Cílon de Crotona

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

Cílon de Crotona foi um importante oligarca grego antigo, do século V a.C, cidadão da cidade de Crotona (actual Calábria), que se tornou inimigo do filósofo Pitágoras, tendo também, de acordo com Jâmblico, assumido o posto de exarca (em grego ἔξαρχος) dos Sibaritas, ou seja, foi governador de Síbaris.[1]

Biografia[editar | editar código-fonte]

Cílon de Crotona era, por nascença, fama e riqueza, um dos cidadãos principais da pólis de Crotona . Porém, era também conhecido por ser ambicioso, por ter mau génio e por ser violento.[2]

Preliminares: os pitagóricos no Sul de Itália[editar | editar código-fonte]

À época, a comunidade pitagórica, distribuira-se pelas várias colónias gregas estabelecidas ao longo da orla costeira do Sul italiano, onde se destacou no palco politico e económico, devido à sua grande interventividade, troca de influências e compadrios, o que não raro suscitava represálias, politicamente motivadas, dentro das pólis.[3][4]

A casa de Mílon de Crotona era um núcleo pitagórico importante, na época, onde se reuniam os sectários do pitagorismo do sul italiano, para discutir as acções políticas a tomar, concertadamente, nas suas respectivas pólis. [5]

Tentativa de ingresso na escola pitagórica[editar | editar código-fonte]

Cílon vendo na escola pitagórica a voadeira indispensável, para conseguir consolidar e afirmar a sua posição política na pólis de Crotona, apresentou-se à casa de Mílon, a fim de ingressar no pitagorismo e, assim, poder gozar das ligações políticas privilegiadas dos pitagóricos. Porém, teve um dissabor.[6]

Pitágoras, o maioral da escola pitagórica, terá conduzido um exame fisiognomónico a Cílon, a fim de aferir se era digno de ser instruído nos ensinamentos da sua escola de pensamento. Ao concluir a análise, declarou que Cílon teria um carácter violento e inapto a seguir os ensinamentos da doutrina pitagórica[1], pelo que se negou a aceitá-lo como seu discípulo e vedou-lhe o acesso à casa de Mílon.[7]

Movimento anti-pitagórico[editar | editar código-fonte]

De acordo com Neantes, Cílon, ofendido pela rejeição por parte de Pitágoras, jurou vingança.[8]

Assim, Cílon juntou-se aos rivais políticos dos pitagóricos, dos quais se destaca Nínon de Crotona[9][10], e declarou guerra a Pitágoras e aos seus discípulos, formando um movimento que ficou conhecido como a «revolta anti-pitagórica».[11] No âmbito deste movimento, inúmeros pitagóricos foram perseguidos e assassinatos, muitos deles por lapidação[12]

Segundo relatos dos filósofos Aristóxenes e Jâmblico, os rivais políticos dos pitagóricos, caudilhados por Cílon, terão atearam fogo aos núcleos pitagóricos de Crotona e do Metaponto.[12][13] Nestes ataques incendiários, que se estima que terão ocorrido por torno do século V a.C, plausivelmente entre 440 e 415 a.C, pereceu grande parte dos pitagóricos do sul italiano, sendo que Lísis de Tarento e Arquipos de Tarento, terão sido dos poucos que conseguiram escapar com vida. [14][11]

Segundo alguns autores, como Neantes, o incêndio da casa de Mílon teria sido concretizado aproveitando-se a ausência de Pitágoras, que se encontraria em Delos, a velar por Ferécides no leito de morte.[15][16] Contudo, de acordo com Dicearco de Messina, Pitágoras estava presente no momento do desastre e terá decidido refugiar-se no porto de Caulónia, para depois zarpar para Locros[8].

