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Memórias de um Sargento de Milícias: diferenças entre revisões

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Considerada uma obra precursora do realismo, destaca-se, ao lado de ''O filho do pescador'' de [[Teixeira e Souza]] e ''A moreninha'', de [[Joaquim Manoel de Macedo]], entre as primeiras produções românticas da literatura brasileira.
Considerada uma obra precursora do realismo, destaca-se, ao lado de ''O filho do pescador'' de [[Teixeira e Souza]] e ''A moreninha'', de [[Joaquim Manoel de Macedo]], entre as primeiras produções românticas da literatura brasileira.


== Enredo ==
O romance se passa no início do século XIX. Em uma viagem de navio, Leonardo-Pataca conhece Maria-das-Hortaliças. Na viagem, os dois se apaixonam e, chegando no Brasil, Maria descobre que está grávida e os dois vão morar juntos. Desse relacionamento nasce um filho: Leonardo. Porém, anos depois, Leonardo-Pataca descobre que Maria o está traindo. Eles brigam e Maria foge de casa com o capitão de um navio. Com a separação, Leonardo-Pataca sai de casa e leva seu filho para ser criado pelo padrinho. O padrinho de Leonardo era um barbeiro que queria que o mesmo fosse padre, mas o menino não tinha a menor vocação, ao contrário, ele era muito travesso.
O tempo passa e Leonardo se torna um típico malandro carioca: não possuía emprego e ficava vadiando. Porém, a sua vida muda quando conhece Luisinha, sobrinha de D. Maria, uma amiga do padrinho. Ele se apaixona por Luisinha, porém tem um rival, José Manuel, que está interessado na herança da moça. Com a ajuda de sua madrinha, uma parteira, eles afastam José Manuel de Luisinha. Entretanto, o padrinho de Leonardo morre e ele tem que voltar a viver com o pai (acaba não se dando bem com sua nova madrasta e, após uma discussão, foge de casa).
Leonardo vai viver com um amigo em uma casa bastante agitada e com muita gente. Acaba se apaixonando por Vidinha e o amor é recíproco. Porém, esse namoro não agrada aos dois primos de Vidinha que têm intenções de se casar com ela. Para tirar Leonardo do caminho, eles vão até o major Vidigal, o chefe de polícia, e acusam Leonardo de vadiagem. Vidigal prende Leonardo quando ele, Vidinha, e seus dois primos saem para um passeio noturno. Mas, no caminho até a casa de guarda, ele consegue fugir.
Mais tarde, Leonardo arruma um emprego na Ucharia Real. Dessa forma, Vidigal não poderia prendê-lo. Mas ele se envolve com a mulher do "toma-largura" e é demitido e preso. Enquanto isso, José Manuel e Luisinha se casam, porém ele a trata muito mal. Vidinha, com ciúmes de Leonardo, vai tomar satisfações com a mulher do "toma-largura". Mas, o que acaba acontecendo, é que o "toma-largura" se interessa por Vidinha.
Enquanto isso, por saber muito sobre a vida marginal, Leonardo acaba virando policial (granadeiro). Porém, pelo seu gosto por travessuras, e muitas vezes pelo seu bom coração, acaba protegendo e ajudando os bandidos.
Vidigal o prende. A comadre (madrinha), em desespero, tenta de todas as formas conseguir a liberdade de Leonardo, mas não a obtém até conhecer Maria-Regalada, velho amor de Vidigal. Juntas, não só conseguem a libertação de Leonardo, como sua promoção a sargento e isso tudo vem em boa hora, já que com a morte de José Manuel, Luisinha, agora viúva, se casa com Leonardo (após se transferir para Sargento de Milícias) e tudo termina em um final feliz, algo muito diferente das idéias românticas da época, já que as histórias sempre acabavam com morte ou suicídio.


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Revisão das 19h09min de 20 de maio de 2008

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Memórias de um sargento de milícias é um romance de Manuel Antônio de Almeida. Foi publicado originalmente em folhetins no Correio Mercantil do Rio de Janeiro, entre 1852 e 1853, anonimamente. O livro foi publicado em 1854 e no lugar do autor constava "um brasileiro".

A narrativa de Memórias de um sargento de milícias, de estilo jornalístico e direto, incorpora a linguagem das ruas, classes média e baixa, fugindo aos padrões românticos da época, onde os romances retratavam os ambientes aristocráticos. A experiência de ter tido uma infância pobre contribuiu para que Manuel Antônio de Almeida desenvolvesse a sua obra.

Considerada uma obra precursora do realismo, destaca-se, ao lado de O filho do pescador de Teixeira e Souza e A moreninha, de Joaquim Manoel de Macedo, entre as primeiras produções românticas da literatura brasileira.

