Método de BET

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O Método de BET ou ainda Teoria de Adsorção Multimolecular é uma teoria matemática com o objetivo de descrever a adsorção física de moléculas de gás sobre uma superfície sólida e serve como base para uma técnica de análise importante para medição de área superficial específica de um material. O método de BET foi desenvolvido por Stephen Brunauer, Paul Hugh Emmett e Edward TellerB.E.T. Brunauer, Emmett, Teller — e publicado em 1938 em artigo intitulado "Adsorption of Gases in Multimolecular Layers" no Journal of the American Chemical Society[1]. O método de BET é considerado uma extensão à teoria de Langmuir, desenvolvida por Irving Langmuir em 1916.

Introdução[editar | editar código-fonte]

Desde a sua publicação o método de BET ou teoria de adsorção multimolecular se tornou a ferramenta de interpretação mais importante e útil no campo de adsorção física de gases. O mecanismo de adsorção física foi primeiramente descrito por Irving Langmuir em 1916 com a teoria monomolecular ou teoria de Langmuir, que descrevia o equilíbrio a taxas iguais de condensação e evaporação sobre a superfície sólida considerando a formação de uma camada única de móleculas sobre a superfície. A interpretação de Langmuir foi seguida e aperfeiçoada por Brunauer, Emmett e Teller (B.E.T.) em 1938, estabelecendo que a superfície é recoberta por infinitas camadas moleculares superpostas — teoria de adsorção multimolecular ou BET[2].

Teoria de Langmuir[editar | editar código-fonte]

A teoria de Langmuir relaciona a fisissorção de uma camada única de móleculas de gás, também chamadas de adsorbatos, sobre superfície sólida à pressão de gás do meio sob temperatura fixa.

Aonde θ é a fração de superfície recoberta, p é a pressão de gás e α uma constante.

A equação de Langmuir é baseada nas seguintes hipóteses:

  • Todos os sítios de adsorção na superfície possuem a mesma energia de adsorção para o adsorbato. O sítio de adsorção é definido como a área na superfície em que uma única molécula pode se adsorver.
  • A adsorção de uma molécula de adsorbato ocorre independentemente da adsorção em sítios vizinhos.
  • A atividade do adsorbato é diretamente proporcional a sua concentração.
  • Adsorbatos formam uma monocamada.
  • Cada sítio de adsorção pode ser ocupado por apenas uma partícula.
Modelo esquemático da adsorção física de moléculas de gás sobre a superfície de um sólido. A figura a. demonstra a adsorção de uma única camada como sugerido pela teoria de Langmuir, e a figura b. apresenta o modelo de multicamadas assumido pelo método de BET.

Método de BET[editar | editar código-fonte]

O método de BET é uma extensão a teoria de Langmuir e introduz o conceito de adsorção de multicamadas segundo três hipóteses adicionais:

  • As moléculas de gás irão adsorver fisicamente na superfície sólida em camadas infinitamente.
  • As diferentes camadas de adsorção não interagem entre si.
  • A teoria se aplica a todas as camadas de adsorção.

Similar a teoria de Langmuir, o método de BET requer a suposição de mecanismos consequêntes às três hipóteses consideradas, são eles:

1. A adsorção de cada molécula de gás na superfície do sólido está relacionada a uma única e bem definida energia de adsorção.

2. A única interação molecular considerável é a de que uma molécula poderá agir como sítio único de adsorção para outra molécula de uma nova camada.

3. A camada mais externa de adsorção está em equilíbrio com a fase gasosa — apresenta taxa de adsorção e desorção similares.

4. O processo de desorção é cinéticamente limitado — calor de adsorção deve ser cedido.

4.1. Este fenômeno é homogêneo em todas as moléculas de uma mesma camada.
4.2. O calor de adsorção referente a primeira camada é igual a E1 — calor de adsorção à superfície sólida.
4.3. Assume-se que as demais camadas de adsorção são similares entre si e podem ser representadas como espécies condensadas — fase líquida —, portanto o calor de adsorção destas camadas é El — calor de liquefação.

5. Na pressão de saturação o número de camadas adsorvidas tende a infinito — equivalente a superfície sólida estar imersa em fase líquida.

Equação de BET[editar | editar código-fonte]

Com base nas simplificações assumidas é possível desenvolver uma nova equação de isoterma para o modelo de múltiplas camadas derivada da teoria de monocamada[3]. As equações obtidas são capazes de representar não só a forma geral de isotermas experimentais, mas predizer valores compatíveis médios para o calor de adsorção e o volume de gás necessário para completar a primeira camada de adsorção em um sólido. A equação resultante do método de BET, para infinitas camadas, pode ser expressa por:

Aonde:

  • v é o volume total de gás adsorvido.
  • vm é o volume de gás adsorvido quando a superfície do sólido está completamente coberta por uma monocamada.
  • c é a constante de BET.
  • p é a pressão medida no estado de equilíbrio.
  • p0 é a pressão inicial do sistema.