Na subsequência desta chacina, os pitagóricos, enquanto força política, ficaram seriamente debilitados, tendo optado por deixar de intervir na vida política, desalentados e decepcionados com a inércia da população geral em agir sobre os autores do crime, que acabou por ficar impune.[11]

Com efeito, atendendo ao relato de Jâmblico, o ataque teve consequências tão drásticas, que resultou na apropriação das terras, cargos políticos e magistraturas, outrora detidas pelos pitagóricos defuntos, por parte dos seus rivais políticos, bem como na declaração de um perdão geral de todas as dívidas das quais os pitagóricos fossem credores.[17][18]

Abonações literárias[editar | editar código-fonte]

Marcos Chicot, na sua obra, «O assassinato de Pitágoras», explora esta episódio do incêndio da casa de Mílon, do movimento da revolta anti-pitagórica e da perseguição conduzida por Cílon e os seus partidários contra Pitágoras e os seus discípulos.[19][20]

Referências

  1. a b Centrone, Bruno (1994). « Cylon de Crotone » - "Dictionnaire des philosophes antiques, vol. II, Babélyca d'Argos à Dyscolius". Paris: CNRS éditions. pp. 533–534. ISBN 2-271-05195-9 
  2. Musti, Domenico (1990). Quaderni Urbinati di Cultura Classica, vol. 36, n.º 3 - Le rivolte antipitagoriche e la concezione pitagorica del tempo. [S.l.]: Fabrizio Serra Editore. pp. 35–65. doi:10.2307/20547064 
  3. Robinson, Eric W. (1997). The First Democracies: Early Popular Government Outside Athens (em inglês). [S.l.]: Franz Steiner Verlag 
  4. Kurt von Fritz: Pythagorean Politics in Southern Italy, New York 1940, S. 4, 13, 28f., 78–80; Walter Burkert: Weisheit und Wissenschaft. Studien zu Pythagoras, Philolaos und Platon, Nürnberg 1962, S. 181 und Anm. 47.
  5. Goulet, Richard (2012). Dictionnaire des philosophes antiques. Paris: CNRS editions. 1071 páginas 
  6. Robinson, Eric W. (1997). The First Democracies: Early Popular Government Outside Athens (em inglês). [S.l.]: Franz Steiner Verlag 
  7. «Pitagora in persona». utenti.quipo.it. Consultado em 17 de janeiro de 2021 
  8. a b La vita di Pitagora - BASE Cinque
  9. Guthrie, W. K. C.; Guthrie, William Keith Chambers (1978). A History of Greek Philosophy: Volume 1, The Earlier Presocratics and the Pythagoreans (em inglês). [S.l.]: Cambridge University Press 
  10. Curnow, Trevor (22 de junho de 2006). The Philosophers of the Ancient World: An A-Z Guide (em inglês). [S.l.]: A&C Black  «NINON OF CROTON (fifth century BC) Ninon was one of the leaders of the anti-Pythagorean movement in Croton. He claimed that the Pythagoreans were elitist and anti-democratic(...)»
  11. a b c Musti, Domenico (1990). Quaderni Urbinati di Cultura Classica, vol. 36, n.º 3 - Le rivolte antipitagoriche e la concezione pitagorica del tempo. [S.l.]: Fabrizio Serra Editore. pp. 35–65. doi:10.2307/20547064 
  12. a b Robinson, Eric W. (1997). The First Democracies: Early Popular Government Outside Athens (em inglês). [S.l.]: Franz Steiner Verlag 
  13. Kurt von Fritz: Pythagorean Politics in Southern Italy, New York 1940, S. 4, 13, 28f., 78–80; Walter Burkert: Weisheit und Wissenschaft. Studien zu Pythagoras, Philolaos und Platon, Nürnberg 1962, S. 181 und Anm. 47.
  14. Kurt von Fritz: Pythagoreer, Pythagoreismus. In: Pauly-Wissowa RE 24, Stuttgart 1963, Sp. 209–268, hier: 212, 214–216
  15. Riedweg 2005, pp. 19–20.
  16. CHRISTOPH, RIEDWEG (2005). Pythagoras: His Life, Teaching, and Influence. 1st ed. Ithaca, New York: Cornell University Press. p. 19-20. 198 páginas 
  17. Robinson, Eric W. (1997). The First Democracies: Early Popular Government Outside Athens (em inglês). [S.l.]: Franz Steiner Verlag 
  18. Knowles, George (2 de Fevereiro de 2008). «Old Masters of Academia: Pythagoras». Controverscial. Consultado em 2 de Julho de 2016 
  19. Chicot, Marcos (15 de julho de 2015). O Assassinato de Pitágoras. [S.l.]: Editorial Presença 
  20. Chicot, Marcos (2014). L'assassinio di Pitagora: Un thriller storico. [S.l.]: Salani Editore. 645 páginas. ASIN B00JLIJLDE