Usuário:Yleite/Reconhecimento de parentes

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Um indivíduo se comporta de modo diferente para com outros com quem tenha diferentes graus de parentesco. A capacidade de reconhecimento de parentes parece ser favorecida pela seleção natural. E muitos estudos mostram que os indivíduos são capazes de distinguir parentes próximos de parentes distantes.


Sobre Egoísmo e Altruísmo[editar | editar código-fonte]

Segundo Richard Dawkins,[1] a seleção natural modela os indivíduos para seus próprios interesses egoístas, e não para o bem da espécie ou do grupo em que vivem, desta forma contrariando as ideias de seleção de grupo. Porém é óbvio para qualquer observador da natureza que os animais não se comportam de modo egoísta o tempo todo. Frequentemente os indivíduos parecem cooperar com outros. Por exemplo, vários leões podem cooperar na caçada de presas; em muitas espécies de aves e mamíferos os indivíduos dão gritos de alarme para alertar sobre a aproximação do predador; as vezes um individuo deixa de ter seus próprios filhotes para ajudar os outros a se reproduzir como no caso das abelhas.


Então, como pode ser justificada a evolução do comportamento cooperativo em termos de vantagens para o indivíduo? Como explicar a evolução do altruísmo? Na verdade, a seleção natural favorece os indivíduos que maximizam sua contribuição genética para gerações futuras, tendo uma visão da evolução centrada nos genes. A reprodução pessoal contribui para este objetivo final de maneira direta, mas ajudar indivíduos geneticamente similares que sobrevivem para se reproduzir pode ser uma rota indireta para o mesmo fim. Isso é mais bem explicado com o exemplo do comportamento de cuidado parental, que é altruístico.

Em muitas espécies de aves pais dos dois sexos trabalham de modo incansável para trazer alimento para uma ninhada completamente indefesa na segurança relativa de um ninho escondido. Se a habilidade de reconhecer a prole genética for vantajosa de modo a evitar o risco de direcionar cuidado parental de forma errada, então podemos esperar uma convergência evolutiva do reconhecimento entre pais e filhos.

Animais parentais conseguem identificar sua progênie genética? Na espécie de morcego da família Molossidae, Tadarida brasiliensis, fêmeas grávidas formam colônias de milhares de indivíduos. Após dar a luz a um único filhote, uma mãe morcego deixa seu prole pendurada no teto da caverna em uma creche que pode conter quatro mil filhotes por metro quadrado. Quando a fêmea retorna para cuidar de seu filhote, ela voa para o ponto no qual viu seu filhote pela última vez e é prontamente assediada por uma horda de filhotes de morcegos famintos. Devido aos aglomerados de filhotes, os primeiros observadores acreditavam que as mães eram incapazes de identificar sua prole e em vez disso tinham que oferecer leite para quem chegasse primeiro. Para investigar melhor, Gary McCracken[2] capturou fêmeas de morcego e os filhotes que mamavam nelas e fez um teste de maternidade. Os dados indicaram que as fêmeas cuidavam dos seus próprios filhotes pelo menos 80 por cento das vezes. Quase sempre reconhecendo por meio de sinais vocais e olfativos.

Ou seja, não importa qual dos sexos ofereça o cuidado parental, um adaptacionista não esperaria que os pais fornecessem assistência livremente a filhotes que não fossem seus próprios.

Coeficiente de Parentesco[editar | editar código-fonte]

Coeficiente de parentesco se refere a probabilidade em que um alelo em um indivíduo esteja presente em outro, pois ambos os indivíduos herdaram de um ancestral comum recente.

Na reprodução sexuada, dois indivíduos deixam suas contribuições genéticas para as futuras gerações por meio de descendentes. Os jovens possuem cópias dos genes dos pais. Em espécies diploides quando um óvulo e um espermatozoide se fundem para formar o zigoto, cada pai contribui exatamente com 50 por cento de seus genes para o filhote. Desta forma, a probabilidade de um pai e seu filhote compartilharem uma cópia idêntica por descendência é de 0,5. Esse é o valor chamado de coeficiente de parentesco (r).

