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Eficácia do direito: diferenças entre revisões

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== Eficácia social e eficácia jurídica ==
== Eficácia social e eficácia jurídica ==


Podemos diferenciar também os conceitos de eficácia social e eficácia jurídica. A eficácia jurídica é um conceito formal, segundo o qual uma norma emanada de acordo com o ordenamento jurídico se torna eficaz juridicamente, podendo ser exigida e tornar-se obrigatória. Já a eficácia social existirá quando as pessoas sujeitas àquela norma de fato a aceitam e obedecem. Assim, uma norma pode ter eficácia jurídica, mas não eficácia social – como ocorre com diversas “leis que não pegam” no país.
a eficácia social existirá quando as pessoas sujeitas àquela norma de fato a aceitam e obedecem. Assim, uma norma pode ter eficácia jurídica, mas não eficácia social – como ocorre com diversas “leis que não pegam” no país.


== Eficácia e validade ==
== Eficácia e validade ==

Revisão das 15h11min de 31 de março de 2014

Nas palavras de Hans Kelsen, a “eficácia do Direito significa que os homens realmente se conduzem como, segundo as normas jurídicas, devem se conduzir, significa que as normas são efetivamente aplicadas e obedecidas”[1].

A palavra “eficácia” vem do latim efficere, eficaccia, efficax, que se refere “à produção dos efeitos esperados” [2]. Desta forma, o Direito é eficaz quando atinge sua finalidade esperada, qual seja, a de ser aplicado e obedecido pela sociedade.

Eficácia na Teoria do Direito e na Sociologia Jurídica

O conceito de eficácia pode ter dois sentidos. O primeiro, estudado pela Teoria do Direito, é a eficácia como aplicabilidade e obediência à norma, ou seja, analisa-se se as normas jurídicas estão sendo efetivamente aplicadas e obedecidas para se dizer que o direito é eficaz.

Para a Sociologia Jurídica, no entanto, importa o estudo da eficácia metajurídica, ou seja, a faculdade que as normas têm de provocar efeitos substanciais (e não somente formais), efeitos para os quais elas haviam sido editadas. Em outras palavras, analisam-se as consequências da norma jurídica e sua adequação aos fins a que elas objetivam.[3]

Eficácia social e eficácia jurídica

a eficácia social existirá quando as pessoas sujeitas àquela norma de fato a aceitam e obedecem. Assim, uma norma pode ter eficácia jurídica, mas não eficácia social – como ocorre com diversas “leis que não pegam” no país.

Eficácia e validade

Kelsen diferencia eficácia e validade: a segunda se refere à obrigatoriedade da norma, ou seja, a uma característica que torna a norma jurídica algo que deve ser obedecido; a primeira refere-se ao fato de que a norma jurídica efetivamente é obedecida. Numa palavra, “a validade é uma qualidade do Direito; a chamada eficácia é uma qualidade da conduta efetiva dos homens e não, como o uso linguístico parece sugerir, do Direito em si” [4].

Entretanto, há uma relação entre esses dois conceitos.

Para Kelsen, “uma norma é considerada válida apenas com a condição de pertencer a um sistema de normas, a uma ordem que, no todo, é eficaz” ,[5]. Ou seja, para que uma norma seja válida, ela deve pertencer a um ordenamento jurídico aceito e obedecido pela sociedade (eficaz). A partir do momento em que o Direito deixa de ser eficaz, a norma também deixa de ser válida.

Robert Alexy entende de maneira similar, ao afirmar que a validade jurídica de um sistema normativo dependerá da eficácia social deste sistema, em termos globais. Ou seja, para o autor, as normas integrantes de um sistema normativo deixam de ser socialmente eficazes, e assim, juridicamente válidas, “quando já não são observadas ou quando sua não observância deixa de ser punida em termos globais” [6].

Porém, para Kelsen, isso não torna a eficácia a razão única da validade da norma; a eficácia é apenas uma condição de validade da norma. “Uma norma não é válida porque é eficaz, ela é válida se a ordem à qual pertence é, como um todo, eficaz” [7]. Isto significa dizer que, segundo Kelsen, a eficácia do Direito é uma condição necessária, mas não exclusiva, da validade da norma, sendo que há outros fatores que influenciam a sua validade [8].

Em relação às normas individualmente consideradas, Kelsen explica que elas podem perder sua validade por serem elas mesmas ineficazes – efeito que ele chama de “dessuetude” [9]. Porém, tal fenômeno só se verifica se a norma se tornar permanentemente ineficaz, ou seja, ocorrerá dessuetude apenas por uma “carência continuada da eficácia da norma” [10].

