Teorema de Nielsen–Schreier: diferenças entre revisões

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Acrescentei um critério de infinitude para grupos apresentados, que ilustra melhor, talvez, o uso do Teorema de Schreier-Reidemeister.
m Algumas ambiguidades foram desfeitas.
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Continuando, obtemos <math>s_{1}^{\epsilon_{1}}s_{2}^{\epsilon_{2}}\ldots s_{r}^{\epsilon_{r}}=av</math>, onde <math>a</math> está no subgrupo gerado proposto e <math>v\in\mathcal{R}</math>. Como o subgrupo gerado claramente é subgrupo de <math>H</math>, temos <math>v\in H</math>, donde <math>v=1</math>, finalizando o argumento. Como corolário, obtemos que são finitamente gerados subgrupos de índice finito de grupos finitamente gerados; além disso, o número mínimo de geradores de tal subgrupo é majorado pelo produto de seu índice pelo número mínimo de geradores do grupo que o contém.
Continuando, obtemos <math>s_{1}^{\epsilon_{1}}s_{2}^{\epsilon_{2}}\ldots s_{r}^{\epsilon_{r}}=av</math>, onde <math>a</math> está no subgrupo gerado proposto e <math>v\in\mathcal{R}</math>. Como o subgrupo gerado claramente é subgrupo de <math>H</math>, temos <math>v\in H</math>, donde <math>v=1</math>, finalizando o argumento. Como corolário, obtemos que são finitamente gerados subgrupos de índice finito de grupos finitamente gerados; além disso, o número mínimo de geradores de tal subgrupo é majorado pelo produto de seu índice pelo número mínimo de geradores do grupo que o contém.

Note que, em geral, para uma transversal <math>T</math> com <math>\overline{1}=h\in H</math>, temos a transversal <math>h^{-1}T</math> na qual <math>\overline{\overline{1}}=1</math>; claramente <math>\overline{\overline{g}}=h^{-1}\overline{g}</math> (barras duplas evidentemente se referem à nova transversal). Logo o conjunto gerador obtido nas considerações anteriores torna-se <math>\big\{ h^{-1}(tx)(\overline{tx})^{^{{\scriptstyle-1}}}\!h\mid t\in T,x\in X\big\}</math>.


=== O Teorema de Schreier-Reidemeister ===
=== O Teorema de Schreier-Reidemeister ===
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'''Lema.''' Se <math>G</math> tem apresentação <math>G\cong\langle X\mid R\rangle</math>, com <math>X,R</math> conjuntos finitos e <math>\operatorname{card}X>\operatorname{card}R</math>, então a abelianização <math>G_{\textrm{ab}}=G/[G,G]</math> possui infinitos elementos. Em particular, <math>G</math> é um grupo infinito.
'''Lema.''' Se <math>G</math> tem apresentação <math>G\cong\langle X\mid R\rangle</math>, com <math>X,R</math> conjuntos finitos e <math>\operatorname{card}X>\operatorname{card}R</math>, então a abelianização <math>G_{\textrm{ab}}=G/[G,G]</math> possui infinitos elementos. Em particular, <math>G</math> é um grupo infinito.


