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Motim de Esquilache[editar | editar código-fonte]

Motim de Esquilache, por Francisco de Goya

O motim de Esquilache foi uma revolta popular ocorrida na Espanha em março de 1766. Dentre as diversas consequências que o movimento trouxe, que incluíam diversos setores da sociedade, a principal foi o banimento do Marquês de Esquilache, o principal ministro do rei Carlos III. Foi considerada uma revolta de subsistência por ter a fome como um dos fatores principais para seu início.

O motim expressou de maneira ingênua suas demandas políticas e econômicas, mas em nenhum momento manifestou-se contra o poder real ou contra os privilégios da nobreza e clero. A historiografia atual estuda o motim sob a perspectiva de um movimento popular com viés político devido à luta pelo poder entre duas facções da Corte, tirando do foco a questão das capas e chapéus como o fator principal e causador da revolta, apesar de terem sido parte importante.

Antecedentes[editar | editar código-fonte]

Os motins e revoltas geralmente são o final do processo de uma crise. No caso espanhol, passou por uma longa e lenta fase preparatória, pois o descontentamento geral tinha desaparecido a diferentes níveis sobre a base das estruturas socioeconômicas e sociais. A Espanha encontrava-se numa situação complicada, vivendo com uma política monárquica absolutista, uma sociedade estamental e uma economia pobre e deficitária que dificultava avanços.[1]

Um elemento importante do país era Leopoldo de Gegorio, mais conhecido como Marquês de Esquilache, o principal e favorito ministro do rei. Propunha uma série de modernizações na cidade de Madri, que não estava de acordo com os padrões que se esperava da residência da Corte ilustrada: as condições eram insalubres, inseguras e a sociedade considerada indigna. Os planos do marquês envolviam limpeza, pavimentação e iluminação das ruas, além da criação de fossas sépticas e jardins. A maneira firme do marquês ao impor reformas e renovações gerava irritação e em alguns casos era interpretada como uma violação dos costumes. A medida mais controversa foi a renovação de uma proibição já existente, que consistia em abolir definitivamente o uso de capas e do sombrero de aba larga, também conhecido como chambergo. A justificativa dada para tal proibição era que a roupa permitia esconder armas e permanecer no anonimato, o que encorajaria a desordem e os delitos e dificultando a identificação dos possíveis revoltosos enquanto estivessem vestindo o traje.

Leopoldo de Gregorio, Marquês de Esquilache

A proibição da vestimenta apesar de seu incomodo, a verdadeira razão para a revolta estava no aumento dos preços dos alimentos básicos devido à baixa da colheita de grãos, produzindo uma situação de fome entre as classes trabalhadoras, e que estava ligada às medidas da reforma econômica promovida por Esquilache. Para exemplificar: o pão, que era alimento fundamental da dieta, duplicou seu preço em cinco anos.[2]

"[...] durante los cuatro años que precedieron al motín, el trigo costó en Castilla, como término medio, 1328 maravedís/fanega, frente los 788 de los siete años anteriores." [3]

Como ocorria nos tumultos de subsistência do Antigo Regime, a escassez de pão tornou-se insuportável para a classe humilde na época do ano em que o trigo é o mais caro, antes da colheita e quando as reservas do ano anterior estão se esgotando, maximizando o conflito. Numa tentativa de combater a alta dos preços Esquilache cria sistemas de monopólios de venda dessas mercadorias, que acabam não funcionando. Os comerciantes também aproveitavam para aumentar os preços justificando-se na premissa da oferta e demanda: havia pouca mercadoria e muita gente querendo comprar. Por conta disso os preços foram aumentando de forma exorbitante, fazendo com que os mais pobres não conseguissem arcar com o preço do trigo.[4] Havia também um fator xenófobo contra os italianos (considerando que Esquilache vinha de Nápoles), que também pode ser classificado como um elemento motivador.

A revolta[editar | editar código-fonte]

Logo com a publicação do édito de proibição de vestimenta veio a reação popular. Usavam pasquins de cunho vexatório contra Esquilache, e um fator curioso é a escrita culta que aparecia neles, o que contradizia com o jeito iletrado dos mais humildes. O movimento era altamente organizado, fazendo uma oposição inteligente com o uso de panfletos, canções e octavilhas que eram confeccionadas durante o motim.[5]

Exemplo das vestimentas
"Chapéus e Capas"; pintura feita por
José Martí y Monsó (1864)
El Ingles impertinente,

El Portugués arrogante,

El Italiano puyante,

Y el Argelino insolente;

Los Holandeses muy ricos,

Los Franceses con ozicos,

El Marruecos em algo media

Y todo eso lo remedia

El sombrero de tres picos.

