Frames

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O termo FRAMES surgiu com pesquisas na Psicologia, inicialmente com o artigo “ A Theory of Play and Fantasy”, publicado em 1955 por Gregory Bateson. Segundo ele, “as interações ancoram - se em quadros (frames) de sentido que moldam as interpretações e ações dos atores envolvidos”. No campo da Antropologia a noção de frames “como um recurso cognitivo estruturador da experiência” aparece na obra “Frame analysis: an essay on the organization of experience ” de Erving Goffman (1986). No âmbito da Inteligência Artificial (AI) a obra de Marvin Minsky (A Framework for Representing Knowledge, 1974), trata frames como “uma estrutura de dados para representar uma situação estereotipada [...]”. Na Linguística os primeiros estudos sobre frames foram sistematizados por Charles Fillmore (Frame Semantics and the Nature of Language, 1976). Segundo ele, o usuário de uma língua faz uso de frames quando “[...] interpreta seu ambiente, formula suas próprias mensagens, compreende as mensagens dos outros, e acumula ou cria um modelo interno de seu mundo”. A partir dos estudos de Fillmore (1976), frames é definido também no campo da Linguística Cognitiva:

  • Charles J. Fillmore, Frame semantics. Linguistics in the morning calm (1982), o frame representa um sistema de conceitos relacionados entre si, em que o entendimento de um dos conceitos desta rede de conceitos implica a compreensão dos demais conceitos.
  • ________, Frames and the semantics of understanding (1985), menciona que qualquer sistema de conceitos relacionados de tal maneira que, para compreender qualquer um desses conceitos, você precisa compreender a estrutura inteira em que tal conceito se encaixa; quando uma das coisas de tal estrutura é introduzida em um texto, ou em uma conversação, todas as outras automaticamente se tornam disponíveis.
  • Zoltán KÖVECSES, Language, Mind, and Culture. (2006), pontua que os frames são representações mentais estruturadas de uma área da experiência humana (ou seja, objectos ou eventos). Como tal, equivalem a representações de protótipos. Estruturas Framelike receberam uma variedade de nomes na literatura, incluindo modelo, modelo cognitivo idealizado, domínio, guião, cena, gestalt experiencial, teoria popular, e vários outros. Os frames têm papéis que podem instanciar por valores particulares. Os frames são como esquemas em que sancionam instâncias mais específicas.
  • Antônio Suárez Abreu, no livro Linguística Cognitiva: uma visão geral e aplicada (2010) define frame como sendo o domínio semântico vinculado a uma palavra, formado tanto por um conjunto de elementos prototípicos, que pode ser considerado como uma espécie de “núcleo duro”, como também por outros elementos vinculados a imaginação (p 37).
  • Paulo Henrique Duque, Discurso e cognição: uma abordagem baseada em frames (2015), pontua frames como sendo mecanismos cognitivos através dos quais organizamos pensamentos, ideias e visões de mundo. Novas informações só ganham sentido se forem integradas a frames construídos por meio da interação ou do discurso.
  • Lilian Ferrari, na obra Introdução à Linguística Cognitiva (2020) menciona que o termo frame designa um sistema estruturado de conhecimento, armazenado na memória de longo prazo e organizado a partir da esquematização da experiência (p.50).

Uma proposta de tipologia[editar | editar código-fonte]

A Semântica de frames, segundo Duque e Souza (2018), configura-se como um modelo de análise que visa a uma representação da organização e da representação dos conceitos (frames) na nossa mente. Portanto, ela tem o objetivo de explicar as variações de sentidos de itens lexicais. Dessa forma, são diversos os mecanismos cognitivos acionados pelas construções gramaticais, que, nessa ótica, acionam um conteúdo lexical em uma intricada rede de frames conectados, os quais, por sua vez, estão conectados e ancorados em outros recursos cognitivos como metáfora, metonímia, inferência, espaços mentais, mesclagem, recursividade, categorias de nível básico, fenômeno prototípico e esquemas imagéticos (FAUCONNIER; TURNER, 1994; LAKOFF, 1990). Em seu trabalho Discurso e Cognição: uma abordagem baseada em frames (2015), Paulo Duque destaca que são vários os critérios que podem ser considerados na categorização dos frames, como grau de complexidade, domínio a que pertence (p. ex.: sociedade, política, religião etc.), tipo de expressão linguística a que está associado (categoria gramatical, estrutura gramatical etc.) ou grau de especificidade (ou de universalidade) cultural. Segue a proposta de classificação dos frames (DUQUE, 2015):