A constante c, como regra terá módulo muito maior do que a unidade e portanto a isoterma será composta por duas regiões — isoterma em S. Para pressões maiores, conforme p se aproxima de p0, a isoterma será convexa ao eixo p/p0. Para a região de baixa pressão v se torna menor e a curva se torna concava ao eixo p/p0, e para p<<p0 a equação (1) se reduz a:

Que é uma forma equivalente a equação de Langmuir (A).

Representação gráfica da equação (3) do método de BET.

Com propósito de simplificação, a equação (1) pode ser reescrita da seguinte forma:

A equação (3) é mais conveniente para se trabalhar, uma vez que o gráfico de p/v(p0-p) X p/p0 é linear, cuja interseção com o eixo das ordenadas é 1/vmc e inclinação igual a (c-1)/vmc. Desta forma podemos obter vm e c a partir da plotagem do gráfico, sendo o primeiro o volume de gás requerido para completar uma camada de adsorção e o segundo, por definição, aproximadamente exp[(E1-El)/RT].

Gráfico esquemático da curva (4) para diferentes valores de n.

Se o número de camadas adsorvidas não puder ultrapassar determinado número finito, então a equação (1) deve ser revista para apenas n termos, e não infinitos. Desta forma obtemos a equação:

Uma interpretação plausivel para n é relacionada a dimensão de poros, irregularidades e capilaridades de um material, que limite o número máximo de camadas possíveis de se adsorverem mesmo à pressão de saturação.

A equação (4) possui dois casos limites importantes. Quando n=1, a expressão se resume a equação de Langmuir (2) e quando n= (superfície livre) se resume a equação (1).

Como n é um valor característico do material, e a princípio desconhecido, para a utilização da equação (4) é necessário que anteriormente sejam plotados os valores experimentais da isoterma para baixa pressão de acordo com a equação (3), com a obtenção dos valores de vm e c a partir da inclinação e interseção do gráfico. Adquiridos os valores deve-se utilizar a equação (4) e ajusta-la para o melhor valor de n.

Analisador de Área Superficial BET[editar | editar código-fonte]

Conceito[editar | editar código-fonte]

O equipamento para análise de área superficial por BET realiza medidas de área superficial específica através da determinação do volume de gás adsorvido fisicamente na superfície da amostra[4]. O procedimento experimental utiliza um inerte gás, em geral nitrogênio, devido a sua facilidade de obtenção em estado puro e por apresentar interação relativamente baixa com a grande maioria dos sólidos. Devido ao fenômeno de adsorção física estar relacionado a forças de interação molecular fracas entre o adsorbato — moléculas de gás — e adsorvente — superfície sólida da amostra —, as medidas no equipamento são realizadas na temperatura de condensação do nitrogênio a fim de se obter valores detectáveis de adsorção. A análise é realizada adicionando em etapas quantidades conhecidas de pressão de nitrogênio (p0) ao recipiente da amostra, de forma que diferentes pressões de vapor (p) sejam alcançadas no equilíbrio do sistema. Durante o procedimento, um sensor de pressão monitora as variações de pressão (p) devido aos processos de adsorção. Quando a pressão de saturação é alcançada não ocorre mais adsorção física independente de acréscimo na pressão. Após as camadas de adsorção serem formadas — p0 for igual a pressão de saturação — a amostra é removida da atmosfera de nitrogênio, e aquecida para que ocorra a dessorção e quantificação das moléculas de nitrogênio adsorvidas no material. Os dados coletados de pressão são apresentados na forma da isoterma de BET — equação (1) —, que relaciona o volume de gás adsorvido v em função da pressão relativa p/p0. Existem cinco tipos de isoterma possíveis de serem obtidas[5]:

Tipos de isoterma de adsorção física

Isoterma Tipo I

A isoterma do tipo I é uma pseudo-isoterma de Langmuir, porque está relacionada a adsorção de uma única ou poucas camadas sobre a superfície sólida. Uma isoterma do tipo I é típica de materiais microporosos, onde os poros excedem em pouco o diâmetro molecular do adsorbato. A equação da isoterma do tipo I é obtida quando n → 1 e c > 1.

