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Dia Nacional do Orgulho Lésbico[1]

Proposto pela ativista Míriam Martinho, em outubro de 2000, em artigo na revista Um Outro Olhar 33[2], o Dia Nacional do Orgulho Lésbico (19 de agosto) foi lançado publicamente em 11 de junho de 2003 pelas ativistas Luiza Granado e Neusa Maria de Jesus, então respectivamente da Rede de Informação Um Outro Olhar e da Coordenadoria Especial de Lésbicas (CEL) da Associação da  Parada do Orgulho GLBT. A data remete à primeira manifestação lésbica contra a discriminação no Brasil, ocorrida no Ferro's Bar,[3] e homenageia a ativista Rosely Roth, figura de destaque do evento. Como na versão original da manifestação, a Folha de São Paulo fez uma reportagem sobre o assunto, desta feita com Luiza Granado e Neusa Maria de Jesus[4], pauta que foi, como de costume, reproduzida por outros jornalistas e outros veículos da mídia, dando uma grande divulgação à iniciativa. E em 19 de junho de 2008, a Assembleia Legislativa Paulista aprovou projeto que instituiu o Dia do Orgulho Lésbico no Estado de São Paulo[5]. Desde então, a data passou a ser lembrada anualmente de forma presencial ou virtual.

Histórico da manifestação: O happening político do Ferro’s Bar

Inaugurado em 1961, na rua Martinho Prado n.º 119, em frente à sinagoga Beth-El, atual Museu Judaico de São Paulo, o Ferro’s Bar, a princípio, foi reduto da boemia paulistana, reunindo atores, atrizes, escritores, jornalistas, gays  e prostitutas em suas disputadas mesas. Já a partir dos anos 70, porém, tornou-se o principal ponto de encontro das lésbicas paulistanas, assim permanecendo até setembro de 2000 quando fechou as portas.

Entretanto, apesar de ter ficado conhecido como bar das lésbicas, as relações do Ferro’s com suas frequentadoras nem sempre foram das mais cordiais. Casos de maus tratos e até violência física contra as clientes, com pouca reação das vítimas, já constavam da história do bar desde seu início. Essa situação iria mudar, contudo, quando os donos do Ferro’s, no primeiro semestre de 1983, resolveram implicar com a venda do boletim ChanacomChana feita por ativistas do Grupo Ação Lésbica-Feminista (GALF)[6]. Fundado, em outubro de 1981, pelas ativistas Míriam Martinho e Rosely Roth e algumas colaboradoras, o Grupo Ação Lésbica-Feminista (GALF) passou a vender o boletim ChanacomChana (produzido a partir de dezembro de 1982) nos bares e boates de lésbicas da época, incluindo o Ferro's.

Quando as integrantes do GALF iam vender seu boletim, contudo, eram agredidas pelo porteiro  com ameaças ou com puxões de braço para que se retirassem. Em 23 de julho de 1983, o clima pesou ainda mais e um dos donos do bar, ladeado por um segurança e o truculento porteiro do Ferro’s, tentaram aos empurrões efetivar a expulsão das militantes, sob a acusação de que estariam promovendo “arruaça” no estabelecimento. Não obtiveram sucesso, porém, porque, de um lado, as frequentadoras do bar protestaram contra a expulsão e, de outro, porque os policiais que foram chamados para ajudar no bota-fora ironicamente não viram razão suficiente para fazê-lo. As ativistas do GALF permaneceram no Ferro’s e inclusive jantaram na ocasião, mas foram barradas na entrada do restaurante depois desse momento.

Conscientes de que o veto à venda do boletim era discriminatório, já que outras publicações e produtos eram vendidos livremente no Ferro’s (camelôs entravam para vender flores e bijuterias para os casais de namoradas, o Exército da Salvação vendia seu jornal para  livrar as lésbicas do “pecado”, mulheres se vendiam sutilmente etc.), as integrantes do GALF passaram as semanas seguintes à proibição organizando uma manifestação de protesto contra as arbitrariedades sofridas a ser realizada no dia 19 de agosto de 1983. Durante esse período, distribuiu o panfleto “Pra você que frequenta o Ferro’s”, na porta do estabelecimento, denunciando a proibição e pedindo apoio das lésbicas para revertê-la. O GALF também entrou em contato com grupos gays, feministas, parlamentares (do PT e PMDB) e com a imprensa convidando-os para o que chamou de happening político do Ferro’s Bar. Como apoio na área legal, convidou a advogada Zulaiê Cobra Ribeiro, representante da Ordem dos Advogados do Brasil e da Comissão de Direitos Humanos à época.

