Mostrar código-fonte de Civilização cartaginesa

{{Ver desambig|redir=Púnico|outros significados|Púnico (desambiguação)|a cidade que deu o nome à civilização|Cartago}}
{{Info/Estado extinto2
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|nome          =Civilização cartaginesa
|outro_nome    =𐤒𐤓𐤕𐤟𐤇𐤃𐤔𐤕 • {{lang|ar|''Qart-ḥadašt''}}
|era           =[[Idade Antiga|Antiguidade]]
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|evento_início =Fundação de Cartago
|evento1     =Primeiro tratado com [[Roma Antiga|Roma]]
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|mapa_legenda   =Territórios cartagineses ou sob influência de Cartago {{AC|c=c|270}}, antes da Primeira Guerra Púnica
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|mapa2_legenda  =Reconstrução computadorizada da cidade de [[Cartago]]
|região1_rótulo =Regiões
|região1        =[[Bacia do Mediterrâneo]] ([[Norte de África]] e {{nowrap|[[Europa meridional|Sudoeste da Europa]])}}
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|título_líder     =Líder: [[rei]] {{nobold|(inicialmente), posteriormente}} [[sufete]]
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}}
A '''civilização cartaginesa''' ou '''civilização púnica'''{{
nre|
1="Púnico" significa "fenício" em [[latim]]; por sua vez "fenício" deriva do {{ling|el}} {{Transl2|el||Φοινικήϊος|&#32;(|''Phoinikếïos''}}), um termo fortemente ligado à palavra grega para [[Púrpura tíria|púrpura]] ({{lang|el|φοῖνιξ}}; ''phoĩnix''), um dos produtos em que os fenícios eram especialistas e pelo qual eram famosos. No entanto, alguns autores discordam que os termos "púnico" e "fenício" sejam sinónimos. Por sua vez, Cartago deriva do {{ling|phn}} {{lang|phn|''Qart-ḥadašt''}}{{sfn|Lillo Carpio|1992}} ("cidade nova").{{sfn|name=m2001_57|Moscati|2001|p=57}}
}} foi uma [[civilização]] da [[Idade Antiga|Antiguidade]] que se desenvolveu na [[Bacia do Mediterrâneo]] entre o fim do {{-séc|IX}} e meados do {{-séc|II}} e esteve na origem de uma das maiores potências comerciais e militares do seu tempo.

[[Cartago]], a cidade que lhe deu o nome, foi fundada na costa do [[golfo de Tunes]] pelos [[fenícios]], segundo a tradição mais usual, em {{AC2|814|x}} Cartago foi gradualmente ganhando ascendente sobre as cidades fenícias do [[Mediterrâneo Ocidental]], antes de se desenvolver a sua própria civilização. Esta é menos conhecida que a da sua contemporânea e rival [[Roma Antiga|Roma]], devido à destruição de Cartago pelo [[exército romano]] no fim da [[Terceira Guerra Púnica]], em {{AC|146}}, um final que é relatado pelas fontes [[Mundo greco-romano|greco-romanas]] que foram extensamente usadas e difundidas de forma durável na [[historiografia]] posterior. Apesar de depreciada pela expressão latina ''{{ilc|nl=s|punica fides}}'', que denota o preconceito originado por uma longa tradição de desconfiança em relação aos fenícios desde [[Homero]], a civilização cartaginesa [[Nascimento|suscitou]], contudo, algumas opiniões mais favoráveis, como a de [[Apiano]],{{
nre|
1=''«Pelo seu poderio, eles igualaram os Gregos, pela sua riqueza, os [[Império Aquemênida|Persas]]»''. [[Apiano]] ''in Libyca'', 2.
}} que os comparou aos gregos em poderio e aos [[Império Aquemênida|Persas]] em riqueza.

A civilização cartaginesa resultou da mistura da cultura indígena dos [[berberes]] do [[Norte de África]] com a dos [[Colónia|colonos]] [[Fenícia|fenícios]].{{
nre|
1=''«Os cartagineses não eram apenas fenícios que se foram instalar a oeste, como se tem dito usualmente. Muitos dados levam a que se lhes reconheça uma especificidade [...] Na realidade, a civilização cartaginesa é produto de uma hibridação. O elemento fenício misturou-se com o elemento autóctone, que aparece sob o nome de '{{ilc||libu|R'bw|Lbou|Libou|Lebu (povo)|Lebu (Antiguidade)|Rebu (povo)|Rebu (Antiguidade)|owl=en|owa=Libu}}' ("os líbios").» — M’hamed Hassine Fantar {{Harvy|sciv|Fantar|2008|p=25}}
}} Por isso não é fácil distinguir aquilo que se deve aos cartagineses e aquilo que se deve aos fenícios nos achados [[Arqueologia|arqueológicos]] descobertos nas [[Escavação|escavações]],{{sfn|Moscati|1971|p=174}} cujo [[dinamismo]] desde os anos 1970 abriu vastos campos de estudo onde é evidenciada uma unidade na civilização não obstante a existência de particularidades locais. Apesar dos progressos, muitos aspectos da civilização não material permanecem desconhecidos, devido à natureza das fontes disponíveis, sempre secundárias, pois toda a [[Literatura fenício-púnica|literatura púnica]] desapareceu, com lacunas frequentemente subjetivas.

==História==

===Das origens até ao {{-séc|V}}===
====Fenícios em África====
As primeiras instalações permanentes fenícias no Norte de África são muito precoces, apesar de provavelmente aquela região não ser mais do que uma simples etapa na rota dos metais da [[Península Ibérica]].{{sfn|name=m2001_47|Moscati|2001|p=47}}{{
nre|
1=Segundo [[Diodoro Sículo]], a Península Ibérica era a região mais rica em minas de prata, mas os nativos não sabiam usar o metal, o que foi aproveitado pelos fenícios, que o levavam para vender na Grécia e na Ásia com grande lucro. Além de prata, os fenícios obtinham na Ibéria também [[estanho]], [[cobre]] e [[ouro]] (este último também em África).<ref name=m2001_47/>
}} Por exemplo, [[Útica]], situada a noroeste de Cartago, foi fundada em {{AC|1101|x}} segundo [[Plínio, o Velho]].{{Harvy|plinio|Plínio, o Velho|loc=XVI, 216}} No {{-séc|XII}} teriam sido também fundados os assentamentos de [[Gades]] (ou Gadir),{{
nre|nome=gades|
1=Gades ou Gadir, chamada Didýme pelos gregos, deu origem à cidade atual de [[Cádis]].
}}{{Harvy|mvel|Marco Veleio Patérculo|loc=Livro I, 2, 3}} no sul de [[Espanha]], e [[Lixo (cidade)|Lixo]],{{Harvy|plinio|Plínio, o Velho|loc=XIX, 63}}{{
nre|
1=Lixo ou Lixus situava-se na foz do [[rio Lucos]], junto ao que é hoje [[Larache]].
}} em [[Marrocos]], a primeira em {{AC|1110|x}} e a última ainda antes disso.<ref name=m2001_47/>

A data de fundação de Cartago por [[Dido]] (ou Elissa), uma princesa de [[Tiro]], irmã do rei [[Pigmalião de Tiro|Pigmalião]] {{-nwrap|r.|814|803}}<ref name=m2001_57/> foi sempre objeto de debate, não apenas durante a Antiguidade, mas também nos nossos dias. Existem duas tradições antigas que se confrontam. A mais difundida que chegou aos nossos dias em fragmentos de [[Timeu de Tauroménio]] reutilizados por outros autores, situa a fundação de Cartago em {{AC|814|x}}<ref name=f82/> A outra lenda coloca a criação de Cartago em redor da [[Guerra de Troia]] ({{ca.|{{-séc|XIII}}}}), uma tradição que é retomada por [[Apiano]].{{Harvy|api|Apiano|loc=Livro I, 1}}

As escavações arqueológicas não revelaram nenhuma data tão antiga, pelo que alguns historiadores puseram a hipótese de a fundação ser bastante mais tardia ({{AC|c=c|670}}). Segundo Pierre Cintas, antes de surgir uma cidade propriamente dita, existiu um simples [[entreposto]] mercantil. Os historiadores mais recentes baseiam-se na análise dos anais de Tiro,<ref name=m2001_57/> usados com fonte por [[Menandro]] {{-nwrap|c.|342|291}} e [[Flávio Josefo]] {{+nwrap|c.|37|100}}, para aceitar uma datação em redor do último quartel do {{-séc|IX}}, a qual é coerente com [[Datação por radiocarbono|datações por radiocarbono]] dos níveis arqueológicos mais antigos de Cartago, que apontam para o período entre 835 e {{AC|800|x}}{{sfn|Aubet|2008|p=179}} A partir da década de 1980, a hipótese da fundação de Cartago em 814 ou {{AC|813|x}} era considerada como bastante plausível pela maioria dos historiadores, pelo menos segundo Sabatino Moscati.{{sfn|Moscati|2001|p=48-51}}

====Substrato líbio====
À época das primeiras instalações fenícias, o Norte de África era ocupada por populações [[Antiga Líbia|líbias]] importantes, cuja continuidade com os [[berberes]] do [[Magrebe]] foi defendida por [[Gabriel Camps]]. Foi considerado que existia um hiato cronológico demasiado grande e sobretudo vagas de invasões sucessivas demasiado numerosas para não terem marcado as populações locais de forma durável. Os [[Antigo Egito|egípcios]] mencionam os líbios com o nome de ''{{ilc||libu|R'bw|Lbou|Libou|Lebu (povo)|Lebu (Antiguidade)|Rebu (povo)|Rebu (Antiguidade)|owl=en|owa=Libu}}'' ou ''lebu'' desde o {{-séc|XII}} como sendo os povos que viviam imediatamente a ocidente do seu território.{{Carece de fontes|hist-af|data=março de 2013}}

A origem das populações líbias foi relatada por um numerosas lendas e tradições, mais ou menos fantasiosas, algumas falando de uma origem [[Medos|meda]], ou [[Persas|persa]], segundo [[Procópio de Cesareia]].{{Harvy|proc|Procópio de Cesareia|loc=Livro II, 10-13}} Mais bem informado, [[Salústio]] {{-nwrap||86|34}} evoca a origem dos líbios na sua obra ''[[Guerra de Jugurta]]''.{{sfn|Camps|2007|p=36-50}} [[Estrabão]] também descreveu as diferentes [[tribo]]s líbias,{{Harvy|estrab|Estrabão|loc=Livro XVII, 3}} os diversos nomes não implicam necessariamente uma distinção étnica e não põem em causa a unidade do povoamento da região quando se deu a chegada dos fenícios.{{Carece de fontes|hist-af|data=março de 2013}}

===Expansão no Mediterrâneo e em África===
====Embargo das possessões fenícias no Mediterrâneo Ocidental e colonização púnica====
[[Imagem:EtruscanLanguage2.JPG|thumb|As [[Tábuas de Pirgos|lamelas de Pirgos]], com inscrições em [[Língua etrusca|etrusco]] e [[Língua púnica|púnica]], comprovam a existência de relações entre essas duas culturas.]]

É muito difícil de distinguir, a partir das escavações nos [[Sítio arqueológico|sítios]] fenício-púnicos, o que é de origem fenícia e o que é de origem cartaginesa. Assim, os arqueólogos não assinalam ruturas como as verificadas em certos sítios antigos como [[Bítia (cidade)|Bítia]] ou [[Nora (Sardenha)|Nora]], na [[Sardenha]]. A fundação de [[Ibiza (cidade)|Ibiza]], tradicionalmente datada em {{AC|675|x}} tanto pode assim ter sido obra quer dos fenícios quer dos cartagineses.{{Carece de fontes|hist-af|hist-eu|data=março de 2013}}

O "império" púnico, cuja formação e funcionamento não têm caraterísticas dum [[imperialismo]] em sentido estrito, é antes considerado uma espécie de [[confederação]] de colónias preexistentes em volta da mais poderosa dentre elas quando se deu o declínio da cidade-mãe de Tiro. Cartago teria ficado encarregue de assegurar a segurança coletiva e a política externa e comercial da comunidade.{{Carece de fontes|hist-af|data=março de 2013}}

Os fenícios do Ocidente e depois os púnicos tiveram relações precoces com outras civilizações, sobretudo com a [[Etruscos|etrusca]], com a qual os estabelecem ligações comerciais.<ref name=AristIII69/> A arqueologia testemunha essas relações comerciais, em particular as [[Tábuas de Pirgos|lamelas de Pirgos]] e alguns achados encontrados em [[necrópole]]s cartaginesas: vasos de produção etrusca chamados [[búcaro]]s e uma inscrição em etrusco na qual se apresenta um cartaginês.<ref name=mgEtru/> A aliança com os etruscos tinha também como objetivo travar a expansão dos [[Foceia|focenses]] do Ocidente, que acabaram por ser derrotados na [[batalha de Alalia]], um confronto marítimo travado ao largo da [[Córsega]] ''circa'' {{AC|540–535|x}}<ref name=LipAlal/> A partir do declínio dos etruscos, a aliança torna-se inoperante.

====Antagonismo com os gregos: as guerras sicilianas====
[[Imagem:Imperiocartagines-pt.svg|thumb|esquerda|Mapa do Império Cartaginês ''ca.''&nbsp;{{AC|323|x}} com os territórios da [[República Romana]] e da [[Magna Grécia]] em destaque]]
[[Imagem:Siciliaguerras sicilianas-pt.svg|thumb|esquerda|Mapa político da Sicília durante as [[guerras sicilianas]] entre cartagineses e gregos]]
<!--
[[Imagem:Afrique-Agathocle.jpg|thumb|Mapa das possessões cartaginesas no Norte de África mostrando as cidade tomadas por [[Agátocles de Siracusa]] no final do {{-séc|IV}} e aquelas por onde é provável que tenha passado o seu lugar-tenente Eumaco]]
-->

A prosperidade de Cartago, ligada ao comércio marítimo, conduz a uma rivalidade com os gregos no território da [[Sicília]], o que leva a que a ilha seja durante muito tempo uma zona de confrontos locais, devido a ambos os protagonistas pretenderem implantar entrepostos ou colónias nas costas sicilianas.{{sfn|Markoe|2001|p=54-55}}

No início do {{-séc|V}}, o conflito muda de natureza: [[Gelão I]], [[tirano]] de [[Siracusa]], tenta unificar a ilha com o apoio de várias cidades gregas. A guerra, inevitável, estala com Cartago, que possivelmente obtém o apoio dos [[Império Aquemênida|persas aqueménidas]]. [[Amílcar I de Cartago|Amílcar Giscão]], comandante das tropas púnicas, é derrotado na [[Batalha de Hímera (480 a.C.)|batalha de Hímera]] em {{AC|480|x}}, a qual, segundo a tradição ocorreu no mesmo dia que a [[batalha de Salamina]], entre os persas e os gregos.{{Carece de fontes|hist-eu|data=março de 2013}}

Em {{AC|410|x}}, Cartago já tinha recuperado desse reverso; a sua implantação e África é mais poderosa, e as expedições longínquas de [[Hanão]] e de [[Himilcão]] fortalecem o seu domínio dos mares. {{ilc|Aníbal Magão||Aníbal Mago}} desembarca então na Sicília em {{AC|409|x}} e obtém vitórias, porém sem ameaçar Siracusa. Em {{AC|405|x}}, a sua segunda expedição revela-se mais difícil. O comandante do exército morre durante uma epidemia de peste durante o [[cerco]] de [[Agrigento]]. O sucessor de Aníbal, Himilcão, consegue negociar o fim das hostilidades com [[Dionísio I de Siracusa|Dionísio]], o tirano de Siracusa, que é mais uma trégua do que um verdadeiro tratado de paz.{{Carece de fontes|hist-eu|data=março de 2013}}

