Quociente eleitoral
Quociente eleitoral é um método pelo qual se distribuem as cadeiras nas eleições pelo sistema proporcional de votos em conjunto com o quociente partidário e a distribuição das sobras.
No Brasil
[editar | editar código-fonte]A eleição pelo sistema proporcional brasileiro às cadeiras legislativas — deputado federal, estadual ou distrital, e vereador — mistura os métodos de d'Hondt e de Jefferson, que prestigiam a força da representatividade do voto tanto ao candidato como ao partido e/ou à coligação partidária.
Importante salientar que, diferente das demais eleições do Poder Legislativo, à eleição do Senador se aplica o sistema de votação majoritária.
Quociente eleitoral e quociente partidário
[editar | editar código-fonte]O Quociente eleitoral é definido pelo código eleitoral brasileiro como sendo:
Determina-se o quociente eleitoral dividindo-se o número de votos válidos apurados pelo de lugares a preencher em cada circunscrição eleitoral, desprezada a fração se igual ou inferior a meio, equivalente a um, se superior— (Código Eleitoral, art. 106).[1]
Enquanto o quociente partidário é:
Determina-se para cada partido ou coligação o quociente partidário, dividindo-se pelo quociente eleitoral o número de votos válidos dados sob a mesma legenda ou coligação de legendas, desprezada a fração— (Código Eleitoral, art. 107).[2]
Ou seja, se chamarmos de Qe o quociente eleitoral e de Qp o quociente partidário, temos:
onde é o número de votos válidos e o número de cadeiras a serem preenchidas; e
onde é o número de votos do partido.
O número de cadeiras obtidas por cada partido corresponde à parte inteira do quociente partidário. Caso a soma das cadeiras obtidas pelos partidos não seja igual ao total de cadeiras, as cadeiras restantes são divididas de acordo com o sistema de médias, também conhecido como distribuição das sobras.[3]
Cláusula de barreira
[editar | editar código-fonte]A cláusula de barreira é condição aplicada após a apuração do quociente partidário , ao qual serão retiradas do partido as cadeiras dos candidatos que inicialmente não tenham ao menos 10% do quociente eleitoral .
As cadeiras retidas do partido irão compor as cadeiras em sobra, que depois serão novamente redistribuidas a partir de nova etapa, chamada cálculo de médias. [4]
Por exemplo, considerando , em que determinado partido, ou coligação, dispute o pleito com apenas 2 candidatos (A e B), recebendo A 300 votos e B apenas 1, nesse caso, o candidato B não fará jus a nenhuma cadeira, inicialmente, apesar de o partido ter direito a 3 cadeiras, conforme o quociente partidário .
Isso acontece porque o candidato B não tem ao menos 10% do quociente eleitoral , ou seja, o candidato B necessitaria ter ao menos 10 votos direcionados a ele próprio para ter direito à cadeira obtida pelo partido.
O mecanismo da cláusula de barreira foi introduzido na intenção de barrar partidos ou coligações pequenas que tivessem determinado candidato puxador de votos, a exemplo da candidatura do Deputado Federal por São Paulo, o artista Tiririca, com votação que à época elegeu mais de 5 candidatos de inexpressiva votação em relação aos demais candidatos do pleito.[5]
Estarão eleitos, entre os candidatos registrados por um partido ou coligação que tenham obtido votos em número igual ou superior a 10% (dez por cento) do quociente eleitoral, tantos quantos o respectivo quociente partidário indicar, na ordem da votação nominal que cada um tenha recebido.
— (Código Eleitoral, art. 108).[6]
Exemplo
[editar | editar código-fonte]Neste exemplos temos 9 vagas para serem preenchidas e 6.050 votos válidos (excluídos votos brancos e nulos).
Partido ou coligação | Votos obtidos |
---|---|
Partido/Coligação A | 1.900 |
Partido/Coligação B | 1.350 |
Partido/Coligação C | 550 |
Partido/Coligação D | 2.250 |
Total de votos válidos | 6.050 |
Qe = votos / vagas = 6.050 / 9 ≈ 672,22.
