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Reggae: diferenças entre revisões

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Revisão das 23h58min de 17 de novembro de 2004

Estilo musical origem jamaicana.

O local de origem do reggae é uma hoje famosa ilha caribenha, a terceira maior da região, com o tamanho equivalente à metade do território do estado de Sergipe no Brasil. Desde o século XVI até meados do século XX ela foi submetida às políticas exploratórias do sistema colonial. A população nativa, composta pelos índios arawak, chamava a ilha de Xaymaca – Terra das Primaveras –, e tal denominação foi a única herança que deles restou, transformada em Jamaica.

A ilha foi "descoberta" por Colombo em 1494 e ficou sob domínio espanhol até 1660, quando foi tomada por piratas ingleses como Harry Morgan, mais tarde feito governador da nova colônia. Relegada a ser mais um fornecedor de cana-de-açúcar e outras matérias-primas, a ilha foi, por 250 anos, um dos muitos destinos dos africanos tirados à força de suas terras para trabalhar nas plantações do Novo Mundo. A grande maioria veio da costa ocidental do continente negro, de etnias como a dos Ibos, Coromantee, Hausa, Mandingo, Nagô e Yorubá. Os dois últimos povos também foram a origem de grande parte da mão-de-obra escrava trazida para o Brasil.

As tradições destes povos foram preservadas na Jamaica atual em comunidades como a nação Bongo, no leste da ilha, e entre os maroons (antigos quilombos). São comunidades que se dedicam a práticas religiosas chamadas por lá de kumina ou pocomania, parecidas com as que temos nas crenças afro-brasileiras, como o candomblé. No entanto a influência puramente africana na Jamaica é mais remota porque lá o tráfico de escravos foi abolido mais cedo, em 1807, enquanto que as colônias espanholas do Caribe, como Cuba, continuaram a receber novos escravos até 1860. Mesmo assim a música que vinha de seus tambores teve uma influência direta sobre o reggae, como pode ser ouvido em canções como “Rastafari is”, de Peter Tosh, ou no canto tradicional “Rastaman Chant”, gravado pelos Wailers no álbum “Burning”. As canções tradicionais têm o formato de chamado-e-resposta, base de todos os estilos de música negra. A música popular européia, na forma das quadrilhas e canções trazidas pelos ingleses, também teve o seu papel na evolução musical jamaicana. A fusão desses estilos, que hoje são considerados como parte do folclore da ilha, gerou o mento, forma musical aparentada com o calipso que usa uma grande variedade de instrumentos, como o banjo, flautins e o violão, muitos deles artesanais como flautas e “saxofones” de bambu. Ainda hoje existem bandas de mento na ilha, a mais famosa delas é a Jolly Boys, que chegou inclusive a gravar um reggae com Lee Perry, a bela “Concious Man”.

A grande contribuição do mento foi impulsionar a criação da indústria fonográfica jamaicana, já que os primeiros discos lançados por lá foram desse estilo. No entanto naquela época, primeira metade dos anos 50, já estava acontecendo uma migração considerável da população do interior para as grandes cidades e o mento, associado com as durezas da vida no campo, não conseguiu manter seu lugar no entre os jamaicanos. A levada do mento continua viva no reggae, principalmente em artistas como Eric Donaldson, The Starlights (as pedradas tão apreciadas no Maranhão, Piauí, Pará e outros lugares) e os Maytones, e também nos ritmos da era digital, que já a reaproveitou algumas vezes.


Em Kingston ou Spanish Town o som que mais agradava no final dos anos 50 era o rhythm & blues americano, que reverberava nas ruas através dos sound-systems, então um simples toca-discos ligado a uma ou duas caixas de som, mas que tinha potência suficiente para colocar todos para dançar. As músicas gravadas então nos precários estúdios disponíveis tentavam imitar o estilo americano. Isso mudou em 1961 com o lançamento de “Oh Carolina”, uma tentativa do produtor e dj Prince Buster de misturar os sons com que havia tomado contato nos rituais rastafari com o vocal do blues, algo totalmente diferente do que se ouvira até então. O sucesso foi enorme e pela primeira vez na Jamaica os tambores afro ganharam o rádio (em 93 Shaggy fez uma versão ragga que estourou mundialmente). Era o início de um movimento de revalorização da identidade cultural da ilha, que chegaria ao auge em agosto do ano seguinte, quando ela conseguiu oficialmente se libertar da sua condição de colônia inglesa.

