Setenta e Quatro (jornal digital)
Setenta e Quatro | |
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Periodicidade | Semanal |
Sede | Rua de Xabregas, nº2, 2º andar, sala 12, 1900-440 Lisboa |
País | Portugal |
Presidente | Carmo Afonso |
Proprietário | Continuar para Começar - Associação Cívica |
Director | Ricardo Cabral Fernandes |
Conselho de redação | Filipe Teles, Isabel Lindim, Ana Patrícia Silva e João Biscaia |
Idioma | Português |
Término de publicação | 2024 |
Página oficial | setentaequatro.pt |
O Setenta e Quatro foi um jornal digital dedicado ao jornalismo de investigação que atua na "garantia dos valores democráticos e progressistas". Lançado em julho de 2021, manteve a sua sua redação em Lisboa, Portugal,[1] até encerrar em março de 2024.
História
[editar | editar código-fonte]O Setenta e Quatro foi lançado a 13 de julho de 2021 no espaço cultural Casa do Capitão,[2] em Lisboa. O jornal assumia-se como um "projeto de informação digital que atua na garantia dos valores democráticos e progressistas",[3] acreditando que "o jornalismo de investigação é um pilar fundamental para a realização de uma sociedade democrática".
O Setenta e Quatro publicava online, mantendo os artigos de acesso livre por defender que "o jornalismo é um serviço público" e que a "informação é um direito", cujo acesso "promove o exercício democrático e fortalece a opinião pública". O jornal publicou edições semanais,[4] nas quais se podem ler entrevistas, artigos longos e aprofundados, ensaios, crónicas e investigações (nove, no total).
A redação inicial era composta por Ricardo Cabral Fernandes (diretor), Filipe Teles, Isabel Lindim e Joana Ramiro. A partir de dezembro de 2021, juntaram-se mais dois jornalistas: Ana Patrícia Silva e João Biscaia. O jornal contou ainda com um grupo de cronistas: Diogo Faro,[5] Teresa Coutinho,[6] Pedro Coelho,[7] Guilherme Trindade,[8] Filipe Vargas[9] e Paula Cardoso.[10] Os cronistas do blogue Ladrões de Bicicletas (João Rodrigues, José Gusmão, Nuno Serra, Vera Ferreira, Vicente Ferreira) também colaboraram com crónicas semanais.
A primeira grande investigação, Licença para odiar: como nasce uma filial dos Proud Boys em Portugal,[11] publicada aquando do lançamento do jornal, partiu da infiltração de um jornalista no grupo de extrema-direita Proud Boys Portugal. No lançamento da publicação, o Setenta e Quatro disponibilizou também um wiki que mapeia a extrema-direita portuguesa de 1974 a 2021.[12]
Em colaboração com a SIC,[13] o Setenta e Quatro publicou ainda em 2021 a segunda grande investigação, Testa de Ferro.[14] Neste trabalho sobre a relação de Luís Filipe Vieira com o Banco Espírito Santo (BES) e o Novo Banco, o jornal digital publicou dez reportagens, percorreu Portugal e foi ainda ao Brasil atrás dos negócios do ex-presidente do Sport Lisboa e Benfica.
Destacam-se outras investigações sobre práticas de conversão de orientação sexual, premiada pela publicação Dezanove,[15] e sobre a violência obstétrica em Portugal.[16] Mais recentemente, em outubro de 2022, o Setenta e Quatro publicou a série de investigação Anatomia de um Homicídio,[17] sobre o assassinato do militante do Partido Socialista Revolucionário José Carvalho por skinheads de extrema-direita a 28 de outubro de 1989.
Em novembro de 2022, o jornal publicou a investigação Polícias sem lei,[18] sobre a violência, racismo e discurso de ódio de elementos das forças de segurança, nomeadamente da PSP e da GNR, integrada no primeiro consórcio de jornalistas de investigação portugueses.[19] Na sequência da publicação da investigação, o Ministério Público abriu um inquérito[20] sobre as mensagens reveladas. O Ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, a Ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes, a Inspetora-Geral da Administração Interna, Anabela Ferreira, o Comandante-Geral da GNR, José Santos Correia, e o Diretor-nacional da PSP, Magina da Silva, foram inquiridos no Parlamento[21] português por causa das revelações da investigação. Dedicou-se durante 2023 a investigar a violência sexual em instituições de saúde, numa série de reportagens apoiadas pelo Pulitzer Centre[22], e as ligações entre figuras políticas e o banqueiro Ricardo Salgado[23].
Parcerias
[editar | editar código-fonte]Um dos pilares editoriais do Setenta e Quatro foi a colaboração com outros jornalistas e órgãos de comunicação social, recusando a lógica da concorrência, para "fortalecer o jornalismo de investigação".[24] O jornal digital disse querer colaborar[25] com organizações da sociedade civil que partilhavam do seu quadro de valores.
