado em 8 de junho de 2024 
  10. Bartecki, Ursula; Heymann, Eckhard W. (11 de setembro de 2008). «Field Observation of Snake-Mobbing in a Group of Saddle-Back Tamarins, Saguinus fuscicollis nigrifrons». Folia Primatologica (3-4): 199–202. ISSN 0015-5713. doi:10.1159/000156296. Consultado em 8 de junho de 2024 
  11. Graw, Beke; Manser, Marta B. (setembro de 2007). «The function of mobbing in cooperative meerkats». Animal Behaviour (3): 507–517. ISSN 0003-3472. doi:10.1016/j.anbehav.2006.11.021. Consultado em 8 de junho de 2024 
  12. Alberto Solórzano-Filho, Jorge (1 de janeiro de 2006). «Mobbing of Leopardus wiedii while hunting by a group of Sciurus ingrami in an Araucaria forest of Southeast Brazil / Assaillir du Leopardus wiedii tandis que chasse par un groupe de Sciurus ingrami dans une forêt d'Araucaria de sud-ouest au Brésil». Mammalia (1-2). ISSN 0025-1461. doi:10.1515/MAMM.2006.031. Consultado em 8 de junho de 2024 
  13. Dominey, Wallace J. (1983). «Mobbing in Colonially Nesting Fishes, Especially the Bluegill, Lepomis macrochirus». Copeia (4): 1086–1088. ISSN 0045-8511. doi:10.2307/1445113. Consultado em 8 de junho de 2024 
  14. Donaldson, Terry J. (1984). «Mobbing Behavior by Stegastes albifasciatus (Pomacentridae), a TerritorialMosaic Damselfish». Japanese Journal of Ichthyology (3): 345–348. doi:10.11369/jji1950.31.345. Consultado em 8 de junho de 2024 
  15. Winn, Howard E.; Marshall, Joseph A.; Hazlett, Brian (1964). «Behavior, Diel Activities, and Stimuli That Elicit Sound Production and Reactions to Sounds in the Longspine Squirrelfish». Copeia (2): 413–425. ISSN 0045-8511. doi:10.2307/1441036. Consultado em 8 de junho de 2024 
  16. Breed, Michael D.; Guzmán-Novoa, Ernesto; Hunt, Greg J. (janeiro de 2004). «D EFENSIVE B EHAVIOR OF H ONEY B EES : Organization, Genetics, and Comparisons with Other Bees». Annual Review of Entomology (em inglês) (1): 271–298. ISSN 0066-4170. doi:10.1146/annurev.ento.49.061802.123155. Consultado em 8 de junho de 2024 
  17. Fuchs, Stefan; Tautz, Jürgen (2011). Hepburn, H. Randall; Radloff, Sarah E., eds. «Colony Defence and Natural Enemies». Berlin, Heidelberg: Springer (em inglês): 369–395. ISBN 978-3-642-16422-4. doi:10.1007/978-3-642-16422-4_17. Consultado em 8 de junho de 2024 
  18. Doran, Patrick J.; Gulezian, Paul Z.; Betts, Matthew G. (julho de 2005). «A test of the mobbing playback method for estimating bird reproductive success». Journal of Field Ornithology (3): 227–233. ISSN 0273-8570. doi:10.1648/0273-8570-76.3.227. Consultado em 8 de junho de 2024 
  19. Motta-Junior, José Carlos (2007). «Ferruginous Pygmy-owl (Glaucidium brasilianum) predation on a mobbing Fork-tailed Flycatcher (Tyrannus savana) in south-east Brazil». Biota Neotropica (em inglês): 321–324. ISSN 1676-0611. doi:10.1590/S1676-06032007000200038. Consultado em 8 de junho de 2024 
  20. Siqueira, Leandro de Castro (dezembro de 2014). «Proposta de tradução do termo mobbing para o português». Revista de Etologia (2): 38–47. ISSN 1517-2805. Consultado em 8 de junho de 2024 
  21. Kaplan, Gisela; Johnson, Gayle; Koboroff, Adam; J. Rogers, Lesley (24 de abril de 2009). «Alarm Calls of the Australian Magpie (Gymnorhina tibicen): Predators Elicit Complex Vocal Responses and Mobbing Behaviour». The Open Ornithology Journal (1). doi:10.2174/1874453200902010007. Consultado em 8 de junho de 2024 

Ligações externas[editar | editar código-fonte]

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