Ska Steve Barrow chamou o ska de “declaração de independência musical jamaicana” , um estilo que nasceu ligado ao período de grande entusiasmo e afirmação dos valores culturais locais. Ao mesmo tempo que os discos de rhythm & blues ficavam cada vez mais difíceis de se achar, a Jamaica fervilhava de talentos musicais. O novo ritmo começou a surgir espontaneamente e apesar de muitos disputarem o título de “pai” do ska, como Prince Buster, Clue J, Coxsonne Dodd e outros, ele foi na verdade uma criação coletiva, como costuma acontecer nesses casos.

O nome ska também é cercado de controvérsia. Alguns dizem que seria uma onomatopéia que imita a forma peculiar de tocar guitarra herdada pelo reggae (também chamada de tchaka-tchaka), enquanto outros juram que sua origem estaria na gíria das ruas, e seria uma abreviatura da interjeição de aprovação “skavoovie”. De qualquer modo, a levada vibrante do ska conquistou primeiro os guetos onde nasceu e logo seria aceita pelas platéias em toda a ilha. Inspirado nas big bands americanas, o ska se impôs como um estilo tocado por grandes conjuntos, com destaque para o naipe de sopros.

Os Skatalites eram a banda principal, cujo nome era uma homenagem aos satélites de comunicação que estavam começando a interligar o planeta. Composta pelos saxofonistas Tommy McCook (que era o líder de fato do grupo) e Roland Alphonso, o trombonista Don Drummond, o guitarrista Jah Jerry, o pianista Jackie Mitoo, o baixista Lloyd Brevett, o baterista Lloyd Knibbs e outros instrumentistas, era a banda de estúdio mais rodada de Kingston. Eles tocaram com os maiores talentos que emergiam na cena jamaicana, como Bob Marley, Peter Tosh, Lee Perry, Jimmy Cliff, Toots Hiberts and The Maytals (foto acima) e muitos outros. Outras bandas como as de Carlos Malcolm , Byron Lee e Baba Brooks também gravaram o ska. A banda percorreu toda a ilha e se apresentava sempre com grande sucesso. A delegação jamaicana que compareceu à Feira Mundial de Nova York de 1964 levou a banda de Byron Lee, diversos cantores e dançarinos de ska, institucionalizando pela primeira vez a música do gueto como representativa da cultura local.

O Ska começou a perder força quando Drummond matou sua namorada, a cantora Marguerita, e foi preso. Os Skatalites começaram a se desmantelar e fizeram a última apresentação desta primeira formacão em 1965. Além da queda de Drummond, algumas características da geografia e do contexto cultural jamaicano começaram a influenciar a evolução dos estilos musicais locais. Primeiro: o fato de ser um mercado pequeno (a ilha tinha na época um milhão e meio de habitantes), pobre e auto-centrado, com pouca ou nenhuma participação das gravadoras multinacionais no processo. Segundo: não se gravavam álbuns inteiros, mas sim compactos de 7 polegadas, com uma ou duas faixas de cada lado.

Assim, a produção e divulgação das músicas era tão ágil que as faixas eram gravadas e mixadas durante a manhã, prensadas à tarde e tocadas à noite nos bailes, os dancehalls, que eram animados pelos sound systems. Além disso, como os artistas ganhavam por faixa gravada, sem receber direitos autorais das dezenas de pequenas gravadoras locais, a produção era intensa. O pequeno poder aquisitivo da população condicionava um processo que levava o público a, primeiramente , ouvir, sentir e dançar cada faixa, para depois decidir se valia a pena comprar o disco correspondente, ação que era acompanhada de perto pelos produtores e músicos.

Deve-se acrescentar ainda a força da intensa competição entre os diversos sound systems, como os de Coxsonne, Reid e os tradicionais Metro Media e Kilimanjaro. Os seus donos estavam sempre à procura de novas sonoridades que poderiam chamar a atenção dos freqüentadores dos bailes e bater os rivais, como aconteceu várias vezes na história do gênero. A Jamaica se transformou em um laboratório sociocultural vivo e dinâmico, tocado, entre outros fatores, pelo ritmo da música.

Por tudo isso, no verão de 1966, o ska seria substituído no coração do público da ilha por uma nova batida, o rocksteady.

Somente vinte anos depois os Skatalites voltariam a tocar juntos, tornando-se parte de uma bem-sucedida retomada do ska, que foi iniciada na década de 1970 pelos filhos dos imigrantes jamaicanos na Inglaterra, formando grupos interraciais como The Specials, The Selecters etc. Hoje o ska ganhou novo fôlego com a chamada third wave, através de grupos com o Hepcat, Toasters e muitos outros.


Curiosidades do Ska

Foi o sucesso da música "Simmer Down", onde os Wailers eram acompanhados pelos Skatalites, que encorajou a banda a se lançar como atração independente e fazer shows.