Que estén las Indias rendidas,

Los pueblos abandonados,

Los lugares desploblados,

Las letras y armas perdidas,

Las plazas desguarnecidas

Y otros con lo que hurtan ricos,

Todos los estorvos chicos,

Lo que sólo importa es

Que anden con cabriolés

Y sombreros de tres picos..." [5]

Os amotinados pediam por um "o bom governo", que começaria ao eliminar os marqueses de Esquilache e Grimaldi, ambos estrangeiros, inimigos do povo.[6]

Esquilache ordenou aos soldados que ajudassem as autoridades municipais no cumprimento da ordem, e multas começaram a ser distribuídas, o que fez o descontentamento crescer e gerar pequenos focos de violência.

O motim começou na tarde do Domingo de Ramos, dia 23 de março de 1766. Um embozado de capa e chambergo aproximou- se provocadoramente dos quartéis Inválidos, onde oficiais de justiça vigiavam habitualmente o cumprimento da norma acerca da capa e chapéus. Um oficial o deteve e depois de uma breve troca de recriminações, o embozado tirou uma espada de entre suas roupas e avisou a um grupo maior, o qual recebeu adesão espontânea de muitos transeuntes. Os policiais foram forçados a fugir, permitindo que o grupo invadisse o quartel e tomasse posse de sabres e fuzis.


O tumulto segue para a Plaza Mayor, onde se reúne uma verdadeira multidão. À porta de Guadalajara pararam o transporte do Duque de Medinaceli, que ao ser abordado compromete-se a transmitir ao rei o descontentamento e as petições do povo. De fato, ele foi ao Palácio para informar, e logo depois voltou acompanhado pelo Duque de Arcos, confiando que a boa reputação entre eles e o povo os tornaria receptivos aos seus conselhos e aquietaria a agitação. Os amotinados ignoraram e começaram um passeio pelas ruas da cidade, que culminou diante da casa do marquês, que, no entanto, não estava ali. Isso não impediu que a residência fosse assaltada. Na segunda de Páscoa, dia 24 de março, espalha-se a notícia de que Esquilache estava no Palácio ao lado do rei, e uma multidão, que continha um número significativo de mulheres e crianças, segue em direção ao paradeiro de Esquilache. Ali há um confronto com a Guarda da Valônia, que resulta em mortos e feridos de ambos lados.

O elemento do clero surge quando se analisava a temeridade dos amotinados, e o fato de que os feridos se recusavam a ser ouvidos em confissão. Posteriormente isso foi interpretado como prova de que os amotinados haviam sido ensinados por clérigos, que os convenceram da santidade de sua causa e que não deveriam temer pela salvação de suas almas. Eles também pareciam estar convencidos de que os feridos ou prisioneiros e suas famílias seriam financeiramente sustentados.

Os embaixadores estrangeiros que estavam em Madri acabaram chegando à mesma conclusão: a multidão foi liderada por líderes ocultos.[7]

O rei estava disposto a aparecer fisicamente diante dos amotinados, acreditando que sua mera presença os acalmaria, mas antes de tomar qualquer tipo de decisão pessoal, convocou urgentemente uma reunião de conselheiros em sua antecâmara. A maioria dos assessores militares o aconselhava a responder com a muita violência para restaurar a ordem. Os conselheiros civis eram claramente a favor de ouvir os pedidos do povo, que culpava Esquilache. O rei aceitou os critérios deste segundo grupo e aparece na sacada para ouvir as demandas. A multidão se dispersa e a cidade parecia estar em estado de calmaria novamente.

Algumas das reinvindicações eram:

  1. abaixar os preços dos insumos.
  2. exílio de Esquilache e sua família.

  3. mantimento das vestimentas que tinham sido proibidas.

  4. hispanização do ministério.