O calculo não é feito somente com pais e filhos, podemos calcular o coeficiente de parentesco entre irmãos e irmãs (r=0,5), primos (r=0,125), tios e sobrinhos (r=0,25) e assim por diante. Indivíduos não aparentados apresentam coeficiente de parentesco igual a zero. Irmãos idênticos apresentam parentesco igual a um. Assim como quando comparamos o parentesco de uma pessoa com ela mesma, o coeficiente será igual a um. Em outras palavras, você apresenta 100% dos seus genes compartilhados com você mesmo.

Assim como através do cuidado parental, também através do cuidado com irmãos e irmãs, primos e outros parentes os organismo conseguem proliferar genes. Assim é possível explicar a existência do comportamento altruísta, tendo em vista que a seleção natural favorece aqueles organismos que proliferam o maior número de cópias do seu material genético para as futuras gerações. Não há nenhuma diferença entre copias de genes produzidos ajudando-se ao filhote ou a irmãos (o coeficiente de parentesco é igual em ambos os casos).[3]

Por exemplo, os tatus-galinhas nascem em ninhadas de quadrigêmeos idênticos, e não é observado nenhum ato heroico de auto-sacrifício em tatus jovens, entretanto tem-se apontado que algum grau de altruísmo bem marcado entre eles seria definitivamente esperado. O requisito mínimo para que um gene altruísta suicida fosse bem-sucedido seria que ele salvasse mais de dois irmãos (ou filhos, ou pais), ou mais de quatro meios-irmãos (ou tios, tias, sobrinhos e sobrinhas, avós ou netos) ou mais de oito primos de primeiro grau e assim por diante. Um tal gene, em média, tenderá a continuar vivendo nos corpos de um número suficiente de indivíduos salvos pelo altruísta para compensar a morte deste último. Além do grau de parentesco, um gene suicida deve levar em consideração custo benefício, ou seja, “é um bom investimento?” Levando em consideração a expectativa de vida, o vigor reprodutivo dos indivíduos salvos.[1]

Seleção de Parentesco ou Seleção Indireta[editar | editar código-fonte]

O ponto principal é que não há nada de particularmente especial quando vemos uma ave cuidando do seu irmão ou irmã mais novos, isso foi favorecido pela seleção natural. O termo seleção de parentesco foi definido primeiramente por Maynard Smith para incluir os efeitos evolutivos tanto da ajuda dada pelos progenitores aos seus parentes descendentes como do altruísmo direcionado aos parentes não descendentes. A seleção de parentesco responde pelo altruísmo dentro da família; quanto maior o grau de parentesco, mais forte a seleção.

O cuidado parental é apenas um caso especial do altruísmo de seleção de parentesco. Geneticamente falando, um adulto deveria dedicar tanto cuidado e atenção aos seus irmãos pequenos e órfãos (seleção indireta) quanto dedica a um dos próprios filhos (seleção direta), o grau de parentesco é exatamente o mesmo.

A Importância do Parentesco[editar | editar código-fonte]

É de se esperar que indivíduos aparentados geralmente apresentem comportamentos altruísticos uns com os outros. E que o oposto também ocorra, indivíduos não aparentados apresentem comportamentos extremos de egoísmo.

Parentes próximos, membros da mesma família, tem maior probabilidade do que a média de compartilhar genes. Se um indivíduo morre para salvar dez parentes próximos, uma cópia do gene de altruísmo familiar poderá perder-se, mas um número maior de cópias do mesmo gene será salvo.

Por exemplo, a descoberta de um número imenso de colônias de formigas-argentinas, que cobrem grandes porções da Califórnia e interagem de forma pacífica, gerou a previsão de que essas colônias seriam geneticamente muito similares, e de fato elas são. Provavelmente porque as numerosas formigas pertencem a mesma super colônia e sejam todas descendentes de uma população que sofreu severa perda de diversidade genética no passado. Mas há muitos lugares onde membros de duas super colônias diferentes têm contato e, como previsto, atacam com ferocidade umas ás outras. [4]

Como os Indivíduos Reconhecem os Parentes?[editar | editar código-fonte]

Se um gene conferisse ao seu portador a capacidade de reconhecer seus parentes e a tendência a ser gentil com os mesmos, este gene seria favorecido pela seleção natural.