Isoterma Tipo II

Isotermas do tipo II são as mais comuns de serem encontradas em medidas de adsorção e ocorrem em sistemas não porosos. O primeiro segmento da curva, côncavo ao eixo p/p0, representa a formação de monocamada adsorvida à superfície, enquanto o segundo segmento, convexo ao eixo p/p0, representa a adsorção de multiplas camadas sobre a superfície — o ponto de inflexão da isoterma corresponde à ocorrência de completa formação da primeira camada —. A equação da isoterma do tipo II é obtida quando c > 1.

Isoterma Tipo III

A isoterma do tipo III ocorre quando c < 1 e corresponde a E1 < El, ou seja, a interação adsorvente-adsorbato é mais fraca que a interação adsorbato-adsorbato, deste modo a adsorção ocorre principalmente em multicamadas, sem que ocorra necessariamente a formação completa da primeira camada. Como não é possível identificar a ocorrência de formação da primeira camada de adsorção, o método de BET não se aplica.

Isoterma Tipo IV

A isoterma do tipo IV é obtida quado ocorre condensação capilar, em que observa-se a formação de monocamada seguida a adsorção de multicamadas até inflexão e saturação da isoterma. A isoterma do tipo IV é típica de amostras com poros no intervalo de mesoporos a macroporos, em que a formação de multicamadas de adsorção é possível porém limitada a dimensão das porosidades do material. A equação da isoterma do tipo IV pode ser expressa pela equação (4) ajustada para o melhor valor de n, com c > 1.

Isoterma Tipo V

As isotermas do tipo V são similares as do tipo IV, porém apresentam c < 1 e, conforme a isoterma do tipo III, não é possível identificar a ocorrência de formação da primeira camada de adsorção, portanto o método de BET não pode ser aplicado.

Novas definições IUPAC

Em 2015 foram publicadas novas recomendações IUPAC[6] para avaliação de área específica e distribuição de tamanho de poros através de técnicas de adsorção de gases, onde os tipos de isotermas foram redefinidos. A leitura desse trabalho é recomendável para todos os usuários dessa técnica.

Analise de Dados[editar | editar código-fonte]

Multi-point BET[editar | editar código-fonte]

A análise de dados é realizada de acordo com a equação de BET (1), aonde os parâmetros da equação devem ser ajustados ao tipo de isoterma do sistema estudado[7]. Idealmente cinco medidas no intervalo de p/p0 entre 0.05 a 0.3 devem ser o suficiente para a determinação da superfície específica. Com os valores coletados utiliza-se a equação (3) para plotar um gráfico p/v(p0-p) versus p/p0, que deve se aproximar de uma linha reta para os valores dentro do intervalo de p/p0 selecionados — as variações não-lineares que ocorrem fora deste intervalo podem ser dividas em dois grupos: os casos que apresentam baixa adsorção e os que apresentam alta adsorção[8], devendo ser analisadas individualmente uma vez que apresentam propriedades singulares para cada material estudado —. Os dados experimentais podem ser considerados aceitáveis caso o coeficiente angular da reta não seja menor do que 0.9975. Como resultado da utilização da equação (3) obtêm-se da interseção com o eixo das ordenadas 1/vmc e da inclinação da curva (c-1)/vmc. Com as duas relações podemos determinar vm e c, sendo o primeiro o volume de gás requerido para completar uma camada de adsorção e o segundo, por definição, aproximadamente exp[(E1-El)/RT]. Uma vez conhecido vm calcula-se a área específica de um material através da seguinte equação:

Aonde:

  • S é a área específica.
  • vm é o volume de gás adsorvido quando a superfície do sólido está completamente coberta por uma monocamada.
  • Lav é o número de Avogadro.
  • Aad é área de seção transversal da uma molécula de adsorbato.
  • Mv é o volume ocupado por 1 mol da molécula de adsorbato.

Single-point BET[editar | editar código-fonte]

Normalmente seriam necessárias pelo menos cinco medidas experimentais para determinação da área específica do material. Entretanto, sob determinadas circunstâncias é aceitável que o cálculo de área específica seja realizado com apenas um valor coletado. Assumindo que c >> 1 a equação (3) se torna:

Desta forma, a curva do gráfico intercepta a origem, e podemos obter 1/vm a partir da inclinação da curva 1/(1-p/p0) X v com apenas um ponto experimental. A exemplo do multi-point BET, uma vez que determinamos vm podemos calcular a área específica do material através da equação (5). O método de single-point BET é frequentemente utilizado em analises de rotina para uma série de amostras de determinado material que conhecidamente apresenta c muito maior do que a unidade. O erro associado a aproximação utilizada pelo método single-point é função da pressão relativa p/p0 e do valor original de c, e deve ser determinado através das equações (3) e (6).

