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Pégaso: diferenças entre revisões

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Revisão das 01h00min de 3 de março de 2005

MITOLOGIA

GEORGE BAKER



Deuses e Heróis

O Romance da Mitologia Grega



Editora Brasiliense São Paulo 1960



Primeira Parte

O Advento de Pélops




Quimera



CAPITULO IV


A AVENTURA DO CAVALO VOADOR E O MONSTRO TRICÉFALO


Repousava Micenas no flanco de uma, colina dominando profundo desfiladeiro. Tinha vista para grande e larga planície que se estendia ao sul, até o mar, e próxima à qual se achava a bela cidade de Argos, onde Pélops encontrou o Rei Preto que o acolheu favoravelmente. Irmão gêmeo de Acrísio, reclamara Preto participação no reinado de Argos, por morte de seu pai; porém, Acrísio repeliu-o. Atravessou então os mares, dirigindo-se para a Lícia onde se casou com a Princesa Antéia, filha do Rei Iobates. Quando Acrísio foi morto, Preto, Rei de Tirinto, não distante, voltou para Argos deixando seu reino aos cuidados de seu filho Megapentes.

Pélops ouvira Perseu relatar este fato. Mas havia outra história que lhe contara Preto e ele nunca tinha ouvido da boca de ninguém. Era essa uma história tão maravilhosa quanto as próprias aventuras de Perseu.

Pouco depois de Preto subir ao trono de Argos, chegou um dia à sua corte um belo mancebo de nome Belerofonte, filho caçula de Glauco, Rei de Efira. Belerofonte matara acidentalmente seu irmão mais velho Aleimeno, que era entranhadamente querido de seu pai e, para fugir à cólera do Rei Glauco, fora compelido a expatriar-se. Depois de ter ouvido a narrativa do acidente, o Rei Preto, como era de seu direito, expurgou o mancebo da culpa de fratricídio, permitindo-lhe, se o desejasse, estabelecer moradia em Argos. A esta proposta acedeu Belerofonte, e ter-se-ia estabelecido ali com prazer, não houvesse a Rainha, Antéia, se apaixonado por ele. Como ele a não atendesse, com o tempo transformou-se seu amor emódio. A rainha acusou-o ao seu marido de ter atentado contra a sua honra.

O Rei Preto deu crédito a esta calúnia e ficou furioso. Como, porém, não pudesse pessoalmente punir de morte a Belerofonte, encaminhou-o ao seu sogro, o Rei Iobates da Lícia, com mensagem cerrada relatando que Belerofonte fizera a corte a Antéia, e pedindo a Iobates que lhe desse a morte. Ora, não via, o Rei Iobates razão por que deveria matar aquele rapaz somente para ser agradável ao genro. Por outro lado, ressentia-se do repreensível procedimento de Belerofonte em relação à Antéia. Sem revelar o conteúdo da mensagem do Rei Preto, ordenou a Belerofonte que fosse matar a Quimera, monstro que causava grandes danos ao território da Lícia. Constituía isto difícil e perigoso empreendimento, por não ser a Quimera um monstro vulgar. Tinha três cabeças e vomitava chamas e fumaça. Eram de leão uma das cabeças e o peito. Outra cabeça e o corpo eram de cabra, ao passo que a terceira cabeça e a cauda eram de dragão. Vivia numa montanha muito alta perto do litoral, e exércitos inteiros enviados para guerreá-la haviam sido derrotados. Se bem que tivesse tanta coragem quanto o mais corajoso dos homens, não podia Belerofonte deixar de se sentir um tanto receoso da tarefa que lhe destinava o Rei Iobates. Mas os deuses, sabendo-o inocente do crime que lhe era falsamente imputado, apiedaram-se dele, dando-lhe seu apoio. De sua moradia no Monte Hélicon trouxe a deusa Atena seu cavalo alado Pégaso, que havia sido domado pelas Musas. Brindou Pégaso a Belerofonte que o montou voando com ele para a montanha onde vivia a Quimera. Houve terrível luta, pois o monstro era poderoso. Contudo, sua última hora havia soado. Com três certeiros golpes de lança aniquilou Belerofonte as três horríficas cabeças. Extinguiram-se as chamas e a fumaça, enquanto o monstro rolava sem vida pela encosta da montanha. Belerofonte deu então liberdade a Pégaso. O belo corcel voou para o céu, subindo, subindo sempre até se transtornar numa constelação que vocês podem ainda hoje contemplar, no céu quando a noite estiver clara. Não sabia o Rei Iobates se devia alegrar-se ou entristecer-se com Belerofonte ter matado a Quimera, regressando ileso. Ainda sentia rancor contra o mancebo, e mandou-o tomar parte em duas guerras, uma contra a tribo chamada Solimi, e outra contra uma nação de mulheres guerreiras chamadas Amazonas. De cada um desses embates saiu Belerofonte vitorioso. Porém, ao voltar da segunda guerra foi vítima de uma cilada, adredemente preparada pelos sicários do Rei Iobates, que tinham recebido instruções para matá-lo. Foram eles, entretanto, que morreram em número de cinqüenta. Os deuses ajudavam Belerofonte, e este voltou são e salvo ao palácio real. Compreendendo o Rei Iobates que não conseguiria ferir Belerofonte, resolveu fazer as pazes com ele. Belerofonte casou-se com a filha do Rei, a Princesa Filone, e tornou-se Rei da Lícia quando ele veio a falecer.