Seguindo-se a regra de arredondamento especificada temos um quociente eleitoral de 672. Para cada partido temos então:
Partido ou coligação | Quociente partidário | Vagas obtidas |
---|---|---|
Partido/Coligação A | 1900/672 ≈ 2,8273 | 2 |
Partido/Coligação B | 1350/672 ≈ 2,0089 | 2 |
Partido/Coligação C | 550/672 ≈ 0,8184 | Nenhuma |
Partido/Coligação D | 2.250/672 ≈ 3,3482 | 3 |
Total | 7 | |
Sobras | 2 |
Assim temos 7 vagas preenchidas, e as duas vagas restantes devem ser preenchidas usando-se o método das médias ou distribuição das sobras.
Distribuição das sobras
[editar | editar código-fonte]A distribuição das sobras, ou método das Médias, é a forma como se distribuem as cadeiras que não puderam ser preenchidas pelo quociente eleitoral nas eleições proporcionais brasileiras. O Código eleitoral brasileiro define:
I - dividir-se-á o número de votos válidos atribuídos a cada partido ou coligação pelo número de lugares definido para o partido pelo cálculo do quociente partidário do art. 107, mais um, cabendo ao partido ou coligação que apresentar a maior média um dos lugares a preencher, desde que tenha candidato que atenda à exigência de votação nominal mínima;
II - repetir-se-á a operação para cada um dos lugares a preencher;
III - quando não houver mais partidos ou coligações com candidatos que atendam às duas exigências do inciso I, as cadeiras serão distribuídas aos partidos que apresentem as maiores médias.
§ 1o O preenchimento dos lugares com que cada partido ou coligação for contemplado far-se-á segundo a ordem de votação recebida por seus candidatos.
§ 2o Somente poderão concorrer à distribuição dos lugares os partidos ou as coligações que tiverem obtido quociente eleitoral.” (NR)— (Código Eleitoral, art. 109)[3]
Ou seja, para cada partido deve-se calcular a média M = Qp / (Cadeiras conquistadas + 1). O partido que obtiver o maior valor de média obterá a primeira cadeira da sobra. Os valores são então recalculados, ajustando o número de cadeiras do partido que ganhou a sobra, até que não haja mais sobras.
Em outubro de 2021 foi sancionada a Lei 14.211 de 2021, que mudou as regras para distribuição das sobras eleitorais. De acordo com a nova lei, só podem concorrer à distribuição das vagas remanescentes os candidatos que obtiverem um mínimo de 20% do quociente eleitoral e os partidos que tiverem pelo menos 80% do quociente. [7]
Pela regra anterior (Lei 13.488/2017), todos os partidos com participação nas eleições poderiam participar da distribuição das sobras, independentemente do número de votos obtidos.[8]
Exemplo
[editar | editar código-fonte]Seguindo o nosso exemplo da seção anterior, temos de distribuir da seguinte forma as 2 cadeiras que sobraram:
Coligação | Quociente partidário | vagas | Média | sobra |
---|---|---|---|---|
Partido/Coligação A | 1900/672 | 2 | 1900 / (2 + 1) = 633 | Sim |
Partido/Coligação B | 1350/672 | 2 | 1350 / (2 + 1) = 450 | |
Partido/Coligação C | 550/672 | 0 | 550 / (0 + 1) = 550 | |
Partido/Coligação D | 2.250/672 | 3 | 2250 / (3 + 1) = 562 |
Veja que o partido C não conquistou nenhuma vaga, portanto está excluído da distribuição de sobras.