Procedimento Experimental[editar | editar código-fonte]

Antes de se realizar o ensaio de superfície as amostras devem ser desgaseificadas promovendo completa remoção de água e outros contaminantes adsorvidos na amostra para se garantir que as medidas de área superficial obtidas durante a análise possam ser adquiridas com precisão. As amostras devem ser desgaseificadas sob vácuo e aquecimento, sendo que a temperatura final e a taxa de aquecimento podem influenciar fortemente nas áreas específicas obtidas. A temperatura escolhida é usualmente a maior possível sem que ocorra o comprometimento da estrutura física da amostra, a fim de se encurtar o tempo de desgaseificação. O mínimo de amostra requerido para se realizar medidas com sucesso em um equipamento por BET é 0.5 mg.

As amostras são inseridas em uma célula de vidro e um bastão de vidro é colocado junto a amostra para reduzir o espaço morto no interior da célula. As células de amostras possuem tamanhos típicos de 6, 9 e 12 mm e podem existir em diferentes formatos — usualmente as células de 6mm são utilizadas para amostras em pó fino, 9mm para partículas maiores e aglomerados (pellets), e 12mm para amostras maiores que não podem ter seu tamanho reduzido —. As células são então alocadas em mantas de aquecimento e conectadas a porta de vácuo do sistema para procedimento de desgaseificação[9].

Após a etapa de desgaseificação, a célula é movida para o módulo de análise e submersa parcialmente em nitrogênio liquido. O nitrogênio liquido é utilizado para o resfriamento e manutenção da temperatura baixa na amostra, a fim de garantir que no momento da analise as interações entre as moléculas de gás e a superfície sólida sejam fortes o suficiente para serem obtidos valores detectáveis de adsorção. O volume morto dentro da célula da amostra precisa ser calibrado antes de cada analise de medidas — para esta finalidade gás helio é utilizado para um ensaio em branco, devido a sua adsorsão nula na superfície da amostra —. Após a calibração do equipamento, o adsorbato, gás de nitrogênio neste exemplo, é injetado no interior da célula com um piston de calibração para realização das medidas.

Cuidados ao fazer análise dos dados[10][editar | editar código-fonte]

A equação de BET pode ser usada para determinação da área específica, obtendo-se o gráfico de [p/po/n(1-p/po)] versus p/po, onde n é quantidade de gás adsorvido, p é a pressão e po é a pressão de saturação de N2. A partir desse gráfico, uma região linear deve ser selecionada baseada nos seguintes critérios propostos por Rouquerol e colaboradores [11]:

  1. A constante BET "C" deve ser positiva;
  2. n(1-p/po) deve crescer monotonicamente com p/po;
  3. a capacidade da monocamada (nm) deve corresponder a uma pressão dentro dos limites dos dados;
  4. o valor calculado para a formação da monocamada (1/(srqt(C) +1)) deve ser aproximadamente igual a p/po na capacidade da monocamada.

Referências

  1. Brunauer, Stephen; Emmett, P. H.; Teller, Edward (1 de fevereiro de 1938). «Adsorption of Gases in Multimolecular Layers». Journal of the American Chemical Society. 60 (2): 309-319. doi:10.1021/ja01269a023 
  2. S. Brunauer, The Adsorption of Gases and Vapors, Oxford University Press, 1943.
  3. S. Brunauer, P. H. Emmett, and E. Teller, Journal of American Chemical Society, 1938, 60, 309.
  4. S. Lowell and Joan E. Shields, Powder Surface Area and Porosity, Springer, 1991, 4, 14.
  5. S. Brunauer, L. S. Deming, W. E. Deming, and E. Teller, Journal of the American Chemical Society, 1940, 62, 1723.
  6. Matthias Thommes*, Katsumi Kaneko, Alexander V. Neimark, James P. Olivier, Francisco Rodriguez-Reinoso, Jean Rouquerol and Kenneth S. W. Sing Pure Appl. Chem. 2015; 87(9-10): 1051–1069 DOI 10.1515/pac-2014-1117
  7. T. Allen, Particle Size Measurement - Volume 2, Springer, 1996, 2, 39.
  8. W. C. Walker and A. C. Zettlemoyer, The Journal of Physical Chemistry, 1948, 52, 47.
  9. P. S. Northrop, R. C. Flagan and G. R. Gavalas, Langmuir, 1987, 3, 300.
  10. Ashlee J. Howarth, Aaron W. Peters, Nicolaas A. Vermeulen, Timothy C. Wang, Joseph T. Hupp, and Omar K. Farha Chem. Mater., Article ASAP DOI: 10.1021/acs.chemmater.6b02626
  11. Rouquerol, J.; Rouquerol, F.; Llewellyn, P.; Maurin, G.; Sing, K. S. W. Adsorption by Powders and Porous Solids: Principles, Methodology and Applications; Academic Press: London, 2013