Expressão de Características Fenotípicas[editar | editar código-fonte]

Conhecida também como Teoria da Barba Verde, é uma teoria proposta por Hamilton onde diz que existem genes que podem identificar a presença de cópias se si mesmo em outros organismos. Fazem isso através de expressão fenotípica de uma determinada característica. Desta forma, os animais que conseguem se reconhecer a partir de uma característica fenotípica teria maior sucesso evolutivo. Teoricamente poderia surgir um gene capaz de conferir uma “etiqueta” visível externamente, por exemplo, uma pele pálida uma barba verde ou algum outro traço saliente, e também a tendência de ser particularmente amável com os portadores desta mesma etiqueta. Uma etiqueta arbitrária como uma barba verde é apenas uma maneira pela qual um “gene” pode reconhecer cópias de si mesmo em outros indivíduos.

Estampagem ou Imprinting[editar | editar código-fonte]

Outro mecanismo de reconhecimento de parentes é o da estampagem (em inglês imprinting) proposto por Konrad Lorenz. Ele realizou seus estudos com base na convicção de que o comportamento de um animal, do mesmo modo que suas adaptações físicas fazia parte de seu equipamento para sobrevivência e era produto da evolução adaptativa. O comportamento animal se desenvolve como resultado da interação de influências genéticas e ambientais. Alguns comportamentos tem determinantes mais genéticos (inatos).Este é um fenômeno exibido por vários animais jovens principalmente pássaros, tais como patinhos e pintinhos. Quando saem dos seus ovos, eles seguirão o primeiro objeto em movimento que eles encontrarem no ambiente (o qual pode ser a sua mãe pata ou galinha, mas não necessariamente). Ocorre então uma ligação social entre o filhote e este objeto ou organismo.

Entre muitas verdades básicas mostradas pelas suas experiências, estavam processos de aprendizagem em que gansos jovens foram ensinados com êxito a aceitar Lorenz como “mãe”. Em seus experimentos Lorenz levava comida para a sua ninhada de gansos e estes animais passaram a reconhecê-lo como mãe. Isso revela o desenvolvimento inicial do comportamento instintivo. Até mesmo, Lorenz incentivava-os a nadar com sons que imitavam efetivamente a “linguagem” dos gansos. É chamada de estampagem, pois os animais literalmente estampam uma figura materna, ou seja, reconhecem como mãe aquele individuo que cuidou e conviveu junto.[5]

O ambiente natural, o imprinting comportamental atua como um instinto para a sobrevivência em recém nascidos. O filhote deve imediatamente reconhecer seus pais, por causa da probabilidade de ocorrerem eventos ameaçadores pouco depois do nascimento, tais como o ataque por um predador ou por outros adultos que poderiam ocorrer. Dessa forma, o imprinting é muito confiável para induzir a formação de uma forte ligação social entre o filhote e a mãe, mesmo que seja a mãe errada.

Esta é a única de muitas formas de imprinting que tem sido estudada, e é chamada de imprinting filial. Outra forma é o imprinting sexual, no qual as aves aprendem as caracteristícas de seus irmãos de ninhada, as quais posteriormente irão influênciar suas preferências sexuais como adultos. Em gansos cinzentos, o imprinting filial e sexual ocorrem quase simultaneamente, mas em outros animais existe um claro intervalo entre os dois processos.

Imprinting em mamíferos é um processo mais raro. Primatas são animais altriciais, ou seja, eles nascem em um estado "incompleto", com o cérebro ainda imaturo, e que levará muitos meses para se tornar completamente operacional, alerta e ativo com todos seus sentidos e ações. Assim, a mãe é a suprema protetora. A ligação mãe-filho acontece por outros processos que não o imprinting.

Regras Simples para o Reconhecimento de Parentes[editar | editar código-fonte]

Existem dois principais mecanismos, o primeiro é: “trate qualquer um em sua casa como seu parente”, e o segundo é: “trate qualquer um que cresceu junto com você como seu parente”.