Em {{AC|398|x}}, Dionísio ataca a cidade cartaginesa de [[Mócia]], no extremo ocidental da Sicília, que é tomada mas é rapidamente recuperada pelos cartagineses. Em seguida, estes montam um cerco a Siracusa que dura até {{AC|396|x}}, ano em que os sitiantes são obrigados a retirar devido a uma epidemia de peste. A guerra continua durante 60 anos. Em {{AC|340|x}}, o exército cartaginês só se encontra no sudoeste da ilha.{{Carece de fontes|hist-eu|data=março de 2013}}

Em {{AC|315|x}}, [[Agátocles de Siracusa]] apodera-se de Messina e em {{AC|311|x}} conquista os últimos entrepostos cartagineses na Sicília. {{ilc|Amílcar Giscão|Amílcar Giscão (século IV a.C.)|Amílcar (filho de Giscão)}} comanda a resposta cartaginesa e em {{AC|311|x}} controla a quase totalidade da Sicília e monta cerco a Siracusa. Entretanto Agátocles lidera uma expedição contra os cartagineses em África. Esta expedição, apesar de ter terminado três anos depois com a fuga de Agátocles, representa uma vitória deste, pois obriga os cartagineses a chamar o seu exército para defenderem o seu próprio território.{{Carece de fontes|hist-eu|data=março de 2013}}

====Nascimento de um império africano no {{-séc|V}}====
[[Imagem:Carthaginian hoplite - Oplita cartaginese.JPG|thumb|upright|Ilustração de um [[hoplita]] (soldado de [[infantaria]] pesada) cartaginês feita a partir de uma moeda de [[Siracusa]] do fim do {{-séc|IV}}]]

Segundo a perspectiva usualmente mais aceite, Cartago concentrou-se no interior do seu território africano depois da derrota de Hímera.{{sfn|name=dec85|Decret|1977|p=85}} No entanto, esta tese é cada vez mais posta em causa por alguns historiadores que estimam que a implantação africana se tornou mais importante em épocas mais tardias. Sob esta ótica, a expansão africana durante o {{-séc|V}} deve-se apenas à necessidade de controlar territórios que permitissem alimentar uma população crescente.{{Carece de fontes|hist-af|data=março de 2013}}

===Antagonismo com Roma e fim da Cartago púnica===
====Primeiras relações com Roma: os tratados====
As primeiras relações com [[Roma Antiga|Roma]] são pacíficas, o que é atestado pelos tratados concluídos em {{AC|509|x}}, referidos na obra de [[Políbio]],{{Harvy|polib|Políbio|loc=III, 5}} {{AC|348|x}} e {{AC|306|x}} Estes tratados garantem a Cartago a exclusividade do comércio desde o Norte de África e ausência de [[Pilhagem|pilhagens]] contra os aliados de Roma em [[Península Itálica|Itália]]. A duração cada vez mais curta entre esses tratados tem sido entendida como um sinal de tensões crescentes entre as duas potências.{{Carece de fontes|hist-eu|data=março de 2013}}

====Confronto: as Guerras Púnicas====
{{Artigo principal|Guerras Púnicas}}

Os episódios denominados "guerras púnicas" referem-se ao antagonismo que se estendeu durante mais de um século, de 264 a {{AC|146|x}}

O [[Primeira Guerra Púnica|primeiro conflito]] ocorre de 264 a {{AC|241|x}}, e implicou a perda da Sicília por parte de Cartago, que foi ainda obrigada a pagar um pesado tributo. Esta derrota tem graves consequências sociais internas, como o episódio da [[Guerra dos Mercenários]], uma [[guerra civil]] com contornos de extraordinária crueldade, que assolou os territórios cartagineses africanos entre 240 e {{AC|237|x}} A capital seria finalmente salva por [[Amílcar Barca]], mas Roma aproveitou as dificuldades internas para agravar as condições de paz.{{Carece de fontes|hist-af|data=março de 2013}}
<!----

[[Imagem:L'Empire carthaginois au IIIe siècle avant JC-cropped.png|esquerda|upright=1.2|thumb|O Império cartaginês no {{-séc|III}}
{| cellspacing="3px" style="font-size:85%;"
|-
|{{Legend|#18fd00|Império cartaginês segundo [[Políbio]] em {{AC|279|x}}}}
|-
|{{Legend|#18fd00|Perdas cartaginesas em {{AC|238|x}}|striped=1}}
|-
|{{Legend|#129604|Ganhos cartagineses em {{AC|219|x}}}}
|-
|{{Legend|#f0b821|Entrepostos cartagineses}}
|-
|{{Legend|line|"Triângulo púnico": zona vital de navegação para o Império cartaginês"|line=3px solid #2669f9}}
|}
]]

---->
[[Imagem:Punic wars-pt.svg|thumb|esquerda|upright=1.25|Mapa das Guerras Púnicas]]

Após isso, o imperialismo de Cartago orienta-se para a [[Península Ibérica]] e para o confronto com os aliados de Roma, o que torna inevitável um [[Segunda Guerra Púnica|segundo conflito]], que estala em {{AC|219|x}} com o cerco cartaginês a [[Sagunto]], que é destruída após oito meses de cerco. A expedição de [[Aníbal Barca]] a Itália, que partindo da Península Ibérica, atravessou os [[Travessia dos Alpes por Aníbal|Pirenéus e os Alpes]] e chegou a [[Cápua]], perto de [[Nápoles]], sem contudo atacar a cidade de [[Roma]], mostra a capacidade do general cartaginês para obter vitórias retumbantes, mas ao mesmo tempo evidencia a sua incapacidade para tirar partido da sua vantagem e submeter uma Roma vacilante. A partir de {{AC|205|x}} a guerra passa a desenrolar-se exclusivamente em solo africano, e em 19 de outubro de {{AC|202|x}} a vitória do general romano [[Cipião Africano|Cipião]] na [[batalha de Zama]] marca a derrota final dos cartagineses.{{Carece de fontes|hist-af|data=março de 2013}}

No decurso dos cinquenta anos que se seguem, Cartago paga regularmente a Roma um pesado tributo, mas ao mesmo tempo dota-se de equipamentos dispendiosos, como portos. A cidade aparenta ter retomado nessa época uma grande prosperidade, que é demonstrada pela execução de projetos urbanos como o do bairro púnico de {{ilc|Birsa|Birsa (bairro de Cartago)|Byrsa|lk=Birsa}}, ligado ao [[Sufete|sufetato]] de Aníbal Barca.{{Carece de fontes|hist-af|data=março de 2013}}

No entanto, devido à ascensão da cidade e ao fim do pagamento do tributo, Roma impõe aos cartagineses o abandono da cidade, a retirada para o interior e a renúncia à identidade marítima.{{sfn|Dridi|2006|p=56}} Acerca disto, [[Marco Veleio Patérculo]] escreveu que ''«Roma, já senhora do mundo, não se sentia em segurança enquanto subsistisse o nome de Cartago»''.{{sfn|Abed|1995|p=28}} A recusa cartaginesa que se segue provoca a [[Terceira Guerra Púnica|terceira e última guerra]], que é marcada pelo [[cerco de Cartago]], que se prolonga de 149 a {{AC|146|x}} No final, mesmo que o solo não tenha sido coberto de sal como relata a historiografia do fim do {{séc|XIX}} início do {{séc|XX}}, a destruição da cidade é total e é lançada uma maldição sobre o local, que é declarado ''sacer''{{
nre|
1=''"Sacer"'' é um termo latino cuja tradução pode ser "sagrado", aqui com o sentido de "local onde ninguém deve ir" ou algo semelhante.
}}<ref name=Ridley86/> Cartago deixa de existir como entidade política, mas durante muito tempo os aspetos da sua civilização perduram, espalhados pelo Mediterrâneo: elementos religiosos, artísticos, linguísticos e até institucionais no Norte de África.{{Carece de fontes|hist-af|data=março de 2013}}

==Geografia==
===Localização dos assentamentos===
[[Imagem:Motya from above artistic reconstruction 1 0.jpg|thumb|Reconstituição da ilha-fortaleza cartaginesa de [[Mócia]], na [[Sicília]]]]

Os locais ocupados pelos fenícios, e depois pelos púnicos, virados para o mar para assegurar a ligação com as rotas comerciais, deviam também garantir a segurança dos habitantes, protegendo-os de um interior que podia ser-lhes hostil. Esta segurança era naturalmente assegurada numa ilha, como em [[Gades]],{{nre|nome=gades}} no sul da [[Península Ibérica]], ou [[Mócia]], na [[Sicília]], ou então, se bem que em menor escala, numa península ou num espaço cercado de colinas, que tornassem a defesa mais fácil em caso de ataque. Deste ponto de vista, a excelência da localização de Cartago explica que ela tenha sido elogiada por vários autores antigos, nomeadamente [[Estrabão]], que compara o local a ''«um navio ancorado»''.{{sfn|Decret|1977|p=55}} Todavia, as qualidades defensivas naturais podiam não ser suficientes, o que implicava o reforço com arranjos suplementares, como em Mócia, onde a ilha foi rodeada por uma [[muralha]] e uma calçada fazia a ligação com a terra firma, facilitando os aprovisionamentos.{{Carece de fontes|hist-eu|data=março de 2013}}

===Cartago, a principal cidade: caraterísticas gerais===
[[Imagem:Quartier punique Byrsa.jpg|thumb|Ruínas púnicas na colina de {{ilc|Birsa|Birsa (bairro de Cartago)|Byrsa|lk=Birsa}} de Cartago]]

Segundo a lenda, Cartago ter-se-ia desenvolvido a partir da colina de {{ilc|Birsa|Birsa (bairro de Cartago)|Byrsa|lk=Birsa}}, uma [[cidadela]] e centro religioso,{{sfn|Guzzo|2007|p=59}} estendendo-se depois para a planície costeira e para as colinas a norte com o arrabalde de Mégara (atualmente [[La Marsa]]), que parece ter sido construído de uma forma mais anárquica do que o resto da cidade. Mégara é possivelmente o subúrbio mais recente, que não teve tempo para se estruturar. À exceção de Mégara Cartago foi construída segundo um plano bastante ordenado, com ruas retilíneas, exceto nas colinas, onde apesar de tudo a urbanização foi planeada. Globalmente, a planície era quadriculada pelas ruas, com a [[ágora]] e as praças ligando as ruas que raiavam em direção às colinas. A cidade era rodeada por espessas muralhas de blocos duma pedra branca que a tornavam luminosa e visível de longe. As escavações do bairro dito de Magão (ou ''Magon'') permitiram estudar a evolução das estruturas defensivas ao longo de um extenso período.<ref name=Rakob/> A cidade foi concebida segundo um plano que sugere que os gregos podem não ter sido os únicos a dar origem a planos urbanos retilíneos ordenados sobre dois eixos que se cruzam perpendicularmente no centro, comuns à maior parte das cidades do [[Antiguidade|mundo antigo]].{{Carece de fontes|hist-af|data=março de 2013}}

O bairro da colina de Birsa foi construído segundo um plano ortogonal, que demonstra o aspeto organizado do urbanismo. As ruas direitas e pavimentadas ou, nas colinas, de terra batida, eram recortadas em ângulo reto.{{sfn|Fantar|1995|p=40}} O relevo do terreno foi pragmaticamente tido em conta, usando lanços de escadas, com degraus muito espaçados onde a inclinação do terreno o tornasse necessário.{{Carece de fontes|hist-af|data=março de 2013}}

[[Imagem:Quartier Magon Carthage maquette porte mer.JPG|thumb|esquerda|Maqueta da "Porta do Mar", no bairro de Magão de Cartago]]

As casas eram parcialmente edificadas usando uma espécie de [[cimento]] misturado com fragmentos de cerâmica, com que se construía o chão das divisões e as paredes. As casas tinham corredores e escadarias em madeira que davam acesso aos andares superiores. Eram abastecidas por água de [[cisterna]]s subterrâneas que recolhiam a água da chuva num pátio central (uma espécie de [[implúvio]]), por meio de canalizações. Não existiam redes de [[esgoto]]s, mas usava-se uma espécie de [[Fossa sética|fossas séticas]].{{Carece de fontes|hist-af|data=março de 2013}}

Entre os principais elementos da cidade figuram a ágora, o porto mercantil e o porto militar, lojas de vários tipos, [[entreposto]]s, quarteirões de [[artesão]]s na periferia (como o dos [[Olaria|oleiros]]), praças de [[Mercado (comércio)|mercados]], [[necrópole]]s (muitas situadas entre as casas e a planície), bem como [[templo]]s. A cidade era coroada pela cidadela central da colina de Birsa, onde também se encontravam os principais templos, como o de [[Eshmun]].{{Carece de fontes|hist-af|data=março de 2013}}

Cartago era uma grande cidade cosmopolita da Antiguidade, onde viviam fenícios e onde conviviam gregos, berberes, [[iberos]] e outros povos originários de territórios cartagineses de além-mar ou da [[África subsariana]], que chegavam via as costas do [[oceano Atlântico]] ou as rotas dos [[oásis]], que foram retomadas mais tarde pelos romanos. Os casamentos mistos não eram raros e contribuíram para desenvolver uma civilização particular.{{Carece de fontes|hist-af|data=março de 2013}}

===Possessões: zona de influência ou império?===
[[Imagem:Quartiere punico 1 (Nora).jpg|thumb|Ruínas do bairro púnico de {{ilc|Nora|Nora (Sardenha)|Nora (Itália)}}, na costa sul da [[Sardenha]], junto à atual vila de [[Pula (Itália)|Pula]]]]

Na época da sua máxima expansão territorial, em {{AC|264|x}}, a área de influência de Cartago era constituída pela maior parte do Mediterrâneo Ocidental e uma parte da costa [[Oceano Atlântico|atlântica]] do noroeste de África. No Norte de África, os [[entreposto]]s e [[colónia]]s cartaginesas estendiam-se desde o é hoje a parte ocidental da [[Líbia]] a pelo menos uma parte da costa da [[Mauritânia (Antiguidade)|Mauritânia]]; na Península Ibérica grande parte do que é hoje a [[Andaluzia]] e a [[Região de Múrcia]] estava sob o domínio ou influência cartaginesa, o mesmo acontecendo com as [[ilhas Baleares]], a [[Sardenha]] e a [[Córsega]], a parte ocidental da [[Sicília]] e ainda outras ilhas mais pequenas, como [[Malta]], as [[Ilhas Eólias|Eólias]] e as [[Ilhas Pelágias|Pelágias]]. Além dos assentamentos púnicos propriamente ditos, Cartago exercia ainda o controlo sobre antigos estabelecimentos fenícios como [[Lixo (cidade)|Lixo]] (perto da atual [[Larache]], a sul de [[Tânger]]), Mogador (atual [[Essaouira]]), ambos na costa atlântica de [[Marrocos]], [[Gades]] (atual [[Cádis]], no sul de [[Espanha]]) e [[Útica]], a noroeste de Cartago. Entre as maiores cidades púnicas encontravam-se, além da capital Cartago, [[Hadrumeto]] (atual Sousse), [[Ruspina]] (atual [[Monastir (Tunísia)|Monastir]]), [[Cartagena (Espanha)|Cartagena]] e [[Hipona]] (atual [[Annaba]]).{{Carece de fontes|hist-af|data=março de 2013}}

Gades e Útica foram fundadas pelos fenícios entre os {{séc|XII}} e {{AC|X|x}} Cartago foi fundada numa península rodeada de [[laguna]]s a nordeste do que é hoje o centro de [[Tunes]]. No auge da sua glória, a cidade tinha {{formatnum:700000}} habitantes, a crer em Estrabão, o [[geógrafo]] grego do {{-séc|II}}{{Carece de fontes|hist-af|data=março de 2013}}

Apesar do tipo de ligações entre Cartago e as diversas componentes das suas possessões ser largamente desconhecido, não há dúvidas que a [[metrópole]] se encarregava das relações diplomáticas e do comércio, mas Sabatino Moscati considera que a ''«a incapacidade [de Cartago] de criar um império sólido e estruturado»'' foi uma das causas da sua derrota final.<ref name=mosc65/>

==Arquitetura e urbanismo==
[[Imagem:Carthaginian wall of Cartagena.jpg|thumb|Restos da [[muralha púnica de Cartagena|muralha púnica]] de [[Cartagena (Espanha)|Cartagena]], no sul de Espanha]]

===Proteção da cidade: fortificações===
Os autores antigos evocaram longamente as muralhas das cidades púnicas quando relataram os cercos a que foram sujeitas algumas delas.{{
nre|
1=Sobre mais detalhes sobre este aspeto, consultar as descrições das muralhas de Cartago.
}} Além das [[cidadela]]s das principais cidades, existiam também [[Fortaleza (arquitetura militar)|fortalezas]] destinadas a controlar determinados territórios. As escavações arqueológicas confirmaram em larga medida a difusão por todo o espaço púnico da cidade com muralha fortificada, pelo menos no estado atual da investigação.<ref name=Lip175/> As escavações do bairro de Magão de Cartago puseram em evidência o traçado da muralha da cidade, na qual existia uma porta no lado do mar.