Mas os deuses não haviam esquecido que o Rei Preto, de Argos, conspirara contra a vida de Belerofonte, apesar de ele não ter o direito de seviciar o rapaz, já que o havia purgado de toda culpa na morte de seu irmão. Tinha o Rei três filhas de nome Lisipe, Ifine e Ifianassa. Por determinação dos deuses foram as três princesas acometidas de súbita loucura. Corriam pelos prados convencidas de que eram vacas. O Rei Preto, acabrunhado pelo sofrimento, ofereceu grande recompensa a quem conseguisse curar as filhas. Certo dia foi ao palácio um famoso adivinho chamado Melampo, afirmando que poderia, restituir a saúde às três princesas. - Mas eu só o farei, disse ele, se em recompensa você me der a terça parte de seu reino. - Isto eu não farei em tempo algum, disse o Rei Preto. Ora vejam! Alienar eu a terça parte de meu reino? Prefiro que continuem minhas filhas dementes para o resto de suas vidas! Melampo foi-se embora. Em breve, porém, correu a notícia de que se alastrava a doença. Não só as três princesas, mas também outras mulheres de Argos corriam pelos prados convencidas de que eram vacas. Crescia o seu número de dia para dia, de maneira que não restava ao Rei Preto outro recurso senão mandar buscar Melampo, o adivinho.

- Seu preço é muito elevado, disse-lhe ele, mas tão grande é minha aflição que estou disposto a aceitá-lo. Se você debelar a insânia de minhas três filhas assim como das outras mulheres de Argos dar-lhe-ei a terça parte do meu reino. - Oh não! retorquiu Melampo. Já uma vez você recusou minhas condições, e sofre agora as conseqüências de sua recusa. Desta vez não peço um terço, senão dois terços do seu reino, e ainda por cima a mão da mais bela das suas três filhas.

O Rei Preto irritou-se, enfurecendo-se, mas teve que aceitar afinal. Então Melampo fez uma infusão da planta chamada heléboro, e deu-a ás princesas para que bebessem. Imediatamente a loucura dissipou-se. Depois foram curadas as outras mulheres da mesma maneira. Melampo desposou Lisipe, a primogênita e a mais bela das princesas. Isso tudo foi relatado pelo Rei Preto a Pélops, enquanto se sentavam à mesa no palácio de Argos, comendo e bebendo; e Pélops sentiu grande desejo de conhecer Melampo, de conversar com esse adivinho e médico que havia angariado tão grande fama. Ao deixar Argos dirigiu-se à casa de Melampo, onde este vivia com sua bela esposa. Apresentando-se a eles disse Pélops: - Ouvi contar do Rei Preto a maneira pela qual você curou a loucura das mulheres de Argos. Gostaria de saber, Melampo, como foi que você obteve o divino dom de profecia e de adivinhação.