Muitos pássaros que apresentam forte cuidado parental não reconhecem a própria ninhada quando esta, por algum motivo, sai do ninho. E agem de acordo com a regra: “cuide do que está no ninho, ignore o que está fora”. Essa regra representa um dilema evolutivo para essas aves, uma vez que os filhotes carregam a herança darwiniana de genes compartilhados. O reconhecimento dos avos e da prole seria uma vantagem evolutiva para essas aves. Mas esse tipo de comportamento pode ser explorado por pássaros parasitas de ninho como os cucus. Eles retiram os ovos dos ninhos de outras aves para colocar seus próprios ovos e esperar que cuidem do seu filhote. Como muitas aves não fazem esse tipo de distinção, espécies parasitas de ninho aproveitam esta oportunidade.

Um exemplo feito por Holmes e Sherman[6] mostra que o reconhecimento em esquilos está baseado em associações feitas entre os indivíduos no ninho onde eles nasceram. Estes pesquisadores capturaram fêmeas grávidas usaram seus filhotes para compor quatro grupos experimentais. Não irmãos criados juntos, não irmãos criados separados, irmãos criados juntos e irmãos criados separados. E observaram o número médio de encontros agonísticos (comportamento social relacionado a luta) entre os indivíduos quando foram colocados em arenas de combate. Os resultados mostraram que os animais que foram criados juntos independente do seu grau de parentesco genético raramente lutavam uns com os outros. Ou seja, tanto os irmãos como os não irmãos criados juntos obedeceram a regra do “trate qualquer um em sua casa como seu parente”. Os indivíduos aprendem quem são seus parentes por associações feitas no início da vida, como a estampagem proposta por Konrad Lorenz.

Entretanto, dos animais criados separadamente, ambos os grupos apresentaram altas taxas de comportamento de luta. Porém, aqueles que eram geneticamente irmãos demonstraram menos agressividade uns com os outros na arena de teste do que os irmãos que não tinha parentesco. É interessante notar que este comportamento somente ocorreu em fêmeas, pois este sexo é o que se comporta altruisticamente na natureza e apresenta evidencias de reconhecimento com quem tem relacionamento genético. Em outras palavras, irmãs criadas separadas eram menos agressivas do que não irmãs criadas separadas.

Um estudo genético mais detalhado feito posteriormente a este estudo destacou que em 78 por cento dos casos mais de um macho era responsável pela paternidade. E uma nova descoberta ainda mais excitante foi de que dos filhotes da mesma cria, as que eram irmãs completas (mesmo pai e mesma mãe) eram menos agressivas e mais cooperativas umas com as outras do que aquelas que eram apenas meio irmãs (mesma mãe e pais diferentes). Por exemplo, quando estão estabelecendo seus territórios, as irmãs completas lutaram e perseguiram umas as outras com menos frequência do que fizeram quando encontraram meio irmãs.

Filhas da mesma cria compartilham tanto a mesma toca, como o mesmo útero, sendo meio ou irmãs completas, logo outros mecanismos podem estar envolvidos. Um dos mecanismos que podem estar envolvidos é conhecido como “coincidência fenotípica”. Uma fêmea pode ser mais altruísta com companheiras da mesma cria que se parecem fenotipicamente a ela mesma, um exemplo disso não os odores similares. Concluindo, uma fêmea de esquilo americano parece categorizar as demais de duas formas. Primeiro ela reconhece e coopera com indivíduos com que compartilhou a toca, em oposição aqueles com quem não compartilhou; os primeiros são as irmãs completas ou meio irmãs. Segundo, ela pode ser particularmente cooperativa com as companheiras de toca que pareçam fenotipicamente com ela e que, por isso, tem mais chances de ser irmãs completas do que meio irmãs.

Referências

  1. a b Dawkins, R. O Gene Egoísta. Tradução de Rejane Rubino. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
  2. McCracken GF. Communical nursing in Mexican free-tailed bat maternity colonies. Science v. 223 p.1090-1091, 1984.
  3. Krebs JR. & Davies NB. Introdução a ecologia comportamental. Atheneu Editora, São Paulo, 1966.
  4. Alcock, J. Comportamento animal: uma abordagem evolutiva. 9.ed. Porto Alegre. Artmed, 2011.
  5. Tinbergen N. Comportamento animal. Editora S.A. 2 ed., Rio de Janeiro, 1981
  6. Holmes,WG & Sherman,PW. The ontogeny of kin recognition in two species of ground squirrels. Amer. Zool. v.22 p.491-517, 1982