  5. retirada da Guarda de Valônia [8]


A terça-feira Santa, dia 25 de março, amanheceu tranquila, com o povo confiando na palavra real dada no dia anterior. No entanto, espalhou-se a notícia de que Carlos III, que tinha se sentido muito afetado em sua dignidade e estava assustado, tinha ido para o palácio de Aranjuez levando consigo toda a sua família. A população foi perturbada pelos rumores que poderiam significar que o monarca pretendia subjugar a cidade usando o exército. A agitação nas ruas aumentou e houve desordem e pilhagem piores do que no dia anterior. Diversos estabelecimentos foram saqueados e um grupo escreve uma carta de exigência ao rei, que seria respondida.

Sua resposta foi proclamada nas ruas de Madrid. O rei explicava sua ausência devido a uma indisposição e ratificava sua promessa de respeitar as demandas populares, principalmente a redução de todos os preços dos alimentos, e ainda mais do pão. Porém fez uma advertência que ele não apareceria até que os ânimos do povo estivessem acalmados, fazendo com que a reação geral a esse pedido fosse de obediência. Armas roubadas foram devolvidas, mas os pasquins não sumiram de circulação.

Pós-revolta e consequências[editar | editar código-fonte]

pintura retratando o Motim de Esquilache

As notícias do motim em Madri se espalharam por toda a Espanha, envolvendo diversas cidades e povoados. Os movimentos não tinham ligação uns com os outros, e também não eram continuidades entre si. Diferentes entre si, um elo em comum era o apelo ao protecionismo do consumidor, seguindo o modelo clássico do motim de subsistência.

Esquilache foi exilado e o Conde de Aranda, Capitão Geral de Valência tornou-se o homem forte do novo governo. A notícia dos tumultos que eclodiram nas províncias foi perturbadora, e se viu necessária a elevação à Presidência do Conselho um homem enérgico e de pulso firme, como o Conde. Com suas tropas havia se mudado para Aranjuez e tranquilizara Carlos III, produzindo um impacto tranquilizador que era muito necessário.[9] Com suas tropas havia se mudado para Aranjuez e tranquilizara Carlos III. A atribuição de culpa, posteriormente, orientava-se no sentido da oportunidade de encontrar bodes expiatórios. entre os inimigos do partido que agora ocupava a confiança do soberano.

A Companhia de Jesus foi expulsa de todos os reinos da Monarquia Hispânica no ano seguinte ao motim (1767), sendo uma de suas consequências. A expulsão dos jesuítas não foi exatamente um sinal de anticlericalismo, pois a medida teve o acordo da maioria do clero, tanto secular como regular. O abastecimento e o consumo de alimentos em Madri estava, a partir daquele momento, monitorados por instituições tradicionais e sem os caprichos liberais dos decretos de comércio livre, oferecendo uma resposta contra cíclica aos períodos de escassez e fome.

Por fim, de modo gradual e consensual por parte da sociedade de Madri, as capas e os chambergos desapareceram, e curiosamente, passaram a identificar a vestimenta do carrasco. O traje das camadas populares passou a ser como o de um personagem de sainete: o manolo, que os aristocratas imitavam por casticismo, como as diversões populares (flamenco e touradas). Era uma promiscuidade estética que em outros lugares da Europa seria inimaginável, mas que na Espanha funcionava como fator de coesão às mudanças sociais. No século XIX a chamada capa espanhola foi identificada como uma moda do país.

Por fim, existem comparações com os eventos da Revolução Francesa (1789), na qual alguns autores consideram o motim de Esquilache como antecipador da Revolução.

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  • VILAR, Pierre (1982), Hidalgos, amotinados y guerrilleros – Pueblo y poderes em la historia de España., ISBN 978-84-742-3176-2, Critica  line feed character character in |title= at position 61 (ajuda)
  • OLAECHEA, Rafael (2003), Contribución al estudio del Motín contra Esquilache (1766), Tiempos Modernos  Texto "issn 1139- 6237" ignorado (ajuda)
  • STEIN, Barbara H. (2004), Apogee of Empire: Spain and New Spain in the Age of Charles III, 1759–1789., JHU Press 
  1. OLAECHEA 2003, p. 04.
  2. VILAR 1982, p. 98.
  3. VILAR 1982, p. 99.
  4. VILAR 1982, p. 96-97.
  5. a b VILAR 1982, p. 107.
  6. OLAECHEA 2003, p. 44.
  7. OLAECHEA 2003, p. 45.
  8. VILAR 1982, p. 114.
  9. OLAECHEA 2003, p. 47.