Enredo

O romance se passa no início do século XIX. Em uma viagem de navio, Leonardo-Pataca conhece Maria-das-Hortaliças. Na viagem, os dois se apaixonam e, chegando no Brasil, Maria descobre que está grávida e os dois vão morar juntos. Desse relacionamento nasce um filho: Leonardo. Porém, anos depois, Leonardo-Pataca descobre que Maria o está traindo. Eles brigam e Maria foge de casa com o capitão de um navio. Com a separação, Leonardo-Pataca sai de casa e leva seu filho para ser criado pelo padrinho. O padrinho de Leonardo era um barbeiro que queria que o mesmo fosse padre, mas o menino não tinha a menor vocação, ao contrário, ele era muito travesso. O tempo passa e Leonardo se torna um típico malandro carioca: não possuía emprego e ficava vadiando. Porém, a sua vida muda quando conhece Luisinha, sobrinha de D. Maria, uma amiga do padrinho. Ele se apaixona por Luisinha, porém tem um rival, José Manuel, que está interessado na herança da moça. Com a ajuda de sua madrinha, uma parteira, eles afastam José Manuel de Luisinha. Entretanto, o padrinho de Leonardo morre e ele tem que voltar a viver com o pai (acaba não se dando bem com sua nova madrasta e, após uma discussão, foge de casa). Leonardo vai viver com um amigo em uma casa bastante agitada e com muita gente. Acaba se apaixonando por Vidinha e o amor é recíproco. Porém, esse namoro não agrada aos dois primos de Vidinha que têm intenções de se casar com ela. Para tirar Leonardo do caminho, eles vão até o major Vidigal, o chefe de polícia, e acusam Leonardo de vadiagem. Vidigal prende Leonardo quando ele, Vidinha, e seus dois primos saem para um passeio noturno. Mas, no caminho até a casa de guarda, ele consegue fugir. Mais tarde, Leonardo arruma um emprego na Ucharia Real. Dessa forma, Vidigal não poderia prendê-lo. Mas ele se envolve com a mulher do "toma-largura" e é demitido e preso. Enquanto isso, José Manuel e Luisinha se casam, porém ele a trata muito mal. Vidinha, com ciúmes de Leonardo, vai tomar satisfações com a mulher do "toma-largura". Mas, o que acaba acontecendo, é que o "toma-largura" se interessa por Vidinha. Enquanto isso, por saber muito sobre a vida marginal, Leonardo acaba virando policial (granadeiro). Porém, pelo seu gosto por travessuras, e muitas vezes pelo seu bom coração, acaba protegendo e ajudando os bandidos. Vidigal o prende. A comadre (madrinha), em desespero, tenta de todas as formas conseguir a liberdade de Leonardo, mas não a obtém até conhecer Maria-Regalada, velho amor de Vidigal. Juntas, não só conseguem a libertação de Leonardo, como sua promoção a sargento e isso tudo vem em boa hora, já que com a morte de José Manuel, Luisinha, agora viúva, se casa com Leonardo (após se transferir para Sargento de Milícias) e tudo termina em um final feliz, algo muito diferente das idéias românticas da época, já que as histórias sempre acabavam com morte ou suicídio.

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Espaço

O espaço físico apresentado na obra é o meio urbano brasileiro do século XIX. A história se passa no Rio de Janeiro, e descreve seus principais pontos, como igrejas, principais ruas, mas descreve também pontos bem à margem da sociedade, como acampamentos de ciganos e bares. Neste trecho, o autor descreve um acampamento cigano: "Moravam ordinariamente um pouco arredados das ruas populares, e viviam em plena liberdade. As mulheres trajavam com certo luxo relativo aos seus haveres: usavam muito de rendas e fitas; davam preferência a tudo quanto era encarnado, e nenhuma delas dispensava pelo menos um cordão de ouro ao pescoço; os homens não tinham outra distinção mais do que alguns traços fisionômicos particulares que os faziam conhecidos."

O autor retrata as classes média e baixa existentes na época, contrariando muitos românticos que retratavam a aristocracia. Quase em nenhuma parte, o livro retrata um ambiente aristocrático.

No trecho a seguir, sobre o batizado da irmã de Leonardo, pode-se observar como era retratado o meio social:

Estavam todos sentados, e o Teotônio em pé no meio da sala olhava para um, e apresentava uma cara de velho; virava-se repentinamente para outro, e apresentava uma cara de tolo a rir-se asnaticamente; e assim por muito tempo mostrando de cada vez um tipo novo. Finalmente, tendo já esgotado toda a sua arte, correu a um canto, colocou-se numa posição que pudesse ser visto por todos ao mesmo tempo, e apresentou a sua última careta. Todos desataram a rir estrondosamente apontando para o major.

Teotônio era um tipo bem popular e por suas caretas era chamado para animar muitas festas. Tal tipo de "divertimento" era impensável em festas aristocráticas.

Foco narrativo

A narrativa é feita em terceira pessoa (mas há passagens do livro em que o foco narrativo passa da terceira pessoa para a primeira pessoa) o que torna mais completa a caracterização das personagens e seu foco secundário vai variando.

O autor utiliza diálogos que retratam a linguagem dos personagens. Esse tipo de narrativa faz com que o texto fique mais interessante, pois ficam evidentes as ironias usadas pelo narrador.

