Espaço vetorial simplético

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Um espaço vetorial simplético[1] é um espaço vetorial sobre um corpo junto com uma forma simplética, isto é, uma função com as seguintes propriedades:

i) bilinearidade: é linear em cada argumento, isto é, para cada , é uma transformação linear de em , e analogamente para o segundo argumento.

ii) alternância: para todo , .

iii) não-degenerescência: se é tal que para todo , então .

Note que, de ii), obtemos quaisquer que sejam e ; usando a bilinearidade, temos que , isto é, toda forma alternada é antissimétrica. A recíproca é verdadeira em corpos de característica diferente de .

Se tem dimensão finita, a escolha de uma base ordenada nos dá uma matriz que é não-singular (pois é não-degenerada), antissimétrica e “oca” (hollow) i.e. todas as entradas da diagonal principal são nulas.

Lema. Seja uma matriz quadrada com entradas num anel comutativo com identidade. Se é ímpar e é antissimétrica e oca, então .

Prova. Como é oca, temos , onde é o conjunto de todas as permutações de sem pontos fixos. Como é ímpar, não há involuções – elementos com – em . Em , declare . Trata-se de uma relação de equivalência. Pela ausência de involuções, cada classe de equivalência tem exatamente dois elementos e é da forma . Logo, se é um conjunto de representantes, então , reunião disjunta. A antissimetria de finaliza a prova.

Como corolário, obtemos que todo espaço simplético de dimensão finita possui dimensão par.

Se e são espaços simpléticos (sobre o mesmo corpo), uma transformação será dita simplética (ou um simplectomorfismo) quando for linear e satisfizer . É imediato que se é simplética, então . Um isomorfismo de em é uma transformação simplética para a qual existe uma inversa também simplética. Não surpreendentemente, no caso dos espaços simpléticos, se uma transformação simplética é invertível, então é um isomorfismo.

Bases simpléticas[editar | editar código-fonte]

Seja um espaço simplético de dimensão finita . Uma base ordenada é dita simplética quando , . Sem supor que um espaço simplético finitamente gerado possui dimensão par, é possível mostrar que há uma base com essas propriedades, provando em particular que a dimensão tem de ser par. Trata-se de um processo análogo ao de Gram-Schmidt.

Considere agora um espaço vetorial . Considerando espaço vetorial , construído a partir dos pares com , podemos definir uma forma bilinear alternada por . Vê-se facilmente que é não-degenerada. Num espaço simplético , um subespaço que induz um isomorfismo é chamado de subespaço Lagrangiano. Que um isomorfismo desse tipo existe é consequência imediata da existência de uma base simplética.

Orientação[editar | editar código-fonte]

Uma forma bilinear alternada num espaço vetorial real de dimensão é não degenerada se e somente se é par e é uma forma de volume. Num espaço simplético com base simplética , . Então

Logo orienta .

Variedades simpléticas[editar | editar código-fonte]

Seja uma variedade diferenciável. Uma -forma será dita não degenerada quando o seguinte se verificar: se é um campo de vetores tal que para todo campo , então . Isso é equivalente a exigir que seja não degenerada para todo .

Uma variedade simplética é um par , com uma -forma não-degenerada e fechada: .

O fibrado cotangente[editar | editar código-fonte]

O fibrado cotangente[2] de uma variedade tem como fibra fixada em o espaço dual . A projeção será denotada por . Para um sistema local de coordenadas em , as bases para as fibras do fibrado tangente sobre determinam bases duais para as fibras de sobre , que denotaremos por , de forma que para temos . Em temos então o sistema adaptado de coordenadas , que será denotado por .

A 1-forma tautológica[editar | editar código-fonte]

Podemos definir a função por . Trata-se de uma -forma em , chamada de forma tautológica. Num sistema adaptado , se expressa como

.

A estrutura simplética canônica do fibrado cotangente[editar | editar código-fonte]

Se fizermos , então é uma forma simplética em . Num sistema adaptado, . Disso é consequência que é não degenerada. A variedade simplética é orientada pela forma , como anteriormente.

A estrutura simplética canônica de um fibrado cotangente motiva o seguinte

Teorema (Darboux). Se é uma variedade simplética, em torno de cada ponto há um sistema simplético de coordenadas, isto é, uma carta local em que se expressa como .

Uma forma simplética dá, portanto, uma orientação.

Mecânica Hamiltoniana[editar | editar código-fonte]

Suponha que um sistema tenha a variedade diferenciável como espaço de configurações. No fibrado cotangente, com a estrutura simplética canônica, podemos considerar funções hamiltonianas, isto é, funções suaves . A definição de transformação canônica torna-se mais simples: trata-se de um difeomorfismo que preserva, via pullback, a forma simplética canônica.

Por não-degenerescência, a uma função hamiltoniana podemos associar um campo de vetores da seguinte maneira: (contração). Isso permite definir colchetes de Poisson: se são hamiltonianas, é definida por . Em coordenadas simpléticas, recuperamos as fórmulas clássicas. Note-se que a definição de Poisson se generaliza para variedades simpléticas quaisquer. Também se generalizam o Teorema dos Toros Invariantes e a existência de cartas locais (ou semi-locais, em vizinhanças de um toro invariante) do tipo ângulo-ação.[3]

Classificação de -grupos finitos extraespeciais[editar | editar código-fonte]

Um -grupo ( primo) finito é dito extraespecial quando e . Exemplos de grupos extraespeciais[4] são o grupo diedral de simetrias do quadrado, e o grupo quaterniônico , ambos de ordem . Esses dois grupos não são isomorfos. De fato, podemos definir o homomorfismo :

Temos . Como possui uma única involução, a saber , quando é um corpo de característica , obtemos que e não são isomorfos, já que possui mais de uma involução.


