Usuário(a):Luis Diniz

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

Sou professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Paraná - UFPR, sendo que maiores informações sobre o meu trabalho podem ser obtidas na Plataforma Lattes, do CNPq.

Mas por que me tornei editor da Wikipédia? Bem, geógrafos e educadores brasileiros afirmam que não existe neutralidade ou objetividade científica, pois todo discurso é ideológico. Todavia, a Wikipédia nasceu tendo o princípio da imparcialidade como um dos seus fundamentos essenciais! Será que a neutralidade dos conteúdos da Wikipédia é ilusória ou os geógrafos e educadores é que estão errados ao supor que não é possível produzir conhecimento com base nesse princípio?

Bem, eu defendo que, nas ciências sociais, a neutralidade ou objetividade científica não pode ser assegurada de forma absoluta pelo emprego de um determinado método, o que implica dizer que os trabalhos de pesquisa e ensino precisam ser sempre avaliados quanto à sua real capacidade de atender a esses princípios. Mas não é porque a neutralidade e objetividade são sempre passíveis de discussão que os pesquisadores e professores podem dar de ombros e dizer que, sendo assim, o negócio é cada um vender o seu peixe e pronto! A neutralidade e a objetividade precisam fazer parte dos trabalhos de pesquisa e ensino como um compromisso indeclinável que os cientistas e professores assumem com seus leitores e alunos. Afinal, sem o compromisso com a neutralidade, a pesquisa e o ensino tornam-se inúteis, pois já existem os militantes de partidos, sindicatos e ONGs para defender causas sociais, políticas ou ambientais. Pesquisadores só prestam uma contribuição original aos debates públicos quando produzem conhecimentos com o uso de métodos que procuram fazer com que as conclusões de suas pesquisas independam, tanto quanto possível, dos valores e convicções apriorísticas do próprio cientista. Do mesmo modo, o ensino só é capaz de desenvolver a autonomia de pensamento do aluno na medida em que procura mostrar a ele diferentes visões da realidade social e oferecer-lhe ferramentas intelectuais para julgá-las por si mesmo.

Nesse sentido, eu estou com a Wikipédia: precisamos produzir e ensinar conhecimento mantendo um compromisso com a neutralidade ou imparcialidade. E isso, obviamente, não implica abrir mão de criticar esta ou aquela teoria, nem de propor alternativas teóricas mais eficazes para explicar a realidade. Qualquer teoria pode ser refutada com honestidade se os métodos utilizados forem pautados pela busca de coerência lógica e empírica, não pela defesa das convicções ideológicas e valores do cientista. Trata-se apenas de dizer que há espaços e momentos certos para o debate teórico-metodológico, como também há os espaços e momentos apropriados para transmitir conhecimentos sem assumir a defesa desta ou daquela perspectiva teórico-metodológica.

A Wikipédia é um dos espaços em que procurei fazer valer o princípio da neutralidade, mas confesso que me decepcionei. a Wikipédia lusófona se tornou alvo da estratégia petista de aparelhamento da internet, na medida em que certos colaboradores da "enciclopédia livre" usam a regra de escrever artigos referenciados em fontes fiáveis para reproduzir mentiras e até difamar adversários do partido.

Eu sou um dos muitos editores da Wikipédia, e já dei contribuições a vários verbetes que tratam de geografia, como Território, Região e Friedrich Ratzel. Duas dessas contribuições mostram que, ao contrário do que dizem marxistas, freirianos e esquerdistas em geral, é perfeitamente possível ser fiel ao princípio da imparcialidade.

Quando li o verbete História do Pensamento Geográfico, constatei que, além de muito mal escrito e com poucas fontes, o texto fazia interpretações totalmente centradas nas visões da geocrítica. Daí que todos os geógrafos anteriores a essa corrente são classificados como "positivistas" (sic), e a geocrítica aparece como a única corrente, digamos, "verdadeira". Os problemas eram tantos que o melhor seria apagar quase tudo e reescrever o texto. Mas considerei que esse não era o melhor caminho, em se tratando de uma obra coletiva. Fui à página de Discussão do verbete e apresentei uma série de críticas, devidamente referenciadas por fontes. A discussão não foi adiante porque ninguém se interessou, então o verbete continuou como estava, mas com os meus questionamentos disponíveis para qualquer um ler.

Já quando li o verbete Milton Santos, achei-o razoavelmente bom. Mas um problema do texto é que ele trazia muitas informações que não estavam referenciadas por fontes, e outros editores já haviam indicado isso. Ora, as coisas que já escrevi sobre esse autor no livro Por uma crítica da geografia crítica (Editora da UEPG, 2013), mostram que meu pensamento é totalmente avesso ao dele. Mas não expus nenhuma crítica às ideias de Milton Santos na Wikipédia. Tudo o que fiz foi colocar as referências bibliográficas que corroboravam os resumos das ideias dele apresentados no verbete, melhorando a qualidade do texto.

Como sou geógrafo, todas as minhas contribuições foram em verbetes dessa área de conhecimento. Nunca escrevi sobre política aqui, por exemplo. Mas percebi o aparelhamento da Wikipédia ao ler alguns verbetes e páginas de discussão sobre esse assunto, nas quais ficava bem nítido que certos editores estavam lá para divulgar mentiras úteis ao projeto de poder do PT, e citavam textos de jornalistas chapa branca, como Paulo Henrique Amorim, como "fontes fiáveis" para justificar o que tinham publicado. Mais tarde, quando publicaram um verbete para tratar dos atos de vandalismo que espocaram em 06 de junho de 2013, a partir da manifestação fascistoide convocada pelo Movimento Passe Livre, explicitou-se que os editores escreviam como se a Wikipédia fosse um fórum de debate, muito embora um dos seus princípios seja justamente a proibição de edições que se destinem a convencer os leitores sobre qual lado está com a razão.

É certo que a Wikipédia tem mecanismos para tentar evitar esse tipo de problema. Todavia, o uso da Wikipédia para fazer difamações contra Gilmar Mendes (ministro do STF que cumpriu um papel chave para que os "mensaleiros" fossem a julgamento) atestou que esses mecanismos são insuficientes. Por volta da época em que Lula ensaiou chantagear Mendes para influir no julgamento, o verbete sobre esse ministro foi contaminado por difamações. Ele reclamou, é óbvio, mas o responsável por evitar essa clara violação dos pilares que deveriam reger a Wikipédia simplesmente não o atendeu. Pior ainda, essa pessoa excluiu da biografia de Mendes as passagens que lhe eram favoráveis e preservou aquelas que prejudicavam sua imagem (Cf.: Vejam quem é um dos Diderots da Wikipedia no Brasil! Ou: Nessa enciclopédia, Tiririca será professor!).

Além disso, há um sério calcanhar de aquiles na Wikipédia (tanto no Brasil quanto internacionalmente) que diz respeito aos incentivos que motivam os editores de seus verbetes. Mas isso é assunto para outra hora. Por enquanto, encerro com duas conclusões. A primeira é que a imparcialidade é um princípio necessário e ao alcance de todo aquele que o tiver como um norte na elaboração e divulgação de conhecimento, como se vê pelos exemplos citados acima. A segunda é que minha experiência como leitor e editor da Wikipédia me levou a rever a opinião que tinha inicialmente sobre o projeto de uma enciclopédia livre. Hoje, considero que é melhor uma enciclopédia profissional, como a Britânica, que produz informação com fins comerciais e usa um sistema de curadoria para zelar pela credibilidade e qualidade das informações. 

Em função de tudo isso, parei de editar na Wikipédia. Enciclopédia livre só é melhor para fãs que querem se manter atualizados sobre seriados de TV...