No trecho que se segue, pode-se observar como o autor aproxima as falas de seus personagens das expressões usadas na época, em uma linguagem extremamente coloquial:

— Já... já... senhora intrometida com a vida alheia... já sabe o padre-nosso, e eu o faço rezar todas as noites um pelo seu defunto marido que está a esta hora dando coices no inferno!...

O livro é repleto de ironias, como no trecho a seguir:

Ser valentão foi em algum tempo ofício no Rio de Janeiro; havia homens que viviam disso: davam pancada por dinheiro, e iam a qualquer parte armar de propósito uma desordem, contanto que se lhes pagasse, fosse qual fosse o resultado.Entre os honestos cidadãos que nisto se ocupavam, havia, na época desta história, um certo Chico-Juca, afamadíssimo e temível.

Pode-se notar, por meio do texto, que esses cidadãos, na verdade, nada tinham de honestos.

Estilo

Manuel Antônio de Almeida utiliza uma linguagem que se aproxima da jornalística, o que torna claros e objetivos os seus textos. Outro aspecto é a utilização de personagens comuns na época, como o barbeiro, a parteira, o major, tornando, assim, a história mais próxima do leitor.

Memórias de um sargento de milícias foi escrito em forma de folhetim (os capítulos eram publicados em seqüência nos jornais da época, o que prendia o leitor, pois deixava um suspense em relação ao capítulo posterior). Essa característica é utilizada atualmente em novelas, como um resquício do folhetim, com a finalidade de colocar o telespectador em suspense.

Essa forma de provocar o suspense no leitor pode ser observada neste trecho, que é o final de um capítulo:

Um grito de espanto, acompanhado de uma gargalhada estrondosa dos granadeiros, interrompeu o major. Descoberta a cara do morto, reconheceu-se ser ele o nosso amigo Leonardo!....

Em alguns trechos, o narrador é onisciente, ou seja, ele não participa da história. Exemplo são as passagens em que o narrador "entra" no pensamento do personagem:

Pois enganava-se redondamente quem tal julgasse: pensava em coisa muito mais agradável; pensava em Luizinha. Pensando nela não podia, é verdade, abster-se de ver surgir diante dos olhos o terrível José Manuel.

Verossimilhança

Ao contrário de outras obras românticas, o autor mostra uma visão bem próxima à realidade. Os problemas sociais, as atitudes dos personagens e uma visão menos idealizada da realidade caracterizam a obra como precursora no Realismo. Personagens como Major Vidigal, por exemplo, realmente existiram.

No trecho que se segue, temos um exemplo da ironia e da crítica aos costumes da época, em que um padre tem relações amorosas com uma cigana:

No mesmo instante viu aparecer o granadeiro trazendo pelo braço o Rev. Mestre-de-Cerimônias em ceroulas curtas e largas, de meias pretas, sapatos de fivela, e solidéu à cabeça. Apesar dos aparos em que se achavam, todos desataram a rir: só ele e a cigana choravam de envergonhados.

Movimento literário

A obra Memórias de um sargento de milícias é uma obra romântica, que, conseqüentemente, apresenta algumas características típicas do movimento. A obra, porém, é um romance urbano, que desenvolveu temas ligados à vida social. A história, porém, não apresenta os exageros sentimentais comuns à maioria das obras românticas.

Fazendo o uso da ironia, o autor deixa perceber que sua intenção era divertir o leitor com os problemas sociais de sua época.

O livro abandona a linguagem metafórica e a mulher e o amor não são idealizados, como em outras obras pertencentes ao Romantismo. Em algumas partes o autor chega mesmo a ironizar o Romantismo. Por exemplo:

tratava-se de uma cigana; o Leonardo a vira pouco tempo depois da fuga da Maria, e das cinzas ainda quentes de um amor mal pago nascera outro que também não foi a este respeito melhor aquinhoado; mas o homem era romântico, como se diz hoje, e babão, como se dizia naquele tempo.

O final feliz de Luizinha e Leonardo, porém, é uma característica tipicamente romântica. Pode-se ver como amor transforma a vida de Luizinha:

Desde o dia em que Leonardo fizera a sua declaração amorosa, uma mudança notável se começou a operar em Luizinha, a cada hora se tornava mais sensível a diferença tanto do seu físico como do seu moral. Seus contornos começavam a arredondar-se; seus braços, até ali finos e sempre caídos, engrossavam-se e tornavam-se mais ágeis; suas faces magras e pálidas, enchiam-se e tomavam essa cor que só sabe ter o rosto da mulher em certa época da vida; a cabeça, que trazia habitualmente baixa, erguia-se agora graciosamente; os olhos, até aqui amortecidos, começavam a despedir lampejos brilhantes; falava, movia-se, agitava-se. A ordem de suas idéias alterava-se também; o seu mundo interior, até então acanhado, estreito, escuro, despovoado, começava a alargar os horizontes, a iluminar-se, a povoar-se de milhões de imagens, ora amenas, ora melancólicas, sempre porém belas.


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