Os púnicos reutilizaram muralhas anteriores em certos casos, como em [[Monte Érix|Érix]] (atual [[Erice]]), na Sicília, e as próprias fortalezas previamente existentes por vezes eram usadas como envasamento (base) para outros elementos fortificados, como em [[Kélibia]], no [[cabo Bon]].

===Espaços públicos e estruturas===
O espaço público organizava-se em redor da [[ágora]]: centro da cidade, a praça era rodeada pelo edifício do Senado e outras edificações de caráter religioso. A ágora de Cartago nunca foi objeto de reconhecimento arqueológico, apesar da sua localização ser mais ou menos conhecida.

[[Imagem:Carthage - Punic port.jpg|thumb|esquerda|[[Doca seca]] na ilhota do almirantado de Cartago, construídas depois do {{-séc|IV}}]]

A localização dos sítios usados pelos púnicos requeria a construção de estruturas, [[Porto (transporte)|portos]] e ''[[cothon]]s''{{
nre|
1=''"Cothon"'' é a designação dada às instalações portuárias cartaginesas.
}} Até mesmo em locais onde os navios podiam estar abrigados em enseadas ou outros locais naturalmente privilegiados, como o ''stagnum''{{
nre|
1=''"Stagnum"'' significa aproximadamente "lago" em {{ling|la}}.
}} de Mócia, onde no início não houve construção de estruturas artificiais, rapidamente se passou a considerar indispensável a criação das estruturas artificiais chamadas ''cothon''.<ref name=dicCiv121/> Encontramos esse tipo de porto artificial em [[Rachgoun]], Mócia, [[Sulcis]] ([[Sant'Antioco]]){{sfn|Dridi|2006|p=74}} ou ainda em [[Mádia]], se bem que nesta última nem todos os autores estejam de acordo quanto a ter existido um ''cothon'', pois as instalações portuárias foram atribuídas à [[Califado Fatímida|época fatímida]].

No caso de Cartago as instalações — pelo menos no seu estado final, já que a localização dos portos primitivos da cidade ainda é tema de debate — são muito elaboradas e descritas por um texto célebre de Apiano.{{Harvy|api|Apiano|loc=''Libyca'', 96}} A fase final da construção teve lugar provavelmente na primeira metade do {{-séc|II}}, com um porto mercantil de um porto militar de forma circular, no meio do qual existia uma ilhota (dita do almirantado) que garantia a segurança da frota de guerra e uma discrição que limitava os riscos de espionagem.{{sfn|Dridi|2006|p=73}}

A escavação destas estruturas durante a campanha internacional de Cartago confirmou que alguns dados desse texto são verossímeis, em particular o número de 220 navios que podiam ser abrigados, apesar deste número poder ser inferior em algumas poucas dezenas.<ref name=apdec65/> No final do período cartaginês, na ilhota do almirantado e em volta do porto militar havia [[Dique seco|docas secas]] onde os navios passavam o inverno.{{sfn|Dridi|2006|p=76}} Nas vizinhanças do porto comercial situava-se uma zona de armazéns e de oficinas de artesãos.{{sfn|Dridi|2006|p=77}}

===Arquitetura sagrada===
[[Imagem:Tempio di Eshmun-Esculapio 1 (Nora).jpg|thumb|Ruínas do Templo de [[Eshmun]] (posteriormente dedicado a [[Esculápio]], em Nora, Sardenha]]

[[Imagem:Tunisise Carthage Tophet Salambo 04.JPG|thumb|[[Estela]]s naquilo que pode ter sido o {{ilc|tofete|Tofete de Cartago|Tofet de Salammbô|Tophet de Cartago}} (ou de Salammbô)]]

A localização do espaço sagrado na civilização cartaginesa estava ligada à topografia urbana, apesar de por vezes a arqueologia ter demonstrado a ausência de regras para o posicionamento dos locais afetos a esse uso. De facto, têm-se encontrado locais sagrados tanto nos centros urbanos ou [[acrópole]]s como nas periferias, quando não até nas zonas rurais. A localização de locais de culto estava dependente do crescimento das cidades, o qual continua em grande parte desconhecido e a posição dentro da cidade pode ter evoluído ao longo do tempo.

Alguns locais de culto são conhecidos pelas fontes literárias, como o templo de [[Eshmun]], o maior santuário de Cartago, que segundo Apiano se encontrava no cimo da acrópole, a qual se identificou como sendo a colina de São Luís, rebatizada Birsa. No entanto, o cume dessa colina foi completamente arrasado na época romana, o que implicou a perda do conjunto dos seus vestígios.{{sfn|Beschaouch|1993|p=81}} O templo de [[Melcarte]] em Gades foi durante afamada durante muito tempo, até à época romana. O santuário de [[Astarte]] em {{ilc|Tas-Silg||Tas-Silġ}}, perto da atual [[Marsaxlokk]], no sul de [[Malta]], sucedeu a um espaço de culto indígena e foi igualmente célebre.

Nas escavações em Cartago foram descobertos outros espaços de culto mais modestos na vizinhança da atual estação ferroviária de Salammbô, na Cartago moderna, e também junto à aldeia de [[Sidi Bou Said]]. Aparentemente, o templo dito de [[Apolo]] pode ter sido descoberto durante a campanha internacional de escavações da [[UNESCO]] na orla da área que era ocupada pela ágora, e ao qual se poderão associar as [[estela]]s descobertas perto dessa zona no {{séc|XIX}} e atribuídas ao {{ilc|tofete|Tofete de Cartago|Tofet de Salammbô|Tophet de Cartago}}.{{sfn|Beschaouch|1993|p=84-86}} O santuário rural de {{ilc|Tinissute||Bir Bouregba|Bir Bou Regba}} (atual Bir Bouregba), apesar de ser datado do início do [[Império Romano]], tem todas as caraterísticas dos santuários orientais tanto pelo seu conjunto de pátios justapostos como pelo seu mobiliário de estátuas em barro cozido representando [[Ba'al Hammon]].<ref name=lancLip451/>

O [[tofete]] é uma estrutura que se encontra em numerosos sítios do Mediterrâneo Ocidental, situado num local afastado da cidade, por vezes num lugar insalubre, como no caso de Cartago. A área apresenta-se como um espaço ocupado pouco a pouco por deposições de urnas e de estelas, que eram cobertas de terra a fim de continuar a utilizar o mesmo espaço.<ref name=dicCiv463/> O estudo deste tipo de estrutura gerou desde o início um debate muito aceso, que ainda dura, com as escavações a não colocarem termo às polémicas originadas por algumas fontes clássicas. Segundo alguns autores, o tofete seria um santuário e um cemitério.

===Arquitetura privada===
[[Imagem:Kerkouane1.JPG|thumb|esquerda|Casa com [[peristilo]] na rua do Apotropeu de [[Kerkuane]], datada do fim do {{séc|IV}} ou início do {{-séc|III}}]]

Nas escavações em [[Kerkuane]] e em dois bairros púnicos de Cartago — o de Magão e o de Aníbal — foram descobertos bairros organizados segundo um plano em quadriculado{{
nre|
1=Também chamado "[[plano hipodâmico]]" (de [[Hipódamo de Mileto]]) ou em grelha.
}} com ruas largas.

A organização da casa púnica é atualmente bem conhecida. A entrada das habitações do bairro de Birsa, batizado bairro de Aníbal, é bastante estreita, com um longo corredor que conduz a um pátio onde se encontra um escoadouro e em volta da qual se organiza o edifício. Na frente situava-se um espaço dedicado, segundo algumas interpretações, ao comércio; uma escadaria conduzia ao andar superior. Várias fontes, em particular Apiano, afirmam que os prédios tinham seis andares.{{Harvy|api|Apiano|loc=''Libyca'', 128}} Os vestígios arqueológicos confirmam a presença de de vários andares, mas desconhece-se o seu número.<ref name=lancMor55/> Algumas moradias aparentam ser mais sumptuosas do que outras, em particular uma ''[[villa]]'' com [[peristilo]] no bairro de Magão. Observa-se a mesma distinção nas casas de Kerkuane, com o belo exemplo da ''villa'' da rua do Apotropeu (''Apotropaion'').

A organização das casas levou M'hamed Hassine Fantar a dizer que seguiam um modelo oriental, com uma apropriação de influências líbias. A questão da água no mundo púnico é da responsabilidade de cada um; as casas eram dispunham de [[cisterna]]s que atualmente ajudam os arqueólogos no estudo da topografia urbana. Em Kerkuane foram encontradas numerosas [[banheira]]s.

===Arquitetura funerária===
[[Imagem:Begraafplaatsfeniciërs 5-05-2007 18-45-22.jpg|upright|thumb|Sepultura púnica em [[Cala d'Hort]], [[Ibiza]]]]

A arquitetura funerária foi o primeiro elemento que foi estudado desde o fim do {{séc|XIX}}, em particular em Cartago, onde as exumações deram lugar a verdadeiras cerimónias mundanas.{{sfn|Lancel|1992|p=92}} A localização em arco de círculo dessas necrópoles{{sfn|Picard|1951|p=39}} permitiu circunscrever a cidade púnica e examinar as variações do seu perímetros.

Os arqueólogos notaram uma certa tipologia de túmulos, geralmente escavados na rocha e não construídos, quer como um tipo de túmulo em poço simples com o caixão no fundo ou a meio, quer incluindo uma escadaria que conduz a um poço. Esta forma de [[inumação]] é largamente predominante, exceto em alguns períodos, como demonstrado na escavação da {{ilc|necrópole púnica de Puig des Molins||Puig des Molins|Necrópoles cartaginesas em Ibiza}}, em [[Ibiza]].

O mobiliário e a decoração destas sepulturas são estereotipados: peças de [[olaria]], [[talismã]]s, [[joia]]s, pedras, uso do [[ocre]] vermelho (simbolizando sangue e, consequentemente, a vida), ovos de [[avestruz]] (símbolo da renascença) e miniaturas de mobiliário em [[argila]]. O caixão era geralmente revestido com [[gesso]]. Um [[sarcófago]] de madeira, num estado de conservação excecional, foi descoberto em Kerkuane, mas até hoje é o único exemplar conhecido do seu género. Diversos túmulos foram ornamentados com decorações pintadas, como os de Djebel Mlezza, no [[cabo Bon]], que podem ser considerados como simbolizando a crença púnica num [[Além (espiritualidade)|Além]], com a [[alma]] do defunto a efetuar uma espécie de viagem. Segundo François Decret ''«para este povo de marinheiros, a Cidade celeste era o último porto a abordar»''.{{sfn|Decret|1977|p=151-152}}

===Outros aspetos da arquitetura e mosaicos púnicos===
[[Imagem:Kerkouane signe de tanit 1.jpg|thumb|esquerda|Pavimento de [[mosaico]] dito ''pavimenta punica'' numa casa de Kerkuane]]

Poucos vestígios da arquitetura púnica sobreviveram, devido à aplicação do princípio romano ''[[Delenda est Carthago]]'' ("Cartago deve ser destruída"), mas há diversas características que se podem depreender das investigações arqueológicas. As escavações em Cartago, em particular as do bairro de habitação à beira-mar, dito "bairro de Magão", e as de Kekuane, puseram em evidência as influências arquiteturais do [[Egito Antigo]] nos períodos mais antigos e da [[Grécia Antiga]] nos períodos mais recentes.

A utilização da {{NT|corniche à gorge|[[cornija]] "com garganta"}}, bem como a existência de modelos reduzidos de fachadas de templos nas estelas com [[disco solar|discos solares]] e [[ureu]]s testemunham a influência egípcia.{{sfn|Lancel|1992|p=417-418}} Fragmentos de colunas emolduradas de [[arenito]] de {{Ilink condicional|El Haouaria||[[El Haouaria]] (cabo Bon)}}, ornamentadas com [[estuque]] foram também descobertos, bem como provas do uso da [[ordem jónica]], nomeadamente no ''[[naiskos]]'' de [[Thuburbo Majus]],{{sfn|Lancel|1992|p=426}} e da [[ordem dórica]] nas escavações de Birsa.

As escavações de Kerkuane e as do flanco sul de Birsa revelaram também a presença de [[mosaico]]s ditos ''pavimenta punica'', com [[tessela]]s aglomeradas numa espécie de [[argamassa]] vermelha.{{sfn|Hours-Miédan|1982|p=99}} Descobriram-se também representações figuradas do {{Ilink condicional|símbolo de Tanit||símbolo de [[Tanit]]}}, quer na cidade de cabo Bon como em outros locais. Estes objetos datados do {{-séc|III}} põem em causa a origem grega do mosaico clássico, durante muito tempo considerada um dado adquirido pelos historiadores e arqueólogos.

==Marinha e exército==
[[Imagem:Stèle navire MN carthage.jpg|thumb|upright|Figura de um navio púnico numa estela do Tofete de Cartago datada do {{-séc|III ou II}}, exposta no [[Museu Nacional de Cartago]], [[Tunes]]]]

O [[Filologia|filólogo]], historiador e arqueólogo francês [[Serge Lancel]] associou estes dois termos nos seus estudos, pois é inútil tentar estudar a civilização cartaginesa sem apreender aquilo que são dois pilares da expansão púnica no Mediterrâneo Ocidental.{{sfn|Lancel|1992|p=155}}

===Marinha===
Cartago beneficiou dos avanços fenícios em matéria de [[construção naval]] e de comércio marítimo. Desde o início da ascensão de Cartago que a marinha púnica teve como objetivos a proteção das rotas comerciais e de mantê-las secretas, em particular exercendo o controlo da zona do [[estreito de Gibraltar]].

Ao serviço do comércio, a marinha afastou os concorrentes gregos, em particular os [[Foceia|focenses]]. Cartago dominou os mares durante largo tempo; possuía a tecnologia marítima e o conhecimento dos mares mais avançados da sua época. Copiada pelos romanos para recuperarem do seu atraso nesse domínio, o poderio naval cartaginês foi consideravelmente reduzido durante a [[Primeira Guerra Púnica]], em meados do {{-séc|III}}

====Tipos de navios====
As duas marinhas de Cartago (mercante e de guerra) tiveram a mesma finalidade: a preservação do comércio. O poderio naval de Cartago explica-se pelo conhecimento superior das técnicas de navegação. Apoiava-se em dois tipos de navio: os [[trirreme]]s, [[galé]]s com três filas sobrepostas de [[Remo (navegação)|remos]]; e os [[quinquerreme]]s, {{NT|avec quatre puis cinq rameurs sur un banc de nage|com cinco filas de remos}}.{{esclarecer|não é isto que consta do artigo da FR; deverá ser melhor traduzido....}} As embarcações estavam equipadas com proas com [[carranca]]s (esculturas) de cabeça de cavalo, conforme é sugerem algumas representações iconográficas. Excelentes construtores de navios, os púnicos construíram graças à sua frota um império marítimo que alguns autores compararam ao de [[Atenas]].