''Prova.'' Seja <math>\operatorname{card}X=n</math>. Passando para a abelianização, podemos ver os relatores em <math>R</math> como polinômios em <math>\mathbb{Q}[x_{1},\ldots,x_{n}]</math>, se <math>X=\{x_{1},\ldots,x_{n}\}</math>. É fato elementar da Álgebra Linear que existe um elemento em <math>(\mathbb{Q}\times\mathbb{Q}\times\dots\times \mathbb{Q})\smallsetminus\{0\}</math> que anula todo elemento de <math>R</math> (heurística: há mais incógnitas do que equações); existe, pois, um elemento em <math>\mathbb{Z}^{n}\smallsetminus\{0\}</math> que anula todo elemento de <math>R</math> (multiplique a solução anterior por um inteiro adequado); podemos supor que esse elemento está no grupo abeliano livre <math>F_{\textrm{ab}}(X)</math>, digamos <math>w=\mathop{{\textstyle{\sum}}}w_{i}x_{i} \ne0</math>. O Teorema de von Dyck garante que a associação <math>X\to F_{\textrm{ab}}(X): x_{i}\mapsto w_{i}x_{i}</math> estende-se a um homomorfismo <math>\psi:G_{\textrm{ab}}\to F_{\textrm{ab}}(X)</math>; possuindo <math>G_{\textrm{ab}}</math> uma imagem homomorfa infinita, uma vez que <math>\langle w\rangle\le \operatorname{Im}\psi</math>, segue o Lema.
''Prova.'' Seja <math>X=\{x_{1},\ldots,x_{n}\}</math>, <math>\operatorname{card}X=n</math>. Passando para a abelianização e adotando a notação aditiva, podemos ver os relatores em <math>R</math> como polinômios homogêneos de grau <math>1</math> em <math>\mathbb{Q}[x_{1},\ldots,x_{n}]</math> — de fato, em <math>\mathbb{Z}[x_{1},\ldots,x_{n}]</math>. Por exemplo, o relator <math>x_{1}^{3}x_{2}^{-1}x_{3}^{7}x_{1}^{-2}x_{4}</math> deve corresponder ao polinômio <math>3x_{1} - x_{2} + 7x_{3} - 2x_{1}+x_{4}=x_{1} - x_{2} + 7x_{3} +x_{4}</math>. É fato elementar da Álgebra Linear que existe um elemento em <math>(\mathbb{Q}\times\mathbb{Q}\times\dots\times \mathbb{Q})\smallsetminus\{0\}</math> que anula todo elemento de <math>R</math> (heurística: há mais incógnitas do que equações); existe, pois, um elemento em <math>\mathbb{Z}^{n}\smallsetminus\{0\}</math> que anula todo elemento de <math>R</math> (multiplique a solução anterior por um inteiro adequado); podemos supor que esse elemento está no grupo abeliano livre <math>F_{\textrm{ab}}(X)</math>, digamos <math>w=\mathop{{\textstyle{\sum}}}w_{i}x_{i} \ne0</math>. O Teorema de von Dyck garante que a associação <math>X\to F_{\textrm{ab}}(X): x_{i}\mapsto w_{i}x_{i}</math> estende-se a um homomorfismo <math>\psi:G_{\textrm{ab}}\to F_{\textrm{ab}}(X)</math>; possuindo <math>G_{\textrm{ab}}</math> uma imagem homomorfa infinita, uma vez que <math>\langle w\rangle\le \operatorname{Im}\psi</math>, segue o Lema.