- Contar-lhe-ei isso com prazer, respondeu Melampo. Na minha juventude estudei com o deus Apolo as propriedades das ervas e das plantas e a confecção de remédios.

-Não ignora você, ser a serpente tida em grande estima pelos médicos. Fiquei muito contrariado ao saber que meus serventes, ao encontrarem um casal de cobras num velho carvalho de meu quintal as haviam matado. Ergui uma pira funerária e queimei os corpos das serpentes com honras e reverências e, encontrando alguns filhotes de serpentes no carvalho, criei essas pequenas órfãs com carinho e desvelo. Um dia adormeci à sombra do carvalho. As cobrinhas, brincando ao sol, ao meu redor, aproximaram-se e com suas lingüinhas palpitantes tocaram de leve minhas orelhas, meus olhos e minha boca. Quando acordei fiquei surpreendido de constatar que podia ouvir e compreender o que diziam, uns aos outros os pássaros e os animais, e até mesmo as cobras e as pequenas criaturas que se agitam na grama. Com elas aprendi a predizer o futuro. Foram elas que me desvendaram o segredo da loucura que os deuses enviaram às mulheres de Argos, assim como a maneira de curá-la. Esse conhecimento me valeu, como você vê, uma linda esposa e uma grande parte de meu reino.

Melampo disse ainda a Pélops que não vivera sempre em Argos, mas viera de Pilos, mais ao norte, donde fora expulso de seu lar pela crueldade de seu tio, o Rei Neleu.

Eram Neleu e seu irmão gêmeo, Pélias, filhos do Rei-Marinho Poseidon, e de uma bela moça de nome Tiro, que mais tarde veio a casar-se com o Rei Creteu de Iolco, de quem teve um filho chamado Eson. Ora, quando morreu o Rei Creteu, por lei deveria Eson subir ao trono, por ser filho legítimo do Rei. Porém, Neleu e Pélias, alegando terem mais direito do que ele por serem mais velhos, expulsaram-no e dividiram o reino entre si. Passado algum tempo Pélias expulsou Neleu. Este expatriou-se e foi construir a cidade de Pilos, em terras estranhas, ao passo que seu irmão Pélias governou sozinho em Iolco.

Neleu casou-se e teve uma bonita filha chamada Pero, pela qual Bias, irmão de Melampo, se apaixonou loucamente. Neleu só consentiria no casamento com a condição de Bias trazer-lhe os grandes touros pertencentes ao Rei Íficles de Fílaco. Bias pediu ajuda a seu irmão Melampo, por compreender ele a linguagem dos animais e com eles poder conversar. Foi assim que Melampo se dirigiu ao prado onde pastavam os touros, e, mansamente, levou-os consigo, quando repentinamente foi aprisionado, e jogado num calabouço. Teria o Rei Íficles, com certeza, condenado Melampo à morte, por ter tentado roubar-lhe os esplêndidos touros de sua propriedade de que tanto se orgulhava. Porém ao saber dos maravilhosos poderes do adivinho, mandou chamá-lo à sua presença. Não possuindo o Rei Íficles um filho para suceder-lhe no trono, pensou que talvez Melampo pudesse usar seus admiráveis dons para salvar-se da morte.

Estava Melampo inteiramente de acordo com o Rei. Ensinou-lhe como conseguir tornar-se pai. Quando sua esposa, a Rainha, teve um filho, ficou Íficles tão agradecido a Melampo que não só o libertou como também o brindou com uma manada dos famosos touros para que os levasse ao seu irmão.

Foi assim que Bias se casou com Pero, a formosa filha do Rei Neleu; Melampo, porém, foi morar em Argos, que era naquela época a maior cidade da Grécia e o lugar que convinha ao homem mais sábio e poderoso de todo o país.


[transcrição e adaptação do texto original de George Baker,em DEUSES E HERÓIS editora Brasiliense, 1960.]

Moacir Índio da Costa Júnior