Partido | Quociente partidário | cadeiras | Média | Ganhador da sobra |
---|---|---|---|---|
Partido/Coligação A | 1900/672 | 3 | 1900 / (3 + 1) = 475 | |
Partido/Coligação B | 1350/672 | 2 | 1350 / (2 + 1) =450 | |
Partido/Coligação C | 550/672 | 0 | 550 / (0 + 1) =550 | |
Partido/Coligação D | 2.250/672 | 3 | 2250 / (3 + 1) = 562 | Sim |
Ao final do processo temos o partido D com 4 cadeiras, A com 3 e B com 2, totalizando nossas 9 cadeiras disputadas.
No exemplo citado acima, nenhum partido obteve menos de 80% do quociente eleitoral, por isso todos os partidos estão disputando as vagas remanescentes. Além disso, o exemplo não leva em consideração as votações individuais dos candidatos, que precisam ser superior à 20% do quociente para que concorram as vagas remanescentes.
Em Portugal
[editar | editar código-fonte]No sistema eleitoral português não existe divisão de vagas no parlamento através de quociente eleitoral, mas pela confecção de uma tabela onde encontram-se dispostos o número de votos por coligação divididos de 1 até o número máximo de cadeiras, muito similar ao sistema brasileiro de divisão de sobras. Este sistema é conhecido como método D'Hondt. Este sistema é matematicamente equivalente ao sistema brasileiro, variando na forma de cálculo e na retirada de certos privilégios de chapas mais votadas, e com a diferença de ser calculado nacionalmente, e não por subdivisões administrativas (estados, no Brasil).
Uma das mais significativas distinções entre a distribuição brasileira e portuguesa consiste no fato desta última não impor um ponto de corte (que é o próprio quociente eleitoral em si): em outras palavras, é totalmente possível que uma chapa conquiste um mandato sem alcançar o que no Brasil equivaleria ao quociente eleitoral. Paralelamente, não raras vezes, estados e municípios brasileiros espectam pequenas chapas proporcionais terem mais votos que a relação votos por mandato de chapas maiores, porém não elegerem um parlamentar sequer justamente por, apesar de haverem chegado próximo do quociente eleitoral, não o alcançarem: fato impossível em Portugal, uma vez que todos disputam as vagas sem pontos de corte.
Exemplo
[editar | editar código-fonte]Um exemplo do cálculo segundo o método D'Hondt utilizado em Portugal, utilizando os mesmos dados dos exemplos anteriores, onde há quatro chapas pleiteando nove vagas:
Divisores / Partidos |
1 | 2 | 3 | 4 | 5 | 6 | 7 | 8 | 9 |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Part/Col A | 1900 (2) | 950 (5) | 633.33 (8) | 475 | 380 | 316.67 | 271.43 | 237.5 | 211.11 |
Part/Col B | 1350 (3) | 675 (7) | 450 | 337.5 | 270 | 225 | 192.86 | 168.75 | 150 |
Part/Col C | 550 | 275 | 183.33 | 137.5 | 110 | 91.67 | 78.57 | 68.75 | 61.11 |
Part/Col D | 2250 (1) | 1125 (4) | 750 (6) | 562.5 (9) | 450 | 375 | 321.43 | 281.25 | 250 |
Entre parênteses ao lado de cada valor calculado encontra-se o número da cadeira conquistada, em ranking. As cadeiras conquistadas encontram-se em negrito. Note que o número de cadeiras conquistadas em cada partido é idêntico ao valor encontrado pelo método brasileiro.
Exemplo II
[editar | editar código-fonte]Outro exemplo do cálculo segundo o método D'Hondt utilizado em Portugal, focando-se no fato de não haver ponto de corte, onde há quatro chapas pleiteando apenas três mandatos:
Divisores / Partidos |
1 | 2 | 3 | % |
---|---|---|---|---|
Part/Col A | 5500 (1) | 2750 (3) | 1833,3... | 55% |
Part/Col B | 3000 (2) | 1500 | 1000 | 30% |
Part/Col C | 1000 | 500 | 333,3... | 10% |
Part/Col D | 500 | 250 | 166,6... | 5% |
Entre parênteses ao lado de cada valor calculado encontra-se o número da cadeira conquistada, em ranking. As cadeiras conquistadas encontram-se em negrito. Note que apesar de a segunda chapa mais votada não haver alcançado o que no Brasil equivaleria ao quociente eleitoral (33,3...%, no caso), conquistou uma das cadeiras em disputa porque alcançou um quociente superior à primeira na disputa pela segunda vaga. A mesma esquematização no Brasil creditaria todos os mandatos à Part/Col A por ser a única a atingir o quociente.