'''Prova do Teorema.''' Se <math>P</math> for infinito, não há nada a fazer. Suponha então <math>P</math> finito de ordem <math>n</math>, de forma que <math>H=\operatorname{Ker}\theta</math> tem índice finito <math>n</math> em <math>G</math>. Seja <math>K\vartriangleleft F(X)</math> a pré-imagem de <math>H</math> no grupo livre sobre <math>X</math>, <math>F/K\cong G/H\cong P</math>. Por Nielsen-Schreier, podemos escolher um isomorfismo <math>\beta : K\to F(Y)</math>, <math>\operatorname{card}Y=n(r-1)+1</math>. Por Schreier-Reidemeister, temos <math>H\cong \big\langle Y\,\big\vert\,\left(aw_{i}^{m_{i}}a^{-1}\right)^{\beta},i=1,2,\ldots,s,a\in A\big\rangle</math>, o conjunto <math>A</math> sendo uma transversal à direita fixa para <math>K</math> em <math>F(X)</math>. Para cada <math>i=1,2,\ldots,s</math> temos <math>n</math> relatores. A ideia principal da demonstração é encontrar relatores redundantes, de modo que o Lema venha à mão. Fá-lo-emos do seguinte modo: escolha um elemento da transversal, digamos <math>a_{0}\in A</math>. Note que as classes <math>Ka_{0}, Ka_{0}w_{1}, Ka_{0}w_{1}^{2},\ldots, Ka_{0}w_{1}^{m_{1}-1}</math> são duas a duas distintas: caso não fossem, teríamos <math>Ka_{0}w_{1}^{\ell}=Ka_{0}</math> para algum <math>0<\ell<m_{1}</math>. Por normalidade de <math>K</math>, ter-se-ia <math>w_{1}^{\ell}\in K</math>, donde, em <math>G</math>, <math>w_{1}^{\ell}\in H</math>, isto é, <math>\big(w_{1}^{\theta}\big)^{\ell}=1</math> — absurdo pois a ordem de <math>w_{1}^{\theta}</math> é <math>m_{1}</math>. Temos então <math>m_{1}</math> elementos de <math>A</math>, <math>a_{0},\overline{a_{0}w_{1}},\overline{a_{0}w_{1}^{2}},\ldots,\overline{a_{0}w_{1}^{m_{1}-1}}</math>. Agora <math>\overline{a_{0}w_{1}^{\nu}}w_{1}^{m_{1}}\overline{a_{0}w_{1}^{\nu}}^{-1}=\overline{a_{0}w_{1}^{\nu}}\big(a_{0}w_{1}^{\nu}\big)^{-1}\big(a_{0}w_{1}^{\nu}\big)w_{1}^{m_{1}}\big(a_{0}w_{1}^{\nu}\big)^{-1}\big(a_{0}w_{1}^{\nu}\big)\overline{a_{0}w_{1}^{\nu}}^{-1}=u_{\nu}(a_{0}w_{1}^{m_{1}}a_{0}^{-1})u_{\nu}^{-1}</math> para algum <math>u\in K</math>. Daí, os <math>m_{1}</math> relatores oriundos de tais elementos da transversal são mutuamente conjugados, logo, destes, precisamos de apenas um. Escolhendo um elemento da transversal diferente daqueles já obtidos, podemos repetir o argumento até a exaustão dos <math>n</math> relatores. Vê-se facilmente agora que são necessários apenas <math>n/m_{1}</math> dos relatores iniciais. Isso claramente se repete para <math>i=2,\ldots,s</math>. Portanto, <math>H</math> tem uma apresentação com <math>n(r-1)+1</math> geradores e <math>(n/m_{1})+(n/m_{2})+\ldots+(n/m_{s})=n\mathop{\textstyle{\sum}}_{i=1}^{s}\textstyle{\frac{1}{m_{i}}}</math> relatores. Por hipótese, o número de geradores excede o número de relatores; apelando ao Lema, temos <math>H</math> infinito, finalizando a demonstração.