[[Imagem:Marsala ship 2.jpg|thumb|Restos de um dos {{ilc|navios de guerra cartagineses naufragados|Naufrágio de Marsala|Navios púnicos de Marsala}} ao largo de [[Marsala]], na Sicília ocidental]]

A descoberta de dois {{ilc|navios de guerra cartagineses naufragados|Naufrágio de Marsala|Navios púnicos de Marsala}} ao largo de [[Marsala]], na Sicília ocidental, permitiu aprofundar os conhecimentos atuais sobre a construção naval púnica do {{-séc|III}} Os navios eram então construídos usando uma técnica muito elaborada, em que eram usados elementos "pré-fabricados".<ref name=honf/> Esta técnica confirma o que consta dos textos clássicos, nomeadamente os de Apiano.{{Harvy|api|Apiano|loc=''Libyca'', 121}} O navio, qualificado em {{ling|fr}} como ''chiourme'',{{
nre|
1=''"Chiourme"'' é um termo francês que designa o conjunrto dos remadores de uma galé.
}} estava dotado de um [[Rostro (náutica)|Rostro]] (esporão) destinado a atacar os barcos inimigos.{{sfn|Lancel|1992|p=183}}

As unidades militares da marinha evoluíram ao longo da história. O trirreme, surgido no {{-séc|VI}}, embarcava 200 homens além dos remadores. O quadrirreme foi inventado no [[período helenístico]] (a partir do final do {{-séc|IV}}). O quinquerreme, com capacidade para pelo menos 300 homens, foi concebido durante as guerras púnicas. A logística era assegurada por outros navios chamados gaulos (''gauloi'').

[[Imagem:Hannon map-pt.svg|thumb|Mapa do périplo de [[Hanão]] ({{séc|VI}} ou {{AC|V|x}})]]

====Périplos====
Os [[périplo]]s marítimos testemunham a ousadia dos marinheiros púnicos e o seu domínio dos conhecimentos navais. É possível que tenham descoberto novas terras: no périplo de [[Hanão]] ({{séc|VI}} ou {{AC|V|x}}), os púnicos de Gades exploraram as costas africanas até ao [[golfo da Guiné]] com uma frota de navios cartagineses. No périplo de [[Himilcão]] teriam alcançado as ilhas [[Cassitérides]] (do [[estanho]]), algures ao largo da [[Grã-Bretanha]], na rota do estanho.
<!------
Os chamados {{ilc|marinheiros de Necão|Périplo dos marinheiros de Necao|Périplo dos marinheiros de Necho|Périplo dos marinheiros de Nechao}}{{Harvy|Heródoto|loc=4.42}}
*{{Citar heródoto|4|42|ref=her442}}

-->
===Exército===
====Recrutamento e comandos====
O tema do recrutamento do exército cartaginês, dos seus [[mercenário]]s e do papel dos cidadãos foi sublinhado pela historiografia desde a Antiguidade: a derrota de Cartago estaria ligada ao recrutamento de soldados profissionais e ao pouco envolvimento dos cidadãos, ao contrário do que acontecia na Grécia e em Roma. Este argumento não tem em conta a coragem dos soldados durante os últimos combates, em que a população também participa, nem a organização da marinha de guerra, em que estavam envolvidos cidadãos.

O exército púnico era composto por soldados de diversas origens: mercenários, cidadãos alistados voluntariamente e habitantes das possessões cartaginesas ou de aliados. O exército tinha por isso um forte caráter cosmopolita; cada uma das partes contribuía com unidades à guisa de participação no esforço comum. Uma estrutura desse tipo não apresentava alguns perigos, pois o Estado não regulava os soldos, como demonstrou a [[Guerra dos Mercenários]] a seguir à [[Primeira Guerra Púnica]].

O comando cartaginês estava nas mãos de militares provenientes das grandes famílias que eram nomeados pela assembleia do povo.{{Harvy|diod258|Diodoro Sículo|loc=25.8}} A hierarquia militar continua mal conhecida, apesar de parecer comprovado que o título de general corresponde ao de ''rab''. A cidade não se mostrava muito indulgente com os oficiais vencidos, havendo muitos relatos de generais crucificados ou executados.{{sfn|Dridi|2006|p=113}}

====Unidades terrestres e armamento====
[[Imagem:Balearic Slinger.jpg|esquerda|thumb|upright|Reconstituição de um {{Ilcx|fundibulários das Baleares|[[Funda|fundibulário]] das [[ilhas Baleares|Baleares]]|Fundibulários das ilhas Baleares}}]]

As tropas de Cartago não diferiam muito das suas congéneres da época. As mudanças nas estruturas e nas manobras devem-se a Aníbal Barca, que queria modificar um exército baseado nas [[Falange (infantaria)|falanges]]{{Harvy|polib|Políbio|loc=I, 33}} com origem na tradição grega,{{sfn|Le Bohec|2003|p=39}} pelo menos no período melhor conhecido da história de Cartago, a partir das guerras sicilianas e depois as guerras púnicas.

Havia diversas unidades diferentes, organizadas em batalhões segundo a sua origem étnica, por vezes armadas conforme as suas próprias tradições. A infantaria ligeira compreendia, além de cidadãos armados de [[lança]]s e [[espada]]s,{{sfn|name=drid117|Dridi|2006|p=117}} unidades especializadas, como os {{Ilink condicional|fundibulários das Baleares||[[Funda|fundibulários]] das [[Baleares]]}}, [[arqueiro]]s e lanceiros líbios armados com [[dardo]]s, [[Punhal|punhais]] e [[escudo]]s de couro,{{sfn|name=drid121|Dridi|2006|p=121}} e ainda grupos de [[infantaria]] [[iberos]] equipados com escudos e espadas curtas chamadas [[falcata]]s.<ref name=drid117/> O "batalhão sagrado", descrito por [[Diodoro Sículo]]{{Harvy|diod26802|Diodoro Sículo|loc=25.80.2}} e [[Plutarco]]{{Harvy|plut|Plutarco|loc=''Timoleon''. 27-28}} tinha um armamento específico. A infantaria pesada estava organizada em falanges, segundo o modelo [[Macedónia Antiga|macedónico]], mas desconhece-se se a [[sarissa]], caraterística dessa formação, era usada no exército cartaginês.

As outras unidades terrestres eram constituídas sobretudo por [[Cavalaria|cavaleiros]], no início unicamente [[númidas]] e depois também de outras origens, nomeadamente iberos e [[gauleses]].<ref name=drid121/> Estas unidades com elevada mobilidade fizeram a diferença nos campos de batalha da [[Segunda Guerra Púnica]]. O seu equipamento incluía [[Biga|carros de combate]], com origem numa longa tradição líbia ligada aos contactos deste povo com os exércitos [[Antigo Egito|egípcios]], e [[Elefante de guerra|elefantes de guerra]]. Estas últimas unidades, mencionadas com destaque pelos contemporâneos das guerras púnicas, na realidade foram limitadas em número e só usadas tardiamente, provavelmente depois das [[guerras pírricas]] {{-nwrap||280|275}}. O seu uso tinha objetivos mais psicológicos do que de combate. Os elefantes eram provavelmente de uma espécie local, menor do que o [[elefante-asiático]]. Segundo alguns autores, os [[cornaca]]s (condutores) seriam de origem [[Índia|indiana]].{{sfn|Dridi|2006|p=122}}

===Técnicas e manobras===
[[Imagem:Slaget_ved_Zama_-_Cornelis_Cort,_1567.jpg|thumb|A [[batalha de Zama]] na visão de [[Cornelis Cort]] {{nwrap||1533|1578}}]]

Entre as contribuições de origem macedónica à arte da guerra cartaginesa, os historiadores salientam a organização em falange{{sfn|Dridi|2006|p=123}} e a disposição das tropas em campanha e nos campos. Entretanto, algumas alterações devem-se a Aníbal Barca: a importância estratégica da cavalaria, novas manobras de envolvimento do adversário ([[batalha de Canas]]),{{sfn|Dridi|2006|p=124-125}} e ainda uma tática de emboscada para atenuar uma desvantagem numérica, como na [[batalha do Lago Trasimeno]]. Os elefantes de guerra, apesar de pouco usados e apenas tardiamente, eram muito notados pelos adversários, e desempenhavam um papel de intimidação e desorganização das linhas inimigas.

No que concerne à guerra no mar, o habitual na época era armar os navios de [[Rostro (náutica)|rostros]] (esporões) atacar as embarcações inimigas. Para contrariar o avanço cartaginês, os romanos conceberam o [[corvo (arma)|corvo]], para facilitar a [[abordagem]] e ganhar vantagem. Foi graças a este dispositivo que lograram derrotar Cartago na [[batalha de Milas]].

Os cartagineses eram também mestres em [[poliorcética]] (técnicas de [[cerco]]), usando [[Torre de cerco|torres de cerco]], [[balista]]s e [[catapulta]]s.
{| {{style-center}}
|+ '''Soldados do exército cartaginês imaginados por Theodore Ayrault Dodge (1891)'''
|- valign=top
| [[Imagem:Sacred band footman.PNG|thumb|x200px|Soldado da [[Legião Sagrada]]]]
| &nbsp;
| [[Imagem:Numidian cavalry.png|thumb|x150px|[[Cavalaria númida|Cavaleiro númida]]]]
| &nbsp;
| [[Imagem:Libyan phoenician lancer.png|thumb|x150px|[[Lanceiro]] líbio]]
| &nbsp;
| [[Imagem:Hannibal spanish soldier.png|thumb|x200px|Soldado [[Iberos|ibero]]]]
|}
==Política e sociedade==
===Instituições===

A organização política de Cartago foi elogiada por numerosos autores antigos, que destacavam a sua ''«reputação de excelência»''".{{Harvy|polib|Políbio|loc=VI, 43}} Apesar de serem conhecidos poucos detalhes sobre o governo da grande cidade, dispõe-se, contudo, de um texto precioso de Aristóteles que descreve como um modelo de constituição "mista", equilibrado e que apresentava as melhores caraterísticas de diversos tipos de regimes políticos.<ref name=AristII116/> Este documento alimentou um debate animado, com certos historiadores, como {{ilc|nl=s|Stéphane Gsell}}, a considerarem-no uma descrição tardia.{{sfn|Gsell|1918|p=184}} A generalidade dos investigadores entende que houve uma evolução das instituições ao longo da história.{{sfn|Sznycer|1978|p=562-563}}

Não obstante a insuficiência de informações disponíveis sobre Cartago, os dados são muito mais importantes do que sobre as outras cidades púnicas.

====Problemática da realeza em Cartago====
Apesar de [[Dido]], que segundo a [[mitologia]] teria sido a fundadora de Cartago, fazer parte de uma [[família real]], a lenda da cidade não a menciona como rainha. Os autores gregos e latinos referem a presença de ''basileis'' ou ''reges''. A teoria da realeza de Cartago, defendida e desenvolvida veementemente por [[Karl Julius Beloch]] {{nwrap||1854|1929}} e [[Gilbert Charles-Picard]] {{nwrap||1913|1928}} é atualmente refutada pela maior parte dos historiadores. Uma parte da historiografia faz supor que houve ambições monárquicas no modelo helenístico dos [[Bárcidas]] na [[Hispânia]], uma hipótese também refutada por Maurice Sznycer.{{sfn|Sznycer|1978|p=566-567}}

O mundo fenício-púnico não ignorava, porém, a monarquia: os reis fenícios mencionados em Tiro não eram, contudo, detentores de um poder absoluto.{{sfn|Sznycer|1978|p=565}}

====Sufetes====
O modelo político de Cartago devia ser semelhante ao de Roma, conforme as tradições orientais e de Tiro, com um [[senado]] e dois [[sufete]]s (literalmente: "[[Juiz|juízes]]"), eleitos anualmente, mas chamados "reis" pelos romanos e gregos devido à incapacidade de encontrarem nas suas culturas um termo adequado para transmitir a realidade púnica.{{sfn|Sznycer|1978|p=568}}

Supõe-se que estes sufetes exerciam simultaneamente o poder [[poder judiciário|judiciário]] e [[poder executivo|executivo]], mas não o poder militar, reservado aos chefes eleitos separadamente todos os anos pela assembleia do povo e recrutados entre as grandes famílias da cidade. [[Aníbal Barca]], por exemplo, foi eleito sufete depois da [[batalha de Zama|derrota de Zama]] em {{AC|196|x}}, segundo [[Tito Lívio]].<ref name=titliv/> O poder dos sufetes era provavelmente um poder civil de administração da coisa pública.<ref name=senec/>

====Elementos oligárquicos====
Os sufetes eram assistidos por um "Conselho dos Anciãos". Os textos históricos evocam os "Anciãos de Cartago" da mesma forma que em [[Léptis Magna]] ainda eram mencionados os "Grandes de Léptis Magna" em plena época romana.{{sfn|Sznycer|1978|p=576}} Aquele conselho foi assimilado ao senado, sendo os seus membros designados nas diversas fontes como "gerontes" ou "seniores".

O senado, provavelmente composto por membros das famílias influentes, contava certamente com várias centenas de membros.{{sfn|Sznycer|1978|p=578}} Tinha competência para todos os assuntos da cidade: guerra, paz, [[diplomacia]], etc. Os generais prestavam contas dos seus atos perante esta assembleia, que tinha a última palavra sobre todos os negócios do estado. Não se sabe se os sufetes eram eleitos por estes [[Oligarquia|oligarcas]] ou pela assembleia do povo.

Além destes, Aristóteles é o único autor clássico que menciona um conselho restrito, os "Cento e Quatro" ou os "Cem" e as "pentarquias".<ref name=AristII1137/> Pouco se conhece destas instituições; segundo [[Marco Juniano Justino|Justino Frontino]] ({{+séc|II}}), a primeira teria funções judiciárias.{{Harvy|just|Justino|loc=''Epitoma hist.''. XIX, 2, 5, 6}}

====Elementos democráticos====
O texto de Aristóteles menciona uma assembleia do povo e, a crer em Políbio, ela tomou o poder durante os séculos III e {{AC|IV|X}}{{Harvy|polib|Políbio|loc=VI, 51}} O seu poder era sem dúvida grande; o mesmo autor fala de [[Corrupção política|corrupção]] muito difundida para a obtenção de magistraturas. e de comandos militares.{{Harvy|polib|Políbio|loc=VI, 56, 4}} Supõe-se que assuntos sobre os quais havia desacordo entre as instituições oligárquicas eram levados a esta assembleia, mas isso não é comprovado por provas arqueológicas. Também se supõe que só os homens livres eram admitidos na assembleia. Algumas fontes, como Diodoro Sículo, referem uma reunião na ágora da cidade.{{Harvy|diod2094|Diodoro Sículo|loc=20.9.4}}

Estas incógnitas não permitem determinar qual era o grau de [[democracia]] na antiga Cartago. Contudo, parece claro que as principais famílias de comerciantes exerciam o essencial do poder.

===Organização social===
A sociedade cartaginesa era muito estratificada. O essencial do poder económico, político e religioso era detido por uma [[aristocracia]] originária de Tiro. O resto da população distribuía-se em proporções desconhecidas em artesãos, comerciantes e um [[proletariado]] heterogéneo composto de escravos e de populações nativas ou púnicas. O lugar da mulher ainda é tema de debate.

====Estratificação da sociedade====
A aristocracia cartaginesa era caracterizada pela sua origem em Tiro (fenícia), sendo a sua fortuna ligada às funções de [[Armador (marinha)|armadores]], proprietários rurais e a funções ligadas ao poder político e judiciário. Tinham um modo de vida luxuoso e viviam no cabo Bon ou no bairro de Mégara.