Comparação com os sistemas de d'Hondt e Jefferson
[editar | editar código-fonte]O sistema brasileiro, apesar de equivalente aos métodos de Jefferson e d'Hondt, é na verdade uma mistura de ambos. A primeira etapa do cálculo, onde calculamos os quocientes eleitoral e partidários, corresponde ao cálculo do divisor padrão e das quotas inferiores no método de Jefferson. Entretanto, ao invés de tentar o ajuste das quotas por tentativa e erro conforme se faz em Jefferson, o sistema brasileiro redistribui as chamadas "sobras" segundo o método d'Hondt, calculando-se divisores sucessivos nas chamadas "médias". Dessa forma o sistema brasileiro reduz o cálculo de d'Hondt apenas às posições da tabela estritamente necessárias, reduzindo o número de cálculos total a serem efetuados (ao custo de maior complexidade no método, dificultando sua compreensão). A equivalência entre d'Hondt e o método brasileiro pode ser vista na tabela abaixo onde aplicamos o método d'Hondt aos coeficientes partidários:
Divisores / Partidos |
1 | 2 | 3 | 4 | 5 | 6 | 7 | 8 | 9 |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Part/Col A | 2.83 | 1.41 | 0.94 | 0.71 | 0.57 | 0.47 | 0.4 | 0.35 | 0.31 |
Part/Col B | 2.01 | 1 | 0.67 | 0.5 | 0.4 | 0.33 | 0.29 | 0.25 | 0.22 |
Part/Col C | 0.85 | 0.43 | 0.28 | 0.21 | 0.17 | 0.14 | 0.12 | 0.11 | 0.09 |
Part/Col D | 3.31 | 1.66 | 1.10 | 0.83 | 0.66 | 0.55 | 0.47 | 0.41 | 0.37 |
Em vermelho temos as cadeiras escolhidas pelo quociente partidário, e em verde as escolhidas pela divisão de sobras. As vagas distribuídas pelo coeficiente partidário possuem valor na tabela maior ou igual a 1, e correspondem as 7 primeiras vagas distribuídas no método de d'Hondt. As duas vagas seguintes, distribuídas segundo o método das sobras, correspondem as duas últimas vagas no método d'Hondt. Mesmo com o Partido/Coligação C possuindo um índice maior que a quarta vaga do Partido/Coligação D, pelo sistema brasileiro ele não tem direito a vaga por não ter obtido nenhum índice igual ou maior que 1.
Referências
[editar | editar código-fonte]- ↑ Glossário - Termos iniciados com a letra Q — Tribunal Superior Eleitoral. [1]. Último acesso: 8 de julho de 2013.
- ↑ Glossário - Termos iniciados com a letra Q — Tribunal Superior Eleitoral [2]. Último acesso: 8 de julho de 2013.
- ↑ a b «Cópia arquivada». Consultado em 11 de setembro de 2010. Arquivado do original em 24 de setembro de 2010
- ↑ «Glossário - Termos iniciados com a letra M»
- ↑ «Puxadores de votos ajudam a eleger colegas»
- ↑ Glossário - Termos iniciados com a letra Q — Tribunal Superior Eleitoral [3]. Último acesso: 15 de julho de 2017.
- ↑ «Lei prevê novas regras para 'sobras' nas eleições de deputados e vereadores». Senado Federal. Consultado em 14 de julho de 2022
- ↑ http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2017/Lei/L13488.htm