'''Prova do Teorema.''' Se <math>P</math> for infinito, não há nada a fazer. Suponha então <math>P</math> finito de ordem <math>n</math>, de forma que <math>H=\operatorname{Ker}\theta</math> tem índice finito <math>n</math> em <math>G</math>. Seja <math>K\vartriangleleft F(X)</math> a pré-imagem de <math>H</math> no grupo livre sobre <math>X</math>, <math>F/K\cong G/H\cong P</math>. Por Nielsen-Schreier, podemos escolher um isomorfismo <math>\beta : K\to F(Y)</math>, <math>\operatorname{card}Y=n(r-1)+1</math>. Por Schreier-Reidemeister, temos <math>H\cong \big\langle Y\,\big\vert\,\left(aw_{i}^{m_{i}}a^{-1}\right)^{\beta},i=1,2,\ldots,s,a\in A\big\rangle</math>, o conjunto <math>A</math> sendo uma transversal à direita fixa para <math>K</math> em <math>F(X)</math>. Para cada <math>i=1,2,\ldots,s</math> temos <math>n</math> relatores. A ideia principal da demonstração é encontrar relatores redundantes, de modo que o Lema venha à mão. Fá-lo-emos do seguinte modo: escolha um elemento da transversal, digamos <math>a_{0}\in A</math>. Note que as classes <math>Ka_{0}, Ka_{0}w_{1}, Ka_{0}w_{1}^{2},\ldots, Ka_{0}w_{1}^{m_{1}-1}</math> são duas a duas distintas: caso não fossem, teríamos <math>Ka_{0}w_{1}^{\ell}=Ka_{0}</math> para algum <math>0<\ell<m_{1}</math>. Por normalidade de <math>K</math>, ter-se-ia <math>w_{1}^{\ell}\in K</math>, donde, em <math>G</math>, <math>w_{1}^{\ell}\in H</math>, isto é, <math>\big(w_{1}^{\theta}\big)^{\ell}=1</math> — absurdo pois a ordem de <math>w_{1}^{\theta}</math> é <math>m_{1}</math>. Temos então <math>m_{1}</math> elementos de <math>A</math>, <math>a_{0},\overline{a_{0}w_{1}},\overline{a_{0}w_{1}^{2}},\ldots,\overline{a_{0}w_{1}^{m_{1}-1}}</math>. Agora <math>\overline{a_{0}w_{1}^{\nu}}w_{1}^{m_{1}}\overline{a_{0}w_{1}^{\nu}}^{-1}=\overline{a_{0}w_{1}^{\nu}}\big(a_{0}w_{1}^{\nu}\big)^{-1}\big(a_{0}w_{1}^{\nu}\big)w_{1}^{m_{1}}\big(a_{0}w_{1}^{\nu}\big)^{-1}\big(a_{0}w_{1}^{\nu}\big)\overline{a_{0}w_{1}^{\nu}}^{-1}=u_{\nu}(a_{0}w_{1}^{m_{1}}a_{0}^{-1})u_{\nu}^{-1}</math> para algum <math>u\in K</math>. Daí, os <math>m_{1}</math> relatores oriundos de tais elementos da transversal são mutuamente conjugados, logo, destes, precisamos de apenas um. Escolhendo um elemento da transversal diferente daqueles já obtidos, podemos repetir o argumento até a exaustão dos <math>n</math> relatores. Vê-se facilmente agora que são necessários apenas <math>n/m_{1}</math> dos relatores iniciais. Isso claramente se repete para <math>i=2,\ldots,s</math>. Portanto, <math>H</math> tem uma apresentação com <math>n(r-1)+1</math> geradores e <math>(n/m_{1})+(n/m_{2})+\ldots+(n/m_{s})=n\mathop{\textstyle{\sum}}_{i=1}^{s}\textstyle{\frac{1}{m_{i}}}</math> relatores. Por hipótese, o número de geradores excede o número de relatores; apelando ao Lema, temos <math>H</math> infinito, finalizando a demonstração.


