Usuário(a):Everson Felipe/Testes

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

Revolta dos Haussás. Em 12 de fevereiro de 1816, agrupamentos cativos das regiões de Santo Amaro e São Francisco do Conde, na Bahia, aproveitaram-se da ocasião de celebração de uma festa religiosa para se levantar contra o cativeiro. O levante durou quatro dias, tendo como ação o ataque aos engenhos, incendiando e atacando qualquer tipo de pessoa que lhes fossem contrários. O período de repressão foi mais duradouro. O levante encabeçado por africanos escravizados provenientes da etnia Haussá, no ano 1816, é entendido como parte de uma série de diversos movimentos de resistência escrava na Bahia durante os anos de 1807 a 1835, englobando também os levantes liderados pelos escravizados Nagôs após 1826.


Os Haussás são um povo do Sael africano ocidental que se encontra principalmente no norte da Nigéria e no sudeste do Níger. Também há populações significativas em áreas do Egito, Sudão, Camarões, Gana, Costa do Marfim e Chade, ademais de pequenos grupos espalhados pela África ocidental e na rota tradicional do Haje muçulmano, através do Saara e do Sael. Como muitos outros grupos étnicos africanos os Haussás compõem uma parcela das inúmeras vitimas escravizadas para as Américas durante o tráfico atlântico.

Grafias utilizadas em documentos[editar | editar código-fonte]

Haussás; Hausas; Hauçás; Aussas; Ussás; escravos muçulmanos.


Histórico de Rebeliões[editar | editar código-fonte]

No período de 1807 a 1820 os Haussás constituíam-se no segundo maior grupo de escravizados africanos na Bahia, atingindo 17% dessa parcela da população. Na região do Recôncavo predominava a produção pelos os engenhos de açúcar, estes que prosperaram no início do século XIX após a revolução Haitiana, que resultou na saída desse país do grande mercado exportador da agricultura. açucareira mundial. Consequentemente o Brasil foi beneficiado economicamente neste processo. Essa maior inserção do Brasil no mercado de exportação, paralelamente, acentuou o tráfico de escravizados para as regiões produtoras de açúcar. Neste período, os trazidos para a Bahia eram oriundos de regiões da África, principalmente o Sudão Central (hoje Norte da Nigéria), marcadas por uma jihad, o que garantiu um intenso tráfico de prisioneiros de guerra. Esses escravos de guerras eram em sua maioria homens nagôs, jejês e haussás. No Brasil, mesmo divergindo em muitas questões dogmáticas, esses prisioneiros mantinham em comum a crença no Islã. Essas características em comum facilitaram a criação de laços de solidariedade coletiva.[1] A primeira rebelião de escravizados haussás ocorrida nesse período, a de 1807, tratou-se de um levante arquitetado mas não efetivado. As tramas foram descobertas e, mesmo não tendo sido executadas, foram duramente repreendidas. Havia uma política de repressão dura, comandada pelo governante da Bahia, o Conde da Ponte. Em 1810, o então governante o Conde dos Arcos, impõe uma política menos agressiva em relação ao modo de vida dos escravos, permitindo as reuniões de negros chamadas de “batuques”. Essa era uma estratégia para aflorar a singularidade dos grupos cativos, através da musica, religião e tradições, afim de manter e aprofundar as diferenças étnicas, assim evitando uma identificação e união entre os diferentes povos.

Além das revoltas, a criação de quilombos também era uma constante no processo de resistência escrava. Durante o ciclo de revoltas na Bahia, aquilombados e insurgentes se integravam na resistência contra o modo de vida dos africanos cativos. Em 1814, numa nova insurgência haussá, os quilombolas se uniram aos pescadores que trabalhavam nas amarrações vizinhas à Itapoã. Algum tempo depois, uma nova insurgência haussá havia sido arquitetada, contando com a participação não apenas de escravizados cativos, mas também de quilombolas e trabalhadores urbanos. Em 28 de fevereiro, escravizados haussás invadiram casas e senzalas, armados e atacando cerca de 20 brancos na região de Itapoã.[2] Meses após, um novo plano havia sido arquitetado. Em maio, um levante encabeçado pelos haussás, mas com a participação de outros grupos étnicos, tinha o intendo de atacar a casa da pólvora para pegar o que pudessem e inutilizar o restante, mas o plano não se concretizou pois foi delatado antes de iniciar. Neste caso, um processo foi instaurado, 39 réus foram condenados, quatro deles a morte, os demais foram açoitados e alguns deportados para Angola, Benguela ou Moçambique.[3][4]

Cinco escravizadas foram acusadas: Ludovina, Teresa, Felicidade, Germana e Ana. Também uma liberta de nome Francisca, acusada de percorrer o Recôncavo com o companheiro Francisco pregando a rebelião, foi condenada ao açoite e degredo para Angola.[5]