Na noite do dia 19 de agosto de 1993, as integrantes do GALF, Célia Miliauskas, Elisete Ribeiro Neres, Luiza Granado, Míriam Martinho, Rosely Roth e Vanda Frias, acompanhadas de seus parceiros do Grupo Outra Coisa de Ação Homossexualista, Antonio Carlos Tosta e Ricardo Cury, se reuniram em frente ao famoso bar buscando informar e mobilizar as frequentadoras para a eminente “invasão”. A fim de confirmar que continuavam proibidas de entrar no Ferro’s, Míriam Martinho e Rosely Roth se posicionaram na porta de entrada, onde o truculento porteiro imediatamente as repeliu.

Em seguida, as ativistas do GALF e seus convidados, mobilizados externa e internamente, iniciaram a manifestação. Enquanto o GALF tentava forçar sua entrada, dentro do bar a vereadora Irede Cardoso[7] iniciava um discurso pelas liberdades democráticas também para as lésbicas. Ao mesmo tempo, outros ativistas e frequentadoras começavam um coro de “entra, entra”.  De repente, um lance um tanto cômico garantiu a “invasão”: alguém tirou o boné do porteiro e o jogou no meio das mesas. Enquanto ele saía atrás do boné, um rapaz abriu a porta do Ferro’s e as militantes do GALF e o pequeno grupo mobilizado à frente do bar entraram livremente. Rosely Roth subiu em algumas cadeiras e discursou sem ser interrompida pelos seguranças ou pelo  porteiro que já recuperará seu boné. Diante da imprensa, da vereadora Irede Cardoso e de várias pessoas favoráveis a venda do Chana, os donos do bar se deram conta de que valia mais a pena ceder as demandas das integrantes do GALF e liberar o boletim. A vereadora Irede Cardoso, atuando como mediadora do conflito, reporta para as frequentadoras e ativistas o que lhe dissera um dos donos do bar (Aníbal):

"O dono do bar está dizendo que foi tudo um mal en­tendido, que ele ama as lésbicas, quer que venham aqui e vendam seu bole­tim em paz. Quer que conversem com o outro sócio, também, para acabar com todos os mal-entendidos. Ele re­conhece que vive de vocês. E viva a democracia!"

E Rosely finaliza a conversa afirmando: “"Ele só voltou atrás por causa de nos­sa força, de nossa união. A democra­cia neste bar só depende de nós!"

Em seguida, a manifestação se dispersou com as ativistas do GALF conseguindo uma mesa onde jantaram e beberam para celebrar a vitória conquistada. De fato, não só nunca mais foram importunadas pelos seguranças e o porteiro do Ferro’s como inclusive passaram a ter anúncios do Ferro’s no boletim ChanacomChana.

Como na definição dos jornalistas  Vanda Frias e Carlos Brickman, a manifestação do Ferro’s foi um happening político bem-organizado pelo GALF que, no entanto, se abriu para o imprevisto, o improviso e a participação de vários atores, todos contribuindo para o sucesso da empreitada. Quando o preconceito fechas as portas, lute para abri-las.

  1. Olhar, Um Outro. «Orgulho Lésbico: o happening político do Ferro's Bar (edição 2022)». Consultado em 25 de julho de 2022 
  2. Olhar, Um Outro. «Memória lesbiana: o dia do orgulho lésbico já havia sido pensado em 2000 para homenagear Rosely Roth». Consultado em 25 de julho de 2022 
  3. «Folha de S.Paulo - Urbanidade: Bar das lésbicas entra na história - 25/06/2003». www1.folha.uol.com.br. Consultado em 25 de julho de 2022 
  4. «Folha Online - Equilíbrio - ONGs lançam "dia do orgulho lésbico" em São Paulo - 09/06/2003». www1.folha.uol.com.br. Consultado em 25 de julho de 2022 
  5. «Assembléia aprova Dia do Orgulho Lésbico». www.al.sp.gov.br. Consultado em 25 de julho de 2022 
  6. Olhar, Um Outro. «Memória Lesbiana: 40 anos do Grupo Ação Lésbica Feminista (GALF) entre fato e ficção». Consultado em 25 de julho de 2022 
  7. «Folha Online - Cotidiano - Morre em SP a ex-vereadora Irede Cardoso - 08/12/2000». www1.folha.uol.com.br. Consultado em 25 de julho de 2022