''Exemplo.'' O grupo <math>\langle x,y\mid x^{4},y^{8},(xy)^{6}\rangle</math> é infinito. Temos <math>\tfrac{1}{4}+\tfrac{1}{8}+\tfrac{1}{6}\le1</math>. Considere as permutações <math>\pi_{1}=(1,2,3,4),\pi_{2}=(1,2,3,4,5,6,7,8),\pi_{1}\pi_{2}=(1,3,5,6,7,8)(2,4)</math> e escolha <math>P=\langle \pi_{1},\pi_{2}\rangle</math>. Em geral, o grupo <math>D(l,m,n)=\langle x,y \mid x^{l}, y^{m},(xy)^{n}\rangle</math>, intimamente relacionado com certas tesselações triangulares de planos (no sentido amplo de geometrias Euclidianas ou não), é infinito se, e somente se, <math>\tfrac{1}{l}+\tfrac{1}{m}+\tfrac{1}{n}\le1</math>. É possível mostrar que, dada uma tripla <math>(l,m,n)</math> de inteiros maiores que um, existem elementos <math>\gamma,\delta</math> do grupo <math>\operatorname{PSL}(2,\mathbb{C})</math> das transformações lineares fracionais do plano complexo estendido <math>\tilde{\mathbb{C}}=\mathbb{C}\sqcup\{\infty\}</math>, tais que <math>\operatorname{ord}(\gamma)=l</math>, <math>\operatorname{ord}(\delta)=m</math>, <math>\operatorname{ord}(\gamma\delta)=n</math>. Por outro lado, as únicas triplas daquela forma satisfazendo <math>\tfrac{1}{l}+\tfrac{1}{m}+\tfrac{1}{n}>1</math> são <math>(2,2,n)</math>, <math>(2,3,3)</math>, <math>(2,3,4)</math>, <math>(2,3,5)</math>. No primeiro caso, vê-se facilmente que se trata de um grupo diedral <math>D_{2n}</math>. Nos casos restantes, temos, respectivamente, <math>\operatorname{Alt}(4)</math>, <math>\operatorname{Sym}(4)</math>, <math>\operatorname{Alt}(5)</math>. Considere as permutações <math>\sigma=(1,2,3)</math>, <math>\tau=(2,4)(3,5)</math>, <math>\sigma\tau=(1,4,2,5,3)</math>. Note que <math>\sigma^{\tau\sigma\tau}=(4,2,3)</math>, <math>\alpha:=\tau\sigma^{\tau\sigma\tau}=(3,5,4)</math> e <math>\langle \tau,\alpha\rangle\le\big(\!\operatorname{Alt}(5)\big)_{1}=\operatorname{Stab}(1)\cong \operatorname{Alt}(4)</math>. Em <math>\langle\tau,\alpha\rangle</math>, temos <math>\langle \tau,\tau^{\alpha}\rangle=\langle (2,4)(3,5),(2,3)(5,4)\rangle\cong C_{2}\times C_{2}</math>; além disso as classes <math>\langle \tau,\tau^{\alpha}\rangle,\langle \tau,\tau^{\alpha}\rangle\alpha,\langle \tau,\tau^{\alpha}\rangle\alpha^{2}</math> são duas a duas distintas e esgotam o espaço de classes <math>\operatorname{mod}\,\,\langle \tau,\tau^{\alpha}\rangle</math>, logo <math>\vert\langle \tau,\alpha\rangle\vert=12</math>. Como <math>5</math> e <math>12</math> dividem a ordem de <math>\langle\sigma,\tau\rangle\le\operatorname{Alt}(5)</math>, temos a igualdade. Usando ideias similares, mas em <math>D(2,3,3)</math>, prova-se que <math>D(2,3,3)</math> é finito de ordem no máximo <math>12</math>; portanto, <math>x\to\tau,y\to\alpha</math> é um isomorfismo <math>D(2,3,3)\cong\operatorname{Alt}(4)</math>. Em <math>D(2,3,5)</math> há um subgrupo que é uma imagem homomorfa de <math>D(2,3,3)</math>, portanto é finito de ordem no máximo <math>12</math>. Usando as potências de <math>xy</math> como representantes de classes módulo tal subgrupo, mostra-se que <math>D(2,3,5)</math> é finito de ordem no máximo <math>12\cdot 5=60</math>, permitindo-nos concluir que <math>x\to\tau,y\to\sigma</math> é um isomorfismo <math>D(2,3,5)\cong\operatorname{Alt}(5)</math>. Ideias inteiramente análogas mostram que <math>x\to(1,4)</math>, <math>y\to(1,2,3)</math> é um isomorfismo <math>D(2,3,4)\cong\operatorname{Sym}(4)</math>.