Em 12 de fevereiro de 1816, agrupamentos cativos das regiões de Santo Amaro e São Francisco do Conde, na Bahia, aproveitaram-se da ocasião de celebração de uma festa religiosa para se levantar contra os engenhos, incendiar, e atacar casas e qualquer tipo de pessoa que lhes fossem contrários.[6] A ofensiva dos senhores se deu com a ajuda de escravizados que estavam sob seus comandos e através da criação de milícias sob o comando do coronel Jerônimo Fiúza Barreto, que era proprietário de um dos engenhos atacados pelos revoltosos. Nos casos de revoltas, a repressão senhorial era sumária. O levante durou quatro dias, porém, o período de repressão foi mais duradouro. Diante do clima de tensão, os proprietários do Recôncavo se organizaram para repreender e inibir possíveis revoltosos, criaram destacamentos que atacavam e espancavam escravizados e negros libertos. Os fazendeiros também buscaram se organizar em busca de soluções políticas mais duradouras.[7] Em 27 de fevereiro, foi realizada uma assembleia de notáveis, com a presença de grandes e pequenos senhores, para debaterem algumas providencias com efeitos mais duradouros. Deportação e enforcamento foram sugeridos, mas não aprovados por razões econômicas, afinal os escravizados garantiam ganhos aos senhores. Optaram por enviar uma petição ao Conde dos Arcos sugerindo ações que ressaltassem a posição subalterna dos cativos na sociedade, outra que lhes garantiam o direito de humilhar e açoitar cativos que transitassem na rua sem autorização dos respectivos senhores. Destacase também o pedido de uma urgente imigração de famílias europeias, para equilibrar a população branca do Recôncavo. Até mesmo a deposição do Conde dos Arcos foi colocada em pauta, e a realização agradava aos senhores, porém, esses não detinham forças para realizar tal manobra.

Efetivamente, ao menos trinta escravizados foram presos e enviado para Salvador, o evento garantiu ao coronel Jerônimo Fiúza Barreto o título de "Salvador do Recôncavo".[8]

Bahia e Pernambuco eram grandes centros de aglutinação de escravizados muçulmanos. Segundo estimativas, é possível que até 150 mil africanos escravizados oriundos da região do Sudão Central tenham cruzado o Atlântico em pouco mais de 100 anos. A estimativa inclui outras designações étnicas de origem da "Iorubalândia" como Hauçás, Nupes, Bornos, Borgus e outras.[9] Durante o ciclo de revoltas na Bahia no século XIX, tem-se início o processo de implementação da religião islâmica no Brasil, chamado de "Islamismo de escravidão".[10] [11] Inicialmente as diferentes manifestações étnicas e religiosas dos escravizados africanos no Brasil eram vistas como atividades subversivas, classificadas genericamente como "batuques". Esses batuques foram alvo constante de discussão das elites provinciais e do governo imperial, por vezes liberando, e outras reprimindo. O que de forma alguma significava que, quando liberavam, entendiam ou reconheciam as especificidades dos cultos, apenas o faziam para provocar a desunião dos grupos cativos e evitar um levante em conjunto. Essas contradições nos métodos de dominação e controle, por vezes, permitiam que essas populações estabelecessem comunidades onde mantinham em vigor seus rituais e agentes culturais, e desse modo, cultivassem algo próprio da sua identidade, evitando a sobreposição pala cultura senhorial.


Referências

  1. REIS, João José. Quilombos e revoltas escravas no Brasil. Revista USP, São Paulo, v. 28, p. 14- 39, 1995.
  2. Gabriela Harrison e Lucas Borges, Dossiê Revoltas: Revolta de Itapuã, Biblioteca visual Consuelo Pondé, 28 de agosto de 2020.
  3. REIS, João José. Há duzentos anos: a revolta escrava de 1814 na Bahia Scielo, Jan./June 2014.
  4. NOTICIA DO LEVANTAMENTO DOS NEGROS PROJETADO NA BAHIA EM 1814, Impressões Rebeldes, acesso em 28/08/2020.
  5. REIS, J. J.. Quilombos e revoltas escravas no Brasil. Revista USP, São Paulo, v. 28, p. 14-39,1995.
  6. SILVA, Luiz Geraldo. 'Sementes da sedição'. Revolta escrava, etnia e controle social na América portuguesa (1750-1815). Afro-Asia (UFBA), Salvador, BA, v. 25-26, p. 09-60, 2001.
  7. REIS, João José. Quilombos e revoltas escravas no Brasil. Revista USP, São Paulo, v. 28, p. 14- 39, 1995
  8. REIS, João José. Há duzentos anos: a revolta escrava de 1814 na Bahia Scielo, Jan./June 2014.
  9. LOVEJOY, Paul E. Jihad e escravidão: a origem dos escravos muçulmanos da Bahia. Topoi, Rio de Janeiro: no. 1 (2000).
  10. RIBEIRO, Lidice Meyer Pinto. Negros Islâmicos no Brasil Escravocrata. Cadernos CERU, v. 22. 2011. p. 288.
  11. Miriam ZanuttiHaussás no Brasil Islamismo Sem Terror, acesso em 28/08/2020.