Alexy converge com Kelsen também neste ponto. Para ele, as normas individualmente consideradas não precisam ser infalivelmente aceitas e obedecidas para ter validade jurídica, desde que estejam integradas em um sistema jurídico socialmente eficaz em termos globais [11]. Porém, poderá ocorrer o fenômeno denominado “dessuetudo” (sic), “que consiste na perda da validade jurídica de uma norma em razão da redução de sua eficácia abaixo daquele mínimo [de eficácia social ou de possibilidade de eficácia]”, sendo que esse mínimo de eficácia não é possível de ser fixado de maneira universalmente exata [12].

H. L. A. Hart tem um posicionamento oposto a Kelsen e Alexy. Para Hart, não há conexão necessária entre eficácia e validade do direito, “a menos que a norma de reconhecimento do sistema inclua, entre seus critérios (como ocorre com algumas), a condição (às vezes denominada norma de dessuetude) de que nenhuma norma seja considerada como pertencente ao sistema se houver deixado de ser eficaz há muito tempo” [13].

Hart pondera, no entanto, que uma desconsideração generalizada pelas normas do sistema (ineficácia do sistema jurídico) torna uma afirmação a respeito da validade deste sistema uma afirmação sem sentido, por estar fora da realidade daquela sociedade. Assim sendo, “pode-se dizer que alguém que emite um enunciado interno sobre a validade de uma norma especial de um sistema pressupõe que seja verdadeiro o enunciado factual externo de que, de modo geral, o sistema é eficaz”. Porém, nem sempre esta regra se aplica, pois “pode ter sentido e nem sempre é inútil” falar-se a respeito da validade de uma norma dentro de um sistema ineficaz. Ele dá como exemplo desta afirmação o modo de ensinar o direito romano como se este sistema ainda fosse eficaz ou estivesse em vigor [14].

Dimitri Dimoulis, analisando a doutrina de Hart, alerta que a eficácia social é um ponto importante de sua teoria, uma vez que a regra de reconhecimento – que constitui a norma última do ordenamento jurídico para Hart – “depende (e decorre) da conduta dos agentes estatais, dos tribunais e dos particulares. Eles reconhecem o direito válido em determinado país e momento, considerando que as normas oriundas de certas fontes sociais possuem caráter jurídico. Dito de outra forma, a regra de reconhecimento identifica o sistema jurídico como um todo e faz depender sua validade de práticas sociais que o reconhecem como tal” [15]. Assim, em última análise, a regra máxima do ordenamento jurídico, para Hart, depende da eficácia social para ser válida.

Eficácia dos direitos fundamentais

O artigo 5º, § 1º, da Constituição Federal, dispõe que “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”. Desta forma, buscou-se garantir a eficácia dos direitos fundamentais enumerados pela Carta Magna. A existência deste dispositivo, por si só, estabelece uma ordem aos aplicadores da Constituição no sentido de que o princípio é o da eficácia plena e a aplicabilidade imediata das normas definidoras dos direitos fundamentais, de forma que só em situação de absoluta impossibilidade se aceitaria a aplicabilidade posterior. Trata-se de um dispositivo de garantia política da defesa da eficácia jurídica e social da Constituição.[16]

Referências bibliográficas

  • ALEXY, Robert. Conceito e validade do direito. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009.
  • ARNAUD, André-Jean (org.). Dicionário enciclopédico de teoria e de sociologia do direito. Rio de Janeiro: Renovar, 1999.
  • DIMOULIS, Dimitri. Positivismo jurídico: Introdução a uma teoria do direito e defesa do pragmatismo jurídico-político. São Paulo: Método, 2006.
  • HART, H.L.A. O conceito de direito. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009.
  • KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do Estado. 4ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
  • SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 33ª ed. São Paulo: Malheiros, 2010.

Referências

  1. KELSEN, p. 55
  2. ARNAUD et. al., p. 296
  3. ARNOLD, p. 296 e 297.
  4. KELSEN, p. 55
  5. KELSEN, p. 58
  6. ALEXY, p. 106
  7. KELSEN, p. 58
  8. KELSEN, p. 174
  9. KELSEN, p. 174
  10. KELSEN, p. 175
  11. ALEXY, p. 107
  12. ALEXY, p. 108
  13. HART, p. 133
  14. HART, p. 134
  15. DIMOULIS, p. 119
  16. SILVA, p. 467