Era no seio desta aristocracia que se deviam recrutar os [[sacerdote]]s, formavam uma classe muito organizada mas que não desempenhavam qualquer papel político. O sacerdócio podia ser igualmente exercido pelas mulheres. Os seus trajes são conhecidos graças à "estela do sacerdote com a criança" encontrada no {{ilc|tofete|Tofete de Cartago|Tofet de Salammbô|Tophet de Cartago}}, na qual a personagem identificada como o celebrante enverga uma túnica de [[linho]] e uma touca peculiar que coroa a cabeça rapada.

As classes mais baixas são mal conhecidas, mas supõe-se que eram formadas por homens livres e escravos que podiam pertencer a uma pessoa ou ao estado. Além disso, encontravam-se nas cidades cartaginesas alguns estrangeiros originários da [[Bacia do Mediterrâneo|bacia mediterrânica]].{{sfn|Dridi|2006|p=97-102}}

====Mulheres====
Não obstante as suas personalidades fortes e destinos trágicos, como são os casos de [[Dido]] (ou Elissa), [[Sofonisba]] e a esposa de [[Asdrúbal, o Beotarca]], as mulheres de Cartago aparecem pouco nas fontes históricas conhecidas. Apesar de marcada por um caráter [[Sociedade patriarcal|patriarcal]], a sociedade cartaginesa concedia uma certa independência relativa às mulheres. O estudo das estelas do tofete de Cartago pôs em evidência [[sacrifício]]s efetuados pelas mulheres em seu próprio nome.{{sfn|Dridi|2006|p=239}} Além disso, aparentemente era-lhes permitido desenvolver algumas atividades profissionais.

Esta independência era, todavia, atenuada por uma certa instrumentalização das mulheres ao serviço das suas famílias, no momento de escolher esposo ou para fins políticos ou económicos. A história de Sofonisba é particularmente evocativa desta sujeição, tendo casado sucessivamente com os reis [[Numídia|númidas]] [[Sífax]] e depois [[Massinissa]]. Sofonisba era filha do general cartaginês [[Asdrúbal Giscão]] e casou-se com Sífax por ordem do seu pai para selar uma aliança de Cartago com o reino númida.{{sfn|Dridi|2006|p=241}} O contexto do casamento é pouco conhecido e não se sabe se a [[poligamia]] era praticada. Por sua vez, encontram-se casos de casamentos mistos nas fontes e talvez se possam também encontrar provas disso nas escavações de sepulturas múltiplas, com um [[rito]] fenício para um dos indivíduos sepultados e africano para outro.

====Populações nativas====
O estudo das populações autóctones é ainda mais complicado. O contacto com os primeiros navegadores, apesar de ser concebível através do ''{{ilc|comércio silencioso|comércio silencioso (Heródoto)|comércio silencioso|negociação silenciosa}}'' relatado por [[Heródoto]], com objetivos puramente comerciais, transformou-se numa relação que se pode considerar de dominação.<ref name=pol71/> É comprovado através de diversos texto conservados que a dominação cartaginesa era forte, tanto no momento da conquista como nos tempos difíceis das guerras púnicas, como é testemunhado pelas revoltas que então se sucederam. No entanto, as populações nativas do exterior, em particular sob a égide de Massinissa, contribuíram para a queda da cidade devido às suas sucessivas invasões durante a segunda metade do {{-séc|II}}

==Economia==
[[Ficheiro:Carthage National Museum representation of city.jpg|thumb|Representação artística da cidade de [[Cartago]] em seu apogeu]]
Cartago constituiu um império comercial marítimo, terrestre e agrícola. As ligações entre todos os territórios, quer púnicos quer sob a sua influência, faziam-se por mar graças à marinha cartaginesa.

===Comércio===
====Rota dos metais preciosos e produtos importados====
Os cartagineses, como os seus ancestrais fenícios, eram excelentes marinheiros e comerciantes. O historiador latino [[Plínio, o Velho]] escreveu a propósito disso que ''«os púnicos inventaram o comércio»''.{{sfn|Decret|1977|p=1033}}

Como Tito, Cartago negociava em metais, procurando sobretudo [[Matéria-prima|matérias-primas]], o que lhe permitiu assegurar a sua riqueza e desenvolver a sua rede mercante. Aos entrepostos no sul da [[Península Ibérica]] ([[Tartessos]]) chegava [[prata]], [[estanho]] e [[couro]]. Nessa região, as [[Mina (mineração)|minas]] eram facilmente acessíveis e de exploração fácil. O estanho provinha igualmente das chamadas ilhas [[Cassitérides]] (atual [[Grã-Bretanha]]).

Paralelamente, os cartagineses também [[Importação|importaram]] e difundiram pequenos objetos [[manufatura]]dos, embora essa fosse uma atividade secundária: [[cerâmica]]s gregas e etruscas e, desde o {{-séc|VII}}, elementos do artesanato egípcio, como [[amuleto]]s. O comércio era praticado também por [[caravana]]s, mas este meio era bastante mais aleatório e perigoso. O comércio terrestre permite explicar alguns assentamentos, em particular no que são hoje a [[Líbia]] e no sul da [[Tunísia]]. A principal atividade dos fenício-púnicos era exportar os metais em estado bruto para o [[Oriente]]. Até ao {{-séc|VI}} gozaram de um [[monopólio]] do comércio e navegação no Mediterrâneo ocidental graças ao qual desfrutavam de livre acesso aos metais e aos recursos humanos e agrícolas de regiões inteiras.

====Produtos exportados====
Os cartagineses [[Exportação|exportavam]] produtos manufaturados pelos seus artesãos ou importados: peças em cerâmica ou [[vidro]] (uma especialidade fenícia), tecidos tingidos de [[Púrpura tíria|púrpura]] (outra especialidade fenícia, derivada do [[Gastrópodes|gastrópode]] marinho [[Murex (zoologia)|murex]] e altamente apreciada na Antiguidade), e ainda trabalhos em [[marfim]], madeira e metal (revestimentos em marfim, ouro ou prata de diversos materiais). Devido ao seu caráter potencialmente perecível, é por vezes difícil identificar certos produtos de exportação. Os tecidos, muito afamados, não deixaram vestígios arqueológicos além de aglomerados de murex e de pesos usados no tingimento dos tecidos.

A viagens de [[exploração]] explicam-se pela busca de minerais e de novas oportunidades de negócio: o estanho da Grã-Bretanha e Ibéria, ou outras matérias-primas na [[África subsariana]]. Certos produtos negociados eram fabricados pelas oficinas cartaginesas.

===Agricultura e pesca===
====Territórios agrícolas de Cartago====
Na véspera da Primeira Guerra Púnica, Cartago controlava na Norte de África uma área de cerca de {{fmtn|73000|km²}}, uma área que corresponde ''grosso modo'' à atual Tunísia, onde os campos agrícolas totalizavam uma área superior à que dispunha Roma e dos seus aliados juntos. Após a conquista romana, passou a ser uma das principais regiões agrícolas do Império Romano, com uma população de cerca de quatro milhões de habitantes. Tal população necessitava de um abastecimento regular e um interior capaz de produzir em quantidade e qualidade suficientes. Além da produção de [[cereal|cereais]] destinada a todas as classes sociais, a produção [[agropecuária]] devia também satisfazer a procura de fruta e carne por parte dos mais abastados.

Esse território foi grandemente amputado pelos ataques de Massinissa no último meio século da existência da cidade, e ficou limitado a uma área inferior a {{fmtn|25000|km²}} em {{AC|146|x}}<ref name=dec85/>

A zona ocupada por Cartago em África era muito fértil, pois desfrutava de uma [[pluviosidade]] adequada para a produção agrícola. Estes recursos foram depois explorados pelos romanos quando constituíram a [[Província romana|província]] da [[África Proconsular]].{{sfn|Decret|1977|p=87-883}}

====Culturas e pecuária====
Desde cedo que Cartago instaurou uma [[divisão do trabalho]] entre culturas destinadas a especulação comercial, nas terras próximas da capital, e as culturas cerealíferas a cargo das populações líbias, estas últimas sujeitas a impostos. O peso destes impostos, em particular durante as guerras púnicas, pode ter tido influência no curso dos acontecimentos que levaram as populações do interior a revoltarem-se.{{Harvy|polib|Políbio|loc=I, 2, 71-72}}

O interior desenvolveu-se graças à produção de [[amêndoa]], [[figo]], [[azeitona]], [[romã]] (que era conhecida como um fruto púnico pelos romanos), [[vinha]] e [[trigo]]. Algumas destas plantas estavam já presentes em estado selvagem na região, mas os fenícios levaram outras espécies cuja produção era depois exportada para toda a bacia mediterrânica. É desse modo que se explica a presença de vestígios de produtos agrícolas púnicos em locais tão distantes como a Grécia.

A [[pecuária]] era praticada há longa data pelas populações autóctones, em particular a dos [[cavalo]]s, [[Gado bovino|bovinos]] e [[Mula|muares]].{{Harvy|polib|Políbio|loc=XII, 3, 3}}

;Técnicas agrícolas
O êxito de Cartago explica-se igualmente pelas suas proezas em matéria de [[agronomia]]. Os cartagineses desenvolveram algumas das técnicas agrícolas mais eficazes das Antiguidade, as quais foram adotadas pelos romanos através da tradução para [[latim]] do tratado do púnico {{ilc|Magão|Magão, o Cartaginês|Mago Carthaginiensis|Magão (escritor)|Magon, o Cartaginês|Magon (escritor)|Mago (escritor)|owl=en|owa=Mago (agricultural writer)}}.{{sfn|Decret|1977|p=873}} Na obra do agrónomo romano Columela, originário de Gades, há alguns fragmentos da obra púnica, nomeadamente um processo de [[vinificação]].<ref name=colXII3912/> A plantação de [[Oliveira|olivais]] obedecia a regras precisas, em particular o espaço entre as árvores, regras essas que por vezes ainda hoje são respeitadas.

Os utensílios agrícolas tinham um papel importante no melhoramento da produção, como é testemunhado pela presença de [[arado]]s, como o presente numa escultura descoberta no que é atualmente a Líbia, que mostra um arado puxado por um [[dromedário]],{{Harvy|sciv2|Heimburger|2008|p=37}} que deu continuidade à produção líbia tradicional.{{sfn|Decret|1977|p=88}}

;Pesca e produtos do mar
A [[pesca]] era uma atividade muito comum na época púnica e, além da produção de conservas em sal e de murex, atribui-se aos fenício-púnicos a popularização do uso do [[garo (condimento)|garo]] na bacia do Mediterrâneo. Este [[condimento]] à base de peixe gordo, usado na cozinha e como medicamento, era produzido em grande escala em instalações descobertas em vários sítios arqueológicos,<ref name=krig185/> A produção e comercialização do garo prossegui e foi expandida na época romana.

==Arte e artesanato==
===Escultura===
====Pedra====
O essencial dos elementos conservados até aos nossos dias está ligado a um uso funerário. Existem outras esculturas, mas de tamanho reduzido, como a [[Dama de Galera]] e o [[protomo]] de leão de Sant’Antioco.

Os [[cipo]]s e [[estela]]s, por vezes em forma de {{ilc|bétilos|Bétilo|Baetylus}} ou "casa do deus", deixam perceber uma evolução estilística. Esculpidas inicialmente em [[arenito]], estes elementos passam depois a ser feitos em [[calcário]], por vezes ladeados de [[acrotério]]s e de motivos incisos de influência marcadamente grega: motivos faunísticos, vegetais, humanos e sobretudo símbolos. A partir dos séculos V e {{AC|IV|x}} assiste-se à difusão do motivo dito "{{Ilink condicional|símbolo de Tanit||símbolo de [[Tanit]]}}" se encontra em muitos outros suportes. No passado pensava-se que só estava presente no Mediterrâneo ocidental, mas as investigações mais recentes mostram a sua presença em sítios do [[Levante (Mediterrâneo)|Levante]].<ref name=dicCiv417/> São ainda reconhecidos outros motivos, como o do {{Ilink condicional|ídolo-garrafa||[[ídolo]]-garrafa}} Distinguem-se diferenças locais, em particular em [[Mócia]], onde as representações humanas são mais precoces e mais generalizados do que em Cartago.{{sfn|Lancel|1992|p=448}}

Os [[sarcófago]]s são muito representativos da mestiçagem própria dos fenício-púnicos: o tipo antropoide originalmente presente na Fenícia evoluiu no Mediterrâneo ocidental. Além dos descobertos em África, há exemplos bem conservados na [[Sicília]] e na [[Península Ibérica]]. No {{-séc|IV}}, o estilo muda na Tunísia, passando a figurar por cima uma estátua do defunto.<ref name=dicCiv392/> Os sarcófagos de Santa Mónica, denominados "do sacerdote e da sacerdotisa", conservados no [[Museu Nacional de Cartago]], são particularmente interessantes pelo tratamento do vestuário e da atitude dos personagens: o sacerdote tem a mão direita levantada num gesto de bendição,{{Harvy|lesphen7|Parrot; Chéhab; Moscati|2007|p=214}} por sua vez, a sacerdotisa segura uma pomba; as mãos esquerdas das duas personagens seguram um vaso de [[Olíbano|incenso]] de uso [[Liturgia|litúrgico]] conhecido, no qual se baseia o nome das obras.{{Harvy|slimF|Slim; Fauqué|2001|p=73}}

====Terracota====
A produção de [[terracota]], muito variada, consistia em [[máscara]]s grotescas de caraterísticas marcadas, sem dúvida de origem levantina.{{sfn|name=guz108|Guzzo|2007|p=108}} As formas são variadas; as rugas e as bocas deformadas são por vezes acompanhadas de motivos geométricos. Foram também encontradas máscaras com traços [[Negros|negroides]]. Destinadas a serem penduradas, estas máscaras tinham uma função [[Apotropismo|apotropaica]], isto é, para afastar os [[demónio]]s.

Existiam também protomos representando a parte superior do corpo de homens ou mulheres. O estilo deste tipo de peças é diverso, por vezes egípcio, mas também grega a partir do {{-séc|VI}}, e foi estabelecida uma classificação.{{sfn|Lancel|1992|p=455-460}}

A produção de ''[[coroplathie]]'' encontrava-se generalizada em muitos sítios púnicos, desde o Norte de África até às [[Baleares]], passando pela Sicília e pela [[Sardenha]]. Trata-se de figurinhas moldadas, que seguram objetos (por exemplo [[pandeireta]]s), ou pequenos animais. Os estereótipos fenício-púnicos coabitam com outros estereótipos [[Helenização|helenísticos]] ou ligados à produção local.<ref name=guz108/> A mesma técnica foi também usada em peças de várias dimensões, de uso religioso, inclusivamente depois da queda de Cartago. Descobriram-se vários exemplares nas escavações do santuário de {{ilc|Tinissute||Bir Bouregba|Bir Bou Regba}} no [[cabo Bon]], nomeadamente uma pequena escultura de do deus [[Ba'al Hammon]] entre duas [[esfinge]]s e duas representações de grande dimensão de [[Tanit]] "cabeça de leão" e de [[Deméter]].

===Vida quotidiana===
Os púnicos eram artesãos especializados e reconhecidos. Os gregos atribuíam-lhe a reputação de venderem ''bibelots'' e [[missanga]]s fabricadas pelos artesãos em troca de produtos de valor como matérias-primas provenientes das regiões onde abordavam os seus navios. Deste modo, numerosos objetos e ''bibelots'' fenícios de inspiração diversa (grega, egípcia, etc.) foram descobertos em sítios que eles frequentavam. As necrópoles que foram escavadas desde o {{séc|XIX}} forneceram material arqueológico importante e variado que denota um artesanato desenvolvido.{{sfn|name=guz106|Guzzo|2007|p=106}} trabalhos em metais, em particular exemplos de lâminas de barbear em bronze frequentemente ornamentadas com motivos gravados, pequenas máscaras de pasta de vidro com funções apotropaicas que ornamentavam [[colar]]es, marfim e osso esculpido e ainda [[joia]]s.