Seja um -grupo finito extraespecial com . O subgrupo é cíclico de ordem ; fixemos um gerador . Se , então (isso é verdade pois é central; use as fórmulas etc). Como , , donde . Segue que é um -grupo abeliano elementar que pode, portanto, ser visto como um espaço vetorial sobre o corpo de elementos. Se o comutador depende apenas das classes em , então faz sentido escrever para bem-definida. Notando que e , temos que é uma forma bilinear alternada. Se para todo , então para todo ; isso significa que , logo é um espaço simplético (de dimensão finita, obviamente). Considere agora uma decomposição simplética , onde é bidimensional com base de tal forma que se e para quaisquer . Faça . Então contém pois , e é um grupo não-Abeliano de ordem . Temos agora que . Ademais, e se . A ordem de é claramente .

Produtos centrais[editar | editar código-fonte]

Um grupo é dito ser o produto central dos subgrupos normais quando , para e para todo (já que temos que ). Intuitivamente, os centros estão sendo identificados.

Observação 1. Se é um produto central dos subgrupos normais , então é um produto central dos subgrupos . Além disso, se é um produto central dos subgrupos , então é um produto central dos (, ), .

Observação 2. Da mesma forma que um produto semidireto interno dá origem a um produto semidireto externo, é possível construir externamente um produto central de dois grupos com centros isomorfos. Dado um isomorfismo , seja . O grupo é um produto central dos subgrupos e . Reciprocamente, se é um produto central interno dos subgrupos normais , então é isomorfo ao produto central externo de por segundo o isomorfismo idêntico .

Da discussão que precede os três parágrafos anteriores, temos a seguinte

Proposição. Um -grupo extraespecial é um produto central de subgrupos não-Abelianos de ordem cada, tendo pois ordem . Um produto central de grupos não-Abelianos de ordem é um grupo extraespecial.

Não é difícil classificar grupos não-abelianos de ordem , primo. Se , ocorrem apenas os exemplos do início desta seção, e . Se é ímpar, as classes de isomorfismo dividem-se em duas, de acordo com a maior ordem possível para um elemento (o expoente do grupo): se o expoente for , teremos um isomorfismo com ; se o expoente for ter-se-á um isomorfismo com . Todos os grupos não-Abelianos de ordem são extraespeciais.

Proposição. Um grupo não-Abeliano de ordem e expoente , para , tem a apresentação mencionada.

Prova. Seja de ordem e tome tal que . Caso tenha ordem , então tem ordem ; seja . Temos que tem ordem (aqui usamos a hipótese de que é ímpar junto com a fórmula , que vale pois é central). Como e tem ordem , os subgrupos gerados por intersectam-se trivialmente, donde segue que por comparação de número de elementos. Como pois é não-Abeliano, segue que , logo , . Então se , . Fazendo , temos finalmente que e , como queríamos. O caso em que já tem ordem é análogo.

Concretamente, o primeiro tipo de isomorfismo é representado pelo grupo de matrizes (se esse subgrupo de é diedral), enquanto o segundo é representado pelo produto semidireto , com o grupo cíclico operado canonicamente, por avaliação, pelo grupo (note-se que então esse gerador de tem de fato ordem ).

Agora seja um grupo extraespecial de ordem . Se , afirmo que é um produto central de grupos ou um produto central de grupos e apenas um . Isso porque o produto central de dois grupos é isomorfo ao produto central . Usando as apresentações do início da seção, monte apresentações identificando os centros para , e verifique que é um isomorfismo. (Note que a apresentação é obtida fazendo o quociente , como na Observação 2)

Se , então ou tem expoente ou é um produto central de grupos não abelianos de ordem e expoente e apenas um grupo não abeliano de ordem e expoente . De fato, se e são grupos não-Abelianos de ordem com de expoente e de expoente , temos que os produtos centrais e são isomorfos. Um isomorfismo é definido por É isomorfismo pois é sobrejetivo e ambos os grupos têm ordem , ou note que a associação que se estende à inversa é . Aqui, , ; em , e em , , , , , , além, claro, das relações de centralização e daquelas que caracterizam como representantes dos tipos de isomorfismo mencionados há pouco. Agora basta notar que todo elemento de um monoide no alfabeto em que são impostas apenas as relações de comutatividade e decorrente do isomorfismo, é da forma ou (estamos usando implicitamente a Observação 1).

Os argumentos anteriores provam o seguinte

Teorema. Para cada e para cada primo ímpar, existem duas classes de isomorfismo de grupos extraespeciais de ordem , de acordo com o expoente, ou . A classe de expoente é representada por um produto central de grupos isomorfos a ; a outra, pelo produto central de um grupo isomorfo a e grupos isomorfos a . É possível exibir apresentações para representantes de cada uma das duas classes.

Um resultado similar, como já vimos, vale para .

Raciocínio inteiramente análogo mostra que um -grupo finito em que o centro é cíclico e o subgrupo derivado tem ordem (grupos chamados de extraespeciais generalizados) possui a seguinte propriedade: e é um -grupo abeliano elementar de posto par. Esses grupos podem ser expressados como produto central de grupos de dois tipos. Há duas classes de isomorfismo quando fixados e o índice do centro. Isso permite exibir apresentações como anteriormente.

Referências[editar | editar código-fonte]

  1. Hoffman, Kenneth; Kunze, Ray (1971). Linear Algebra. United States: Pearson 
  2. Spivak, Michael (2005). A Comprehensive Introduction to Differential Geometry, vol. I. Houston, Texas: Publish or Perish 
  3. Spivak, Michael (2011). Physics for Mathematicians: Mechanics I. Houston, Texas: Publish or Perish 
  4. Robinson, Derek J S (1996). A Course in the Theory of Groups. United States: Springer-Verlag