A primeira parceria foi estabelecida com a SIC, resultando na investigação Testa de Ferro,[26] assinada por Filipe Teles e pelo jornalista da Grande Reportagem SIC Pedro Coelho.[27]
Em janeiro de 2022, o Setenta e Quatro estabeleceu uma parceria com o coletivo universitário Repórteres Em Construção (REC)[28] criado em 2018. As edições semanais do jornal digital passaram a contar com testemunhos de jornalistas recolhidos no Manual da Reportagem do REC, organizado por Pedro Coelho, Ana Isabel Reis e Luís Bonixe. Em abril de 2022, o jornal digital firmou uma parceria com o blogue Ladrões de Bicicletas,[29] um "espaço de opinião de esquerda, socialista" composto por economistas portugueses. A parceria com o Setenta e Quatro materializou-se em crónicas semanais no espaço do jornal digital.
Os jornalistas Filipe Teles e Ricardo Cabral Fernandes foram cofundadores do primeiro consórcio de jornalistas de investigação, O Consórcio - Rede de Jornalistas de Investigação,[30] onde também se incluíam jornalistas da SIC, do Investigate Europe, do Fumaça e freelancers, além de académicos e advogados. O consórcio pretendeu promover pontes com a Academia, integrando académicos e alunos de jornalismo, para fortalecer a prática jornalística em Portugal.
O jornal fechou em março de 2024, após perto de três anos em atividade, "por razões exclusivamente financeiras". Num comunicado conjunto, os quatro redatores do Setenta e Quatro assumiram que a publicação tinha dificuldades há vários meses, apesar das doações de mais de dois mil leitores, culpando a falta de mecenato e de financiamento público do jornalismo em Portugal pela falta de opções para sustentar o órgão[31].
Financiamento
[editar | editar código-fonte]O Setenta e Quatro era detido pela associação sem fins lucrativos Continuar para Começar - Associação Cívica, presidida pela advogada Carmo Afonso. O jornal afirmou-se como "independente de organizações partidárias, sindicais, desportivas, religiosas, económicas e financeiras",[32] assentando num modelo de financiamento através de bolsas de investigação, publicidade e subscrições, oferecendo cinco modalidades diferentes.[33]
Em julho de 2021, a ex-candidata à Presidência da República Ana Gomes doou o excedente da sua campanha (31 mil euros) ao Setenta e Quatro.[34] A antiga diplomata justificou a sua doação com o facto de considerar que o jornalismo de investigação é uma "ferramenta indispensável no combate pelos valores fundamentais da democracia e dos direitos humanos".
Em outubro de 2021, o jornal digital lançou a campanha crowdfunding[35] "Para lá do blá-blá-blá" para enviar as jornalistas Isabel Lindim e Joana Ramiro à 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP26), em Glasgow, na Escócia. A campanha arrecadou 4.040 euros.[36] Uma nova campanha, em outubro de 2023, reuniu mais 18 mil euros para evitar o fecho da redação[37].
Referências
- ↑ TSF (13 julho 2021). «Artigo jornal». TSF. Consultado em 12 dezembro de 2022
- ↑ Observador (10 julho 2021). «Novo jornal digital Setenta e Quatro, dedicado à investigação, quer contribuir para reforço da democracia». Observador. Consultado em 12 dezembro 2022
- ↑ Setenta e Quatro (13 julho 2021). «Quem somos». Setenta e Quatro. Consultado em 12 dezembro 2022
- ↑ Setenta e Quatro (19 outubro 2021). «Setenta e Quatro passa a lançar edições semanais». Setenta e Quatro. Consultado em 12 dezembro 2022
- ↑ Faro, Diogo (13 julho 2021). «Diogo Faro». Setenta e Quatro. Consultado em 12 dezembro 2022
- ↑ Coutinho, Teresa (19 novembro 2021). «Teresa Coutinho». Setenta e Quatro. Consultado em 12 dezembro 2022
- ↑ Coelho, Pedro (4 fevereiro 2022). «Pedro Coelho». Setenta e Quatro. Consultado em 12 dezembro 2022
- ↑ Trindade, Guilherme (5 novembro 2021). «Guilherme Trindade». Setenta e Quatro. Consultado em 11 dezembro 2022
- ↑ Vargas, Filipe (3 março 2022). «Filipe Vargas». Setenta e Quatro. Consultado em 11 dezembro 2022
