Discussão:Mário Eloy

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A 15 de Março de 1900 nasce em Algés e, com ele, a génese do segundo Modernismo português: Mário Eloy de Jesus Pereira. Filho de um ourives e neto de actores, herda dessa parte da família o gosto pela arte cénica, passando por uma breve aprendizagem de representação em palco e também por outras formas de expressão plástica, como a pintura. Mário Eloy irá revelar-se essencialmente um irreverente autodidacta, cunhando todas as suas obras de uma excentricidade muito pessoal, fruto do agitado e longo caminho que percorre.

Desejoso de descobrir o seu próprio caminho, acompanhando as vanguardas europeias e desapontado com o ensino na Escola de Belas-Artes de Lisboa, onde apenas estudou dois anos (1913-1915), Mário Eloy decide, aos 19 anos, aventurar-se numa viagem até Madrid, onde frequenta o Museu do Prado. Desviava-se assim das teias do destino que o prenderiam a um emprego como bancário.

Essa procura da diferença é incentivada por um espírito atormentado entre angústias, visões e paixões. De regresso a Portugal, em 1924, participa pela primeira vez numa exposição no Salão da Ilustração Portuguesa, sendo apelidado de “talentoso criativo moderno”. Trabalha em sintonia com a primeira geração do Modernismo português, vivendo as preocupações de um século à beira da ruptura e as revoluções que exaltam o povo. Como Almada Negreiros, mesmo quando ausente de Portugal, idealiza para a sua terra natal os mais ambiciosos projectos, a par do que vai acontecendo no estrangeiro, porque ambos sentem que Lisboa lhes pertence. Eduardo Viana será também uma figura muito importante no desenrolar das obras de Eloy e convida-o a participar na primeira Mostra de Arte Moderna, que organiza em 1925.

Mais tarde, em 1943, António Dacosta – um surrealista português – dirá acerca da obra de Mário: “A pintura de Eloy aperta como um nó cego uma humanidade actual e confusa, triste e emudecida.” Eis o contexto de guerra que a todos tira vida e acrescenta incertezas de um futuro cada vez menos risonho. É uma pintura que anuncia uma preocupação social, essencialmente atenta ao sofrimento humano.

É altura de partir para Paris, onde depois de algumas exposições descobre, em 1927, que Berlim era afinal a cidade onde poderia expandir todo o seu entusiasmo e criatividade. A arte em Paris estava, então, no ciclo do grande centro do mundo, onde circulava Picasso, Cézanne e mesmo Van Gogh: tudo aquilo que Eloy deles aprendera fora absorvido num novo sentido, no contexto da arte alemã.

Berlim estava aberta à novidade de uma forma mais objectiva, permitindo-lhe encontrar aí o seu caminho como expressionista – a vanguarda progressista do absurdo e do absoluto, que se distancia do Impressionismo pela procura de sensações interiores traduzidas para a tela. Os seus retratos são tão introspectivos que os modelos se vêem como não queriam ser retratados, mas acreditando que estão representados como são na realidade e que isso os ajuda a conhecerem-se a si próprios.

Mário Eloy tenta ler para além das aparências: interessam-lhe a expressividade das sensações e emoções interiores, optando frequentemente pela deformação ou desfiguração caricaturada. Em 1928, tem um filho e casa-se. É altura de começar a escrever em revistas alemãs; escrita que traz para Portugal, transformando-se num pintor-poeta. Dois anos mais tarde, é indicado para a Sociedade de Artistas Plásticos de Berlim, onde tem a honra de ser o único estrangeiro.

Em 1932, regressa sozinho a Portugal, para participar em exposições estatais e expor com os Artistas Independentes. Nesse ano ganhou o “Prémio Amadeo Souza-Cardoso”. Quando se inicia a Segunda Guerra Mundial, a mulher foge da Alemanha com o seu filho, para escapar ao regime de Hitler, e fixa-se na Holanda. Por seu lado, Mário Eloy, artista errante e inquieto, cede aos fantasmas da imaginação, e os seus quadros de 1939 entram no campo do delírio.

É desta data, mas com estudos desde 1937, uma das obras em depósito na colecção do CAMJAP: A Fuga. Inserida num período da vida de Eloy em que a sua actividade plástica atinge o auge da independência, apenas ainda com ligeiras afinidades com a obra plástica e poética de Chagall: o romper com a realidade, a vontade de fugir, de evasão, provocados pelo controverso contexto nacional e internacional.

O personagem foge do quadro envolvido em cores fortes, entre os azuis e os verdes repletos de intensidade, pintados com tintas sobrepostas que criam ondulações e vibrações no sentido da fuga. A rugosidade da tela incomoda igualmente a leitura da obra; o abraço desesperado à outra figura esboçada e sem expressão definida reflecte o seu estado de espírito. Em 1945, a doença rara de que sofre agudiza-se e é internado na Casa de Saúde do Telhal: a loucura fá-lo perder todas as genuínas capacidades.

Morre a 5 de Setembro de 1951, deixando uma obra em que se cruzam a expressão individual e o compromisso social.