Os skas geralmente tinham nomes chamativos, às vezes baseados nas notícias dos jornais, como "President Kennedy", "Lee Oswald" , "Fidel Castro" ou pitorescos como "Ball of Fire" e "El Pussy Cat" para atrair a atenção para um gênero ainda carente de estrelas.

O atual primeiro-ministro da Jamaica, PJ Patterson (que já está no poder há 10 anos), era na década de 1960 um empresário musical (produziu vários shows dos Skatalites), e um advogado iniciante. Foi ele quem defendeu Don Drummond em seu julgamento pela morte da esposa Marguerita. Alegando insanidade mental (o que parecia ser verdade), Patterson livrou Drummond da pena de morte, mas este acabou morrendo no manicômio em 1968.

Rocksteady

Rocksteady é o nome normalmente dado ao ritmo que dominou as paradas jamaicanas entre o ska e o surgimento do reggae, mais exatamente entre o fim de 66 e a metade de 68. No entanto pode-se dizer que, na verdade, trata-se do primeiro formato que o reggae como conhecemos hoje tomou, tendo muito mais a ver com o ritmo que tornaria a Jamaica famosa em todo o mundo do que com o o ska. Talvez o nome rocksteady não tenha vingado porque poderia ser confundido com o rock n' roll, ou porque os jamaicanos gostaram mais do nome reggae, ou as duas coisas. O fato é que a divisão entre rocksteady e reggae acabou prevalescendo entre os pesquisadores do ritmo e os executivos das gravadoras, o que talvez possa ajudar a explicar por que um período tão importante da música jamaicana permanece pouco conhecido por grande parte do público.

É geralmente aceito que teria sido justamente um cantor, Hopeton Lewis, o primeiro a pedir aos músicos para desacelerar o ritmo do ska para que fosse possível encaixar a letra de uma canção. Nesta gravação histórica, que resultaria no sucesso 'Take it Easy', o pianista Gladstone Anderson teria comentado que aquele era um balanço mais regular, mais firme (rock steady), batizando o novo ritmo. No final de 66, outras canções apareceram retomando o andamento do rhythm & blues de Fats Domino, tão popular na ilha nos anos 50 e aproveitando a batida persistente em que o ska se baseava, criando um som diferente de tudo o que havia sido ouvido antes e que seria a base para tudo o que se faria depois.

A introdução da guitarra e do baixo elétricos em meados dos anos 60 pode ser considerada como um evento fundamental que tornou possível esta mudança no cenário musical jamaicano. Eles permitiram que os músicos criassem linhas de baixo mais ágeis, que serviriam como base para o rocksteady e também para o reggae. Outros atribuem tal reviravolta ao verão excepcionalmente quente de 1966. Por outro lado, Bob Marley chegou a comentar que os instrumentistas ligados ao ska, que tinham como referência musical o jazz e rhythm & blues, teriam ficado insatisfeitos com a parca remuneração recebida e diminuído o ritmo de produção, abrindo o caminho o caminho para novos músicos, mais influenciados pela soul music e pelo rock n'roll. Assim, os metais (saxofone, trombone, trumpete etc), que eram a base do ska, foram para o segundo plano, dando espaço para que os outros instrumentos e a voz dos cantores sobressaíssem. Seja como for, logo o rocksteady caiu nas graças dos novos frequentadores dos dancehalls, um público mais jovem e ansioso por um música que cantasse a vida urbana de uma Jamaica que se modernizava rapidamente.

Talvez por isso os primeiros rocksteady tivessem como tema a vida dos rude boys, a juventude sem emprego, rapazes e moças que muitas vezes haviam acabado de chegar do interior e ficavam a vagar pelas ruas das grandes cidades jamaicanas, `as vezes praticando pequenos roubos, `as vezes se envolvendo em brigas e confusões pelos guetos. Prince Buster e sua canção "Judge Dread" condenava os rudies, enquanto que Bunny Wailer lamentava em "Let Him Go" que sua energia fosse desperdiçada nas prisões. Outros clássicos da época foram "A Message to you Rudy", canção de Dandy Livingstone que seria mais tarde regravada pelo The Specials (ver Skarcéu) e a mais conhecida das 'rude boys songs': "(007) Shanty Town", de Desmond Dekker, que foi incluída na trilha do filme "The Harder they Come". Mas logo as canções românticas e as que cantavam a vida cotidiana se impuseram como as mais identificadas com o rocksteady, embora os temas sociais e as mensagens rasta que dominariam o reggae nos anos 70 já começassem a aparecer.