;Cerâmicas
No que concerne à [[olaria]] usada no dia-a-dia, fora do contexto religioso, nas escavações foram encontradas peças de cerâmica destinadas ao uso alimentar ou culinário, além de [[Lâmpada a óleo|candeias de azeite]] cujas formas revelam uma produção estereotipada e racionalizada. Foram ainda encontrados exemplos de vasos-[[Mamadeira|biberão]].

A partir do {{-séc|II}}, há muitas imitações de importações gregas, mas persiste também uma produção típica dita "formas de bolo".{{sfn|name=lanc466|Lancel|1992|p=466}} Nas escavações nas necrópoles de Cartago foram encontradas [[maqueta]]s que representam elementos da vida quotidiana, como um [[forno]] de [[pão]] de tipo ''[[tabouna]]''{{
nre|
1=O pão ''[[tabouna]]'', é um pão artesanal da [[Tunísia]], semelhante ao [[chapati]] [[Índia|indiano]]. O termo ''tabouna'' designa igualmente o [[forno]] de [[terracota]] onde esses pães são cozidos.
}} que se encontra no Museu Nacional de Cartago, e também pequenas peças de mobiliário que permitem imaginar como seria o interior das casas.

;Amuletos
Foram encontrados numerosos [[amuleto]]s em osso, massa de vidro e pedra nas sepulturas, principalmente de mulheres e de crianças, os quais tinham como função proteger os defuntos através de ritos mágicos. Eram importados — sobretudo do Egito — ou fabricados localmente. Alguns temas são recorrentes, como os deuses egípcio [[Hórus]] e, principalmente, [[Bes]], e também o [[olho de Hórus]].<ref name=dicCiv2728/>

;Joalharia
Nas necrópoles foram encontradas [[joia]]s sumptuosas em ouro, prata e [[Pedra semipreciosa|pedras semipreciosas]]. Ligada à estrutura de comércio fenício-púnico e resultante de uma longa tradição oriental, esta produção consiste em [[colar]]es muito pesados, mas também [[Anel|anéis]], [[brinco]]s em forma de anel para as orelhas e nariz (estes também chamados ''nezem''), que dão ideia da aparência que deviam ter os púnicos, um aspeto amplamente ridicularizado nas fontes clássicas. Foram também descobertas joias em forma de [[escaravelho]] e estojos porta-amuletos com funções evidentes de proteção.<ref name=pis418/>

;Peças de marfim e osso
Foram descobertas pequenas tabuletas em marfim esculpido, um material frequentemente substituído por osso, de custo mais baixo. A influência oriental ou egípcia é recorrentes nestes artefatos frequentes em diversos sítios do Mediterrâneo, tanto ocidental como oriental. Grande número de objetos desta natureza data dos séculos VIII a {{AC|IV|x}} e a presença de marfim em estado bruto nos mesmos locais sugere um fabrico local.<ref name=guz106/>

;Lâminas de barbear
Nas necrópoles posteriores ao {{-séc|VII}} foram encontradas numerosas lâminas de barbear em [[bronze]] ou [[ferro]]. Tais objetos estavam ligados a uma simbologia de purificação dos defuntos, exercendo uma função religiosa ou de [[talismã]].{{sfn|Lancel|1992|p=453}} Podiam destinar-se a ser pendurados, pelo menos no caso das lâminas presentes no espaço ibérico.

A partir do {{-séc|V}}, estes objetos passam a ser decorados com desenhos. Estes — por vezes presentes nas duas faces nos casos dos exemplares mais tardios — testemunham influências variadas, essencialmente egípcias ou [[Civilização egeia|egeias]]. a produção pode ter sido desenvolvida autonomamente nas diversas regiões das possessões cartaginesas, demonstrando reais capacidades criativas.<ref name=dicCiv371/>

;Vidro
Segundo uma lenda relatada por Plínio, o Velho,{{Harvy|plinio|Plínio, o Velho|loc=XXXVI, 190-191}} o [[vidro]] foi inventado por fenícios, que teriam mantido o segredo do seu fabrico durante muito tempo. De facto, não há dúvida que eles desenvolveram a técnica de sopro e sobretudo comercializaram a sua produção de vidro em larga escala,<ref name=dicCiv490/> o que terá dado origem à lenda.

As descobertas de vidro são muito frequentes nos sítios arqueológicos,<ref name=ubert536/> tanto Mediterrâneo ocidental como no oriental. Os objetos mais típicos são pequenas máscaras de figuras humanas, com fácies variados, destinadas serem enfiadas em colares que também incluíam pequenas esferas de vidro. Havia também pequenos potes de [[pomada]] ou [[perfume]]. As peças mais notáveis são coloridas na pasta do vidro.

;Numismática e glíptica
As [[Moeda (peça metálica)|moedas]] cartaginesas surgem tardiamente, não sendo anteriores a 480 ou {{AC|430|x}}<ref name=dicCiv320/> Os elementos que figuram nas moedas cartaginesas do Norte de África, Sicília, Sardenha, Península Ibérica e nos últimos três séculos da existência metrópole testemunham uma grande diversidade nos temas abordados. A [[glíptica]] (arte de gravação de pedras) era muito generalizada e provinha de uma longa tradição oriental: foram encontrados numerosos [[sinete]]s nas necrópoles púnicas, nos quais se nota uma certa degeneração a partir da segunda metade do {{-séc|IV}}<ref name=dicCiv194/>

==Língua e literatura==
===Língua e escrita===
{{Artigo principal|Língua púnica}}
A [[língua fenícia]] serviu de ligamento e de fundo linguístico e cultural comum aos fenícios do ocidente,<ref name=lanc466/> cujo centro era Cartago, a púnica. Esta língua, usada tanto pelas elites como pelas populações sob influência púnica — [[númidas]] e [[berberes]] do [[Magrebe]] (como em [[Marrocos]]), mas também [[iberos]] e outras populações do reino de [[Tartessos]] (no sul da [[Hispânia]]) — era veiculada em profundidade nos seus territórios.

Apesar da predominância do [[latim]], perdurou até à chegada dos [[Conquista muçulmana do Magrebe|invasores árabes]] no {{séc|VII}}. Nesta altura, a língua em declínio tinha-se tornado um [[patoá]] local, pelo menos em certas regiões. Corolário da língua, o uso do [[alfabeto fenício]], antepassado do [[alfabeto grego]], espalhou-se em toda a bacia mediterrânica até se tornar o veículo do pensamento dos povos da esfera púnica. Esta escrita sem [[Vogal|vogais]] foi modificada após a implantação romana no Norte de África, passando a incluir vogais. O seu aspeto foi-se modificando ao longo do tempo e diferindo conforme as regiões. No {{séc|IV}}, o alfabeto latino era usado para transcrever a língua púnica.{{sfn|Lancel|1992|p=587}}

===Literatura e epigrafia===
{{Artigo principal|Literatura fenício-púnica}}
A [[literatura]] cartaginesa não chegou até nós, mas sabe-se que existiam em Cartago numerosas bibliotecas, o que indica alguma produção literária ou pelo menos uma difusão da literatura da época, em particular da [[língua grega]].{{sfn|name=guz121|Guzzo|2007|p=121}} A [[filosofia]] era divulgada no meio púnico, e são conhecidos alguns nomes de filósofos, pelos escritos de [[Diógenes Laércio]] e [[Jâmblico]].{{sfn|Dridi|2006|p=196}} O filósofo mais célebre de origem cartaginesa é sem dúvida [[Clitómaco (filósofo)|Clitómaco]], que foi para [[Atenas]] em 163 ou {{AC|162|x}}, onde foi discípulo de [[Carnéades]] e chegou a líder da [[Academia de Platão|Academia]].

Existia literatura de [[direito]], [[história]] e [[geografia]], embora toda ela se tenha perdido. Todavia, foram conservados fragmentos do importante tratado de [[agronomia]] de {{ilc|Magão|Magão, o Cartaginês|Mago Carthaginiensis|Magão (escritor)|Magon, o Cartaginês|Magon (escritor)|Mago (escritor)|owl=en|owa=Mago (agricultural writer)}}, que teve grande influência sobre os romanos, como se comprova pelo facto da sua tradução para latim ter sido decidida pelos conquistadores imediatamente a seguir à tomada de Cartago.<ref name=guz121/> Os autores romanos posteriores, como [[Plínio, o Velho]],<ref name=pl22/> [[Marco Terêncio Varrão|Varrão]]{{Harvy|varr|Varrão|I, 1, 10-11}} e [[Columela]],<ref name=colI13/><ref name=colXII42/> citam vários extratos e não poupam elogios ao autor. O relato do périplo de [[Hanão]], apesar de ser um texto em redigido em grego, deve ser a tradução de um texto púnico, provavelmente exibido num templo púnico. Porém, sendo de difícil interpretação, esse documento suscita muitas polémicas.{{sfn|name=hmied17|Hours-Miédan|1982|p=17}}

Apesar de tudo, as numerosas estelas encontradas fornecem um conjunto de inscrições, nomeadamente as descobertas nos tofetes, entre os quais o de Cartago. Estes textos foram reunidos na obra ''[[Corpus Inscriptionum Semiticarum]]'', iniciada por [[Ernest Renan]] em 1867 e interrompida em 1962,{{sfn|Hours-Miédan|1982|p=16}} mas por aparentarem ser muito estereotipados pouco adiantam para o conhecimento da cidade. Além disso, dão pouca informação sobre a [[onomástica]] e por isso conhecem-se poucos nomes próprios.

Por outro lado, os arqueólogos descobriram um pequeno número de documentos chamados "tarifas de sacrifícios", que eram colocados nos tempos.<ref name=hmied17/> O mais conhecidos deles é a "tarifa de [[Marselha]]", assim chamado por foi encontrado no porto daquela cidade. Não obstante a sua localização, ele é, segundo os especialistas, de origem cartaginesa. Cabe ainda citar como inscrição particular o caso das [[Tábuas de Pirgos|lamelas de Pirgos]], encontradas em [[Cerveteri]], [[Itália]], que lançam alguma luz sobre as relações entre [[etruscos]] e cartagineses no {{-séc|VI}}

==Religião==
A [[religião]] é o aspeto da civilização cartaginesa que foi objeto da maior polémica, devido às acusações de monstruosidade a propósito dos [[sacrifício]]s de crianças mencionados nas fontes antigas, desde [[Diodoro Sículo]] a [[Tertuliano]]|,{{Harvy|tert|Tertuliano|loc=2-3}} retransmitidas até à atualidade por numerosos estudiosos.

===Panteão===
A [[mitologia]] de Cartago foi em grande parte herdada dos fenícios, e a sua religião, apesar ter sido transcrita em latim ou em grego nas fontes antigas, conservou ao longo da sua história o caráter profundamente [[Semita|semítico]] ocidental.{{sfn|Sznycer|1978|p=586}}

O [[panteão]], fundado sobre uma base semítica, evoluiu ao longo do tempo, muitas vezes depois de um encontro com tradições locais. Além disso, certas divindades adquiriram em diversas colónias o caráter de políade (divindade local ou protetora de uma cidade). Assim, Tinnit ou [[Tanit]] pode considerar-se a políade de Cartago, [[Melcarte]] desempenhava esse papel em [[Gades]], onde tinha um templo célebre; na [[Sardenha]] existia Sid (que na época romana se passou a chamar ''[[Sardus Pater]]'').{{sfn|Dridi|2006|p=172}}

O panteão, o qual tinha um número relativamente elevado de divindades, era dominado por [[Ba'al Hammon]] no Norte de África, que era frequentemente acompanhado de Tanit (face de Ba'al), como sua ''paredros'' (consorte). Ba'al e Tanit adquiriram provavelmente caraterísticas específicas no Norte de África, pois no Oriente as caraterísticas de Ba'al diferem das da divindade cartaginesa e [[Astarte]], que era a sua ''paredros'' no Oriente, parece tido pouca expressão no mundo cartaginês, apesar de haver sinais do seu culto.{{sfn|Sznycer|1978|p=588}}

Observa-se uma certa continuidade religiosa — os antigos deuses fenícios sempre foram venerados pelos cartagineses, como Astarte, deusa da fecundidade e da guerra, [[Eshmun]], deus da [[medicina]], e Melcarte, deus fenício da expansão e do enriquecimento da experiência humana. Este último adquire as caraterísticas do [[herói]] grego [[Héracles]]. A figura de Ba'al Hammon, originário da Fenícia, foi também influenciado pelos egípcios. [[Amon]] era conhecido na Líbia e praticamente em todo o Norte de África, e foi também assimilado a um deus local cuja representação era igualmente um [[Ovelha|carneiro]]. Este deus e o seu culto estavam relacionados com o fogo e o sol. Na época romana, o culto de Ba'al adotou alguns traços de [[Júpiter (mitologia)|Júpiter]], deus maior do [[Religião romana|panteão romano]], e ainda era era praticado quando o cristianismo chegou.

Por fim, pelo menos um [[Religião na Grécia Antiga|culto grego]], o de [[Deméter]] e Coré ([[Perséfone]]), ligado à fertilidade e às colheitas estava presente na cultura cartaginesa durante a guerra greco-púnica. Segundo Diodoro Sículo, depois da destruição do templo daquelas deusas em [[Siracusa]] em {{AC|396|x}}, abateram-se calamidades sobre o exército cartaginês, o que levou as autoridades a introduzirem os seus cultos a fim aplacarem as divindades. Existem ainda indícios de culto à deusa egípcia [[Ísis]].{{sfn|Dridi|2006|p=177}}

As divindades do panteão púnico eram particularmente honradas nos momentos importantes da história, por exemplo para prestar homenagem ao sucesso de uma expedição marítima ou para favorecer uma iniciativa militar em preparação.

===Santuários e ritos===
Os lugares de culto são construções específicas ou espaços adaptados. Forma descobertos muitos templos em diversos locais; a sua localização não obedecia a uma regra precisa. Os situados à beira-mar beneficiavam do contacto com os estrangeiros (oferendas, [[ex-voto]]s, doações, etc.). Também foram descobertos santuários em grutas.

A religião era um assunto do Estado em Cartago; apesar dos sacerdotes não intervirem diretamente na política interna e externa, tinham uma grande influência sobre uma sociedade profundamente religiosa. Os cultos eram estruturados por uma hierarquia de sacerdotes cujos cargos mais elevados eram ocupados por membros das famílias mais poderosas da cidade.{{sfn|Dridi|2006|p=178}} Toda uma sociedade parece ter estado ligada aos templos: servos, [[Barbeiro (profissão)|barbeiros]], [[Escravidão|escravo]]s, etc. Os fiéis podiam comprar ex-votos nas dependências dos lugares de culto.{{sfn|Dridi|2006|p=180}} Em alguns templos existia [[prostituição]] sagrada, masculina e feminina, definitiva ou apenas provisória. Isso acontecia por exemplo em [[Sica Venéria]] (atual El Kef), segundo [[Valério Máximo]].{{Harvy|valm|Valério Máximo}}

Os cultos tinham um papel económico importante graças às oferendas (como carne e outros alimentos) aos deuses e aos sacerdotes. Os sacrifícios tinham também um peso significativo: as "tarifas" eram definidas por cada tipo de sacrifício em função de cada pedido, e vários exemplos delas foram conservados; uma delas estava exposta no {{ilc|Castelo Borély||Château Borély}}, em Marselha. Os sacrifícios enumerados nesses documentos são variados: animais, pequenos (aves) ou grandes (bois), mas também vegetais, alimentos ou objetos. Depois da partilha do produto do sacrifício entre a divindade, sacerdote e fiel, era erigida uma estela em jeito de comemoração.{{sfn|Dridi|2006|p=185}}

A questão do [[tofete]] é fulcral nas polémicas em torno da religião púnica, devido à escassez e qualidade das fontes, o que dá azo às mais diversas interpretações. O tofete foi identificado com o ritual de ''[[Moloch]]'' relatado pelos autores antigos como sendo um sacrifício de crianças. Em vários tofetes os arqueólogos encontraram numerosas estelas com inscrições estereotipadas que evocam a realização de um voto ou agradecimento:
{{Citação2|cinzabq=s|
1=À grande dama Tanit Pene Péné Ba'al e ao senhor Ba'al Hammon, o que ofereceu [fulano], filho de [sicrano], que ele [Ba'al] ou que ela [Tanit] oiça[m] a sua voz e o bendiga[m].{{sfn|Lancel|1995|p=41}}
}}
Contudo, estes textos continuam pouco explícitos e são sobretudo repetitivos.{{sfn|Lancel|1995|p=340}}

Não obstante as menções nas fontes antigas, deve salientar-se a ausência de indicações a esses sacrifícios em certos textos essenciais, como os de [[Tito Lívio]]. Este silêncio é algo surpreendente pois os romanos não tinham qualquer interesse em esconder o que quer que fosse que teria justificado a sorte reservada a Cartago.{{sfn|Lancel|1995|p=348}} O debate sobre o sacrifício de crianças na civilização púnica ainda não foi encerrado, pois a ciência não está em condições de descobrir as causas da mortes a partir das ossadas contidas nas urnas nem de dizer se aqueles lugares eram outra coisa que não necrópoles para crianças.

