Sismo da Terceira de 1801

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O sismo da Terceira de 1801 (ou terramoto de 1801 como é conhecido nos Açores) foi um sismo de grande intensidade que atingiu a parte leste da ilha Terceira, causando grandes danos na vila de São Sebastião e povoações vizinhas.

Descrição dos acontecimentos[editar | editar código-fonte]

Francisco Ferreira Drummond, historiador residente na vila de São Sebastião e coevo dos acontecimentos, descreve assim o terramoto e as suas consequências (Anais da Ilhas Terceira, vol. III, pp. 120–123):

— No dia 26 de janeiro de 1801, pelas três horas e meia da tarde, sentiu-se em toda esta ilha um violentíssimo terramoto, que destruiu e desmoronou a maior parte dos edifícios nos lugares onde houvera o do ano próximo passado; porém ainda desta vez, na vila de S. Sebastião fez maiores estragos, deixando assolada uma boa parte dela, arruinada a igreja matriz, a torre dos sinos, as ermidas filiais casa da Câmara e os paços do concelho, e até as fortalezas da costa. Foi o maior terramoto que nesta vila consta houvera até hoje. Sofreram geralmente os edifícios, e igrejas, desde o lugar de Vila Nova até à dita vila de S. Sebastião, onde sempre costuma acabar o flagelo; mas foram vítimas de total ruína as paróquias de Santa Catarina do Cabo da Praia e Santa Bárbara da Fonte do Bastardo; e as torres dos sinos de todas as outras, excepto de Vila Nova, ficaram tão arruinadas e fendidas, que nelas não se podia entrar sem risco iminente, pelo que se tiraram os sinos para deles se usar em pequenas sineiras que se lhes fizeram nos adros, e o mesmo aconteceu nos conventos de religiosos, até que se reedificaram as torres, o que só foi depois de muitos anos. O estrago que fez este horrendo terremoto, sobre as ruínas do outro de 24 de Junho, do ano próximo pretérito, foram muito maiores (se exceptuarmos a vila da Praia) do que os de 15 de Junho de 1841. Continuaram por espaço de 15 dias os tremores de terra, ainda que brandamente; com a felicidade de serem mui poucas as pessoas que sofreram no meio de tamanhas ruínas, pois somente na vila de São Sebastião morreu uma pobre mulher debaixo da verga da porta por onde saía com uma criança nos braços, a qual também foi vitima desta desgraça.

À reedificação dos edifícios públicos, anos depois, e por meio de sumas dificuldades, como sempre, acudiu a fazenda real; e também se tornou digno de censura o pouco zelo e cuidado dos oficiais da Câmara da Praia em comunicar ao general o estado em que ficara o seu concelho depois desta horrorosa catástrofe, como se lê no ofício escrito ao juiz de fora em 29 de Janeiro, arguindo-o da sua omissão e exigindo que ele imediatamente lhe dissesse quais os estragos ali feitos e o estado dos edifícios publicas e particulares — que acautelasse as casas dos que fugiram, e lhe propusesse o remédio conveniente nas actuais circunstâncias, com o fim de se providenciar o que fosse possível — e que lhe indicasse os materiais necessários para a reedificação.

Por ocasião deste miserando acontecimento, como já disse do ano próximo passado, fizeram-se muitas procissões e penitências.

A segunda povoação mais incomodada foi a dita vila da Praia, onde caíram muitas casas e ficaram outras inabitáveis. Foram atingidos os mosteiros das freiras e o convento de S. Francisco, para cuja reedificação se ajuntaram dentro e fora da província muitas esmolas, assim como já se ajuntava para os das outras ilhas, onde nunca se concluíram as obras; foi inspector das que se fizeram no dito convento até o ano de 1818, em que se deram por acabadas faltando o dinheiro, o padre definidor frei José de Santa Ana, natural da mesma vila.

Nenhuns socorros se deram para a reedificação dos edifícios de particulares, e sendo passados muitos e muitos anos, é que os moradores das referidas povoações os foram consertando, como lhes foi possível, de forma que ainda hoje em algumas delas aparecem vestígios do que naquele tempo sofreram, sem embargo do muito que se fez na sua reparação desde 15 de Junho de 1841 até ao ano de 1844.

Parecerá excessivo o dizermos que a vila de S. Sebastião ofereceu por muitos anos um horroroso espectáculo ao viajante, pelo grande número de edifícios de todo o género que nela estavam caídos; e pouco melhor se manifestava a vila da Praia, na qual ainda no ano de 1812, conhecemos algumas casas espequeadas sobre as ruas públicas, e outras, muitas, com feias e medonhas ruínas, porque a falta de meios não permitira que seus donos as reparassem, pois nem havia quem se aventurasse a suplicar a caridade e beneficência dos povos residentes em outros países; sendo as autoridades desse tempo, se não indiferentes, surdas e mudas a tal respeito, ao menos pouco empenhadas em promover os prontos socorros de que careciam estes povos, perseguidos no espaço de dois anos por flagelos tão respeitáveis, acrescendo-lhes a esterilidade dos frutos da terra que também nessas épocas fatais os não deixava.

Se não parece justo imputarmos ao capitão-general D. Lourenço José Boaventura de Almada, Conde de Almada, este descuido, visto que a respeito da vila da Praia, como acima dissemos, parecia querer dar algumas providências, também o não louvaremos pelo silêncio em que ficou depois de saber qual o estado dela. Se alguma coisa representou em favor dos povos, o que não consta de registo algum público, nada se lhe respondeu talvez; e se quanto lhe disseram de tais desastres lhe pareceu muito pouco, bem podemos acreditar que o enganaram. Em todo o caso, não sendo atributo próprio do historiador o fundar-se em suposições, inclinamo-nos contudo a imputar estas grandes faltas ao estado de atraso em que estavam os homens e as coisas do século. Seria despotismo o fintar os povos, ou vergonha o pedir-lhes!?