''Exemplo.'' O grupo <math>\langle x,y\mid x^{4},y^{8},(xy)^{6}\rangle</math> é infinito. Temos <math>\tfrac{1}{4}+\tfrac{1}{8}+\tfrac{1}{6}\le1</math>. Considere as permutações <math>\pi_{1}=(1,2,3,4),\pi_{2}=(1,2,3,4,5,6,7,8),\pi_{1}\pi_{2}=(1,3,5,6,7,8)(2,4)</math> e escolha <math>P=\langle \pi_{1},\pi_{2}\rangle</math>. Em geral, o grupo <math>D(l,m,n)=\langle x,y \mid x^{l}, y^{m},(xy)^{n}\rangle</math>, intimamente relacionado com certas tesselações triangulares de planos (no sentido amplo de geometrias Euclidianas ou não), é infinito se, e somente se, <math>\tfrac{1}{l}+\tfrac{1}{m}+\tfrac{1}{n}\le1</math>. É possível mostrar que, dada uma tripla <math>(l,m,n)</math> de inteiros maiores que <math>1</math>, existem elementos <math>\gamma,\delta</math> do grupo <math>\operatorname{PSL}(2,\mathbb{C})</math> das transformações fracionais lineares do plano complexo estendido <math>\tilde{\mathbb{C}}=\mathbb{C}\sqcup\{\infty\}</math>, tais que <math>\operatorname{ord}(\gamma)=l</math>, <math>\operatorname{ord}(\delta)=m</math>, <math>\operatorname{ord}(\gamma\delta)=n</math>. Por outro lado, as únicas triplas daquela forma satisfazendo <math>\tfrac{1}{l}+\tfrac{1}{m}+\tfrac{1}{n}>1</math> são <math>(2,2,n)</math>, <math>(2,3,3)</math>, <math>(2,3,4)</math>, <math>(2,3,5)</math>. No primeiro caso, vê-se facilmente que se trata de um grupo diedral <math>D_{2n}</math>. Nos casos restantes, temos, respectivamente, <math>\operatorname{Alt}(4)</math>, <math>\operatorname{Sym}(4)</math>, <math>\operatorname{Alt}(5)</math>. Considere as permutações <math>\sigma=(1,2,3)</math>, <math>\tau=(2,4)(3,5)</math>, <math>\sigma\tau=(1,4,2,5,3)</math>. Note que <math>\sigma^{\tau\sigma\tau}=(4,2,3)</math>, <math>\alpha:=\tau\sigma^{\tau\sigma\tau}=(3,5,4)</math> e <math>\langle \tau,\alpha\rangle\le\big(\!\operatorname{Alt}(5)\big)_{1}=\operatorname{Stab}(1)\cong \operatorname{Alt}(4)</math>. Em <math>\langle\tau,\alpha\rangle</math>, temos <math>\langle \tau,\tau^{\alpha}\rangle=\langle (2,4)(3,5),(2,3)(5,4)\rangle\cong C_{2}\times C_{2}</math>; além disso as classes <math>\langle \tau,\tau^{\alpha}\rangle,\langle \tau,\tau^{\alpha}\rangle\alpha,\langle \tau,\tau^{\alpha}\rangle\alpha^{2}</math> são duas a duas distintas e esgotam o espaço de classes <math>\operatorname{mod}\,\,\langle \tau,\tau^{\alpha}\rangle</math>, logo <math>\vert\langle \tau,\alpha\rangle\vert=12</math>. Como <math>5</math> e <math>12</math> dividem a ordem de <math>\langle\sigma,\tau\rangle\le\operatorname{Alt}(5)</math>, temos a igualdade. Usando ideias similares, mas em <math>D(2,3,3)</math>, prova-se que <math>D(2,3,3)</math> é finito de ordem no máximo <math>12</math>; portanto, <math>x\to\tau,y\to\alpha</math> é um isomorfismo <math>D(2,3,3)\cong\operatorname{Alt}(4)</math>. Em <math>D(2,3,5)</math> há um subgrupo que é uma imagem homomorfa de <math>D(2,3,3)</math>, portanto é finito de ordem no máximo <math>12</math>. Usando as potências de <math>xy</math> como representantes de classes módulo tal subgrupo, mostra-se que <math>D(2,3,5)</math> é finito de ordem no máximo <math>12\cdot 5=60</math>, permitindo-nos concluir que <math>x\to\tau,y\to\sigma</math> é um isomorfismo <math>D(2,3,5)\cong\operatorname{Alt}(5)</math>. Ideias inteiramente análogas mostram que <math>x\to(1,4)</math>, <math>y\to(1,2,3)</math> é um isomorfismo <math>D(2,3,4)\cong\operatorname{Sym}(4)</math>.


