Objet petit a

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Na teoria psicanalítica de Jacques Lacan, objet petit a representa o objeto inatingível do desejo . Às vezes é chamado de objeto de causa do desejo. Lacan sempre insistiu que o termo deveria permanecer sem tradução, "adquirindo assim o status de um signo algébrico".[1]

Origens[editar | editar código-fonte]

Jacques-Alain Miller, protegido de Lacan, remonta a ideia aos Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade, de Sigmund Freud, a partir dos quais Karl Abraham desenvolve a noção de parte-objeto, um conceito desenvolvido por sua aluna, Melanie Klein, que por sua vez inspirou a ideia de Donald Winnicott do objeto de transicional.[2]

Desenvolvimento lacaniano[editar | editar código-fonte]

Nos seminários de Lacan do final dos anos 1950 e começo dos anos 1960, o conceito em evolução do objeto (petit) a é visto no matema da fantasia como o objeto do desejo buscado no outro.[3]

Em 1957, em seu Seminário Les Formations de l'inconscient, Lacan introduz o conceito de objet petit a como o objeto parcial imaginário (kleiniano), um elemento que é imaginado como separável do resto do corpo. No Seminário Le transfert (1960-1961) ele articula o objeto a com o termo agalma (do grego, ornamento). Assim como o agalma é um objeto precioso escondido em uma caixa sem valor, o objet petit a é o objeto de desejo que buscamos no Outro. A caixa pode assumir muitas formas, todas sem importância, a importância está no que está dentro da caixa, a causa do desejo.

Nos Seminários L'angoisse (1962-1963) e Os Quatro Conceitos Fundamentais da Psicanálise (1964), o objet petit a é definido como a sobra, o resquício deixado pela introdução do Simbólico no Real. A definição é aprofundada no Seminário O Outro Lado da Psicanálise (1969-1970), onde Lacan elabora seus Quatro discursos. No discurso do Mestre, um significante tenta representar o sujeito para todos os outros significantes, mas sempre se produz um excedente: esse excedente é o objet petit a, um excedente de sentido, um excedente de jouissance.

Slavoj Žižek explica este objet petit a em relação ao MacGuffin de Alfred Hitchcock: "MacGuffin é obejt petit a puro e simples: a falta, a permanência do Real que põe em ação o movimento simbólico de intepretação, um buraco no centro da ordem simbólica, a mera aparência de algum segredo a ser explicado, interpretado, etc".[4]

Hierarquia do objeto (a)[editar | editar código-fonte]

Falando da queda do a, Lacan observou que "a diversidade de formas assumidas por esse objeto da queda deve estar relacionada ao modo como o desejo do Outro é apreendido pelo sujeito".[5] A forma mais primitiva é "algo que se chama seio (...) este seio em sua função de objeto, o objet a, é a causa do desejo".[6]

Em seguida, surge a segunda forma: o objeto anal. "Conhecemo-lo pela fenomenologia do dom, o presente oferecido na angústia".[7] A terceira forma surge "no nível do ato genital (...) [onde] o ensinamento freudiano, e a tradição que o manteve, situa para nós o abismo da castração".[8]

Lacan também identificou “a função do petit a no nível da pulsão escopofílica. Sua essência se realiza na medida em que, mais do que em qualquer outro lugar, o sujeito é cativo da função do desejo".[9] O termo final refere-se ao "petit a fonte do superego (...) o quinto termo da função de petit a, por meio do qual se revelará a gama do objeto em sua relação — pré-genital — com a demanda do — pós-genital — Outro".[10]

Analista e o a[editar | editar código-fonte]

Para que a transferência ocorra, o analista deve incorporar o a para o analisando: "analistas que o são apenas na medida em que são objeto — o objeto do analisando".[11] Para Lacan, “não basta que o analista suporte a função de Tirésias. Ele também deve, como Apollinaire nos diz, ter seios"[12] — deve representar ou incorporar o objeto (ausente) do desejo.

Trabalhar através da transferência a partir de então implica mover-se além da função do a: o "analista tem que (...) ser o suporte do a que separa", para permitir que a análise seja eventualmente completada.[13] "Se o analista durante a análise vier a ser esse objeto, ele também não o será no final da análise. Ele se submeterá ao destino de qualquer objeto que represente a, ser descartado".[14]

Ligações externas[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. Lacan, Jacques (1995). Écrits. Col: Le champ freudien [Nachdr. d. Ausg.] Paris 1966 ed. Paris: Éd. du Seuil 
  2. Miller, Jacques-Allain. "Microscopia." Translated by Bruce Fink. In Jacques Lacan Television. New York & London: W. W. Norton, 1990. p. xxxi.
  3. Mary Jacobus, The Poetics of Psychoanalysis (Oxford 2005) p. 26n
  4. Slavoj Žižek, Liebe Dein Sintoma com Dich Selbst! (documentário)
  5. Jacques Lacan, Television (London 1990) p. 85
  6. Jacques Lacan, The Four Fundamental Concepts of Psycho-analysis (London 1994) p. 168
  7. Jacques Lacan, "Introduction to the Names-of-the-Father Seminar", in Television p. 85
  8. Lacan, "Introduction" p. 85-6
  9. Lacan, "Introduction" p. 86
  10. Lacan, "Introduction" p. 87
  11. Lacan, Television p. 4
  12. Jacques Lacan, The Four Fundamental Concepts of Psycho-analysis (London 1994) p. 270
  13. Lacan Concepts p. 273
  14. Stuart Schneiderman, Returning to Freud (New York 1980) p. 8