- ↑ Cardoso, Paula (13 julho 2021). «Paula Cardoso». Setenta e Quatro. Consultado em 11 dezembro 2022
- ↑ Cabral Fernandes, Ricardo (13 julho 2021). «Licença para odiar: como nasce uma filial dos Proud Boys em Portugal». Setenta e Quatro. Consultado em 10 dezembro 2022
- ↑ Wiki (13 julho 2021). «Wiki da extrema-direita». Setenta e Quatro. Consultado em 9 dezembro 2022
- ↑ Coelho, Pedro (14 novembro 2021). «A história de um empresário que tentou influenciar autarcas e poderes públicos». SIC Notícias. Consultado em 14 dezembro 2022
- ↑ Teles, Filipe (20 abril 2022). «Testa de Ferro». Setenta e Quatro. Consultado em 14 dezembro 2022
- ↑ Dezanove (30 dezembro 2021). «Prémios dezanove: os melhores de 2021». Dezanove. Consultado em 5 dezembro 2022
- ↑ Lindim e Silva, Isabel e Ana Patrícia (24 março 2022). «Acabar com o silência e com a culpa: relatos de violência obstétrica». Setenta e Quatro. Consultado em 4 dezembro 2022
- ↑ Cabral Fernandes e Biscaia, Ricardo e João (20 outubro 2022). «Anatomia de um Homicídio». Setenta e Quatro. Consultado em 2 dezembro 2022
- ↑ Teles, Filipe (16 novembro 2022). «Polícias sem lei: zero à direita». Setenta e Quatro. Consultado em 1 dezembro 2022
- ↑ O Consórcio - Rede de Jornalistas de Investigação (16 novembro 2022). «O Consórcio - Rede de Jornalistas de Investigaçaõ». O Consórcio - Rede de Jornalistas de Investigação. Consultado em 7 dezembro 2022
- ↑ Público e Lusa (17 novembro 2022). «MP abre inquérito a mensagens de ódio de agentes da PSP e da GNR nas redes sociasi». PÚBLICO. Consultado em 6 dezembro 2022
- ↑ Lusa (30 novembro 2022). «Mensagens de ódio na polícia levam dois ministros e três dirigentes ao Parlamento». PÚBLICO. Consultado em 3 dezembro 2022
- ↑ «Paredes frágeis em lugares de dor: a violência sexual em hospitais e consultórios». setentaequatro.pt. Consultado em 28 de março de 2024
- ↑ «Encontrámos 156 políticos na agenda de Ricardo Salgado». setentaequatro.pt. Consultado em 28 de março de 2024
- ↑ Ramos de Almeida, Nuno (28 julho 2021). «"A extrema-direita violenta está num campo político que está a ganhar influência"». Contacto. Consultado em 3 dezembro 2022
- ↑ Gerador (20 julho 2021). «Setenta e Quatro: o novo projeto de jornalismo de investigação que quer reforçar a democracia». Gerador. Consultado em 2 dezembro 2022
- ↑ Teles, Filipe (17 novembro 2021). «Testa de Ferro: um império imobiliário que deixou uma torre de dívida». Setenta e Quatro. Consultado em 3 dezembro 2022
- ↑ Coelho, Pedro (14 novembro 2021). «A história de um empresário que tentou influenciar autarcas e poderes públicos». SIC Notícias. Consultado em 4 dezembro 2022
- ↑ Ramiro, Joana (7 janeiro 2022). «Setenta e Quatro estabelece parceria com o coletivo Repórteres em Construção». Setenta e Quatro. Consultado em 5 dezembro 2022
- ↑ Ramos de Almeida, João (7 abril 2022). «O pântano e a fogueira». Setenta e Quatro. Consultado em 7 dezembro 2022
- ↑ JN/Agências (14 novembro 2022). «Consórcio português de jornalismo de investigação lançado na quarta-feira». Jornal de Notícias. Consultado em 7 dezembro 2022
- ↑ «O Setenta e Quatro fica-se por aqui». Setenta e Quatro. Consultado em 28 de março de 2024
- ↑ Setenta e Quatro (13 julho 2021). «Quem somos». Setenta e Quatro. Consultado em 9 dezembro 2022
- ↑ Setenta e Quatro (13 julho 2021). «Contribuir». Setenta e Quatro. Consultado em 8 dezembro 2022
- ↑ Lusa (30 julho 2021). «Ana Gomes doa 31 mil euros que sobraram das presidenciais para promover jornalismo independente». Observador. Consultado em 6 dezembro 2022
- ↑ Cabral Fernandes, Ricardo (4 outubro 2021). «Setenta e Quatro lança crowdfunding para cobrir a COP26 em Glasgow». Setenta e Quatro. Consultado em 7 dezembro 2022
- ↑ Setenta e Quatro (23 dezembro 2021). «Anúncio verbas recolhidas». Twitter. Consultado em 12 dezembro 2022
- ↑ «O crowdfunding chegou ao fim. Muito, muito obrigado por todo o apoio». Setenta e Quatro. Consultado em 28 de março de 2024