=== Um último exemplo ===
=== Um último exemplo ===

Revisão das 23h49min de 15 de março de 2020

O Teorema de Nielsen-Schreier é um importante resultado da Teoria dos Grupos que demonstra que todo subgrupo de um grupo livre é livre sobre algum conjunto.

Conjuntos fechados por prefixos

Seja um grupo livre sobre o conjunto . Um subconjunto de será dito fechado por prefixos quando para toda palavra , , reduzida como escrita, temos . Note que um subconjunto fechado por prefixos necessariamente contém a palavra vazia . (É verdade que o grupo livre é construído como o conjunto de classes de equivalência de palavras, mas é natural identificar uma classe com o único elemento em forma reduzida que contém.)

Transversais de Schreier

Se é um subgrupo do grupo livre , uma transversal à direita de em será dita transversal de Schreier quando for um subconjunto fechado por prefixos. É um fato que, dado um subgrupo de um grupo livre, existe uma transversal de Schreier correspondente.

O enunciado

Teorema. (Nielsen-Schreier)[1][2][3]

Seja um grupo livre sobre o conjunto e seja . Fixe uma transversal à direita para em e, dado um elemento , seja o único elemento de tal que . Assuma-se que . Então

  • O subgrupo é gerado pelo conjunto .

A cada elemento não-idêntico do conjunto dos , , associe um símbolo e forme o conjunto .

  • Se a transversal for uma transversal de Schreier, o epimorfismo que estende é um isomorfismo. Em outras palavras, o (sub)grupo é livre, livremente gerado por . Vale também que tem posto .

A substância do Teorema está no segundo item. Com efeito, o que se afirma no primeiro item independe da liberdade do grupo em questão. Temos então a seguinte

Afirmação. Seja um grupo gerado pelo subconjunto . Se e é uma transversal à direita para em com , então .

Para ver por que a afirmação segue, note-se primeiro que , pois se . Portanto se , podemos realizar o seguinte malabarismo simbólico:

Continuando, obtemos , onde está no subgrupo gerado proposto e . Como o subgrupo gerado claramente é subgrupo de , temos , donde , finalizando o argumento. Como corolário, obtemos que são finitamente gerados subgrupos de índice finito de grupos finitamente gerados; além disso, o número mínimo de geradores de tal subgrupo é majorado pelo produto de seu índice pelo número mínimo de geradores do grupo que o contém.

Note que, em geral, para uma transversal com , temos a transversal na qual ; claramente (barras duplas evidentemente se referem à nova transversal). Logo o conjunto gerador obtido nas considerações anteriores torna-se .

O Teorema de Schreier-Reidemeister

O Teorema de Nielsen-Schreier permite exibir uma apresentação de um subgrupo a partir de uma para o grupo que o contém. Para isso, temos o seguinte

Teorema. (Schreier-Reidemeister)

Seja o grupo apresentado , isto é, , o subgrupo pelo qual estamos fatorando sendo o fecho normal do subgrupo gerado pelo conjunto de relatores. Seja um subgrupo de e seja a pré-imagem de em . Se é um isomorfismo de com o grupo livre sobre o conjunto e se é uma transversal qualquer de em , então temos a apresentação , onde o conjunto de relatores é .

A demonstração é imediata pois temos a igualdade entre fechos normais .

É também imediato o seguinte

Corolário. São finitamente apresentáveis subgrupos de grupos finitamente apresentáveis que possuem índice finito.

Haja vista que o índice da pré-imagem será finito, implicando que o será também o posto da pré-imagem como grupo livre; além disso, .

Um critério para infinitude

O objetivo nesta seção é provar o seguinte

Teorema. Seja . Suponha que . Se houver um grupo e um epimorfismo tal que a ordem do elemento é precisamente , então o grupo é infinito.

Começaremos com um

Lema. Se tem apresentação , com conjuntos finitos e , então a abelianização possui infinitos elementos. Em particular, é um grupo infinito.

Prova. Seja , . Passando para a abelianização e adotando a notação aditiva, podemos ver os relatores em como polinômios homogêneos de grau em — de fato, em . Por exemplo, o relator deve corresponder ao polinômio . É fato elementar da Álgebra Linear que existe um elemento em que anula todo elemento de (heurística: há mais incógnitas do que equações); existe, pois, um elemento em que anula todo elemento de (multiplique a solução anterior por um inteiro adequado); podemos supor que esse elemento está no grupo abeliano livre , digamos . O Teorema de von Dyck garante que a associação estende-se a um homomorfismo ; possuindo uma imagem homomorfa infinita, uma vez que , segue o Lema.

