Goteira

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Baioneta inglesa com sangrador cavado na lâmina.
Alfange alemão, com goteira
Baioneta com sangrador

A goteira[1], também chamado sangrador[2] ou mosca,[3] é a ranhura, concavidade ou sulco aberto na face da lâmina de uma arma branca, com o intuito principal de a tornar mais leve, sem deitar a perder a resistência e a flexibilidade do metal da lâmina.

Etimologia[editar | editar código-fonte]

Os nomes «sangrador» e «goteira» são alusivos a um suposto efeito, atribuído a este tipo de entalhe das lâminas das armas brancas, de promover o sangramento da vítima apunhalada pela arma, ao oferecer um canal, por onde o sangue pudesse circular para fora do corpo, enquanto a lâmina se encontrasse alojada dentro da vítima.[4] Em teoria, também poderiam servir para combater um putativo efeito de sucção ou de ventosa, que se poderia proporcionar ao espetar a lâmina demasiado fundo, o que dificultaria a remoção da arma do corpo da vítima.[5]

No entanto, tais efeitos nunca foram confirmados cientificamente, crendo-se presentemente que os relatos medievais que a eles fazem menção sejam mormente apócrifos.[6][7]

Funções e utilidade[editar | editar código-fonte]

Afigura-se provável que nas armas históricas, as considerações estéticas e mecânicas (no que concerne ao peso, rigidez e resistência da lâmina) tenham sido os escopos principais deste tipo de ranhuras.[2]

Réplica da espada de D. Nuno Alvares Pereira na Igreja de Flor da Rosa

Sem embargo, é sabido também que as goteiras, em certos tipos de armas brancas, como por exemplo nos estiletes[8][9], também serviam para ajudar a acumular maiores quantidades de veneno, quando se untavam as lâminas de armas com venenos, como a cicuta, o acónito ou o heléboro-fétido.[10]

Exemplos históricos[editar | editar código-fonte]

A espada historicamente atribuída a D. Nuno Álvares Pereira destaca-se pelas goteiras ornamentais em forma de serpe, no forte e no médio (primeiros dois terços) da folha da lâmina da espada[11], e pelas goteiras em forma de coração no fraco (último terço da folha da lâmina)[11] e junto à ponta da espada.[12]

Referências

  1. Machado, José Pedro (1981). O Grande Dicionário da Língua Portuguesa vol. V. Porto: Amigos do Livro - editores. p. 470. 638 páginas. ISBN 9722344595 
  2. a b COUTINHO DE OLIVEIRA, JOÃO MIGUEL (2020). A ESPADA MEDIEVAL, DA THESIS À PRAXIS (SÉCULOS XIV E XV). Lisboa: Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. p. 107. 197 páginas 
  3. Fornari, Carlos (15 de agosto de 2023). «Anatomia de uma Faca: Explorando Suas Partes Fundamentais». Furbem 
  4. Seifert, Gerhard (1982). Einführung in die Blankwaffenkunde: bezogen auf d. europ. blanken Trutzwaffen (em alemão). [S.l.]: G. Seifert 
  5. Limburg, Peter R., What's In The Names Of Antique Weapons, Coward, McCann & Geoghegan, ISBN 0-698-20233-3, ISBN 9780698202337 (1973), pp. 77-78
  6. «Knife Encyclopedia; Blood Groove». A.G. Russell Knives. Consultado em 18 de Junho de 2021 
  7. De Santis, Alessandra (13 de Maio de 2017). «Fuller». Ultimate Knives and Gear. Consultado em 18 de Junho de 2021 
  8. Peterson, Harold, Daggers and Fighting Knives of the Western World, Dover Publications, ISBN 0-486-41743-3, ISBN 978-0-486-41743-1 (2002), pp. 16-26
  9. M. C. Costa, António Luiz (2015). Armas Brancas- Lanças, Espadas, Maças e Flechas: Como Lutar Sem Pólvora Da Pré-História ao século XXI. São Paulo: Draco. p. 34. 176 páginas 
  10. M. C. Costa, António Luiz (2015). Armas Brancas- Lanças, Espadas, Maças e Flechas: Como Lutar Sem Pólvora Da Pré-História ao século XXI. São Paulo: Draco. p. 34. 176 páginas 
  11. a b COUTINHO DE OLIVEIRA, JOÃO MIGUEL (2020). A ESPADA MEDIEVAL, DA THESIS À PRAXIS (SÉCULOS XIV E XV). Lisboa: Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. p. 13. 107 páginas 
  12. Mérida Araújo, Ruht Andrea (2017). Arte & Armas - Elementos para o estudo e análise da iconografia de armas brancas dos séculos XVIII e XIX da Coleção Manuel Francisco de Araújo (Museu Militar do Porto). Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto. p. 180. 204 páginas