Os cultos e a sua prática deixaram vestígios visíveis nas diferentes colónias fenícias do Mediterrâneo ocidental, que se tornaram cartaginesas, mas também entre os povos que tiveram contacto com essa civilização, como os [[berberes]] da [[Numídia]] e [[Mauritânia (Antiguidade)|Mauritânia]] e os [[iberos]].

===Religiosidade popular===
Nota-se uma diferença entre a religião do estado e a crença popular, visível nos [[amuleto]]s e outros [[talismã]]s com fins de proteção contra os demónios ou doenças, que revelam uma forte [[Religião no Antigo Egito|influência egípcia]]. Entre as classes populares praticava-se o culto de [[Mitologia egípcia|divindades egípcias]], como o deus anão [[Bes]]. Numerosos objetos encontrados nas escavações tinham a função de proteger os vivos e os mortos (máscaras e amuletos representando Bes, mas também lâminas de barbear). A magia impregnava a vida; tanto era praticada [[magia branca]] (para o bem), como a [[magia negra]] (para eliminar potenciais rivais).{{sfn|Dridi|2006|p=194}}

O [[culto dos antepassados]] era provavelmente observado no seio das habitações familiares, mas permanece relativamente obscuro. Algumas proibições alimentares, em particular a do [[porco]], foram observadas até ao início do {{+séc|IV}}{{sfn|Dridi|2006|p=182}}

Os púnicos acreditavam numa vida depois da morte, o que é atestado pela câmaras funerárias — apesar da [[cremação]] também ser sido praticada — onde os defuntos eram preparados para a sua vida no Além com oferendas de comida e bebida. Os túmulos eram decorados como uma moradia e eram perfumados antes de serem fechados. Alguns mortos eram deitados segundo o rito oriental, enquanto que outros eram colocados em posição fetal, segundo a tradição berbere, e revestidos com [[ocre]], o que mostra uma influência local sobre a religião cartaginesa, pelo menos no Norte de África. Do mesmo modo, foram encontrados em túmulos púnicos das ilhas [[Baleares]] estatuetas típicas da cultura local.

==Civilização exógena e mestiçada==
A vida cultural da civilização cartaginesa, que alguns classificaram de [[talassocracia]] devido à sua relação estreita e durável com o mar, resultou da mistura das influências indígenas, fenícia, grega e também egípcia.

===Persistências orientais e contribuições africanas===
A arte fenícia é uma subtil mistura de elementos gregos e egípcios. A cultura egípcia influenciou profundamente os fenícios desde o {{AC|3º milénio|x}}, mas a cultura helénica passou a ser a principal influência a partir do {{-séc|IV}} A cultura fenícia emerge a partir do colapso egípcio na sequência da invasão dos [[Povos do Mar]] no {{-séc|XIII}} Antes disso, a cultura fenícia confundia-se com as suas congéneres da área [[Síria|sírio]]-[[Líbano|libanesa]] ([[Canaã]]). Alguns púnicos do ocidente chamavam-se a si próprios [[cananeus]] durante muito tempo após a absorção do império cartaginês pelos romanos. Devido à posição geográfica de Cartago e à presença dos fenícios no Mediterrâneo ocidental, a cidade púnica cristalizou e reagrupou esta presença, transformando-a num império com o desenvolvimento da colonização.

===Identidade cartaginesa===
A arte púnica, dos fenícios do ocidente, apresenta componentes egípcias, como o trabalho do vidro — com as pequenas máscaras de vidro dos túmulos púnicos, caraterísticos da mentalidade fenícia e que se destinavam a manter afastados do morto os maus espíritos ou demónios — e motivos como o [[Nymphaea lotus|lótus]] que se encontram em objetos ou na decoração de edifícios. A partir do {{-séc|IV}} aparecem vestígios da influência helénica que se sobrepõem às influências egípcias e se juntam à cultura fenícia primitiva.

O [[mausoléu]] líbio-púnico de [[Duga]] ocupa um lugar particular, pois ele simboliza o sincretismo arquitetural entre tradições egípcias e contribuições gregas ou helenísticas.<ref name=coar/> Há ainda outros testemunhos dessa arquitetura funerária monumental, como em [[Sabrata]].

A escultura evoluiu de um estilo [[hierático]], quase simbólico, para uma estética mais figurativa mas que idealizava a perfeição. O efebo de [[Mócia]], um mármore do {{-séc|V}} descoberto nas escavações terrestres em 1979, testemunha este contacto com o mundo grego da Sicília. Esta estátua deu origem a várias teses: alguns veem nela uma representação de [[Melcarte]], com uma nítida influência grega, enquanto que outros investigadores a consideram uma obra grega que foi levada para Mócia na sequência de operações militares. Há ainda outros que a identificam como uma obra encomendada a um artista grego da Sicília do {{-séc|V}}, mas feita segundo os cânones cartagineses, em particular no que se refere ao vestuário.<ref name=tus618/> Segundo alguns, a estátua representaria um cocheiro ou um patrocinador de jogos.<ref name=tus439/>

A ambiguidade dos cânones desta obra conduz a uma ''«perda das referências habituais, fonte de desconforto intelectual e estético»''.{{sfn|Lancel|1995|p=440}} Os sarcófagos ditos "da sacerdotisa" da necrópole dos ''rabs'' apresenta igualmente essas influências mistas.

Os cânones estéticos dos [[Prótomo|protomos]] indicam a mesma mestiçagem e os critérios que estiveram na origem das escolhas dos artesãos continuam difíceis de apreender. Por seu lado, as estatuetas de [[Ibiza]] revelam uma influência local, sem dúvida ligada ao relativo isolamento da ilha.{{sfn|Lancel|1995|p=460}}

Como metrópole situado entre o Oriente e o Ocidente, Cartago desempenhou globalmente um papel facilitador das trocas económicas e culturais, revelando uma grande porosidade às influências exteriores.{{sfn|Lancel|1995|p=462}}

===Persistência após a queda de Cartago===
A civilização púnica perdurou bastante tempo depois da destruição de Cartago em {{AC|146|x}}, em instituições locais de cidades romanas, na arquitetura e sobretudo na língua e religião. Constata-se a presença de sufetes e de magistrados municipais nas instituições das cidades romanas do Norte de África até ao {{+séc|II}}{{Harvy|dicCiv|Lipinski|1992|p=429}} Por vezes havia três sufetes, o que pode é considerado por alguns ''[[Semitas|semitistas]]'' como uma influência berbere.

As persistências na arquitetura manifesta-se sobretudo no ''[[opus africanum]]'' e no [[mosaico]]. O ''opus africanum'' é uma técnica de construção de [[alvenaria]] que se encontra nas escavações de [[Kerkuane]] e muitos outros sítios púnicos e um dos exemplos da sua utilização na época romana pode ver-se no capitólio de [[Duga]]. Em relação ao mosaico, a escola de mosaístas africanos, particularmente hábeis, carateriza-se pelos mármores de bela qualidade, e os seus modelos de bestiários e de cenas mitológicas foi largamente difundido no [[Império Romano]].

No domínio religioso, as persistência do culto prestado a [[Saturno (mitologia)|Saturno]] africano{{
nre|
1=Sobre esta questão, ver os trabalho de {{ilc|nl=s|Marcel Le Glay}}.
}} e a ''interpretatio romana'' do Ba'al púnico bem como da sua {{NT|parèdre|consorte}} [[Caelestis]], transpondo a deusa Tanit,{{sfn|Lancel|1995|p=580}} foi estudada. O culto de Sardus Pater na Sardenha procede da mesma evolução. Os santuários rurais foram mantidos, como em {{ilc|Tinissute||Bir Bouregba|Bir Bou Regba}} e {{ilc|Bou Kornine||Djebel Bou Kornine|Djebel Boukornine}}. O santuário neopúnico mais importante escavado até 2009, e o que proporcionou os elementos mais interessantes de fusão de elementos líbios e púnicos, encontra-se em El Hofra (antiga [[Cirta]]). Ali foram encontrados elementos de continuidade nas estelas ditas "da Ghorfa" e sinais de culto do Saturno africano, deus infernal e provedor de colheiras, que durou até ao fim do primeiro quartel do {{+séc|IV}}{{sfn|Lancel|1995|p=584-586}}

A transmissão dos "livros púnicos" das bibliotecas da cidade mártir para os reis númidas{{Harvy|plinio|Plínio, o Velho|loc=XVIII, 22}} foi objeto de discussões acaloradas, nas quais foi evocada a sua utilização por [[Salústio]] para elaborar a sua ''[[Guerra de Jugurta]]''. No entanto, os traços dessas obras desaparecem rapidamente; desde [[Agostinho de Hipona]] (Santo Agostinho) que elas são evocadas apenas como lembranças.{{Harvy|agos|Agostinho de Hipona|loc=17, 2}}

Aparentemente a língua púnica foi mantida durante muito tempo, como é testemunhado pelos textos ditos "neopúnicos" e a difusão daquela língua nos reinos númidas, em particular nas suas [[Moeda (peça)|moedas]].{{sfn|Lancel|1995|p=475-476}} Santo Agostinho chega a evocá-la numa das suas obras.<ref name=agos13/> Esta manutenção de uma [[Línguas semitas|língua semita]] pode ter facilitado a arabização do [[Magrebe]], segundo [[Stéphane Gsell]] e M'hamed Hassine Fantar depois dele.{{sfn|Lancel|1995|p=589}}

==Nascimento e desenvolvimento de uma disciplina==
===Redescoberta da civilização púnica===
O interesse pelo mundo fenício-púnico surgiu no {{séc|XVII}}, particularmente com o papel dos fenícios apreendido na obra ''Geographia sacra'' de [[Samuel Bochart]], mas floresceu sobretudo nos séculos XVIII e XIX, sob o ponto de vista da [[epigrafia]] e da [[filologia]]. A descoberta da [[estela de Nora]], objeto de numerosos estudos, data do {{séc|XVIII}}.

No {{séc|XIX}}, no contexto da colonização contemporânea, foram levadas a cabo extensas escavações nos países do Magrebe, focadas sobretudo nas épocas romana e [[Império Bizantino|bizantina]], pois os vestígios do período anterior eram menos impressionantes e não obedeciam à ideologia subjacente a esses estudos. No entanto, no início do {{séc|XX}} ocorreram grandes descobertas, como o tofete de Cartago em 1921 e, antes disso, deve assinalar-se o papel pioneiro de {{ilc|nl=s|Joseph Whitaker|Joseph Isaac Spadafora Whitaker|Joseph Whitaker (ornitologista)|Joseph Whitaker}} em [[Mócia]].

===Independência da disciplina e contribuições da arqueologia===
Após o último período da ocupação colonial, com a chegada de investigadores (como Gilbert-Charles Picard), a vaga das independências a partir de 1956 permitiu a eclosão de uma escola de investigações na Tunísia, representada nomeadamente por M'hamed Hassine Fantar e Abdelmajid Ennabli. As escavações desde a Líbia até Marrocos, assim como em Espanha (ilhas [[Baleares]] e [[Andaluzia]]) e em Itália com as investigações na Sicília e principalmente o exaustivo da Sardenha fenício-púnica, alargaram consideravelmente a problemática.<ref name=LipEt/>

===Campo de estudo atual===
Desde o fim dos anos 1970 e da criação do Congresso Internacional dos Estudos Fenícios e Púnicos, os académicos dos diversos países do espaço púnico implementam sinergias nas suas áreas de estudo, em particular os investigadores italianos da [[Universidade de Roma "La Sapienza"|Universidade La Sapienza]] de [[Roma]] (na senda de {{ilc|nl=s|Sabatino Moscati}}) e os seus colegas espanhóis e tunisinos.

Stéphane Gsell, no tomo IV da sua monumental ''Histoire ancienne de l'Afrique du Nord'' ("História antiga da África do Norte") usa palavras muito duras sobre a civilização cartaginesa:
{{Citação2|cinzabq=s|
1=Pela sua parte, Cartago contribuiu pouco para a civilização em geral. O seu luxo era pouco útil para a arte. Dissemos que a sua indústria, que nada inventou, arrastava-se na rotina, e que a técnica em si era medíocre ou ruim.{{sfn|Gsell|1920|p=486}}
}}
Os avanços da arqueologia depois da segunda metade do {{séc|XX}} permitiram esbater esta visão, de um homem marcado pelo [[classicismo]], já que a civilização cartaginesa, não se enquadrando no esquema de um domínio das artes maiores,{{sfn|Lancel|1995|p=416}} dificilmente poderia ser apreendida por um erudito do primeiro terço do {{séc|XX}}, que todavia trabalhou para a fazer sair do esquecimento.

Numerosas exposições que foram organizadas a partir dos anos 1980, nomeadamente a que decorreu em [[Veneza]] no [[Palazzo Grassi]] em 1988, só para citar a mais marcante, até à do [[Instituto do Mundo Árabe]], em [[Paris]], em 2007-2008,<ref name=expo1/> demonstram o interesse público por uma civilização aberta para as outras, ''«entre o Oriente e o Ocidente»'', segundo Serge Lancel, e nesse sentido muito contemporânea, não obstante a sua ''«entidade ambígua»''.