  • Frames Conceptuais Básicos - estão associados diretamente a itens ou expressões lexicais individuais. Ex: palavras como “comprar” e “vender” estão associadas a eventos específicos do frame TRANSAÇÃO - COMERCIAL, que por sua vez, é constituído por cinco papéis fundamentais COMPRADOR, VENDEDOR, MERCADORIA, DINHEIRO e VALOR.
  • Esquema Imagético (Esquema - I) - é um frame extremamente simples e muito básico. Os esquemas-I estão envolvidos em relações espaciais básicas, tais como as expressas por preposições.
  • Frames interacionais - orientam a nossa conduta e as nossas expectativas no discurso. Eles incluem o conhecimento das intenções do falante/escritor e as rotinas dos eventos de fala, o que contribui para a compreensão do intercâmbio conversacional. Também inclui o conhecimento de categorias discursivas tais como contos, receitas e notícias. De acordo com Fillmore (1982, p.117), trata-se de um “[...] tipo de acionamento de frame igualmente importante”. Um exemplo citado por Lakoff, é o frame DEBATE POLÍTICO, fundamentado nos clássicos programas de debate na TV e no rádio. Esse frame contém dois ou mais DEBATEDORES, de visões antagônicas sobre um determinado assunto, que a cada troca de turno fornecem suas respectivas OPINIÕES enquanto tentam invalidar os ARGUMENTOS um do outro. O debate é orientado por um MODERADOR, que normalmente fica localizado entre os debatedores oponentes. O DEBATE-TELEVISIVO é normalmente estruturado em uma sequência de ASSUNTOS, cuja progressão é orientada pelo moderador.
  • Frames de domínio específico - certos conceitos são evocados por frames de domínios conceptuais bem específicos (justiça, religião, política partidária, economia etc.). Esses frames muitas vezes conflitam com frames convencionais. Por exemplo, “assassino” e “inocente” orientam uma construção de sentido específica no domínio da justiça. Nesse domínio, há uma diferença fundamental entre HOMICÍDIO-DOLOSO (matar alguém com a intenção de matar) e HOMICÍDIO-CULPOSO (matar alguém, mas sem a intenção de matar). Nesse domínio, noções como INOCENTE e CULPADO são perfiladas num frame de JULGAMENTO em que pessoas podem ser inocentes mesmo que tenham matado alguém. Fora desse domínio, normalmente as pessoas acionam o frame ENVOLVIMENTO NO CRIME e este frame não apresenta o papel intenção do homicida na sua estrutura.
  • Frames sociais (cenários e categorização social) - orientam o nosso comportamento e as nossas expectativas sociais. Podem ser frames bem simples, como FAMÍLIA, e complexos, como é o caso de instituições como ESCOLA, GOVERNO e IGREJA. Normalmente, por ser o nosso primeiro frame social, o frame FAMÍLIA serve de modelo para os demais frames sociais.
  • Frames descritores de eventos - contém papéis e relações estáticas e dinâmicas como eventos, estados e mudanças de estados. O frame QUEBRAR e o frame MORRER, por exemplo, são descritores de eventos que participam da construção de roteiros.
  • Frames roteiro - são frames complexos que normalmente contém vários papéis e ordenam eventos cronologicamente. São estruturas de conhecimento que delineiam como os eventos do dia a dia se desdobram. São esses frames que organizam algoritmicamente o nosso conhecimento sobre procedimentos. Sequências de ações que caracterizam eventos experienciados, com frequência, guiam nossas expectativas e formatam comportamentos em situações cotidianas.
  • Frames culturais - é um frame específico de uma dada cultura. Cumpre esclarecer que, com exceção dos esquemas - I, todos os demais tipos de frames apresentados aqui passam por uma espécie de filtro cultural.

Para que possamos entender e interpretar um conceito (frame), se faz necessário a compreensão da estrutura global do mesmo. (JONHSON, 1987; MOREIRA; SALOMÃO, 2012), pois, ao ler e ouvir uma palavra, um frame é ativado no cérebro. A Linguística Cognitiva traz contribuições importantes, especificamente à Semântica de frames, sendo uma área que ainda necessita de estudos mais aprofundados.

Referências[editar | editar código-fonte]

ABREU, Antônio Suárez. Linguística Cognitiva: uma visão geral e aplicada. Cotia - SP, Ateliê Editoral, 201

DUQUE, Paulo Henrique. Discurso e cognição: uma abordagem baseada em frames. FRAMES. Revista da Anpoll nº 39, p. 25-48, Florianópolis, Jul./Ago. 2015

DUQUE, Paulo Henrique; SOUZA, Ewerton William Estevam de. O processo cognitivo - discursivo de construção de sentido em notícias e piadas: uma abordagem baseada em frames. DLCV, João Pessoa, PB, v. 14, n. 2, p. 377-401, jul./dez. 2018.

FERRARI, Lilian. Introdução à Linguística Cognitiva. São Paulo, Contexto, 2020.

FILLMORE, Charles. J. Frame semantics. Linguistics in the morning calm, Seoul, Korea, p. 111–138, 1982

________. Frames and the semantics of understanding. [s.l], v. 6, n. 2, p. 222-254, 1985.

________. Frames and the semantics of understanding. Quaderni di Semantica, 6(z), 222-254• 1985

GOFFMAN, E. Frame analysis: an essay on the organization of experience. Northeastern University Press: Boston, 1986.

JOHNSON, M. The body in the mind: the bodily basis of meaning, imagination, and reason. Chicago: University of Chicago Press, 1987.

KÖVECSES, Zoltán. Language, Mind, and Culture. A Practical Introduction. Oxford and New York: Oxford University Press. 2006.

LAKOFF, G.; JOHNSON, M. Metaphors we live by. Chicago: University of Chicago Press, 1980.

LAKOFF, G. Women, fire, and dangerous things. Chicago: University of Chicago Press, 1987.

MENDONÇA, R. F.; SIMÕES, P. G. Enquandramento: diferentes operacionalizações analíticas de um conceito. RBCS, v. 27, n. 79, 2012. p. 187- 201.

MINSKY, M. A Framework for Representing Knowledge. In: WISTON, P.(ed.)Psychology of Computer Vision . McGraw - Hill, 1974. Disponível em:https://courses.media.mit.edu/2004spring/mas966/Minsky%201974%20Framework%20for%20 knowledge.pdf

MOREIRA, A.; SALOMÃO, M. M. M. Análise ontológica aplicada ao desenvolvimento de frames. Alfa: Revista de Linguística, São José do Rio Preto, v. 56, n. 2, p. 491–521, 2012.