'''The Wailers'''

Na época em que o rocksteady começou, Bob Marley estava nos Estados Unidos tentando juntar dinheiro para fundar seu próprio selo de gravação. Logo que ele voltou, no mesmo ano de 1966, juntou-se novamente aos Wailers e gravou alguns rocksteady para Coxsonne Dodd, como "Rocking Steady", mas foi com "Nice Time" e "Put it on", de Marley, que o grupo se manteria no topo e se incluiria na galeria dos grandes grupos harmônicos que começaram naquele tempo. Peter Tosh também adicionaria boas canções à fase rocksteady dos Wailers como a primeira versão de "I'm the toughest" (outra 'rudie song') e suas primeiras louvações rastafari, como "Rasta shook them up" (sobre a visita do imperador da Etiópia, Haile Selassie I, também em 1966).

A concorrência entre os grupos nunca foi tão grande como naquele tempo. Houve uma explosão produtiva na ilha, já que o rocksteady usava menos instrumentistas, o que facilitava as gravações. Dezenas de grupos apareceram (veja a lista abaixo), e os mais importantes foram os Heptones (cujo líder, Leroy Sibbles, também era baixista e criou muitos dos ritmos clássicos do rocksteady e do reggae), os Melodians (com o clássico 'Rivers of Babylon', entre outros) e os Paragons (do vocalista John Holt). Os dois últimos eram ligados a Duke Reid, o produtor que conseguiu tomar por um breve momento a liderança do mercado musical jamaicano do Studio One. Sua gravadora, a Treasure Isle, foi a responsável pela maioria dos sucessos do período. Outros produtores que fariam carreira na indústria musical jamaicana, como Joe Gibbs, Bunny Lee e Lee Perry, também iniciaram suas produções próprias durante aqueles anos loucos e iriam liderar a mudança do som que levaria ao reggae roots.Ficheiro:Http://www.globalsite.com.br/massive/isle.jpg

Algumas das principais características associadas ao reggae começaram com o rocksteady. Musicalmente as bases foram estabelecidas por instrumentistas como Lynn Taitt e Leroy Sibbles, criando os 'riddims' (bases instrumentais) que seriam continuamente reutilizados, desde o roots até a atual era digital (o chamado dancehall não está tão longe do roots quanto se costuma pensar, ver Dancehall), iniciando uma prática que iria definir toda a música realizada posteriormente na ilha. Foi nessa época também que foram realizados os primeiros ensaios do dub e foi sobre os clássicos do rocksteady que U Roy começou a gravar o seu canto falado (ver U Roy), que introduziriam a figura essencial do deejay. Os temas que o reggae exploraria em suas letras, como as mensagens de cunho social, as referências à Bíblia, as louvações a Jah (como "The Israelites", um dos primeiros grandes sucessos internacionais da música jamaicana, que era um típico rocksteady) também se estabeleceram naquele período. Até mesmo as letras que exploram o tema sexual chamadas de 'slackness' tiveram sua origem naquela época, em canções como "Fatty Fatty", dos Heptones ou na série de compactos "Censored", creditada a um certo Lloydie and The Lowbites, tema que dominaria o dancehall no final dos anos 80 e começo dos 90, repercutindo até hoje.Ficheiro:Http://www.globalsite.com.br/massive/techniq.jpg

No Brasil o que se conhece do rocksteady são os clássicos como "54-46", "The Israelites" ou "(007) Shanty Town". A já citada trilha sonora do filme "The Harder they Come" tem talvez a melhor seleção da época de transição entre o rocksteady e o reggae roots e é encontrável em alguns sebos. A série "Jamaican Gold" também traz alguns bons exemplos, como os álbuns dos Ethiopians, Hopeton Lewis, The Jamaicans e da banda de Byron Lee, os Dragonairies (ver lista abaixo).

Hoje o rocksteady se mantém vivo, através de artistas identificados com aquele período, como Alton Ellis, Ken Boothe e Eric Donaldson, que não conseguiram se adaptar `as mudanças do ritmo, mas que retomaram suas carreiras recentemente. Produtores como Joe Gibbs estão voltando `a ativa, entre outros motivos, para para suprir o mercado brasileiro, mais exatamente no Maranhão e outros estados que tornaram o reggae um fenômeno de massa com músicas novas de artistas ligados ao rocksteady e ao reggae roots. Como se isso não bastasse, algumas bandas novas, particularmente da chamada third wave do ska (ver Skarcéu), como Hepcat e Dr. Ring-a-Ding and The Seniors All Stars, vêm mantendo viva a chama do rocksteady, para a alegria dos que gostam desse ritmo "caminhante" e vibrante e de todos os que apreciam a boa música.