==Notas==
{{InícioRef}}
{{Tradução/ref|fr|Civilisation carthaginoise|42129328}}
{{-fim}}
{{Reflist|group=lower-alpha|colwidth=35em}}

{{Referências|colwidth=25em|refs=

{{Harvy|name=dicCiv121|dicCiv|Dictionnaire de la civilisation phénicienne et punique|1992|p=121,&nbsp;463}}

{{Harvy|name=dicCiv463|dicCiv|Dictionnaire de la civilisation phénicienne et punique|1992|p=463}}

<ref name=f82>[[Timeu de Tauroménio]]. Fragmento 82</ref>

<ref name=mgEtru>Gras, Michel. ''“Étrusques”''. {{Harvx|dicCiv|Dictionnaire de la civilisation phénicienne et punique|1992|p=163}}</ref>

{{Harvy|name=AristIII69|arist|Aristóteles|loc=''Política''. {{nowrap|III, 6, 9}}}}

<ref name=LipAlal>Lipinski, Édouard. ''“Alalia”''. {{Harvx|dicCiv|Dictionnaire de la civilisation phénicienne et punique|1992|p=14}}</ref>

<ref name=Ridley86>Sobre este assunto, ver {{Harvnb|Ridley|1986}}</ref>

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<ref name=apdec65>Segundo {{Harvx|api|Apiano|loc=''Libyca'', 96}}, citado em {{Harvnb|Decret|1977|p=65}}</ref>

<ref name=lancLip451>Lancel, Serge; Lipinski, Edward. ''“Thinissut”''. {{Harvx|dicCiv|Dictionnaire de la civilisation phénicienne et punique|1992|p=451}}</ref>

<ref name=lancMor55>Lancel, Serge; Morel, Jean-Paul. ''“La colline de Byrsa : les vestiges puniques”''. {{Harvx|un92|Pour sauver Carthage...|1992|p=55}}</ref>

<ref name=honf>[[Honor Frost|Frost, Honor]], citado por {{Harvnb|Lancel|1992|p=185}}</ref>

{{Harvy|name=AristII116|arist|Aristóteles|loc=''Política''. {{nowrap|II, 1-16}}}}

{{Harvy|name=titliv|titliv|Tito Lívio|loc=''Ab Urbe condita libri''. {{nowrap|XXIII, 46.3}}}}

{{Harvy|name=senec|senec|Séneca|loc=''De tranquillitate animi''. IV,&nbsp;5}}

{{Harvy|name=AristII1137|arist|Aristóteles|loc=''Política''. {{nowrap|II, 11, 3, 7}}}}

{{Harvy|name=pol71|polib|Políbio|loc=I, 2, 71-72}}, citado em {{Harvnb|Decret|1977|p=65}}

{{Harvy|name=colXII3912|colum|Columela|loc=''De re rustica'', {{nowrap|XII, 39, 1-2}}}}

{{Harvy|name=krig185|Krings|Krings; Lipinski, Édouard|loc=''Garum'', p. 185}}

<ref name=dicCiv417>Bertrandy, François. ''“Signe de Tanit”''. {{Harvx|dicCiv|Dictionnaire de la civilisation phénicienne et punique|1992|p=417}}</ref>

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<ref name=ubert536>Uberti, Maria Luisa. ''“Le verre”''. {{Harvx|lesphen7|''Les Phéniciens''|2007|p=536-561}}</ref>

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<ref name=dicCiv194>Gubel, Éric. ''“Glyptique”''. {{Harvx|dicCiv|Dictionnaire de la civilisation phénicienne et punique|1992|p=194}}</ref>

{{Harvy|name=pl22|plinio|Plínio, o Velho|loc=XVIII, 22-23}}

{{Harvy|name=colI13|colum|Columela|loc=''De re rustica'', {{nowrap|I, 1, 3}}}}

{{Harvy|name=colXII42|colum|Columela|loc=''De re rustica'', {{nowrap|XII, 4, 2}}}}

<ref name=coar>[[Filippo Coarelli|Coarelli, Filippo]]; Thébert, Yvon; citados por {{Harvnb|Lancel|1995|p=421}}</ref>

<ref name=tus618>Tusa, Vincenzo. ''“Le jeune homme de Motyé”''. {{Harvx|lesphen7|''Les Phéniciens''|2007|p=618-621}}</ref>

<ref name=tus439>Tusa, Vincenzo, citado por {{Harvnb|Lancel|1995|p=439}}</ref>

<ref name=agos13>''«os africanos que falam púnico chamam-se a eles próprios `[[Cananeus]]´»'' — {{Harvx|agos|Agostinho de Hipona|loc=13}}</ref>

<ref name=LipEt>Lipinski, Édouard. ''“Études phénico-puniques”''. {{Harvx|dicCiv|Dictionnaire de la civilisation phénicienne et punique|1992|p=164-165}}</ref>

<ref name=expo1>{{Citar web|url=http://www.imarabe.org/temp/expo/pheniciens.html|titulo=La Méditerranée des Phéniciens » (6 novembre 2007-20 avril 2008) no Institut du monde arabe|obra=www.imarabe.org|língua=fr|arquivourl=https://web.archive.org/web/20090331232439/http://www.imarabe.org/temp/expo/pheniciens.html|arquivodata=2009-03-31|acessodata=2013-04-03|urlmorta=yes}}</ref>

}}<!--fim refs-->

==Bibliografia==
===Fontes clássicas===
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*{{Citation|sobrenome=Procópio de Cesareia|autorlink=Procópio de Cesareia|ano=552|local=Constantinopla|editora=desconhecido|titulo=História das Guerras|ref=proc}}
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*{{Citation|autor=Tito Lívio|autorlink=Tito Lívio|ano=27–25 a.C.|titulo=Ab Urbe condita libri|url=http://www.gutenberg.org/ebooks/10907|acessodata=28 de março de 2013|ref=titliv}}
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*{{Citation|último=Varrão|primeiro=Marco Terêncio|ano=século I a.C.|autorlink=Marco Terêncio Varrão|titulo=De re rustica|ref=varr}}
{{-fim}}

===Generalidades===
{{InícioRef|colwidth=35em}}
*{{Citation|último1=Aubet|primeiro1=Maria Eugenia|ano=2008|titulo=Political and Economic Implications of the New Phoenician Chronologies|publicado=[[Universidade Pompeu Fabra]]|língua=en|local=[[Barcelona]]|url=http://www.upf.edu/larq/_pdf/AubtCrono.pdf|acessodata=13 de abril de 2013|arquivourl=https://web.archive.org/web/20131211024112/http://www.upf.edu/larq/_pdf/AubtCrono.pdf|arquivodata=2013-12-11|urlmorta=yes}}
*{{Citation|último1=Camps|primeiro1=Gabriel|ano=2007|titulo=Les Berbères, mémoire et identité|língua=fr|publicado=Actes Sud|local=Arles|páginas=350|isbn=9782742769223}}
*{{Citation|último1=Fantar|primeiro1=M'hamed Hassine|data=abril–maio de 2008|titulo=Carthage, la cité qui fit trembler Rome|língua=fr|periódico=Les cahiers de Science et Vie|número=104|ref=sciv}}
*{{Citation|último=Heimburger|primeiro=Florence|data=abril–maio de 2008|titulo=Naissance d’un empire|língua=fr|periódico=Les cahiers de Science et Vie|número=104|ref=sciv2}}
*{{Citation|último1=Gras|primeiro1=Michel|ano=1994|último2=Rouillard|primeiro2=Pierre|último3=Teixidor|primeiro3=Javier|titulo=L’Univers phénicien|publicado=Arthaud|língua=fr|local=Paris|isbn=2700307321}}
*{{Citation|último1=Gsell|primeiro1=Stéphane|ano=1918|titulo=Histoire ancienne de l’Afrique du Nord, tome II (L’État carthaginois)|língua=fr|local=Paris}}.
*{{Citation|último1=Gsell|primeiro1=Stéphane|ano=1920|titulo=Histoire ancienne de l’Afrique du Nord, tome IV (La civilisation carthaginoise)|língua=fr|local=Paris}}.
*{{Citation|editor-sobrenome=Krings|editor-nome=Véronique|ano=1995|titulo=La civilisation phénicienne et punique. Manuel de recherches|língua=fr|ref=Krings}}.
*{{Citation|último1=Lillo Carpio|primeiro1=Martín|ano=1992|titulo=Historia de Cartagena: De Qart-?adašt a Carthago Nova|publicado=Ed. Mediterráneo|língua=es|volume=1-4|páginas=386|isbn=9781231401323}}
*{{Citation|editor-sobrenome=Lipinski|editor-nome=Édouard|ano=1992|titulo=Dictionnaire de la civilisation phénicienne et punique|publicado=Brépols|língua=fr|local=Paris|isbn=2503500331|ref=dicCiv}}
*{{Citation|último1=Markoe|primeiro1=Glenn|ano=2001|titulo=Phoenicians|publicado=University of California Press|língua=en|páginas=224|isbn=9780520226142|url=http://books.google.pt/books?id=smPZ-ou74EwC|acessodata=13 de abril de 2013}}
*{{Citation|último1=Moscati|primeiro1=Sabatino|ano=1971|titulo=L’épopée des Phéniciens|língua=fr|local=Paris}}
*{{Citation|último1=Moscati|primeiro1=Sabatino|ano=2001|titulo=The Phoenicians|publicado=I.B.Tauris|língua=en|páginas=670|isbn=9781850435334|url=http://books.google.pt/books?id=1EEtmT9Tbj4C|acessodata=13 de abril de 2013}}
{{-fim}}

===Cartago===
{{InícioRef|colwidth=35em}}
*{{Citation|último1=Abed|primeiro1=Aïcha ben|ano=1995|titulo=Carthage. Capitale de l’Africa|língua=fr|periódico=Connaissance des arts, hors-série Carthage n°69}}
*{{Citation|último1=Fantar|primeiro1=M'hamed Hassine|ano=1995|titulo=Carthage la cité punique|publicado=Cérès|língua=fr|local=Tunes}}
*{{Citation|último1=Guzzo|primeiro1=Maria Giulia Amadasi|ano=2007|titulo=Carthage|publicado=PUF|língua=fr|local=Paris|isbn=9782130539629}}
*{{Citation|último1=Beschaouch|primeiro1=Azedine|ano=1993|autorlink=Azedine Beschaouch|titulo=La légende de Carthage|series=[[Découvertes Gallimard]]|volume=172|publicado=Gallimard|língua=fr|local=Paris|isbn=2070532127}}
*{{Citation|último1=Decret|primeiro1=François|ano=1977|titulo=Carthage ou l’empire de la mer|publicado=Seuil|língua=fr|local=Paris|series=Points histoire|isbn=2020047128}}
*{{Citation|último1=Demerliac|primeiro1=Jean-Gabriel|ano=1983|último2=Meirat|primeiro2=Jean|titulo=Hannon ou l’empire punique|publicado=Les Belles Lettres|língua=fr|local=Paris|isbn=2251334173}}
*{{Citation|último1=Dridi|primeiro1=Hédi|ano=2006|titulo=Carthage et le monde punique|publicado=Les Belles Lettres|língua=fr|local=Paris|isbn=2251410333}}
*{{Citation|último1=Fantar|primeiro1=M'hamed Hassine|ano=1993|titulo=Carthage. Approche d’une civilisation,|publicado=Alif|língua=fr|local=Tunes}}
*{{Citation|último1=Hours-Miédan|primeiro1=Madeleine|ano=1982|titulo=Carthage|publicado=PUF|língua=fr|local=Paris|isbn=2130374891}}
*{{Citation|último1=Lancel|primeiro1=Serge|ano=1992|titulo=Carthage|publicado=Fayard|língua=fr|local=Paris}}. Reeditado em Tunes por Cères em 1999.{{ISBN|9973194209}}
*{{Citation|último1=Lancel|primeiro1=Serge|ano=1995|titulo=Questions sur le tophet de Carthage|capítulo=La Tunisie, carrefour du monde antique|publicado=Faton|língua=fr|local=Paris}}.
*{{Citation|último1=Le Bohec|primeiro1=Yann|ano=2003|titulo=Histoire militaire des guerres puniques|publicado=Éd. du Rocher|língua=fr|local=Mónaco|isbn=2268021475}}
*{{Citation|último1=Picard|primeiro1=Gilbert Charles|ano=1958|último2=Picard|primeiro2=Colette|titulo=La vie quotidienne à Carthage au temps d’Hannibal|publicado=Hachette|língua=fr|local=Paris}}
*{{Citation|último1=Picard|primeiro1=Colette|ano=1951|titulo=Carthage|publicado=Les Belles Lettres|língua=fr|local=Paris}}
*{{Citation|último1=Ridley|primeiro1=R.T.|ano=1986|titulo=To Be Taken with a Pinch of Salt: The Destruction of Carthage|língua=en|periódico=Classical Philology|volume=81|número=2}}
*{{Citation|último1=Sznycer|primeiro1=Maurice|ano=1978|capítulo=Carthage et la civilisation punique|titulo=Rome et la conquête du monde méditerranéen|publicado=PUF|língua=fr|local=Paris|notas=volume 2 (Genèse d’un empire)}}|page=545-593}}
{{-fim}}

===Arte e catálogos de exposições===
{{InícioRef|colwidth=35em}}
*{{Citation|editor-sobrenome=Arodaky|editor-nome=Badr-Eddine|ano=2007|titulo=La Méditerranée des Phéniciens. De Tyr à Carthage|publicado=Somogy|língua=fr|local=Paris|isbn=9782757201305|ref=arod}}
*{{Citation|editor-sobrenome=Moscati|editor-nome=Sabatino|ano=1989|titulo=Les Phéniciens. L’expansion phénicienne|publicado=Le Chemin vert|língua=fr|local=Paris|isbn=2714423787}}
*{{Citation|último1=Parrot|primeiro1=André|ano=2007|último2=Chéhab|primeiro2=Maurice H.|último3=Moscati|primeiro3=Sabatino|titulo=Les Phéniciens|publicado=Gallimard|língua=fr|local=Paris|series=col. L’univers des formes|ref=lesphen7}}
*{{Citation|autor=VVAA|ano=1995|titulo=Carthage. L’histoire, sa trace et son éch|publicado=Association française d’action artistique|língua=fr|local=Paris|isbn=9973220269}}
*{{Citation|autor=VVAA|ano=1982|titulo=De Carthage à Kairouan (catalogue exposition)|língua=fr}}
*{{Citation|autor=VVAA|data=outubro de 2007|titulo=La Méditerranée des Phéniciens|língua=fr|periódico=Connaissance des arts|número=344}}
{{-fim}}

===Arqueologia===
{{InícioRef|colwidth=35em}}
*{{Citation|último1=Cintas|primeiro1=Pierre|ano=1970|titulo=Manuel d’archéologie punique|publicado=Picard|língua=fr|local=Paris}}
*{{Citation|último1=Ennabli|primeiro1=Abdelmajid|ano=1993|último2=Slim|primeiro2=Hédi|titulo=Carthage. Le site archéologique|publicado=Cérès|língua=fr|local=Tunes|isbn=997370083X}}
*{{Citation|último1=Fantar|primeiro1=M'hamed Hassine|ano=2005|titulo=Kerkouane, cité punique au pays berbère de Tamezrat|publicado=Alif|língua=fr|local=Tunes|isbn=9973-22-120-6}}
*{{Citation|último1=Slim|primeiro1=Hédi|ano=2001|último2=Fauqué|primeiro2=Nicolas|titulo=La Tunisie antique. De Hannibal à saint Augustin|publicado=Mengès|língua=fr|local=Paris|isbn=285620421X|ref=slimF}}
*{{Citation|autor=VVAA|ano=1968–1969|titulo=Carthage, sa naissance, sa grandeur|língua=fr|periódico=Archéologie vivante|volume=1|número=2}}
*{{Citation|autor=VVAA|ano=1992|titulo=Pour sauver Carthage. Exploration et conservation de la cité punique, romaine et byzantine|publicado=Unesco/INAA|língua=fr|isbn=9232027828|ref=un92}}
*{{Citation|autor=VVAA|ano=1995|titulo=La Tunisie, carrefour du monde antique|publicado=Faton|língua=fr|local=Paris}}
*{{Citation|autor=VVAA|data=outubro de 2007|titulo=La Méditerranée des Phéniciens|língua=fr|periódico=Connaissance des arts|número=344}}
{{-fim}}

==Ligações externas==
{{Commonscat|getwikidata||a}}
{{InícioRef}}
*{{Citation|último1=Thuillier|primeiro1=Jean-Paul|data=janeiro de 2001|titulo=Les Carthaginois, marins et agronomes|publicado=www.clio.fr|língua=fr|periódico=Le Monde de Clio|url=http://www.clio.fr/BIBLIOTHEQUE/les_carthaginois_marins_et_agronomes.asp|acessodata=23 de março de 2013}}
{{-fim}}

{{Impérios}}
{{Controle de autoridade}}
{{Portal3|História|Tunísia|África|Europa}}

[[Categoria:Civilização cartaginesa| ]]