Prova do Teorema. Se for infinito, não há nada a fazer. Suponha então finito de ordem , de forma que tem índice finito em . Seja a pré-imagem de no grupo livre sobre , . Por Nielsen-Schreier, podemos escolher um isomorfismo , . Por Schreier-Reidemeister, temos , o conjunto sendo uma transversal à direita fixa para em . Para cada temos relatores. A ideia principal da demonstração é encontrar relatores redundantes, de modo que o Lema venha à mão. Fá-lo-emos do seguinte modo: escolha um elemento da transversal, digamos . Note que as classes são duas a duas distintas: caso não fossem, teríamos para algum . Por normalidade de , ter-se-ia , donde, em , , isto é, — absurdo pois a ordem de é . Temos então elementos de , . Agora para algum . Daí, os relatores oriundos de tais elementos da transversal são mutuamente conjugados, logo, destes, precisamos de apenas um. Escolhendo um elemento da transversal diferente daqueles já obtidos, podemos repetir o argumento até a exaustão dos relatores. Vê-se facilmente agora que são necessários apenas dos relatores iniciais. Isso claramente se repete para . Portanto, tem uma apresentação com geradores e relatores. Por hipótese, o número de geradores excede o número de relatores; apelando ao Lema, temos infinito, finalizando a demonstração.

Exemplo. O grupo é infinito. Temos . Considere as permutações e escolha . Em geral, o grupo , intimamente relacionado com certas tesselações triangulares de planos (no sentido amplo de geometrias Euclidianas ou não), é infinito se, e somente se, . É possível mostrar que, dada uma tripla de inteiros maiores que , existem elementos do grupo das transformações fracionais lineares do plano complexo estendido , tais que , , . Por outro lado, as únicas triplas daquela forma satisfazendo são , , , . No primeiro caso, vê-se facilmente que se trata de um grupo diedral . Nos casos restantes, temos, respectivamente, , , . Considere as permutações , , . Note que , e . Em , temos ; além disso as classes são duas a duas distintas e esgotam o espaço de classes , logo . Como e dividem a ordem de , temos a igualdade. Usando ideias similares, mas em , prova-se que é finito de ordem no máximo ; portanto, é um isomorfismo . Em há um subgrupo que é uma imagem homomorfa de , portanto é finito de ordem no máximo . Usando as potências de como representantes de classes módulo tal subgrupo, mostra-se que é finito de ordem no máximo , permitindo-nos concluir que é um isomorfismo . Ideias inteiramente análogas mostram que , é um isomorfismo .

Um último exemplo

Seja e . Afirmo que é um grupo Abeliano livre de posto , isto é, . Primeiro, temos . De fato, , já que e ; logo, o quociente tem apresentação .

Seja a imagem inversa de em (usar-se-á o mesmo símbolo para denotar um elemento de e sua imagem em ; esperadamente, não haverá confusão). Temos a transversal de Schreier para . Pelo Teorema de Nielsen-Schreier, é livre de posto , com a associação (estendendo-se a) um isomorfismo cuja inversa será denotada por . Calculando, temos , ,,, , , . Note que os elementos de obtidos de comprimento são permutações cíclicas uns dos outros, portanto são conjugados, logo constituem um conjunto de relatores redundantes, dos quais precisamos de apenas um; o mesmo vale para aqueles de comprimento . O gerador some. Temos daí que . Finalmente, e ; agora é fácil estabelecer, por exemplo, via Teorema de Von Dyck, um isomorfismo . Isso prova a afirmação inicial. Note que como subproduto desses argumentos, obtemos como um produto semidireto .


Referências

  1. ROBINSON, Derek J. (1996). A Course in the Theory of Groups. New York: Springer-Verlag. ISBN 0387944613 
  2. JR, Marshall Hall. The Theory of Groups. Providence, RI: AMS-Chelsea Publishing. ISBN 0821819674 
  3. MAGNUS, Wilhelm; SOLITAR, Donald; Karrass, Abraham. Combinatorial Group Theory. United States: Dover Publications. ISBN 0486438309